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Jurisprudência


TRF3 0011029-89.2008.4.03.6000 00110298920084036000

Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. FINANCIAMENTO ESTUDANTIL. AGRAVO RETIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. DOCUMENTO HÁBIL. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRELIMINARES REJEITADAS. TABELA PRICE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS. CUMULAÇÃO DE MULTA MORATÓRIA E PENA CONVENCIONAL. DESPESAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM 20%. CLÁUSULA DE MANDATO. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. A parte apelante reiterou no recurso de apelação o agravo retido de fls. 121/123, interposto contra a decisão que indeferiu a produção de prova pericial, razão pela qual o agravo deve ser conhecido. Sustenta o agravante que é imprescindível a realização da prova pericial contábil, para verificar os índices e as taxas efetivamente aplicados pela CEF na atualização do débito, sobretudo se foi aplicada a redução da taxa de juros para 3,4% nos termos da Resolução nº 3.842/2010. Por sua vez, a CEF manifestou-se pelo não provimento do agravo, alegando que as questões discutidas são exclusivamente de direito. 2. O artigo 330 do Código de Processo Civil permite ao magistrado julgar antecipadamente a causa e dispensar a produção de provas, quando a questão for unicamente de direito e os documentos acostados aos autos forem suficientes ao exame do pedido. E o artigo 130 do Código de Processo Civil confere ao juiz a possibilidade de avaliar a necessidade da prova e de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, de modo que, caso a prova fosse efetivamente necessária a prova pericial contábil para o deslinde da questão, teria o Magistrado ordenado sua realização, independentemente de requerimento. Na hipótese, inexiste o alegado cerceamento de defesa, porquanto a parte recorrente confessa a existência da dívida, porém, de forma genérica e sem qualquer fundamentação, insurge-se contra os valores cobrados tão somente sob a alegação de onerosidade excessiva - deixando de questionar qualquer cláusula contratual que considere abusiva. 3. Para a propositura da ação monitória é exigido, tão somente, uma prova escrita da obrigação, destituída de força executiva, servindo, assim qualquer instrumento ou documento que traga em si alguma probabilidade de se reconhecer a existência da obrigação a ser cumprida. Vale dizer que o excesso de cobrança não inibe o procedimento monitório, pois tais valores podem ser revistos mediante simples cálculos aritméticos. 4. Com relação à alegação que os documentos trazidos pela autora a fim de demonstrar o montante do débito são unilaterais e não são aptos a demonstrar a liquidez da dívida, cumpre ressaltar que as planilhas de débito demonstrando a atualização do débito e discriminando os encargos cobrados sempre serão unilaterais. Ora, a parte assina um contrato que prevê os encargos moratórios e a forma de cálculo e, assim que verificada a inadimplência, a parte credora realiza os cálculos nos termos do contrato. É evidente que não se exige um documento bilateral para comprovação do valor atualizado e acrescido de encargos do débito. Assim, cabe à parte devedora apontar especificamente os equívocos existentes no cálculo do credor - ao invés disso, no caso preferiu o devedor alegar, de modo genérico, ausência de liquidez da dívida. 5. O C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.155.684/RN, sob a sistemática do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que os contratos firmados no âmbito do Programa de Financiamento Estudantil - Fies não se submetem às regras encartadas no Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista que o objeto do contrato não é propriamente um serviço bancário, mas a viabilização de programa do governo em benefício do estudante. 6. É possível a revisão do contrato de financiamento estudantil, desde que a apelante aponte concretamente alguma ilegalidade em suas cláusulas. 7. Inexiste qualquer ilegalidade na utilização do Sistema Francês de Amortização, conhecido como Tabela Price, previsto na cláusula que amortiza a dívida em prestações periódicas, iguais e sucessivas, cujo valor de cada prestação é composto de uma parcela de capital (amortização) e outra de juros. Isto porque esse tipo de amortização não acarreta incorporação de juros ao saldo devedor, já que os juros são pagos mensalmente, juntamente com as prestações, não havendo qualquer possibilidade de ocorrer anatocismo. Anote-se que a simples aplicação do referido sistema não implica, necessariamente, na vedada incidência de juros sobre juros, que somente poderá ocorrer na hipótese de amortização negativa, quando o valor da prestação for insuficiente para quitar a parcela de juros. 8. O C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.155.684/RN, sob a sistemática do art. 543-C do CPC, também havia pacificado o entendimento de que não se admite a capitalização de juros em contrato de crédito educativo, tendo em vista a inexistência de previsão expressa em norma específica. Por esta razão, entendia-se que a Súmula nº 121 do SFT, abaixa transcrita, aplicava-se aos contratos de crédito educativo. Ocorre que, posteriormente ao julgamento do mencionado recurso repetitivo pelo C. STJ, sobreveio a Medida Provisória nº 517, de 31/12/2010, que alterou a redação do art. 5º da Lei nº 10.260/2001 a fim de autorizar a cobrança de juros capitalizados mensalmente, a serem estipulados pelo Conselho Monetário Nacional, nos contratos submetidos ao Programa de Financiamento Estudantil. Desse modo, conclui-se que: (i) aos contratos de crédito educativo firmados até 30/12/10 é vedada a cobrança de juros sobre juros/capitalização de juros; (ii) todavia, a capitalização mensal é possível naqueles contratos celebrados após essa data. 9. Em relação à limitação das taxas de juros sobre o crédito educativo, devem ser observadas as seguintes limitações: a) a limitação de 6% (seis por cento) ao ano aplica-se somente aos contratos firmados até 23/09/1999; b) aos contratos firmados de 23/09/1999 até 30/06/2006, aplica-se o limite de 9% (nove por cento) ao ano, previsto na Medida Provisória nº 1.865/1999; c) aos contratos firmados de 01/07/2006 até 27/08/2009, aplicam-se os limites de 3,5% (três e meio por cento) ao ano para os cursos apontados no art. 1º, I, da Resolução CMN nº 3.415/2006, e 6,5% (seis e meio por cento) ao ano para os demais cursos; d) aos contratos firmados de 28/08/2009 até 10/03/2010, aplica-se o limite de 3,5% (três e meio por cento) ao ano para todos os cursos; e) por fim, para os contratos celebrados a partir de 11/03/2010, aplica-se o limite de 3,4% (três vírgula quatro por cento) ao ano. Demais disso, a partir de 15/01/2010, quando entrou em vigor, então, a Lei nº 12.202/10, as reduções da taxa juros estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional estendem-se aos saldos devedores de todos os contratos, ainda que firmados anteriormente, conforme estabelecido no seu art. 5º, § 10º. Assim, para todos os contratos do FIES, mesmo que anteriores à data de 15.01.2010, a partir de tal termo aplica-se a taxa de juros de 3,5% ao ano e, a partir de 10.03.2010, 3,4% ao ano, a título de juros. Do mesmo modo, também incidirão eventuais reduções de juros porventura determinadas pelo CMN. 10. A multa de mora ou multa moratória foi estabelecida em 2% sobre o valor da obrigação assumida no contrato e pode ser cobrada no caso de impontualidade no pagamento da prestação/parcela, incluindo a hipótese de vencimento antecipado da dívida. Enquanto que a pena convencional, também denominada de cláusula penal ou multa contratual ou multa compensatória, foi estabelecida em 10% sobre o total do débito apurado na forma do contrato e pode ser cobrada no caso de a CEF iniciar procedimento de cobrança, judicial ou extrajudicial. Estes dois encargos não ensejam bis in idem, porquanto possuem finalidades nitidamente diversas. 11. Quanto à cláusula contratual que prevê a cobrança de despesas judiciais e honorários advocatícios no patamar de 20%, resta prejudicado exame da matéria, pois a CEF, por mera liberalidade, não incluiu estes valores no débito em cobrança. 12. Analisada à luz do Código Civil, a denominada "cláusula mandato", que segundo o apelante autoriza a ré a efetuar o bloqueio de contas, aplicações, ou créditos do autor ou de seus fiadores, para fins de liquidar obrigações contratuais vencidas, não pode ser considerada abusiva ou desproporcional. De outro lado, não se verificou acontecimento extraordinário e imprevisível a autorizar a revisão do contrato, com fundamento no art. 478 do Código Civil. 13. No caso dos autos, verifico que foram juntadas cópias do contrato às fls. 09/15 e dos aditamentos às fls. 17/23, 25/29, 31/35, 37/38 e 40/41. O sistema de amortização, conhecido como Tabela Price, está previsto na cláusula 10ª do contrato e dos aditamentos. Todavia, conforme já explicado, a adoção desse sistema para amortização da dívida não enseja, por si só, qualquer ilegalidade. De outro lado, a parte apelante não logrou demonstrar que a CEF esteja aplicando tal sistema de modo a ensejar amortização negativa. O contrato fora firmado em 21/05/2001 e, em sua cláusula 11ª, previu a capitalização mensal dos juros (fl. 13). Todavia, por ter sido celebrado antes de 30/12/2010, é vedada a capitalização mensal dos juros. À época da contratação, estava vigente a Medida Provisória nº 1.865/1999 que fixava a taxa de juros em 9%. Contudo, conforme explicado, a partir de 15/01/2010, as reduções da taxa juros estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional devem incidir sobre o saldo devedor dos contratos já formalizados. Portanto, no caso dos autos, aplica-se, sobre o saldo devedor a taxa de juros: (i) de 3,5% (três e meio por cento) ao ano, a partir de 15/01/2010, e; (ii) de 3,4% (três vírgula quatro por cento) ao ano, a partir de 10/03/2010. Não há demonstração de qualquer ilegalidade decorrente da fixação de pena convencional em 10% sobre o total do débito apurado na forma do contrato. Também não restou demonstrada a cobrança de despesas judiciais e honorários advocatícios no patamar de 20% ou a utilização da cláusula de mandato. 14. Tratando-se de sucumbência recíproca, determino o rateio das custas e despesas processuais e a cada parte arcar com os honorários advocatícios de seu patrono. 15. Recurso de apelação da parte autora parcialmente provido, para afastar a capitalização mensal dos juros, bem como para determinar a redução da taxa de juros para 3,5% (três vírgula cinco por cento) ao ano no período de 15/01/2010 à 09/03/2010 e para 3,4% (três vírgula quatro por cento) ao ano a partir de 10/03/2010, nos termos do voto.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares e dar parcial provimento ao recurso de apelação da parte autora, para afastar a capitalização mensal dos juros, bem como para determinar a redução da taxa de juros para 3,5% (três vírgula cinco por cento) ao ano no período de 15/01/2010 à 09/03/2010 e para 3,4% (três vírgula quatro por cento) ao ano a partir de 10/03/2010, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 24/05/2017
Data da Publicação : 30/05/2017
Classe/Assunto : AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1933422
Órgão Julgador : QUINTA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/05/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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