TRF3 0011434-86.2016.4.03.6181 00114348620164036181
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL
DE DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NÃO DEMONSTRADA. COAÇÃO
MORAL IRRESISTÍVEL. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA
DROGA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTIGO 33,
§ 4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE
FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. As circunstâncias da prisão, o reconhecimento do recebimento de valores
do exterior por parte de DAMIAN NWANZE CHIBUIKE, bem como a declaração do
réu GIUSEPPE TUFANO de que retornaria à Itália na data de sua prisão
evidenciam que a droga apreendida em seu poder destinava-se ao exterior,
o que já é suficiente para caracterizar a transnacionalidade e atrair
a competência da Justiça Federal. Consoante o artigo 40, I, da Lei n°
11.343/2006, é necessário somente que "a natureza, a procedência da
substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciem
a transnacionalidade do delito", e não que haja a efetiva transposição
de fronteira s entre os países.
2. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos.
3. Para fazer jus à escusa do estado de necessidade, é imprescindível
que o agente se encontre diante de uma "situação de perigo atual", que
tenha gerado a "inevitabilidade da conduta lesiva". E no presente caso,
além de tais requisitos não estarem comprovados, é certo que existem
inúmeros caminhos lícitos de suprir ou amenizar problemas financeiros,
sem necessitar partir para a criminalidade. Contudo, os réus optaram pela
saída cômoda, preferindo auferir proventos de maneira fácil, adentrando no
repugnante mundo do crime, cometendo tráfico internacional de entorpecentes.
4. Para que tal tese da coação moral irresistível fosse aceita, deveria
haver elementos probatórios nesse sentido, ou, ao menos, uma narrativa coesa
e verossímil por parte do réu. Isso porque não há prova alguma nos autos
de que teria sofrido qualquer tipo de coação. Na hipótese, o próprio réu
GIUSEPPE TUFANO reconheceu que foi contratado para o transporte da mochila
e que veio ao Brasil com essa finalidade, sem qualquer fato que leve a crer
que o fez contra a sua vontade.
5. Dosimetria da Pena. Primeira fase. Idêntica para os dois corréus. Trata-se
de réus primários, que não ostentam maus antecedentes, bem como as
demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não lhe são
desfavoráveis e, considerando o entendimento fixado pela 11ª Turma desta
Corte, bem como a quantidade da droga apreendida, 867g (oitocentos e sessenta
e sete gramas) de cocaína, a pena-base deve ser reduzida para 05 (cinco)
anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
6. Segunda fase. Idêntica para os dois corréus. A confissão dos réus,
porque espontânea, ou seja, sem a intervenção de fatores externos,
autoriza o reconhecimento da atenuante genérica, em 1/6, inclusive porque
foi utilizada como um dos fundamentos da condenação. A pena na segunda
fase fica estabelecida em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos)
dias-multa, observada a Súmula 231 do STJ.
7. Terceira fase da dosimetria. Mantida, para ambos os réus, a majoração
da pena em decorrência da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I,
da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito), no percentual mínimo
de 1/6 (um sexto).
8. Em relação ao réu Giuseppe Tufano, do fato puro e simples de determinada
pessoa servir como "mula" para o transporte de droga não é possível,
por si só, inferir a inaplicabilidade da causa de diminuição de pena
prevista no § 4º do artigo 33 da Lei 11.342/2006, por supostamente integrar
organização criminosa. Trata-se de apelante primário, que não ostenta
maus antecedentes, conforme comprovam os documentos acostados aos autos, bem
como considerando que não há prova nos autos de que se dedica a atividades
criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa,
apesar de encarregado do transporte da droga. Caberia à acusação fazer
tal comprovação, o que não ocorreu no caso dos autos. Certamente, estava
a serviço de bando criminoso internacional, o que não significa, porém,
que fosse integrante dele.
9. Pena definitiva para o réu Giuseppe Tufano, em 4 (quatro) anos, 10 (dez)
meses e 10 (dez) dias de reclusão, e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco)
dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo,
vigente na data dos fatos.
10. Em relação ao réu Damian Nwanze Chibuike, seu papel não pode ser
encarado como simples mula, pois ele foi o elo entre os integrantes da
organização criminosa dedicada ao tráfico internacional de entorpecentes e
o corréu Giuseppe Tufano. Tal fato é indicativo de que se dedica ao tráfico
internacional de drogas como meio de vida, razão pela qual não merece a
aplicação da causa de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33,
da Lei 11343/06.
11. Pena definitiva do réu Damian Nwanze Chibuike fixada em 5 (cinco) anos,
10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa,
no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na
data dos fatos.
12. Regime inicial semiaberto para ambos os réus, nos termos do art. 33,
§ 2º, b, do Código penal, mesmo considerando-se o disposto no § 2º do
art. 387 do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.º 12.736/2012.
13. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera
quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do
art. 44 do Código Penal.
14. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
15. Apelações das defesas parcialmente providas.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL
DE DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NÃO DEMONSTRADA. COAÇÃO
MORAL IRRESISTÍVEL. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA
DROGA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTIGO 33,
§ 4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE
FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. As circunstâncias da prisão, o reconhecimento do recebimento de valores
do exterior por parte de DAMIAN NWANZE CHIBUIKE, bem como a declaração do
réu GIUSEPPE TUFANO de que retornaria à Itália na data de sua prisão
evidenciam que a droga apreendida em seu poder destinava-se ao exterior,
o que já é suficiente para caracterizar a transnacionalidade e atrair
a competência da Justiça Federal. Consoante o artigo 40, I, da Lei n°
11.343/2006, é necessário somente que "a natureza, a procedência da
substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciem
a transnacionalidade do delito", e não que haja a efetiva transposição
de fronteira s entre os países.
2. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos.
3. Para fazer jus à escusa do estado de necessidade, é imprescindível
que o agente se encontre diante de uma "situação de perigo atual", que
tenha gerado a "inevitabilidade da conduta lesiva". E no presente caso,
além de tais requisitos não estarem comprovados, é certo que existem
inúmeros caminhos lícitos de suprir ou amenizar problemas financeiros,
sem necessitar partir para a criminalidade. Contudo, os réus optaram pela
saída cômoda, preferindo auferir proventos de maneira fácil, adentrando no
repugnante mundo do crime, cometendo tráfico internacional de entorpecentes.
4. Para que tal tese da coação moral irresistível fosse aceita, deveria
haver elementos probatórios nesse sentido, ou, ao menos, uma narrativa coesa
e verossímil por parte do réu. Isso porque não há prova alguma nos autos
de que teria sofrido qualquer tipo de coação. Na hipótese, o próprio réu
GIUSEPPE TUFANO reconheceu que foi contratado para o transporte da mochila
e que veio ao Brasil com essa finalidade, sem qualquer fato que leve a crer
que o fez contra a sua vontade.
5. Dosimetria da Pena. Primeira fase. Idêntica para os dois corréus. Trata-se
de réus primários, que não ostentam maus antecedentes, bem como as
demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não lhe são
desfavoráveis e, considerando o entendimento fixado pela 11ª Turma desta
Corte, bem como a quantidade da droga apreendida, 867g (oitocentos e sessenta
e sete gramas) de cocaína, a pena-base deve ser reduzida para 05 (cinco)
anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
6. Segunda fase. Idêntica para os dois corréus. A confissão dos réus,
porque espontânea, ou seja, sem a intervenção de fatores externos,
autoriza o reconhecimento da atenuante genérica, em 1/6, inclusive porque
foi utilizada como um dos fundamentos da condenação. A pena na segunda
fase fica estabelecida em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos)
dias-multa, observada a Súmula 231 do STJ.
7. Terceira fase da dosimetria. Mantida, para ambos os réus, a majoração
da pena em decorrência da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I,
da Lei n.º 11.343/06 (transnacionalidade do delito), no percentual mínimo
de 1/6 (um sexto).
8. Em relação ao réu Giuseppe Tufano, do fato puro e simples de determinada
pessoa servir como "mula" para o transporte de droga não é possível,
por si só, inferir a inaplicabilidade da causa de diminuição de pena
prevista no § 4º do artigo 33 da Lei 11.342/2006, por supostamente integrar
organização criminosa. Trata-se de apelante primário, que não ostenta
maus antecedentes, conforme comprovam os documentos acostados aos autos, bem
como considerando que não há prova nos autos de que se dedica a atividades
criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa,
apesar de encarregado do transporte da droga. Caberia à acusação fazer
tal comprovação, o que não ocorreu no caso dos autos. Certamente, estava
a serviço de bando criminoso internacional, o que não significa, porém,
que fosse integrante dele.
9. Pena definitiva para o réu Giuseppe Tufano, em 4 (quatro) anos, 10 (dez)
meses e 10 (dez) dias de reclusão, e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco)
dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo,
vigente na data dos fatos.
10. Em relação ao réu Damian Nwanze Chibuike, seu papel não pode ser
encarado como simples mula, pois ele foi o elo entre os integrantes da
organização criminosa dedicada ao tráfico internacional de entorpecentes e
o corréu Giuseppe Tufano. Tal fato é indicativo de que se dedica ao tráfico
internacional de drogas como meio de vida, razão pela qual não merece a
aplicação da causa de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33,
da Lei 11343/06.
11. Pena definitiva do réu Damian Nwanze Chibuike fixada em 5 (cinco) anos,
10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa,
no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na
data dos fatos.
12. Regime inicial semiaberto para ambos os réus, nos termos do art. 33,
§ 2º, b, do Código penal, mesmo considerando-se o disposto no § 2º do
art. 387 do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.º 12.736/2012.
13. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera
quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do
art. 44 do Código Penal.
14. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
15. Apelações das defesas parcialmente providas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª
Região, por unanimidade, em dar parcial provimento à apelação da defesa
de GIUSEPPE TUFANO, apenas para reduzir a pena-base, restando estabelecida
a pena definitiva em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de
reclusão, no regime prisional inicial semiaberto e 485 (quatrocentos e
oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo, vigente na data dos fatos e dar parcial provimento
à apelação de DAMIAN NWANZE CHIBUIKE, para reduzir a pena-base e fixar
o regime prisional inicial semiaberto, restando estabelecida a pena em 5
(cinco) anos, 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três)
dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo,
vigente na data dos fatos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
25/07/2017
Data da Publicação
:
03/08/2017
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 70825
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO SIDMAR MARTINS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Observações
:
OBJETO DO CRIME: APREENDIDA 867G DE COCAINA.
Referência
legislativa
:
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4 ART-40 INC-1
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-59 ART-33 PAR-2 LET-B ART-44
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-231
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-387 PAR-2
LEG-FED LEI-12736 ANO-2012
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/08/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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