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Jurisprudência


TRF3 0011528-83.2013.4.03.6134 00115288320134036134

Ementa
PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. LEI Nº 8.137/90. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO CONFIGURADA. PROCEDIMENTO FISCAL. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. VALIDADE DA INTIMAÇÃO POR EDITAL E AVISO DE RECEBIMENTO. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE POR DIFICULDADES FINANCEIRAS. INAPLICABILIDADE. CONTINUIDADE DELITIVA CARACTERIZADA. APELAÇÕES DOS RÉUS NÃO PROVIDAS. - Nos crimes societários, embora as condutas dos réus nem sempre sejam amplamente especificadas na denúncia, deve-se constar da narrativa, o liame entre a conduta e a autoria, a permitir o exercício da ampla defesa e do contraditório. Se da simples leitura da peça acusatória verificar-se a possibilidade do exercício de defesa plena do réu, não há se falar em inépcia da inicial, sendo este o caso dos autos. - Não há se falar em nulidade do procedimento administrativo por cerceamento de defesa, tendo em vista a citação por edital, bem como a intimação dos réus por meio de aviso de recebimento (A.R.), não resultando qualquer prejuízo aos Apelantes. - A perfectibilização do crime previsto no artigo 1º, incisos I a IV, da Lei n.º 8.137/1990 exige supressão ou redução do tributo, de modo que haja efetiva ofensa ao bem jurídico tutelado, com prejuízo patrimonial ao erário público, bem como o lançamento definitivo do crédito tributário, nos termos da Súmula Vinculante n.º 24. - Materialidade delitiva não contestada e comprovada por meio das Peças Informativas n.º 1.34.008.000442/2012-94, e os documentos que a acompanham, sobretudo a Representação Fiscal para Fins Penais, os Termos de Constatação e Intimação, pelas cópias das Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais e Declarações de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica, os Demonstrativos de Apuração das Contribuições Sociais - DACON, as Declarações de Imposto de Renda Pessoa Jurídica, o Relatório do Trabalho Fiscal, os Autos de Infração, os quais demonstram a supressão e redução desses tributos federais no que tange aos anos-calendários de 2007 e 2008. - Em se tratando de crime de sonegação fiscal, a materialidade do crime acaba sendo comprovada por meio da constituição definitiva do crédito tributário e da cópia do Procedimento Administrativo Fiscal, os quais gozam de presunção de legitimidade e veracidade, porquanto se cuidam de atos administrativos, não havendo que se falar em qualquer nulidade, conforme já analisado em tópico acima. - Autoria não contestada e comprovada por meio de certidão simplificada da JUCESP e da prova testemunhal, tendo sido demonstrado, à época da ocorrência dos fatos, que os increpados exerciam a administração da empresa e, portanto, detinham a responsabilidade de prestarem informações ao Fisco, sem qualquer redução ou supressão de tributos. - Nos crimes contra a ordem tributária, basta o dolo genérico, consubstanciado na supressão voluntária de tributos federais mediante a omissão de informação ao Fisco, não havendo se comprovar que houve intenção em sua conduta. - É certo que a tese das dificuldades financeiras como causa supralegal de excludente da culpabilidade tem sido aceita, de forma restrita, nas situações de tributos descontados ou cobrados do contribuinte de fato, como nos casos do artigo 168-A do Código Penal e artigo 2º, inciso II, da Lei n.º 8.137/1990, cujas condutas prescindem de fraude. - Para que se justifique a exclusão da culpabilidade nesses casos, tais dificuldades devem ser intensas, devem extrapolar a mera situação de penúria, isto é, deve-se analisar se estava em risco a própria sobrevivência da empresa, se não foi o próprio agente quem, por meio de gestão temerária ou fraudulenta, deu causa à má situação financeira, e se a prática da conduta tipificada foi medida última, excepcional e ocasional (e não rotineira). - Contudo, as causas supralegais de culpabilidade invocadas pela defesa (inexigibilidade da conduta diversa e estado de necessidade exculpante) não se aplicam ao delito do artigo 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.137/1990, pois a sonegação pressupõe o emprego de fraude por parte do agente, o que torna absolutamente irrelevante a existência de dificuldades financeiras da pessoa jurídica e sua capacidade econômica para eventual recolhimento do tributo. Portanto, tais dificuldades podem até impedir o pagamento do tributo, mas não justificam a omissão de informações à autoridade fazendária. - Atento a estes elementos dispostos no artigo 59 do Código Penal, o magistrado avaliou cada uma das circunstâncias e entendeu que a pena-base quanto a esse réu deveria ser fixada no mínimo legal, em 02 (dois) anos de reclusão, o que deve ser mantido face à correta aferição do magistrado e à míngua de recurso da acusação. - Na segunda fase o juízo a quo refutou a aplicação da atenuante genérica da confissão espontânea (art. 65, inciso III, "d", do Código Penal), pedido reiterado pelo réu em sede de Apelação. - No caso em concreto, verifica-se que o acusado confessou os fatos em seu interrogatório judicial, embora tenha alegado que somente deixou de pagar os tributos devidos em razão de invencíveis dificuldades financeiras, fato que ensejaria o reconhecimento da "confissão", na modalidade qualificada, conforme acima mencionado. Não obstante, tendo em vista que a pena-base foi fixada no mínimo legal, a aplicação dessa atenuante ensejaria a redução da reprimenda abaixo do patamar legal, o que esbarra n a Súmula n. 231 do STJ, a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. - Na terceira fase da dosimetria o juízo a quo reputou que deveria incidir o aumento da pena em ¼ (um quarto) em decorrência da continuidade delitiva, contudo, registre-se que o concurso de crimes não integra o sistema trifásico da pena, devendo a eventual majoração pela sua ocorrência dar-se após o encerramento da última fase da dosimetria, notadamente porque só há que se falar em sua aplicação após conhecidos todos os delitos sancionados pelo julgador, devendo a pena ser mantida até a terceira fase em 02 (dois) anos de reclusão. - O réu defende-se dos fatos narrados na exordial e não da capitulação jurídica, de modo que se verifica, com clareza, na descrição na exordial e em análise aos autos que houve a prática de sonegação fiscal em diversas competências dos anos de 2008 e 2009, restando configurada a perpetração da conduta delitiva de forma reiterada e tendo em vista a ocorrência de crimes de mesma espécie, além da semelhança das condições de tempo, lugar e maneira de execução, revelando-se imperioso o reconhecimento do crime continuado (artigo 71 do Código Penal), mantendo-se a sentença recorrida. - Acerca do quantum de aumento, em acórdão relatado pelo Desembargador Federal Nelton dos Santos, a Segunda Turma deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região adotou o critério de aumento decorrente da continuidade delitiva, qual seja, de dois meses a um ano de omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias, o acréscimo é de 1/6 (um sexto); de um a dois anos de omissão, aumenta-se 1/5 (um quinto); de dois a três anos de omissão, ¼ (um quarto); de três a quatro anos de omissão, 1/3 (um terço); de quatro a cinco anos de omissão, ½ (um meio); e acima de cinco anos de omissão, 2/3 (dois terços) de aumento (TRF 3ª Região, Segunda Turma, ACR n.º 11780, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos). - Nesta perspectiva, considerando que os fatos dizem respeito à supressão e redução de IRPJ, PIS e COFINS em diversas competências consecutivas referentes a 2008 e 2009, correta a fração de aumento fixada em 1/4 (um quarto) pela sentença recorrida, resultando a reprimenda em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão. - A fixação da pena de multa deve levar em consideração seus limites mínimo e máximo com adoção de proporcionalidade em face da pena privativa de liberdade, atendendo, pois, aos preceitos constitucionais (da legalidade, da proporcionalidade e da individualidade) e legais (Exposição de Motivos da Reforma da Parte Geral do Código Penal). - No caso concreto, o magistrado sentenciante não observou o critério acima estabelecido e fixou a pena de multa no mínimo legal. Contudo, ante a ausência de recurso da acusação e a proibição da reformatio in pejus, resta mantido a pena tal como fixada em primeira grau, em 10 (dez) dias-multa. - O valor do dia-multa foi fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à data dos fatos e como deve ser mantido ante a ausência de recurso sobre o tema e porque se coaduna à situação financeira do réu. - O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade deve ser o ABERTO (alínea "c" do parágrafo 2º do artigo 33 do Código Penal), conforme corretamente fixado na sentença recorrida. - Presentes os requisitos dos incisos I e II do art. 44 do Código Penal (pena privativa de liberdade aplicada não superior a quatro anos, crime praticado sem violência ou grave ameaça e réu não reincidente em crime doloso), e sendo a medida suficiente (art. 44, inciso III, do Código Penal), a pena privativa de liberdade aplicada foi substituída pelo juízo a quo por duas penas restritivas de direitos (art. 44, § 2º, do Código Penal), consistentes em prestação de serviços à comunidade, a ser cumprida no local do domicílio do condenado, de acordo com suas aptidões, em entidade a ser indicada pelo Juízo das Execuções Penais, à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixada de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, bem como em prestação pecuniária a ser paga a entidade com destinação social no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), o qual ficará à disposição do Juízo Federal das Execuções Penais. À míngua de recurso acerca do tema e tendo em vista que a substituição observou os critérios legais e a individualização da pena, nada há a ser modificado. - Apelações dos réus não providas.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, REJEITAR AS PRELIMINARES arguidas pela defesa E NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DOS RÉUS, mantendo na íntegra a sentença recorrida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 23/10/2018
Data da Publicação : 05/11/2018
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 63199
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : LEG-FED LEI-8137 ANO-1990 ART-1 INC-1 INC-2 INC-3 INC-4 ***** STFV SÚMULA VINCULANTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL LEG-FED SUV-24 ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-168A ART-59 ART-65 INC-3 LET-D ART-33 PAR-2 LET-C ART-44 INC-1 INC-2 INC-3 PAR-2 LEG-FED LEI-8137 ANO-1990 ART-2 INC-2 ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-231
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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