main-banner

Jurisprudência


TRF3 0011538-94.2016.4.03.0000 00115389420164030000

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. DOCUMENTO NOVO. INEXISTÊNCIA. ERRO DE FATO. OCORRÊNCIA. OBSERVÂNCIA DE VÍNCULOS EM MÚLTIPLOS NIT. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. DESCONTO DE PERÍODO DE EXERCÍCIO CONCOMITANTE DE ATIVIDADE LABORATIVA. IMPOSSIBILIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITO DE OPÇÃO AO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. IMPOSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO DO JULGADO SE OPTADO PELO BENEFÍCIO CONCEDIDO NA VIA ADMINISTRATIVA. IUDICIUM RESCINDENS. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA. IUDICIUM RESCISORIUM. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO SUBJACENTE. VERBA HONORÁRIA. CONDENAÇÃO. 1. Fundada a ação rescisória na existência de documento novo, a prova nova deve ser, por si só, suficiente para modificar o julgado rescindendo, ainda que de forma parcial. Não se objetiva reabrir a dilação probatória para, simplesmente, suprir deficiência do conjunto probatório produzido na ação originária, decorrente da não observância pela parte, por desídia ou negligência, de seu ônus processual probatório, mas, sim, viabilizar a apresentação de prova nova, cuja existência a parte ignorava ou de que não podia fazer uso, bem como, em casos excepcionais, documento cujo valor probatório era desconhecido pela parte em razão de circunstâncias vulnerabilizantes, como aquelas vivenciadas por trabalhadores rurais. 2. Patente a inexistência de prova nova para fins rescisórios, haja vista que os documentos colacionados como tal já constavam dos autos da demanda subjacente. 3. Embora não reconhecida a existência de prova nova, entende-se ser devida, também, a apreciação da hipótese rescindenda prevista no artigo 966, VIII, do CPC/2015, aplicando-se os princípios da mihi factum, dabo tibi ius e iura novit curia. Ainda que não apontada expressamente a referida hipótese rescindenda a causa de pedir é voltada à explicitação da ocorrência de erro de fato no julgado rescindendo. Não se reconhece qualquer prejuízo à autarquia, a qual em exercício de contraditório e ampla defesa, defendeu-se quanto aos fatos apontados pela autora, sustentando entendimento no sentido de que os recolhimentos constantes do segundo do NIT ainda deveriam ser objeto de "verificação" para comprovação da qualidade de segurada. 4. Para que seja reconhecido erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva para a conclusão do decidido. Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo. 5. No caso concreto, a autora possui dois números de identificação do trabalhador (NIT). O julgado rescindendo, ao apreciar a existência da qualidade de segurada, entendeu que autora não contava com quaisquer contribuições posteriores a 2003, considerando o extrato do CNIS relativo unicamente a um NIT. Ao não observar a existência de um segundo NIT, nos quais constavam vínculos posteriores a 2003 e que conferiam à autora qualidade de segurada na data da entrada do requerimento administrativo, verifica-se ter o julgado rescindendo considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que influiu de forma definitiva para a conclusão de improcedência dos pedidos formulados na demanda subjacente. 6. A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal. 7. A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe garanta a subsistência. Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis). 8. Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no artigo 151 da Lei n.º 8.213/91. Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia. 9. Reconhecido o direito da autora à percepção de aposentadoria por invalidez, com renda mensal a ser calculado pela autarquia na forma do artigo 44 da Lei n.º 8.213/91. 10. Fixada a data de início do benefício na data do indeferimento administrativo, isto é, em 23.10.2009, observando-se pedido expresso na subjacente e nesta ação rescisória (artigo 492 do CPC). 11. Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação e na necessidade de devolução das parcelas recebidas durante o período que o segurado auferiu renda. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez. 12. Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária de lhe conceder o benefício vindicado, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. 13. Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode simplesmente afastar a incapacidade, como sustenta o INSS, ou admitir a penalização do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime. Precedentes. 14. É faculdade do demandante a opção pela percepção do benefício que se lhe afigurar mais vantajoso, vedado, contudo, o recebimento em conjunto de duas aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da Lei nº 8.213/91, e, com isso, a execução dos valores atrasados é condicionada à opção pelo benefício concedido em Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados concomitantemente com a manutenção do benefício concedido administrativamente representaria uma "desaposentação" às avessas, cuja possibilidade - renúncia de benefício - é vedada por lei - art. 18, §2º da Lei nº 8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C. Supremo Tribunal Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC. 15. A autora percebe, desde 18.05.2015, aposentadoria por idade, na qual foram computadas contribuições vertidas após a data fixada para o início da aposentadoria por invalidez. No caso de opção pelo benefício judicial, os valores devidos por força da presente condenação deverão ser compensados com aqueles já pagos administrativamente no período concomitante. 16. A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada, desde a data de cada vencimento, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da elaboração da conta, com aplicação do IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), com efeitos prospectivos. 17. Os juros de mora, incidentes mês a mês a partir da citação na ação subjacente até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Cálculos e Procedimentos aplicável à Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante. 18. Verba honorária fixada em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a data deste julgado. 19. Rejeitada a matéria preliminar. Em juízo rescindendo, com fundamento no artigo 966, VIII, do CPC/2015, julgada procedente a ação rescisória para desconstituir o julgado na ação subjacente. Em juízo rescisório, nos termos do artigo 487, I, do CPC/2015, julgado procedente o pedido formulado na ação subjacente para condenar a autarquia, observado o direito de escolha da autora pelo benefício que lhe for mais vantajoso, na implantação de aposentadoria por invalidez.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar suscitada; em juízo rescindendo, julgar procedente a presente ação rescisória para desconstituir o julgado na ação subjacente; e, em juízo rescisório, julgar procedente o pedido formulado na ação subjacente para condenar a autarquia, observado o direito de escolha da autora pelo benefício que lhe for mais vantajoso, na implantação de aposentadoria por invalidez, com data de início do benefício fixada em 23.10.2009 e renda mensal a ser calculado na forma do artigo 44 da Lei n.º 8.213/91; compensando-se os valores devidos com aqueles já pagos administrativamente no período concomitante, condenar o INSS no pagamento das prestações vencidas devidamente acrescidas de juros de mora mensais, desde a data da citação na ação subjacente até a expedição do ofício requisitório, e de correção monetária, desde a data de cada vencimento, calculados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da elaboração da conta, aplicando-se o IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), com efeitos prospectivos; e, no pagamento de honorários advocatícios no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, consideradas as parcelas vencidas até a data deste julgamento; bem como, por maioria, decide, na hipótese de opção pelo benefício concedido na via administrativa, vedar a execução dos valores decorrentes do benefício ora obtido judicialmente, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 14/03/2019
Data da Publicação : 27/03/2019
Classe/Assunto : AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 11227
Órgão Julgador : TERCEIRA SEÇÃO
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Referência legislativa : ***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-966 INC-8 ART-492 ART-487 INC-1 ***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-485 INC-9 PAR-1 PAR-2 ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-201 INC-1 ***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-42 ART-43 ART-44 ART-45 ART-46 ART-47 ART-59 ART-60 ART-61 ART-62 ART-63 ART-151 ART-18 PAR-2 ART-124 INC-2
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/03/2019 ..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão