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Jurisprudência


TRF3 0011577-27.2007.4.03.6105 00115772720074036105

Ementa
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINARES DE CERCEAMENTO DE DEFESA, CARÊNCIA DA AÇÃO E ILEGITIMDADE PASSIVA REJEITADAS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EXTRAÇÃO CLANDESTINA DE AREIA EM PROPRIEDADE LOCALIZADA NO MUNICÍPIO DE JAGUARIÚNA. DANO AMBIENTAL CONFIGURADO. CONDENAÇÃO POR CRIME AMBIENTAL. NÃO CUMPRIMENTO DE PARTE DA TRANSAÇÃO PENAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E PROPTER REM DO POSSUIDOR. FUNÇÃO SÓCIO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE. - A alegação de cerceamento de defesa suscitada pelo apelante. Com efeito, o magistrado, no uso de suas atribuições, deverá estabelecer a produção de provas que sejam importantes e necessárias ao deslinde da causa, é dizer, diante do caso concreto, deverá proceder à instrução probatória somente se ficar convencido da prestabilidade da prova (TRF/3ª Região, AI nº 405916, Processo 00139752120104030000, Rel. Des. Márcio Moraes, 3ª Turma, e-DJF3 de 03/12/2010, p. 320). Sendo destinatário natural da prova, o juiz tem o poder de decidir acerca da conveniência e da oportunidade de sua produção, visando obstar a prática de atos inúteis ou protelatórios, desnecessários à solução da causa. No caso, existe amplo conjunto probatório (extensa documentação, laudos elaborados por especialistas em meio ambiente e por profissionais integrantes dos órgãos oficiais de proteção ao meio ambiente e outros) suficiente para a resolução da controvérsia. - Não há que se falar em carência de ação. Resta demonstrado nos autos o interesse de agir, condição da ação que se faz presente toda vez que da provocação do aparato judiciário tem o proponente de determinada demanda, in abstracto, a condição de aferir em seu benefício algum resultado concreto útil. A tutela jurisdicional demonstra-se necessária e adequada. - Quanto à alegada ilegitimidade passiva ad causam, como pertinentemente destacado pelo MPF nos autos que: "Mesmo que o Município tenha assumido que iria recuperar a área pois necessitava de um local para ser usado como aterro de inertes, a responsabilidade do réu subsiste, de forma solidária, tanto por ter sido o causador direto do dano ambiental perpetrado como por ser o proprietário da área". - O INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA ajuizou a presente ação civil pública em face de VALDIR BODINI, objetivando obter tanto a cessação da prática de conduta lesiva ao meio ambiente decorrente de extração clandestina de areia em propriedade localizada no município de Jaguariúna levada a cabo por empresa do apelante, denominada Cerâmica Bodini, como a recuperação de área degradada e o pagamento de indenização pelos danos causados. - O art. 225 da Constituição Federal consagrou o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental, criando o dever de o agente degradador reparar os danos causados e estabeleceu o fundamento de responsabilização de agentes poluidores, pessoas físicas e jurídicas. Para assegurar a efetividade desse direito, a CF determina ao Poder Público, entre outras obrigações, que crie espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos em todas as unidades da Federação. - Com relação à tutela ambiental, se aplica a responsabilidade objetiva, ou seja, não há espaço para a discussão de culpa, bastando a comprovação da atividade e o nexo causal com o resultado danoso. Tal responsabilização encontra fundamento nos artigos 4º, VII, c/c 14, §1º, ambos, da Lei nº 6.938/81. - Quanto ao cometimento de danos ambientais e ao dever de repará-los, tem-se que as obrigações decorrentes de eventuais prejuízos ou interferências negativas ao meio ambiente são propter rem, possuindo caráter acessório à atividade ou propriedade em que ocorreu a poluição ou degradação. O simples fato de o novo proprietário/possuidor se omitir no que tange à necessária regularização ambiental é mais do que suficiente para caracterizar o nexo causal. - A Constituição Federal estabelece que "a propriedade atenderá a sua função social" (art. 5º, inciso XXIII) e que o Código Civil assinala que "o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas" (artigo 1.228, § 1º, da Lei 10.406/02). - Não se pode negar, portanto, que a função social da propriedade só é observada se utilizada de forma racional, com a preservação do meio ambiente, e se atendidos os objetivos previstos na legislação para cada tipo de área protegida. Desrespeitar uma área definida como de Preservação Permanente, construindo-se, por exemplo, um imóvel no local protegido, significa descumprir sua função ambiental, o que é suficiente para caracterizar o dano ao meio ambiente. Tal prejuízo só pode ser reparado com a destruição do imóvel erguido em local indevido, o que possibilitará a regeneração natural da vegetação originariamente existente e garantirá o retorno da função sócio ambiental daquela propriedade. - No caso dos autos, VALDIR BODINI, em decorrência das referidas condutas lesivas ao meio ambiente, foi processado criminalmente. Nos autos do Processo nº 2001.61.05.001829-7, que tramitou perante a 1ª. Vara Federal de Campinas, o apelante, através do instituto da transação penal, se comprometeu a pagar a quantia de três salários mínimos ao centro CORSINI e a promover a recuperação da área degradada através de um PRAD. A prestação pecuniária foi paga, todavia, depois de transcorridos quase 5 (cinco) anos da homologação da transação penal, o apelante não cumpriu integralmente a obrigação de recuperar as áreas degradadas conforme o PRAD apresentado, fato que motivou o IBAMA a ajuizar a presente ação pública. - Encontra-se claramente demonstrado nos autos, através do conjunto probatório (extensa documentação, laudos elaborados por especialistas em meio ambiente e por profissionais integrantes dos órgãos oficiais de proteção ao meio ambiente, bem como amplo material fotográfico), o descumprimento do referido PRAD. - Ao contrário do alegado por VALDIR BODINI, não houve ampliação indevida das áreas a serem recuperadas. Conforme observou o Ministério Público Federal, em seu parecer, não obstante a CETESB ter apurado, no curso desta ação, que a empresa "Cerâmica Bodini Ltda", de propriedade do apelante, também não possui licença para extração de argila e operação de olaria, é certo que o IBAMA, na condição de autor, deixou claro que o objeto da presente ação civil pública se restringe ao PRAD de fls. 254/306. - Não há que se falar que, em razão do apelante já ter cumprido o PRAD naquilo que o competia, ficaria a cargo do município de Jaguariúna o aterramento e a recuperação ambiental da área. VALDIR BODINI, alegando dificuldades financeiras, celebrou parceria com o município de Jaguariúna para promover o aterramento de parte da área. Entretanto, a autorização da referida parceria não afasta a responsabilidade do apelante pelo cumprimento da obrigação. Não há nenhum documento que vincule o ente federativo em cumprir a obrigação. Sobre o acordo, conforme se extrai das informações trazidas pela CETESB, embora a prefeitura de Jaguariúna tenha solicitado licença prévia para a implantação do aterro de resíduos da construção civil no Sítio Capotuna, este foi indeferido. - A responsabilidade civil de VALDIR BODINI decore do fato dele ser o responsável pela empresa Cerâmica Bodini Ltda, causadora de impacto ambiental, bem como por ser proprietário do imóvel denominado Sítio Capotuna. - Cabível a condenação ao pagamento de indenização pelos danos ambientais causados, haja vista a legislação ambiental vigente e a teoria da reparação integral do dano. - A r. sentença deve ser mantida. Agravo retido e recurso de apelação improvidos.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido e ao recurso de apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 18/12/2018
Data da Publicação : 08/02/2019
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1868711
Órgão Julgador : QUARTA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-225 LEG-FED LEI-6938 ANO-1981 ART-4 INC-7 ART-14 PAR-1 ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-23 ***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002 LEG-FED LEI-10406 ANO-2002 ART-1228 PAR-1
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/02/2019 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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