TRF3 0011719-86.2007.4.03.9999 00117198620074039999
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. PROVAS TESTEMUNHAIS IDÔNEAS.. TERMO INICIAL. CITAÇÃO
VÁLIDA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS
PARA OS CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO
INSS PARCIALMENTE PROVIDAS. SENTENÇA REFORMADA.
1 - No caso, a r. sentença julgou parcialmente procedente e reconheceu
o labor rural no período de 24/05/1970 a 25/08/1986, reconheceu como
tempo de serviço especial o labor exercido no período de 06/08/1989 a
15/12/1998 e condenou o INSS a conceder ao autor a aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição integral, a partir da citação, incidindo correção
monetária sobre as prestações em atraso, desde os respectivos vencimentos,
na forma da Súmula 8, deste Tribunal, observada a legislação de regência
especificada na Portaria nº 92/2001 DF-SJ/SP, de 23/10/2001, editada com
base no Provimento nº 26/01 da Corregedoria Regional desta Região, além
de juros de mora no percentual de 1% ao mês, sobre as prestações vencidas.
2 - Condenou o INSS, ainda, no pagamento da verba honorária de 10% (dez
por cento) sobre as prestações vencidas até a data da sentença.
3 - Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de
sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I,
do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação
do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de
prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula
nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos
os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim,
a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com
potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma
desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem
ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP
nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de
Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento
de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado
no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de
economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91
em seu artigo 11, inciso VII.
8 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento
das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário,
desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei
nº 8.213/91.
9 - A vasta documentação juntada é suficiente à configuração do
exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e
segura prova testemunhal.
10 - As testemunhas do autor, Cícero Leite Bispo, Técio Mendes Ferreira e
Otávio Cardoso dos Santos, ouvidas em audiência realizada em 28/06/2005,
(fls. 105, 107/109) descreveram o trabalho campesino do autor com sua
família.
11 - A primeira testemunha asseverou que "Conhece o autor da fazenda do Osugui
e sabe que ele é trabalhador rural. O autor não tinha empregados. Conheceu
o autor na década de setenta e sabe que ele trabalhou uns quinze anos no
sítio Antônio, de propriedade de Osugui. Ele plantava algodão e milho. O
autor trabalhava com o irmão e o pai. Não sabe para onde eles foram depois
disso. O depoente morava no sítio vizinho."
12 - A segunda testemunha afirmou que "Conhece o autor do sítio Santo
Antônio, de propriedade de Osugui, desde 1970 e sabe que ele é trabalhador
rural. O autor era porcenteiro nas lavouras de algodão, milho, café. O autor
trabalhava com o pai e um irmão. O depoente mudou dali em 1985 e o autor
ainda continuou lá, mas não sabe até quando. O autor também trabalhou
no sítio Santa Maria, do mesmo dono e no mesmo bairro." Ao ser reperguntado
respondeu que "Era só a família que trabalhava, sem empregados."
13 - A terceira testemunha afirmou que "Conhece o autor do sítio Santo
Antônio, bairro Santa Maria, de propriedade de Luiz Osugui, desde 1970 e
sabe que ele é arrendatário, nas lavouras de algodão, milho, café. O autor
trabalhava com o pai e um irmão mais velho. O depoente era vizinho. O depoente
mudou do sítio vizinho em 1976, mas sempre retornava ao local e sabe que o
autor continuou lá até 1985. Depois ele foi trabalhar na usina. A família
do Osugui tinha outras propriedades, todas vizinhas." Ao ser reperguntado
respondeu que "Era só a família que trabalhava, sem empregados."
14 - O digno Juízo de 1º grau acolheu o trabalho no campo de 24/05/1970
(data em que o autor completou 12 anos) a 25/08/1986, data da nota fiscal
expedida pelo autor como porcenteiro (fls. 29).
15 - As provas orais reforçam o labor campesino durante o citado período,
porquanto somente a terceira testemunha o limitou até 1985, sendo possível,
portanto, reconhecer o trabalho naquele período.
16 - Pretende o autor, ainda, a contagem como especial do trabalho exercido
no período de 06/08/1989 a 15/12/1998.
17 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 22/22-verso comprovam
que o autor exerceu o cargo de motorista, no setor agrícola, e executava a
atividade de "Dirigir caminhões transportadores de cana de açúcar para
a indústria ou plantio e insumos agrícolas, através de carreadores de
terra, estradas vicinais e rodovias municipais e estaduais" exposto, de modo
habitual e permanente, ao agente nocivo ruído de 83,2 decibéis e de ritmo
de trabalho penoso no período de 06/08/1989 a 01/04/2004 (data do Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP).
18 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e
em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço
sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à
contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho
na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial
(STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR;
artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
19 - Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº
9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em
atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional,
conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de
janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de
julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios,
preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos
agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
20 - Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação
ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º,
passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos
agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido
pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a
possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria
profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de
conversão do tempo de trabalho comum em especial.
21 - Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ
01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo
Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
22 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades
especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade
profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
23 - Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades
profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente
nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo
I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto
que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos
profissionais.
24 - Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação
da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da
exposição à agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
25 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a
exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho,
guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
26 - Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação
dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente
nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei
nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior.
27 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente
nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo
de condições ambientais.
28 - O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível
mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73,
de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
29 - O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto
nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado
a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o
Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs
357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo,
o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo
de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava
o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
30 - De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de
07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de
tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
31 - A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99,
Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do
agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
32 - Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman
Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de
controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa
do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser
aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
33 - Assim, reputo enquadrado como especial o labor exercido no período de
06/08/1989 a 05/03/1997, por ter o autor desempenhado as atividades sempre
exposto ao agente nocivo ruído de 83,2 decibéis, nível considerado
insalubre pelo Decreto nº 53.831/64.
34 - O período de 06/03/1997 a 15/12/1998, data final reconhecida pela
r. sentença de 1º grau, deve ser considerado de labor comum, pois, a partir
de 29/04/1995 não há mais a possibilidade do mero enquadramento da atividade
de motorista em categoria profissional considerada especial, em decorrência
da presumida penosidade, e, no citado período, o nível de ruído a que o
autor esteve exposto encontrava-se abaixo do limite de tolerância previsto
no Decreto nº 2.172/97 (90 decibéis), o que impossibilita o reconhecimento
da atividade especial no referido período.
35 - Observe-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos
termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada
no E. Superior Tribunal de Justiça.
36 - Somando-se o período de labor rural (24/05/1970 a 25/08/1986) à
atividade especial reconhecida nesta demanda (06/08/1989 a 05/03/1997),
devidamente convertida em comum, acrescidos aos períodos incontroversos
constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que passa
a integrar a presente decisão, constata-se que o demandante, alcançou,
mediante o cumprimento do período adicional previsto na regra de transição,
34 anos, 06 meses e 12 dias de contribuição em 03/11/2004, data da citação
(fl. 78-verso), tempo suficiente a lhe assegurar, a partir daquela data,
o direito à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
37 - A parte autora completou o tempo exigido para a concessão do benefício
previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição com proventos
integrais em 21/04/2005 (art. 462, CPC/73 e 493, CPC/2015), conforme
planilha anexa, o que lhe asseguraria o direito a uma daquelas modalidades de
aposentadoria, cabendo ao INSS proceder às simulações para que o autor faça
a opção pelo benefício na modalidade que se lhe afigurar mais benéfica.
38 - Facultado ao demandante a opção pela percepção do benefício que
se lhe afigurar mais vantajoso, vedado o recebimento em conjunto de duas
aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da Lei nº 8.213/91. Condicionado
a execução dos valores atrasados à opção pelo benefício concedido em
Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados concomitantemente
com a manutenção de eventual benefício concedido administrativamente
representaria uma "desaposentação" às avessas, cuja possibilidade -
renúncia de benefício - é vedada por lei - art. 18, §2º da Lei nº
8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C. Supremo Tribunal
Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC.
39 - Os juros de mora, entretanto, devem ser fixados de acordo com o Manual
de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal,
por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
40 - Já a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada
de acordo com o Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei
nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a
partir de 29 de junho de 2009.
41 - Tendo o autor decaído de parte mínima do pedido, em vista do artigo 21,
parágrafo único, do CPC/73, vigente à época da interposição do recurso,
condeno o INSS no pagamento dos honorários advocatícios, ora arbitrados
em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas devidas até a sentença
(Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente.
42 - Remessa necessária e apelação do INSS parcialmente providas.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. PROVAS TESTEMUNHAIS IDÔNEAS.. TERMO INICIAL. CITAÇÃO
VÁLIDA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS
PARA OS CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO
INSS PARCIALMENTE PROVIDAS. SENTENÇA REFORMADA.
1 - No caso, a r. sentença julgou parcialmente procedente e reconheceu
o labor rural no período de 24/05/1970 a 25/08/1986, reconheceu como
tempo de serviço especial o labor exercido no período de 06/08/1989 a
15/12/1998 e condenou o INSS a conceder ao autor a aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição integral, a partir da citação, incidindo correção
monetária sobre as prestações em atraso, desde os respectivos vencimentos,
na forma da Súmula 8, deste Tribunal, observada a legislação de regência
especificada na Portaria nº 92/2001 DF-SJ/SP, de 23/10/2001, editada com
base no Provimento nº 26/01 da Corregedoria Regional desta Região, além
de juros de mora no percentual de 1% ao mês, sobre as prestações vencidas.
2 - Condenou o INSS, ainda, no pagamento da verba honorária de 10% (dez
por cento) sobre as prestações vencidas até a data da sentença.
3 - Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de
sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I,
do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação
do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de
prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula
nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos
os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim,
a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com
potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma
desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem
ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP
nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de
Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento
de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado
no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de
economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91
em seu artigo 11, inciso VII.
8 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento
das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário,
desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei
nº 8.213/91.
9 - A vasta documentação juntada é suficiente à configuração do
exigido início de prova material, devidamente corroborada por idônea e
segura prova testemunhal.
10 - As testemunhas do autor, Cícero Leite Bispo, Técio Mendes Ferreira e
Otávio Cardoso dos Santos, ouvidas em audiência realizada em 28/06/2005,
(fls. 105, 107/109) descreveram o trabalho campesino do autor com sua
família.
11 - A primeira testemunha asseverou que "Conhece o autor da fazenda do Osugui
e sabe que ele é trabalhador rural. O autor não tinha empregados. Conheceu
o autor na década de setenta e sabe que ele trabalhou uns quinze anos no
sítio Antônio, de propriedade de Osugui. Ele plantava algodão e milho. O
autor trabalhava com o irmão e o pai. Não sabe para onde eles foram depois
disso. O depoente morava no sítio vizinho."
12 - A segunda testemunha afirmou que "Conhece o autor do sítio Santo
Antônio, de propriedade de Osugui, desde 1970 e sabe que ele é trabalhador
rural. O autor era porcenteiro nas lavouras de algodão, milho, café. O autor
trabalhava com o pai e um irmão. O depoente mudou dali em 1985 e o autor
ainda continuou lá, mas não sabe até quando. O autor também trabalhou
no sítio Santa Maria, do mesmo dono e no mesmo bairro." Ao ser reperguntado
respondeu que "Era só a família que trabalhava, sem empregados."
13 - A terceira testemunha afirmou que "Conhece o autor do sítio Santo
Antônio, bairro Santa Maria, de propriedade de Luiz Osugui, desde 1970 e
sabe que ele é arrendatário, nas lavouras de algodão, milho, café. O autor
trabalhava com o pai e um irmão mais velho. O depoente era vizinho. O depoente
mudou do sítio vizinho em 1976, mas sempre retornava ao local e sabe que o
autor continuou lá até 1985. Depois ele foi trabalhar na usina. A família
do Osugui tinha outras propriedades, todas vizinhas." Ao ser reperguntado
respondeu que "Era só a família que trabalhava, sem empregados."
14 - O digno Juízo de 1º grau acolheu o trabalho no campo de 24/05/1970
(data em que o autor completou 12 anos) a 25/08/1986, data da nota fiscal
expedida pelo autor como porcenteiro (fls. 29).
15 - As provas orais reforçam o labor campesino durante o citado período,
porquanto somente a terceira testemunha o limitou até 1985, sendo possível,
portanto, reconhecer o trabalho naquele período.
16 - Pretende o autor, ainda, a contagem como especial do trabalho exercido
no período de 06/08/1989 a 15/12/1998.
17 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 22/22-verso comprovam
que o autor exerceu o cargo de motorista, no setor agrícola, e executava a
atividade de "Dirigir caminhões transportadores de cana de açúcar para
a indústria ou plantio e insumos agrícolas, através de carreadores de
terra, estradas vicinais e rodovias municipais e estaduais" exposto, de modo
habitual e permanente, ao agente nocivo ruído de 83,2 decibéis e de ritmo
de trabalho penoso no período de 06/08/1989 a 01/04/2004 (data do Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP).
18 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e
em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço
sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à
contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho
na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial
(STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR;
artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
19 - Cumpre salientar que em período anterior à da edição da Lei nº
9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em
atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional,
conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de
janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de
julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios,
preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos
agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
20 - Ou seja, a Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação
ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º,
passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos
agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido
pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a
possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria
profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de
conversão do tempo de trabalho comum em especial.
21 - Sobre o tema, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
6ª Turma, REsp nº 440955, Rel. Min. Paulo Gallotti, j. 18/11/2004, DJ
01/02/2005, p. 624; 6ª Turma, AgRg no REsp nº 508865, Rel. Min. Paulo
Medina, j. 07/08/2003, DJ 08/09/2003, p. 374.
22 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades
especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade
profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
23 - Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades
profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente
nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo
I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto
que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos
profissionais.
24 - Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação
da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da
exposição à agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
25 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a
exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho,
guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
26 - Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação
dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente
nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei
nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior.
27 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente
nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo
de condições ambientais.
28 - O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível
mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73,
de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
29 - O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto
nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado
a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o
Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs
357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo,
o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo
de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava
o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
30 - De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de
07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de
tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
31 - A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99,
Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do
agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
32 - Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman
Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de
controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa
do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser
aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
33 - Assim, reputo enquadrado como especial o labor exercido no período de
06/08/1989 a 05/03/1997, por ter o autor desempenhado as atividades sempre
exposto ao agente nocivo ruído de 83,2 decibéis, nível considerado
insalubre pelo Decreto nº 53.831/64.
34 - O período de 06/03/1997 a 15/12/1998, data final reconhecida pela
r. sentença de 1º grau, deve ser considerado de labor comum, pois, a partir
de 29/04/1995 não há mais a possibilidade do mero enquadramento da atividade
de motorista em categoria profissional considerada especial, em decorrência
da presumida penosidade, e, no citado período, o nível de ruído a que o
autor esteve exposto encontrava-se abaixo do limite de tolerância previsto
no Decreto nº 2.172/97 (90 decibéis), o que impossibilita o reconhecimento
da atividade especial no referido período.
35 - Observe-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos
termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada
no E. Superior Tribunal de Justiça.
36 - Somando-se o período de labor rural (24/05/1970 a 25/08/1986) à
atividade especial reconhecida nesta demanda (06/08/1989 a 05/03/1997),
devidamente convertida em comum, acrescidos aos períodos incontroversos
constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que passa
a integrar a presente decisão, constata-se que o demandante, alcançou,
mediante o cumprimento do período adicional previsto na regra de transição,
34 anos, 06 meses e 12 dias de contribuição em 03/11/2004, data da citação
(fl. 78-verso), tempo suficiente a lhe assegurar, a partir daquela data,
o direito à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
37 - A parte autora completou o tempo exigido para a concessão do benefício
previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição com proventos
integrais em 21/04/2005 (art. 462, CPC/73 e 493, CPC/2015), conforme
planilha anexa, o que lhe asseguraria o direito a uma daquelas modalidades de
aposentadoria, cabendo ao INSS proceder às simulações para que o autor faça
a opção pelo benefício na modalidade que se lhe afigurar mais benéfica.
38 - Facultado ao demandante a opção pela percepção do benefício que
se lhe afigurar mais vantajoso, vedado o recebimento em conjunto de duas
aposentadorias, nos termos do art. 124, II, da Lei nº 8.213/91. Condicionado
a execução dos valores atrasados à opção pelo benefício concedido em
Juízo, uma vez que se permitir a execução dos atrasados concomitantemente
com a manutenção de eventual benefício concedido administrativamente
representaria uma "desaposentação" às avessas, cuja possibilidade -
renúncia de benefício - é vedada por lei - art. 18, §2º da Lei nº
8.213/91 -, além do que já se encontra afastada pelo C. Supremo Tribunal
Federal na análise do RE autuado sob o nº 661.256/SC.
39 - Os juros de mora, entretanto, devem ser fixados de acordo com o Manual
de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal,
por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
40 - Já a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada
de acordo com o Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei
nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a
partir de 29 de junho de 2009.
41 - Tendo o autor decaído de parte mínima do pedido, em vista do artigo 21,
parágrafo único, do CPC/73, vigente à época da interposição do recurso,
condeno o INSS no pagamento dos honorários advocatícios, ora arbitrados
em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas devidas até a sentença
(Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente.
42 - Remessa necessária e apelação do INSS parcialmente providas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, conheço e dou parcial provimento à remessa necessária e à
apelação do INSS para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição
tão somente para julgar improcedentes os pedidos de aposentadoria integral
por tempo de contribuição a partir da citação e de reconhecimento
da especialidade das atividades desenvolvidas no período de 06/03/1997
a 15/12/1998 e condenar a autarquia previdenciária na implantação e
pagamento do benefício de aposentadoria proporcional desde 03/11/2004, data
da citação, ou de aposentadoria por tempo de contribuição com proventos
integrais desde 21/04/2005, fixar os juros de mora de acordo com os critérios
estabelecidos pelo Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal, e para determinar que a correção monetária dos valores
em atraso seja calculada segundo o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar
com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à
Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009, bem como condenar a autarquia
previdenciária no pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10%
sobre as parcelas devidas até a sentença e facultar ao demandante a opção
de percepção pelo benefício que lhe for mais vantajoso, condicionando,
entretanto, a execução dos valores atrasados à necessária opção por
aquele cujo direito foi reconhecido em Juízo, mantendo, no mais, íntegra
a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
05/06/2017
Data da Publicação
:
19/06/2017
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1185710
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/06/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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