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Jurisprudência


TRF3 0012072-84.2014.4.03.6183 00120728420144036183

Ementa
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. PAGAMENTO INDEVIDO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REVISÃO ADMINISTRATIVA. REPETIÇÃO DEVIDA. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ OBJETIVA. REFILIAÇÃO OPORTUNISTA. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. ARTIGOS 42, § 2º E 115, II, DA LEI 8.213/91. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. PERÍCIAS BASTANTES. AMPLIAÇÃO DA CAUSA PETENDI INDEVIDA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. PEDIDOS IMPROCEDENTES. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA OFICIAL PROVIDAS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. - A Administração Pública tem o dever de fiscalização dos seus atos administrativos, pois goza de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsista. - Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade e supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei nº 9.784/99, aplicável à espécie. - Deve o INSS observar as regras constitucionais, sob pena de ver seus atos afastados por intervenção do Poder Judiciário. Com efeito, a garantia do inciso LV do artigo 5o da Constituição da República determina que em processos administrativos também deve ser observado o contraditório regular. - A devolução é imperativa quando não se apura a presença da boa-fé objetiva (artigo 422 do Código Civil), como no presente caso. - O patrimônio público merece respeito e o princípio da moralidade administrativa, conformado no artigo 37, caput, da Constituição da República, obriga a autarquia previdenciária a efetuar a cobrança dos valores indevidamente pagos, na forma do artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91. - Considerando que a r. sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não se aplicam as novas regras previstas no artigo 496 e §§ do Novo CPC. Apesar de ter sido proferida a sentença após a vigência da alteração do artigo 475, § 2º, do CPC/1973 pela Lei n. 10.352/2001, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, conheço da remessa oficial, porque foi ultrapassado tal valor. - Rejeitados os requerimentos de conversão do julgamento em diligência e de anulação da sentença, porque ausente o alegado cerceamento de defesa, à medida que foram realizadas duas perícias, ambas bastante fundamentadas pelos respectivos peritos. Os regramentos do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da Constituição da República) restaram perfeitamente atendidos. - Noi apontada qualquer falha nas conclusões das perícias, limitando-se a Defensoria Pública da União a tentar reabrir a instrução que se lhe mostrou patentemente desfavorável. E, ao se manifestar sobre os laudos, a parte autora limitou-se a postular a procedência dos seus pedidos, sem levantar qualquer hipótese de conversão em diligência para realização de nova perícia ou outras provas (f. 188). - Quanto pleito de conversão de diligência para se ressuscitar a instrução a fim de apurar novamente o termo inicial da incapacidade e o período de graça, constata-se manobra procrastinatória, com intuito de tumultuar o andamento do procedimento. Aliás, a parte autora pretende alterar a causa petendi, flagrante afronta às regras do artigo 264, § único, e 312 do CPC/73. - A parte autora percebeu benefício previdenciário de auxílio-doença, entre 18/8/2006 e 04/5/2011. Todavia, em auditoria realizada no benefício (revisão administrativa), o INSS considerou ilegal a percepção do benefício porque redefiniu a Data do Início da Incapacidade - DII em 30/12/2003, ou seja, em período preexistente à refiliação oportunista havida em 01/8/2005. Assim, o INSS passou a efetuar a cobrança de R$ 91.965,12, fato que gerou toda a indignação da parte autora, que tachou a conduta do INSS de "expropriação do autor". - A Administração Pública tem o dever de fiscalização dos seus atos administrativos, pois goza de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsista. - Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade e supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei nº 9.784/99, aplicável à espécie. - A Administração pode rever seus atos. Ao final das contas, a teor da Súmula 473 do E. STF "A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos a apreciação judicial". - Não fluiu o prazo decadencial de 10 (dez) anos. Nos termos do artigo 54, da Lei nº 9.784/99, o direito da Administração de rever seus atos passou a decair em 5 anos, a partir da data que o ato foi praticado. Contudo, a Medida Provisória nº 138, de 19/11/2003, aumentou o prazo decadencial para 10 (dez) anos. - Quando patenteado o pagamento a maior de benefício, o direito de a Administração obter a devolução dos valores é inexorável, ainda que tivessem sido recebidos de boa-fé, à luz do disposto no artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91. Trata-se de norma cogente, que obriga o administrador a agir, sob pena de responsabilidade. - O Código Civil estabelece, em seu artigo 876, que, tratando-se de pagamento indevido, "Todo aquele que recebeu o que não era devido fica obrigado a restituir". Além disso, deve ser levado em conta o princípio geral do direito, positivado como regra no atual Código Civil, consistente na proibição do enriquecimento ilícito. Assim reza o artigo 884 do Código Civil: "Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido." - Como se vê do item quarto do parágrafo anterior, dispensa-se o elemento subjetivo (ou seja, a presença de má-fé) para a caracterização do enriquecimento ilícito e do surgimento do dever de restituir a quantia recebida. Para além, não há previsão de norma (regra ou princípio) no direito positivo brasileiro determinando que, por se tratar de verba alimentar, o benefício é irrepetível. A construção jurisprudencial, que resultou no entendimento da irrepetibilidade das rendas recebidas a título de benefício previdenciário, por constituírem verba alimentar, pode incorrer em negativa de vigência à norma do artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91. - Há inúmeros precedentes no sentido da necessidade de devolução dos valores indevidamente recebidos da seguridade social, inclusive oriundos do Superior Tribunal de Justiça. - O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento pelo sistema do recurso repetitivo, consolidou o entendimento de que, em casos de cassação de tutela antecipada, a lei determina a devolução dos valores recebidos, ainda que se trate de verba alimentar e ainda que o beneficiário aja de boa-fé (REsp 995852 / RS, RECURSO ESPECIAL, 2007/0242527-4, Relator(a) Ministro GURGEL DE FARIA, Órgão Julgador, T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento, 25/08/2015, Data da Publicação/Fonte, DJe 11/09/2015). - A propósito, a situação do autor não pode ser considerada de boa-fé, isso porque o autor perdera a qualidade de segurado após afastar-se em 27/3/1996, reingressando no RGPS em 01/8/2005 e recolhendo contribuições até 31/7/2006, quando já se entrava manifestamente incapaz. Com efeito, o parecer fundamentado do INSS constante dos autos apontou a data de 01/5/2003 como DII, pois foi a partir de então que o autor passou por diversas internações. - A conclusão da perita psiquiatra (f. 165/166) foi duvidosa, pois deixa claro que foi a partir de 30/12/2003 o autor já passou por diversas internações (f. 165/166). A conclusão de tal perícia foca no transtorno psiquiátrico residual, ignorando todavia a condição pretérita do autor, que já se encontrava inválido em fins de 2003, em razão da alcoolismo e psicose (vide o próprio relatório da perita psiquiátrica às f. 165/166). - Perfilha-se, assim, do entendimento do MMº Juízo a quo e também da médica perita Arlete Rita Siniscalchi, no sentido de que a DII é 30/12/2003 e não 15/8/2006. A perícia médica realizada por esta perita foi conclusivo no sentido de que a DII deu-se em 30/12/2003, perdurando até setembro de 2013 (f. 180). - In casu, não há dúvidas de que se aplica à presente demanda o disposto no artigo 42, § 2º, primeira parte, da Lei nº 8.213/91. Inviável, assim, à luz da legislação previdenciária, conceder benefício a quem volta a contribuir já incapaz. - O seguro social depende de recolhimento de contribuições e não pode conceder prestações previdenciários ao arrepio da boa-fé ou com propósitos de caridade. A Previdência Social é essencialmente contributiva (artigo 201, caput, da Constituição Federal) e só pode conceder benefícios mediante o atendimento dos requisitos legais, sob pena de transmudar-se em Assistência Social. - A devolução é imperativa porquanto se apurou a ausência de boa-fé objetiva (artigo 422 do Código Civil), como no presente caso, pois filiar-se à previdência social quando já estropiado, física ou mentalmente, implica má-fé, já que se trata de hipótese de descabimento da concessão de benefício previdenciário. - Condenada a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 4º, III, do Novo CPC. Fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser beneficiária da justiça gratuita. - Ademais, considerando que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º e 11, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal. - Pedidos julgados improcedentes. - Apelação do INSS e remessa oficial providas. Apelação da parte autora desprovida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora e, por maioria, dar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do voto do Relator, que foi acompanhado pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan e pela Desembargadora Federal Marisa Santos com ressalva de entendimento pessoal (que votou nos termos do art. 942 "caput" e § 1º do CPC). Vencido a Desembargadora Federal Ana Pezarini que negava provimento à apelação do INSS e à remessa oficial. Julgamento nos termos do disposto no artigo 942 "caput" e § 1º do CPC.

Data do Julgamento : 14/08/2017
Data da Publicação : 28/08/2017
Classe/Assunto : ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2184332
Órgão Julgador : NONA TURMA
Relator(a) : JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/08/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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