TRF3 0012200-18.2011.4.03.6181 00122001820114036181
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO MEDIANTE FRAUDE. UTILIZAÇÃO DE
CARTÕES DE CRÉDITO CLONADOS. PRELIMINAR DE NULIDADE. DA PRELIMINAR
DE NULIDADE. SISTEMA ACUSATÓRIO. IMPARCIALIDADE. PRINCÍPIO
DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA
COMPROVADAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE REDUZIDA. VALOR UNITÁRIO DO DIA MULTA
REDUZIDO. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA
DE LIBERDADE. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
1. Réu condenado como incurso nas sanções do artigo 155, §4º, II c.c
artigos 29 e 71, ambos do Código Penal.
2. Rejeitada preliminar de nulidade do processo por afronta ao processo
acusatório, ao argumento que o julgador da causa também presidiu o
inquérito policial, determinando medidas cautelares como busca e apreensão
e interceptação telefônica, o que importa em pré-julgamento da causa,
comprometendo a sua imparcialidade.
3. A legislação processual penal determina que o juiz que decidir sobre
medidas cautelares, ainda que na fase pré-processual, será justamente o
competente para julgar a ação penal. Nesse sentido, o artigo 75 do CPP prevê
que "a precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma
circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente." O
artigo 83 do CPP dispõe expressamente que "verificar-se-á a competência
por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente
competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos
outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa,
ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa (arts. 70,
§ 3o, 71, 72, § 2o, e 78, II, c)". E o artigo 1º da Lei nº 9.296/96 é
expresso no sentido de que o juízo competente para a ação principal é
quem decidirá sobre a quebra do sigilo telefônico.
4. Não se pode presumir que o magistrado estará comprometido em sua
imparcialidade pelo simples fato de ter autorizado o cumprimento de medidas
cautelares durante o inquérito policial.
5. Não há que se falar em violação ao sistema acusatório, uma vez que
o magistrado apenas determinou a quebra de sigilo telefônico e a busca e
a apreensão após ter sido previamente provocado pelo Ministério Público
Federal, tendo valorado a prova produzida após o contraditório e a ampla
defesa.
6. Não comporta acolhimento o pleito defensivo de aplicação do princípio
da insignificância. O Plenário do STF decidiu no julgamento do HC 123108/MG
que "a simples circunstância de se tratar de réu reincidente ou de incidir
alguma qualificadora (CP, art. 155, § 4º) não deve, automaticamente,
afastar a aplicação do princípio da insignificância. É preciso motivação
específica à luz das circunstâncias do caso concreto, como o alto número
de reincidências, a especial reprovabilidade decorrente de qualificadoras
etc." (HC 123108, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em
03/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-018 DIVULG 29-01-2016 PUBLIC 01-02-2016).
7. No caso, as circunstâncias do caso concreto não são compatíveis com a
incidência do princípio da insignificância. Destarte, o montante subtraído
pelo acusado representava mais de 33 vezes o valor do salário mínimo vigente
à época dos fatos. Ademais, a conduta não pode ser considerada minimamente
ofensiva e de baixa reprovabilidade social, ante a reiteração criminosa do
réu, que responde a processos criminais por processos por crimes contra o
patrimônio, contra a vida e contra a paz pública (fls. 516/517 e 553/555),
tendo ainda o acusado se aproveitado da facilidade que tinha como prestador
de serviços da REDECARD para adulterar máquinas POS de forma a capturar
as trilhas magnéticas e senhas dos cartões de crédito, prejudicando
inúmeros clientes e instituições financeiras. Acrescente-se que, com as
mais de setenta condutas criminosas praticadas pelo réu, a Caixa Econômica
Federal não foi a única que arcou com prejuízo, mas também outras cinco
instituições financeiras, devendo-se ainda levar em conta o potencial
lesivo da conduta do acusado, que comprometeu a higidez e credibilidade das
instituições financeiras.
8. Materialidade e autoria demonstrada. Decreto condenatório mantido.
9. Dosimetria da pena. Consoante Súmula n. 444 do Superior Tribunal de
Justiça, dispõe que "é vedada a utilização de inquéritos policiais e
ações penais em curso para agravar a pena-base". Desta forma, processos e
inquéritos em andamento não podem ser considerados como maus antecedentes,
conduta social reprovável e personalidade perniciosa do agente.
10. O fato de o acusado ter utilizado o "próprio trabalho técnico para
facilitar a clonagem de cartões e sua utilização fraudulenta" já faz
parte da qualificadora prevista no inciso II do §4º do artigo 155 do
CP. Destarte, o acusado foi responsável pela instalação de equipamentos
de captura ilegais de trilhas e senhas de cartões magnéticos, utilizando-se
da facilidade de prestador de serviços da empresa REDECARD.
11. No entanto, a pena-base deve ser fixada acima do mínimo legal,
tendo em conta as circunstâncias que envolveram a prática do fato e as
consequências do crime. As atitudes perpetradas pelo acusado merecem uma
reprovação social maior que o mínimo legal estipulado. As circunstâncias
em que o crime foi praticado ensejam um aumento na pena-base, considerado
que a conduta do acusado causaram transtornos e descrédito ao mercado
e ao sistema bancário nacional. A consequência de suas ações foi de
intensa relevância, tendo o acusado causado prejuízo a seis instituições
financeiras no montante de R$ 19.287,63 (dezenove mil, duzentos e oitenta e
sete reais e sessenta e três centavos), calculado em 2011. É certo que a
ocorrência de prejuízo é inerente nos crimes de natureza patrimoniais. No
entanto, o valor subtraído se revela excessivo para o crime de furto.
12. A pena de multa é sanção legalmente prevista, de forma cumulativa à
pena privativa de liberdade, devendo ser, portanto, aplicada. Questões
envolvendo a alegada impossibilidade de pagamento da multa devem ser
veiculadas, oportunamente, pela via adequada.
13. Para fixação da pena de multa deve ser guardada proporcionalidade com
a pena privativa de liberdade imposta ao réu. Valor unitário da pena de
multa reduzido, pois fixado de modo exacerbado na sentença.
14. Considerando as circunstâncias judiciais desfavoráveis, ponderadas
na primeira fase da dosimetria da pena, de rigor a manutenção do regime
inicial de cumprimento de pena semiaberto, tendo por fundamento o disposto
no artigo 33, § 3º, do Código Penal.
15. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos, em face do não preenchimento dos requisitos subjetivos do
art. 44 do Código Penal, considerando que as circunstâncias judiciais não
são favoráveis ao réu, tanto que fixada a pena-base acima do mínimo.
16. Apelação do réu provida em parte.
Ementa
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO MEDIANTE FRAUDE. UTILIZAÇÃO DE
CARTÕES DE CRÉDITO CLONADOS. PRELIMINAR DE NULIDADE. DA PRELIMINAR
DE NULIDADE. SISTEMA ACUSATÓRIO. IMPARCIALIDADE. PRINCÍPIO
DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA
COMPROVADAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE REDUZIDA. VALOR UNITÁRIO DO DIA MULTA
REDUZIDO. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA
DE LIBERDADE. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
1. Réu condenado como incurso nas sanções do artigo 155, §4º, II c.c
artigos 29 e 71, ambos do Código Penal.
2. Rejeitada preliminar de nulidade do processo por afronta ao processo
acusatório, ao argumento que o julgador da causa também presidiu o
inquérito policial, determinando medidas cautelares como busca e apreensão
e interceptação telefônica, o que importa em pré-julgamento da causa,
comprometendo a sua imparcialidade.
3. A legislação processual penal determina que o juiz que decidir sobre
medidas cautelares, ainda que na fase pré-processual, será justamente o
competente para julgar a ação penal. Nesse sentido, o artigo 75 do CPP prevê
que "a precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma
circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente." O
artigo 83 do CPP dispõe expressamente que "verificar-se-á a competência
por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente
competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos
outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa,
ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa (arts. 70,
§ 3o, 71, 72, § 2o, e 78, II, c)". E o artigo 1º da Lei nº 9.296/96 é
expresso no sentido de que o juízo competente para a ação principal é
quem decidirá sobre a quebra do sigilo telefônico.
4. Não se pode presumir que o magistrado estará comprometido em sua
imparcialidade pelo simples fato de ter autorizado o cumprimento de medidas
cautelares durante o inquérito policial.
5. Não há que se falar em violação ao sistema acusatório, uma vez que
o magistrado apenas determinou a quebra de sigilo telefônico e a busca e
a apreensão após ter sido previamente provocado pelo Ministério Público
Federal, tendo valorado a prova produzida após o contraditório e a ampla
defesa.
6. Não comporta acolhimento o pleito defensivo de aplicação do princípio
da insignificância. O Plenário do STF decidiu no julgamento do HC 123108/MG
que "a simples circunstância de se tratar de réu reincidente ou de incidir
alguma qualificadora (CP, art. 155, § 4º) não deve, automaticamente,
afastar a aplicação do princípio da insignificância. É preciso motivação
específica à luz das circunstâncias do caso concreto, como o alto número
de reincidências, a especial reprovabilidade decorrente de qualificadoras
etc." (HC 123108, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em
03/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-018 DIVULG 29-01-2016 PUBLIC 01-02-2016).
7. No caso, as circunstâncias do caso concreto não são compatíveis com a
incidência do princípio da insignificância. Destarte, o montante subtraído
pelo acusado representava mais de 33 vezes o valor do salário mínimo vigente
à época dos fatos. Ademais, a conduta não pode ser considerada minimamente
ofensiva e de baixa reprovabilidade social, ante a reiteração criminosa do
réu, que responde a processos criminais por processos por crimes contra o
patrimônio, contra a vida e contra a paz pública (fls. 516/517 e 553/555),
tendo ainda o acusado se aproveitado da facilidade que tinha como prestador
de serviços da REDECARD para adulterar máquinas POS de forma a capturar
as trilhas magnéticas e senhas dos cartões de crédito, prejudicando
inúmeros clientes e instituições financeiras. Acrescente-se que, com as
mais de setenta condutas criminosas praticadas pelo réu, a Caixa Econômica
Federal não foi a única que arcou com prejuízo, mas também outras cinco
instituições financeiras, devendo-se ainda levar em conta o potencial
lesivo da conduta do acusado, que comprometeu a higidez e credibilidade das
instituições financeiras.
8. Materialidade e autoria demonstrada. Decreto condenatório mantido.
9. Dosimetria da pena. Consoante Súmula n. 444 do Superior Tribunal de
Justiça, dispõe que "é vedada a utilização de inquéritos policiais e
ações penais em curso para agravar a pena-base". Desta forma, processos e
inquéritos em andamento não podem ser considerados como maus antecedentes,
conduta social reprovável e personalidade perniciosa do agente.
10. O fato de o acusado ter utilizado o "próprio trabalho técnico para
facilitar a clonagem de cartões e sua utilização fraudulenta" já faz
parte da qualificadora prevista no inciso II do §4º do artigo 155 do
CP. Destarte, o acusado foi responsável pela instalação de equipamentos
de captura ilegais de trilhas e senhas de cartões magnéticos, utilizando-se
da facilidade de prestador de serviços da empresa REDECARD.
11. No entanto, a pena-base deve ser fixada acima do mínimo legal,
tendo em conta as circunstâncias que envolveram a prática do fato e as
consequências do crime. As atitudes perpetradas pelo acusado merecem uma
reprovação social maior que o mínimo legal estipulado. As circunstâncias
em que o crime foi praticado ensejam um aumento na pena-base, considerado
que a conduta do acusado causaram transtornos e descrédito ao mercado
e ao sistema bancário nacional. A consequência de suas ações foi de
intensa relevância, tendo o acusado causado prejuízo a seis instituições
financeiras no montante de R$ 19.287,63 (dezenove mil, duzentos e oitenta e
sete reais e sessenta e três centavos), calculado em 2011. É certo que a
ocorrência de prejuízo é inerente nos crimes de natureza patrimoniais. No
entanto, o valor subtraído se revela excessivo para o crime de furto.
12. A pena de multa é sanção legalmente prevista, de forma cumulativa à
pena privativa de liberdade, devendo ser, portanto, aplicada. Questões
envolvendo a alegada impossibilidade de pagamento da multa devem ser
veiculadas, oportunamente, pela via adequada.
13. Para fixação da pena de multa deve ser guardada proporcionalidade com
a pena privativa de liberdade imposta ao réu. Valor unitário da pena de
multa reduzido, pois fixado de modo exacerbado na sentença.
14. Considerando as circunstâncias judiciais desfavoráveis, ponderadas
na primeira fase da dosimetria da pena, de rigor a manutenção do regime
inicial de cumprimento de pena semiaberto, tendo por fundamento o disposto
no artigo 33, § 3º, do Código Penal.
15. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos, em face do não preenchimento dos requisitos subjetivos do
art. 44 do Código Penal, considerando que as circunstâncias judiciais não
são favoráveis ao réu, tanto que fixada a pena-base acima do mínimo.
16. Apelação do réu provida em parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, rejeitar a preliminar suscitada, dar parcial provimento
ao recurso de GABRIEL GEOVANE GONÇALVES para reduzir a pena-base e a
pena de multa, resultando na pena de 03 (três) anos e 09 (nove) meses de
reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, além do pagamento
de 18 (dezoito) dias-multa, e reduzir o valor unitário do dia-multa para
1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, e, por
maioria, de ofício, excluir a condenação em reparação de danos, nos
termos do voto do Des. Fed. Wilson Zauhy, acompanhado pelo Des. Fed. Valdeci
dos Santos. Por maioria, determinar a imediata expedição de mandado de
prisão, nos termos do voto do Des. Fed. Hélio Nogueira, acompanhado pelo
Des. Fed. Valdeci dos Santos, vencido o Des. Fed. Wilson Zauhy que entende
deva ser determinada a expedição de mandado de prisão somente após a
certificação de esgotamento dos recursos ordinários no caso concreto,
devendo ser comunicado ao juízo de origem para que adote providências
necessárias quanto ao início da execução provisória da pena.
Data do Julgamento
:
12/06/2018
Data da Publicação
:
26/06/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 64578
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-155 PAR-4 INC-2 ART-29 ART-71 ART-33 PAR-3
ART-44
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-75 ART-83 ART-70 PAR-3 ART-71 ART-72 PAR-2
ART-78 INC-2 LET-C
LEG-FED LEI-9296 ANO-1996 ART-1
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-444
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/06/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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