TRF3 0012741-46.2014.4.03.6181 00127414620144036181
PENAL. ESTELIONATO. ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. TENTATIVA. CRIME
IMPOSSÍVEL. INOCORRÊNCIA. USO DE DOCUMENTOS IDEOLOGICAMENTE FALSOS PARA A
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. APTIDÃO PARA ENGANAR. MATERIALIDADE,
AUTORIA DELITIVA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. APELAÇÃO DA
ACUSAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Para que a tentativa não seja punida, o meio empregado pelo agente precisa
ser absolutamente (completamente) ineficaz para a consecução da empreitada
criminosa ou o objeto (pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta do sujeito
ativo do tipo penal) precisa ser absolutamente impróprio para o desiderato
pretendido pelo criminoso. Tais situações retratadas escoram-se na ideia de
que o bem jurídico tutelado pela norma penal não corre risco algum em face
da conduta (comissiva ou omissiva) levada a efeito, de modo que o crime é
reputado como impossível (REsp 1385621/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI
CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27/05/2015, DJe 02/06/2015).
2. O meio empregado pelo acusado para o cometimento, em tese, do crime
de estelionato, consistiu no uso de documentos ideologicamente falsos,
não se mostrando como absolutamente ineficaz para a prática da infração
penal. Isso porque, os documentos falsificados não continham falsificação
grosseira, sendo aptos à consecução do resultado pretendido pelo agente,
que somente não se consumou por motivo alheio à sua vontade, qual seja,
atuação diligente e eficaz dos servidores do Instituto Nacional do Seguro
Social, ao diligenciarem para apuração do conteúdo falso constante dos
documentos utilizados para o requerimento do benefício previdenciário.
3. O objetivo pretendido com a fraude perpetrada (concessão de benefício
previdenciário) somente não foi atingido por circunstâncias externas,
alheias à vontade do agente, o que não afeta o fato de que o meio empregado
para tal consecução era perfeitamente apto à produção do resultado
pretendido, não configurando o crime impossível que exige a percepção
da fraude ictu oculli. Precedentes.
4. A materialidade do delito está demonstrada pelo processo administrativo,
em especial pelo requerimento do benefício assistencial, declaração da
composição familiar falaciosa, comprovação de endereço falso, escritura
pública de declaração enganosa, declaração da possível beneficiária,
em sede policial, bem como comprovação de que o marido da requerente
recebia aposentadoria por idade. É admissível, para o fim de comprovação
da materialidade delitiva, a utilização de dados coletados em processo
administrativo perante o INSS, uma vez que nele deve-se observância ao
princípio do contraditório. Precedentes.
5. A autoria delitiva restou comprovada pela procuração que a requerente
outorgou ao acusado, bem como por constar dos requerimentos administrativos
e da declaração de composição do grupo e renda familiar a assinatura do
réu, corroborado pela declarações em sede policial e judicial. Observância
do art. 155 do Código de Processo Penal.
6. O dolo do acusado é patente ante a deliberada intenção de receber
para si e para outrem vantagem ilícita, em prejuízo do INSS, mediante meio
fraudulento (uso de documentos falsos).
7. Dosimetria da pena. O mero apontamento não pode ser utilizado para
majorar a pena-base, a título de maus antecedentes (CP, art. 59), visto
já ter sido atingido pelo período depurador, nos termos do art. 64,
I, do Código Penal. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Por outro
lado, condenações por contravenção penal não são capazes de induzir
reincidência relativamente a crimes, à míngua de previsão no art. 63 do
Código Penal, bem como diante do teor do art. 7º da Lei das Contravenções
Penais (Decreto-lei nº 3.688/1941), por igual motivo considero não ser
possível sua utilização para fins de elevação da pena-base, a título de
maus antecedentes. Inexistência de agravantes ou atenuantes. Na terceira fase,
aplicação da fração de aumento de 1/3 (um terço) nos termo do art. 171,
§ 3º do Código Penal. Pena de multa fixada no mínimo legal.
8. Em razão do "quantum" da pena privativa de liberdade, sua substituição
se dá por apenas uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação
de serviços à comunidade pelo tempo da condenação.
9. Apelação parcialmente provida
Ementa
PENAL. ESTELIONATO. ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. TENTATIVA. CRIME
IMPOSSÍVEL. INOCORRÊNCIA. USO DE DOCUMENTOS IDEOLOGICAMENTE FALSOS PARA A
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. APTIDÃO PARA ENGANAR. MATERIALIDADE,
AUTORIA DELITIVA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. APELAÇÃO DA
ACUSAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Para que a tentativa não seja punida, o meio empregado pelo agente precisa
ser absolutamente (completamente) ineficaz para a consecução da empreitada
criminosa ou o objeto (pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta do sujeito
ativo do tipo penal) precisa ser absolutamente impróprio para o desiderato
pretendido pelo criminoso. Tais situações retratadas escoram-se na ideia de
que o bem jurídico tutelado pela norma penal não corre risco algum em face
da conduta (comissiva ou omissiva) levada a efeito, de modo que o crime é
reputado como impossível (REsp 1385621/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI
CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27/05/2015, DJe 02/06/2015).
2. O meio empregado pelo acusado para o cometimento, em tese, do crime
de estelionato, consistiu no uso de documentos ideologicamente falsos,
não se mostrando como absolutamente ineficaz para a prática da infração
penal. Isso porque, os documentos falsificados não continham falsificação
grosseira, sendo aptos à consecução do resultado pretendido pelo agente,
que somente não se consumou por motivo alheio à sua vontade, qual seja,
atuação diligente e eficaz dos servidores do Instituto Nacional do Seguro
Social, ao diligenciarem para apuração do conteúdo falso constante dos
documentos utilizados para o requerimento do benefício previdenciário.
3. O objetivo pretendido com a fraude perpetrada (concessão de benefício
previdenciário) somente não foi atingido por circunstâncias externas,
alheias à vontade do agente, o que não afeta o fato de que o meio empregado
para tal consecução era perfeitamente apto à produção do resultado
pretendido, não configurando o crime impossível que exige a percepção
da fraude ictu oculli. Precedentes.
4. A materialidade do delito está demonstrada pelo processo administrativo,
em especial pelo requerimento do benefício assistencial, declaração da
composição familiar falaciosa, comprovação de endereço falso, escritura
pública de declaração enganosa, declaração da possível beneficiária,
em sede policial, bem como comprovação de que o marido da requerente
recebia aposentadoria por idade. É admissível, para o fim de comprovação
da materialidade delitiva, a utilização de dados coletados em processo
administrativo perante o INSS, uma vez que nele deve-se observância ao
princípio do contraditório. Precedentes.
5. A autoria delitiva restou comprovada pela procuração que a requerente
outorgou ao acusado, bem como por constar dos requerimentos administrativos
e da declaração de composição do grupo e renda familiar a assinatura do
réu, corroborado pela declarações em sede policial e judicial. Observância
do art. 155 do Código de Processo Penal.
6. O dolo do acusado é patente ante a deliberada intenção de receber
para si e para outrem vantagem ilícita, em prejuízo do INSS, mediante meio
fraudulento (uso de documentos falsos).
7. Dosimetria da pena. O mero apontamento não pode ser utilizado para
majorar a pena-base, a título de maus antecedentes (CP, art. 59), visto
já ter sido atingido pelo período depurador, nos termos do art. 64,
I, do Código Penal. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Por outro
lado, condenações por contravenção penal não são capazes de induzir
reincidência relativamente a crimes, à míngua de previsão no art. 63 do
Código Penal, bem como diante do teor do art. 7º da Lei das Contravenções
Penais (Decreto-lei nº 3.688/1941), por igual motivo considero não ser
possível sua utilização para fins de elevação da pena-base, a título de
maus antecedentes. Inexistência de agravantes ou atenuantes. Na terceira fase,
aplicação da fração de aumento de 1/3 (um terço) nos termo do art. 171,
§ 3º do Código Penal. Pena de multa fixada no mínimo legal.
8. Em razão do "quantum" da pena privativa de liberdade, sua substituição
se dá por apenas uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação
de serviços à comunidade pelo tempo da condenação.
9. Apelação parcialmente providaDecisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL, para afastar a ocorrência de crime impossível e julgar procedente
a pretensão punitiva estatal e condenar o réu IZAC PEREIRA DA SILVA pela
prática do crime tipificado no art. 171, § 3º, c.c. o art. 14, II, ambos
do Código Penal, em regime inicial aberto, além de 10 (dez) dias-multa,
fixados em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato,
nos termos do voto do Des. Fed. Relator; prosseguindo, a Turma, por maioria,
decidiu fixar a pena definitiva do acusado IZAC PEREIRA DA SILVA em 10
(dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e 10 (dez) dias-multa, a ser
cumprida em regime inicial aberto, substituída por uma pena restritiva de
direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade pelo tempo
da condenação, nos termos do voto divergente do Des. Fed. Nino Toldo,
com quem votou o Des. Fed. José Lunardelli, pela conclusão, vencido o
Des. Fed. Relator que fixava a pena privativa de liberdade em 01 ano e 13 dias
de reclusão e a substituía por duas restritivas de direitos, consistentes
na prestação pecuniária de 02 salários mínimos, a entidade assistencial
eleita pelo juízo da execução e prestação de serviços à comunidade ou
a entidades públicas, a ser definida pelo juízo da execução, nos termos
do relatório e votos que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
21/08/2018
Data da Publicação
:
20/09/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 70189
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ART-64 INC-1 ART-63 ART-14 INC-2
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-155
***** LCP-41 LEI DAS CONTRAVENÇÕES PENAIS
LEG-FED DEL-3688 ANO-1941 ART-7
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/09/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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