TRF3 0012767-15.2012.4.03.6181 00127671520124036181
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. SUBTRAÇÃO DE PROCESSO. ARTIGO
337, CÓDIGO PENAL. QUADRILHA. ARTIGO 288, CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE,
AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. TEORIA DA COCULPABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE
APLICAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. REDIMENSIONADA.
1. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos.
2. O fato de ter havido a posterior restauração dos autos desaparecidos,
ainda que em sua integralidade, não exclui o crime.
3. O crime de quadrilha se consuma pela associação relativamente duradoura
de pessoas unidas por uma convergência de vontades, independentemente da
efetivação dos delitos visados. Não é necessário, contudo, que todas
as pessoas envolvidas efetivamente se conheçam, bastando a vontade livre
e consciente de integrar uma organização criminosa.
4. As circunstâncias em que praticados os crimes não deixam dúvida quanto
à associação dos seis acusados com o fim específico de cometer delitos. A
estrutura aparelhada com divisão clara de tarefas e por meios acessíveis e
justificáveis apenas no âmbito de um organismo, demonstra inequivocamente
a associação dos indivíduos de maneira organizada e complexa.
5. Acusados que constituíram grupo criminoso estável para reiteradamente
subtraírem autos judiciais. Os acusados PEDRO e JOSÉ JOAQUIM financiaram o
grupo, com o objetivo de obtenção de vantagem patrimonial para a empresa
da qual eram sócios (Makro Color), DANIEL foi o mentor e organizador da
empreitada criminosa, que com o auxilio de ROBERTA, recebiam os recursos
dos réus empresários a serem divididos com JOHN e ANDERSON. Daniel
cooptando comparsas dentre trabalhadores terceirizados da Justiça
Federal, retransmitindo as informações necessárias para localização
e identificação dos autos a serem subtraídos, pagavam os executores da
subtração e entregavam os autos subtraídos aos acusados empresários,
sendo esses os "serviços de consultoria" prestados por ROBERTA e DANIEL,
e, por fim, JOHN e ANDERSON, aproveitando-se das facilidades oriundas das
funções de trabalhadores terceirizados da Justiça Federal, executaram a
subtração dos seis autos de execuções fiscais.
6. Mesmo que o Estado deixe de prestar a devida assistência aos seus cidadãos
(e, em especial, à determinada parcela da sociedade), isso, por si só, não
justificativa ou autoriza a prática delitiva, na medida em tal carência
é insuficiente para afastar a consciência da ilicitude e a capacidade de
autodeterminação do indivíduo, cujo móvel pode ser questionado, mas não
eliminado da equação da análise da culpabilidade.
7. Dosimetria. Redimensionamento das penas.
7.1. A culpabilidade tida como elemento do crime não pode ser confundida
com a culpabilidade prevista no artigo 59 do Código Penal, que diz respeito
à reprovabilidade, à censurabilidade da conduta.
7.2. As circunstâncias do crime que dizem respeito ao modus operandi empregado
na prática do delito, que são elementos que, embora não componham o crime,
influenciam em sua gravidade, no presente caso demonstram uma maior ousadia
dos acusados JOHN e ANDERSON, que se valendo da condição de trabalhadores
terceirizados do fórum federal das execuções fiscais subtraíram seis
autos de processo.
7.3. Aos delitos de subtração ou inutilização de livro ou documento a
conduta da ré ROBERTA BARDO é normal para espécie e a culpabilidade não
se diferencia do que é normalmente visto nesse tipo de crime. Quanto às
circunstâncias do crime, comungo do entendimento exarado pelo magistrado
a quo, ao valorá-las negativamente, haja vista a simulação de contrato
de trabalho fictício e a utilização de conta corrente em nome falso para
dificultar a apuração da responsabilidade penal.
7.4. A reprovabilidade e a censurabilidade da conduta do réu DANIEL BERNARDINO
destoam em face da ousadia em cooptar trabalhadores terceirizados da justiça
federal para a prática delitiva.
7.5. Quanto às circunstâncias do crime, igualmente, mantenho a sentença
em face da ousadia do acusado considerando a simulação de contrato de
trabalho fictício e a utilização de conta corrente em nome falso para
dificultar a apuração da responsabilidade penal.
7.6. Reconhecida ao réu DANIEL BERNARDINO a atenuante prevista no artigo 65,
III, d, do Código Penal e mantida a incidência da agravante do artigo 62,
I e IV, do Código Penal, que se compensam.
7.7. Conduta dos réus PEDRO ANDREOTTI e JOSÉ JOAQUIM, que na condição
de sócios da empresa Makro contrataram os serviços dos demais réus para
subtração de autos de execução fiscal aparelhadas contra a empresa
revestem-se de maior reprovabilidade e censurabilidade. Circunstâncias do
crime devem ser negativamente valoradas em face da ousadia dos acusados
considerando a simulação de contratos de trabalho fictícios para
contratação dos réus DANIEL e ROBERTA com vistas a encobrir a prática
delitiva.
7.8. Incidência da atenuante prevista no artigo 65, I do Código Penal,
aos réus PEDRO ANDREOTTI e JOSÉ JOAQUIM, maiores de 70 anos quando da
prolação da sentença.
7.9. Regime prisional inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, b,
do Código Penal.
7.10. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos, na medida em que as penas definitivas superam
quatro anos de reclusão e, portanto, não foram preenchidos os requisitos
do art. 44 do Código Penal.
8. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
9. Apelações dos réus JOHN LENNON SOUZA DOS SANTOS, ANDERSON GOMES BARASINO,
PEDRO ANDREOTTI e JOSÉ JOAQUIM desprovidas.
10. Apelações dos réus DANIEL BERNARDINO e ROBERTA BARDO parcialmente
provida.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. SUBTRAÇÃO DE PROCESSO. ARTIGO
337, CÓDIGO PENAL. QUADRILHA. ARTIGO 288, CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE,
AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. TEORIA DA COCULPABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE
APLICAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. REDIMENSIONADA.
1. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos.
2. O fato de ter havido a posterior restauração dos autos desaparecidos,
ainda que em sua integralidade, não exclui o crime.
3. O crime de quadrilha se consuma pela associação relativamente duradoura
de pessoas unidas por uma convergência de vontades, independentemente da
efetivação dos delitos visados. Não é necessário, contudo, que todas
as pessoas envolvidas efetivamente se conheçam, bastando a vontade livre
e consciente de integrar uma organização criminosa.
4. As circunstâncias em que praticados os crimes não deixam dúvida quanto
à associação dos seis acusados com o fim específico de cometer delitos. A
estrutura aparelhada com divisão clara de tarefas e por meios acessíveis e
justificáveis apenas no âmbito de um organismo, demonstra inequivocamente
a associação dos indivíduos de maneira organizada e complexa.
5. Acusados que constituíram grupo criminoso estável para reiteradamente
subtraírem autos judiciais. Os acusados PEDRO e JOSÉ JOAQUIM financiaram o
grupo, com o objetivo de obtenção de vantagem patrimonial para a empresa
da qual eram sócios (Makro Color), DANIEL foi o mentor e organizador da
empreitada criminosa, que com o auxilio de ROBERTA, recebiam os recursos
dos réus empresários a serem divididos com JOHN e ANDERSON. Daniel
cooptando comparsas dentre trabalhadores terceirizados da Justiça
Federal, retransmitindo as informações necessárias para localização
e identificação dos autos a serem subtraídos, pagavam os executores da
subtração e entregavam os autos subtraídos aos acusados empresários,
sendo esses os "serviços de consultoria" prestados por ROBERTA e DANIEL,
e, por fim, JOHN e ANDERSON, aproveitando-se das facilidades oriundas das
funções de trabalhadores terceirizados da Justiça Federal, executaram a
subtração dos seis autos de execuções fiscais.
6. Mesmo que o Estado deixe de prestar a devida assistência aos seus cidadãos
(e, em especial, à determinada parcela da sociedade), isso, por si só, não
justificativa ou autoriza a prática delitiva, na medida em tal carência
é insuficiente para afastar a consciência da ilicitude e a capacidade de
autodeterminação do indivíduo, cujo móvel pode ser questionado, mas não
eliminado da equação da análise da culpabilidade.
7. Dosimetria. Redimensionamento das penas.
7.1. A culpabilidade tida como elemento do crime não pode ser confundida
com a culpabilidade prevista no artigo 59 do Código Penal, que diz respeito
à reprovabilidade, à censurabilidade da conduta.
7.2. As circunstâncias do crime que dizem respeito ao modus operandi empregado
na prática do delito, que são elementos que, embora não componham o crime,
influenciam em sua gravidade, no presente caso demonstram uma maior ousadia
dos acusados JOHN e ANDERSON, que se valendo da condição de trabalhadores
terceirizados do fórum federal das execuções fiscais subtraíram seis
autos de processo.
7.3. Aos delitos de subtração ou inutilização de livro ou documento a
conduta da ré ROBERTA BARDO é normal para espécie e a culpabilidade não
se diferencia do que é normalmente visto nesse tipo de crime. Quanto às
circunstâncias do crime, comungo do entendimento exarado pelo magistrado
a quo, ao valorá-las negativamente, haja vista a simulação de contrato
de trabalho fictício e a utilização de conta corrente em nome falso para
dificultar a apuração da responsabilidade penal.
7.4. A reprovabilidade e a censurabilidade da conduta do réu DANIEL BERNARDINO
destoam em face da ousadia em cooptar trabalhadores terceirizados da justiça
federal para a prática delitiva.
7.5. Quanto às circunstâncias do crime, igualmente, mantenho a sentença
em face da ousadia do acusado considerando a simulação de contrato de
trabalho fictício e a utilização de conta corrente em nome falso para
dificultar a apuração da responsabilidade penal.
7.6. Reconhecida ao réu DANIEL BERNARDINO a atenuante prevista no artigo 65,
III, d, do Código Penal e mantida a incidência da agravante do artigo 62,
I e IV, do Código Penal, que se compensam.
7.7. Conduta dos réus PEDRO ANDREOTTI e JOSÉ JOAQUIM, que na condição
de sócios da empresa Makro contrataram os serviços dos demais réus para
subtração de autos de execução fiscal aparelhadas contra a empresa
revestem-se de maior reprovabilidade e censurabilidade. Circunstâncias do
crime devem ser negativamente valoradas em face da ousadia dos acusados
considerando a simulação de contratos de trabalho fictícios para
contratação dos réus DANIEL e ROBERTA com vistas a encobrir a prática
delitiva.
7.8. Incidência da atenuante prevista no artigo 65, I do Código Penal,
aos réus PEDRO ANDREOTTI e JOSÉ JOAQUIM, maiores de 70 anos quando da
prolação da sentença.
7.9. Regime prisional inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, b,
do Código Penal.
7.10. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos, na medida em que as penas definitivas superam
quatro anos de reclusão e, portanto, não foram preenchidos os requisitos
do art. 44 do Código Penal.
8. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
9. Apelações dos réus JOHN LENNON SOUZA DOS SANTOS, ANDERSON GOMES BARASINO,
PEDRO ANDREOTTI e JOSÉ JOAQUIM desprovidas.
10. Apelações dos réus DANIEL BERNARDINO e ROBERTA BARDO parcialmente
provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª
Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO aos recursos de apelação dos
réus JOHN LENNON SOUZA DOS SANTOS e ANDERSON GOMES BARASINO e, DE OFÍCIO,
redimensionar as penas impostas pela prática dos crimes de subtração
de processos em concurso material com o crime de quadrilha, ficando cada
um dos réus definitivamente condenado à pena de 04 (quatro) anos e 08
(oito) meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto;
NEGAR PROVIMENTO aos recursos de apelação dos réus PEDRO ANDREOTTI e JOSÉ
JOAQUIM e, DE OFÍCIO, redimensionar as penas impostas pela prática dos crimes
de subtração de processos em concurso material com o crime de quadrilha,
ficando cada um dos réus definitivamente condenado à pena 04 (quatro) anos,
06 (seis) meses e 12 (doze) dias de reclusão, a ser cumprida inicialmente
em regime semiaberto; DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação da ré
ROBERTA BARDO para redimensionar as penas impostas pela prática dos crimes
de subtração de processos em concurso material com o crime de quadrilha,
ficando a ré definitivamente condenada à 05 (cinco) anos, 05 (cinco) meses e
10 (dez) dias de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto;
DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação do réu DANIEL BERNARDINO para,
reconhecer a incidência da atenuante da confissão espontânea e redimensionar
as penas impostas pela prática dos crimes de subtração de processos em
concurso material com o crime de quadrilha, ficando o réu definitivamente
condenado à 05 (cinco) anos, 05 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão,
a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
06/11/2018
Data da Publicação
:
13/11/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 72094
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-337 ART-288 ART-59 ART-62 INC-1 INC-4 ART-65
INC-3 LET-D INC-1 ART-33 PAR-2 LET-B ART-44
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/11/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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