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Jurisprudência


TRF3 0012956-72.2018.4.03.9999 00129567220184039999

Ementa
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. REMESSA NÃO CONHECIDA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL RAZOÁVEL. COMPROVAÇÃO DO TRABALHO RURAL PELO PERÍODO EXIGIDO NA LEGISLAÇÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO MANTIDA. - Considerando que o valor da condenação ou proveito econômico não ultrapassa 1.000 (mil) salários mínimos na data da sentença, conforme art. 496, § 3º, I, do CPC/2015, não é caso de remessa oficial. - Os requisitos para concessão da aposentadoria por idade de trabalhador rural estão fixados nos arts. 142 e 143 da Lei 8213/1991, e, quando segurado especial em regime de economia familiar, nos arts. 39, I, e 142 da mesma lei. - A carência estatuída no art. 25, II, não tem aplicação integral imediata, devendo ser escalonada e progressiva, na forma estabelecida no art. 142, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou as condições necessárias à obtenção do benefício. Trata-se de regra de transição destinada àqueles que já estavam no sistema antes da modificação legislativa. - Embora o art. 2º da Lei 11.718/2008 tenha estabelecido que "para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010", mesmo a partir de 01.01.2011 é possível a concessão do benefício, contudo, com base em fundamento legal diverso. - A aposentadoria por idade continua sendo devida aos rurícolas, não mais nos termos do art. 143 do PBPS, mas, sim, com fulcro no art. 48 e parágrafos da Lei 8.213/91, com as modificações introduzidas pela Lei 11.718/2008. - Nos casos em que o(a) autor(a) completa a idade para a aposentadoria por idade rural após 31.12.2010, já não se submete às regras de transição dos arts. 142 e 143, e deve preencher os requisitos previstos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 11.718/2008): 60 (sessenta) anos de idade, se homem, 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, tempo de efetiva atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período correspondente à carência exigida para o benefício, isto é, 180 (cento e oitenta) meses, e imediatamente anterior ao requerimento. - A inicial sustentou que a autora era trabalhadora rural, tendo exercido sua atividade ora em regime de economia familiar, ora como boia-fria. - A interpretação sistemática da legislação previdenciária permite concluir que a exigência de comprovação do exercício da atividade no período imediatamente anterior ao do requerimento do benefício só tem sentido quando ainda não completado o tempo necessário para a concessão, na forma prevista no art. 142 da Lei 8.213/91. Se a parte deixou as lides rurais após trabalhar pelo período exigido no art. 143, não tem sentido negar-lhe o benefício. Aplicando o princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços para populações urbanas e rurais, descrito no art. 194, II, da Constituição Federal, é de se entender que, à semelhança dos urbanos, a posterior perda da condição de segurado não obsta à concessão do benefício quando já cumprida a carência. - Comprovado o exercício da atividade rural, não há que se falar em perda da qualidade de segurado, uma vez o trabalhador rural deve apenas comprovar os requisitos idade e tempo de atividade. - O conceito de carência, para o diarista e para o segurado especial, tem sentido peculiar, que se satisfaz com o exercício da atividade, dispensando o pagamento das contribuições previdenciárias. - A autora completou 55 anos em 22.09.2009, portanto, fará jus ao benefício se comprovar sua condição de rurícola pelo período de 168 meses. - O art. 106 da Lei 8.213/1991 enumera os documentos aptos à comprovação da atividade, rol que não é taxativo, admitindo-se outras provas, na forma do entendimento jurisprudencial dominante. - Documentos expedidos por órgãos públicos, nos quais consta a qualificação do marido da autora como lavrador, podem ser utilizados como início de prova material, como exige o art. 55, § 3º, da Lei 8213/91, para comprovar a sua condição de rurícola, se confirmada por prova testemunhal. - A perda da condição de segurado que não impede a concessão do benefício àquele que cumpriu a carência também se aplica aos trabalhadores rurais. - Essa norma, como todas as demais, não comporta leitura e interpretação isoladas. Deve ser analisada dentro do sistema que a alberga e, no caso, com vistas à proteção previdenciária dada aos trabalhadores rurais. - Cabe investigar o real significado da exigência contida no art. 143 da Lei 8.213/91, o quê realmente deve ser exigido do trabalhador rural para que tenha direito à sua aposentadoria por idade. Deve estar trabalhando no dia imediatamente anterior ao requerimento? Um ano antes? Dois anos antes? Qual o período de interrupção do trabalho rural que pode ser considerado imediatamente anterior ao requerimento do benefício? - A resposta está no próprio art. 143, cuja infeliz redação, ensejadora de tantas discussões, tem em vista a proteção do trabalhador rural. - No regime anterior à Constituição de 1.988, os trabalhadores rurais estavam expressamente excluídos do Regime Geral de Previdência Social, e tinham algum amparo apenas dentro dos limites do Prorural. - A Constituição de 1988 estabelece que, para fins de seguridade social, trabalhadores urbanos e rurais devem ter tratamento uniforme e equivalente, o que impõe que os trabalhadores rurais tenham a mesma proteção previdenciária dada aos urbanos. - O novo Regime Geral de Previdência Social, conforme previsto na Constituição, foi implementado com as Leis 8.212 e 8.213/91. - Instituído o novo RGPS, era necessário dar proteção àqueles trabalhadores rurais que, antes da nova legislação, estavam expressamente excluídos da cobertura previdenciária, e essa proteção veio, justamente, na forma prevista no art. 143 da Lei 8.213/91: aposentadoria por idade, desde que comprovado o efetivo exercício da atividade rural pelo período correspondente à carência prevista no art. 143, e no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício. - A "mens legis" foi, sem dúvida, proteger aquele trabalhador rural que antes do novo regime previdenciário não tivera proteção previdenciária, ou seja, que fizera das lides rurais o seu meio de vida. É verdade que a lei tolera que a atividade rural tenha sido exercida de forma descontínua. Entretanto, não admite que tenha aquele trabalhador perdido a sua natureza rurícola. - A análise só pode ser feita no caso concreto. É a história laboral do interessado que pode levar à conclusão de que permaneceu, ou não, essencialmente, trabalhador rural. - Se das provas surgir a comprovação de que o trabalho rural não foi determinante para a sobrevivência do interessado, não se tratará de trabalhador rural com direito à proteção previdenciária prevista no art. 143 da Lei 8.213/91. - O reconhecimento de trabalho rural exercido na qualidade de diarista ou em regime de economia familiar depende da apresentação de início de prova material contemporânea aos fatos, conforme previsto no art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, corroborado por posicionamento jurisprudencial consolidado na Súmula 149 do STJ. Admitida somente a averbação/reconhecimento da atividade campesina após os 12 anos de idade. - A prova material apresentada deve guardar a necessária correlação lógica e pertinente com a prova oral, devendo considerar, ainda, as situações peculiares do rurícola diarista, que não possui similaridade com a do rurícola em regime de economia familiar, pois o primeiro trabalha de forma avulsa, com vínculo não empregatício com o tomador do serviço, e mediante remuneração, e o segundo trabalha por conta própria, em regra, com a cooperação de familiares, sem qualquer vínculo de dependência financeira com terceiros, visando a subsistência ou o rendimento decorrente da venda da produção. - A prova material de cada modalidade de trabalho rural possui características próprias, principalmente quanto ao alcance e à possibilidade de seu aproveitamento por outrem. - O trabalho rural em regime de economia familiar permite o aproveitamento do início de prova material em reciprocidade entre os membros da entidade familiar, sendo permitida a comunicação da qualificação profissional de um membro para outro, como ocorre entre os cônjuges, entre pais e filhos, e em outras hipóteses, nas quais presente o parentesco. - No reconhecimento do trabalho rural do diarista não se permite, em regra, o aproveitamento da prova material, que não em nome próprio, em razão do caráter solitário e avulso do trabalho desempenhado. - O diarista só poderá aproveitar o início de prova material produzida em nome de outrem, mesmo que de algum familiar, se devidamente amparado pelas demais provas dos autos. - Se de um lado a jurisprudência alarga o conceito de início de prova material, por outro lado, o início de prova material, por si só, não serve para comprovar o trabalho rural, sendo indispensável a existência de prova testemunhal convincente. - Em recurso repetitivo (Resp 1352791-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgamento em 27/11/2013), o STJ firmou posicionamento de que os períodos em que o rurícola trabalhou com registro em CTPS na atividade rural devem ser computados para efeito de carência, para efeitos de outra modalidade de aposentadoria. Isto porque o responsável pelo recolhimento para o Funrural era o empregador, não o empregado. - A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, em 19 de agosto de 2015, firmou a tese de que o INSS deve computar, para efeito de carência, o período trabalhado como empregado rural, registrado por empresas agroindustriais ou comerciais, no caso da aposentadoria por tempo de serviço rural (Processo nº 0516170-28.2009.4.05.8300). - O ano do documento mais remoto, onde conste a qualificação de lavrador, era o termo inicial dessa atividade, ainda que a prova testemunhal se reportasse a período anterior. Contudo, com o julgamento do REsp n. 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, a jurisprudência do STJ admitiu o reconhecimento de tempo de serviço rural em período anterior ao documento mais antigo, desde que corroborado por convincente prova testemunhal. - Para comprovar sua condição de rurícola, a autora juntou os seguintes documentos: comprovante de residência; CTPS em nome próprio, indicando vínculo rural de 01.04.1996 a 13.08.1996; CTPS do esposo, apontando vínculos rurais de 01.07.1975 a 30.11.1975, 31.05.1977 a 30.12.1977, 06.01.1978 a 08.05.1979, 11.12.1979 a 30.09.1983, 05.10.1983 a 11.03.1984, 01.02.1985 a 09.09.1986, 01.12.1986 a 31.08.1988, 01.02.1989 a 17.12.1989 e vínculos urbanos de 05.07.1976 a 06.08.1976, 21.05.1990 a 26.05.1994 e de 01.09.1995 a 05.09.1995; certidão de casamento da autora, celebrado em 09.05.1975, demonstrando que o marido está qualificado como lavrador; certidão de nascimento de filhos, lavradas em 06.08.1979 e 17.05.1982; certidão de casamento de filho da autora, lavrada em 17.11.2012 e fotos. - A jurisprudência consolidou-se no sentido de que "para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício" (Súmula nº 14 TNU) e ainda que o rol de documentos previsto no art. 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo. - Quanto à contemporaneidade dos documentos, a prova material indiciária precisa ter sido formada em qualquer instante do período de atividade rural que se pretende comprovar. Dentro do intervalo que se pretende comprovar, o documento pode ter sido formado no início, no meio ou no fim do período. A prova material pode ser contemporânea ao início do período de carência e ter sua eficácia probatória estendida prospectivamente (para o futuro) se conjugada com prova testemunhal complementar convincente e harmônica. Igualmente, pode ser contemporânea ao final do período de carência e ter sua eficácia estendida retroativamente (para o passado) se conjugada com prova testemunhal complementar convincente e harmônica. A jurisprudência da TNU está pacificada no sentido de admitir a eficácia retrospectiva e prospectiva dos documentos indiciários do exercício de atividade rural. - A consulta ao CNIS (documento em anexo) confirma o aduzido vínculo rural em nome da autora e, quanto ao marido, apenas confirma parte dos vínculos citados. - A autora traz documento em nome próprio e posterior ao último vínculo urbano do marido, em 1995, o que indica a continuidade da atividade rural pela autora, o que resta confirmado pelos depoimentos testemunhais. - As testemunhas ouvidas em juízo afirmam conhecer a autora há mais de vinte anos e que ela sempre trabalhou na lavoura (audiência realizada em 08.11.2017). - A prova testemunhal confirmou o trabalho rural da autora, inclusive quando completados os 55 anos de idade, nos termos do exigido no REsp 1.354.908/SP, com o que é viável a concessão do benefício. - Remessa não conhecida. - Apelação improvida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e, por maioria, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do voto da Desembargadora Federal Marisa Santos, que foi acompanhada pela Desembargadora Federal Ana Pezarini e pela Desembargadora Federal Inês Virgínia (que votaram nos termos do art. 942, "caput" e §1º, do CPC). Vencido o Relator, que lhe dava provimento, o qual foi acompanhado pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan. Julgamento nos termos do disposto no artigo 942, "caput" e §1º, do CPC. Lavrará acórdão a Desembargadora Federal Marisa Santos.

Data do Julgamento : 26/09/2018
Data da Publicação : 25/10/2018
Classe/Assunto : ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2303257
Órgão Julgador : NONA TURMA
Relator(a) : JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/10/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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