TRF3 0013370-98.2016.4.03.6100 00133709820164036100
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO EM EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE
CRÉDITO BANCÁRIO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. COMISSÃO DE
PERMANÊNCIA. CDC. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. ANATOCISMO. SISTEMAS DE
AMORTIZAÇÃO. TARIFAS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
I - Nas ações em que se pleiteia a revisão de cláusulas de contratos
de mútuo, em regra, incide o artigo 355, I, do novo CPC, (artigo 330,
I, do CPC/73), permitindo-se o julgamento antecipado da lide, porquanto
comumente as questões de mérito são unicamente de direito. Na hipótese
de a questão de mérito envolver análise de fatos, é do autor o ônus de
provar o fato constitutivo de seu direito, inteligência do artigo 373, I,
do novo CPC/15 (artigo 333, I, do CPC/73). Cabe ao juiz da causa avaliar
a pertinência do pedido de realização de perícia contábil, conforme
artigos 370 e 464 do novo CPC (artigos 130 e 420 do CPC/73), razão pela
qual o indeferimento de pedido para produção de prova pericial, por si
só, não representa cerceamento de defesa. Considerando as alegações da
embargante e a configuração do caso em tela, não se vislumbra o alegado
cerceamento de defesa.
II - O contrato de abertura de crédito não é título executivo mesmo quando
acompanhado de extrato de conta-corrente, documentos que permitiram apenas o
ajuizamento de ação monitória. Este tipo de contrato tampouco seria dotado
de liquidez, característica que, ademais, afastaria a autonomia da nota
promissória a ele vinculada (Súmula 233, Súmula 247 e Súmula 258 do STJ).
II - A regulamentação das Cédulas de Crédito Bancário estabeleceu
parâmetros opostos àqueles consagrados nas Súmulas 233, 247 e 258 do STJ. A
Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial se preencher
os requisitos definidos pela legislação (artigo 28, caput, § 2º, I e II,
artigo 29 da Lei 10.931/04). O artigo 28, § 3º da Lei 10.931/04 prevê que
o credor fica obrigado a pagar ao devedor o dobro do valor cobrado a maior
em execução de Cédula de Crédito Bancário promovida sem os requisitos
definidos pela legislação (REsp 1291575, STJ, julgado pelo rito do artigo
543-C do CPC). O teor do artigo 18 da LC nº 95/98 afasta qualquer defesa
que pretenda se basear em ofensa ao artigo 7º do mesmo diploma legal.
III - Uma vez pactuada, não constitui prática irregular a cobrança de
comissão de permanência quando configurado o inadimplemento contratual,
contanto que sua utilização não seja concomitante à incidência de
correção monetária, e de outros encargos moratórios e remuneratórios,
bem como de multa contratual. Mesmo ao se considerar a sua utilização
exclusiva, seu valor não pode ser superior ao montante correspondente à
somatória dos critérios que são afastados para a sua incidência. Por essas
mesmas razões, não é permitida a cumulação de cobrança de comissão
de permanência e taxa de rentabilidade (Súmula 30, Súmula 294, Súmula
296 e Súmula 472 do STJ).
IV - O Código de Defesa do Consumidor se aplica às instituições
financeiras (Súmula 297 do STJ), mas a aplicação da teoria da imprevisão
e do princípio rebus sic standibus para relativizar o pacta sunt servanda
requer a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que
sustentavam o contrato, justificando o pedido de revisão contratual. Mesmo
nos casos em que se verifica o prejuízo financeiro, a nulidade pressupõe
a incidência dos termos do artigo 6º, V, artigo 51, IV e § 1º do CDC,
sendo o contrato de adesão espécie de contrato reconhecida como regular
pelo próprio CDC em seu artigo 54.
V - Não se vislumbra a configuração de abuso pela cobrança de
tarifas previstas nos contratos celebrados na vigência da Resolução
CMN 2.303/1996. Na ocasião a orientação estatal era essencialmente não
intervencionista, facultando às instituições financeiras a cobrança pela
prestação de quaisquer tipos de serviços, com exceção daqueles que a
norma definia como básicos, desde que fossem efetivamente contratados e
prestados ao cliente, assim como respeitassem os procedimentos voltados a
assegurar a transparência da política de preços adotada pela instituição
(STJ, REsp 1255573/RS, artigo 543-C do CPC/73).
VI - A legislação sobre o anatocismo, ao mencionar "capitalização de
juros" ou "juros sobre juros", não se refere a conceitos da matemática
financeira, sendo de todo regular a utilização de taxa de juros efetiva com
capitalização mensal, derivada de taxa de juros nominal com capitalização
anual, ainda quando aquela seja ligeiramente superior a esta. Tampouco
se refere a juros compostos ou a sistemas de amortização que deles se
utilizem. Como conceito jurídico "capitalização de juros" pressupõe
o inadimplemento e um montante de juros devidos, vencidos e não pagos e
posteriormente incorporados ao capital para que incidam novos juros sobre
ele. Não há no ordenamento jurídico brasileiro proibição absoluta de
tal prática, sendo permitida mesmo pela Lei de Usura (artigo 4º do Decreto
22.626/33), com frequência anual, sendo este o critério de interpretação
da Súmula 121 do STF.
VII - Na esteira da Súmula 596 do STF, desde a MP 1.963-17/00, atual MP
2.170-36/01, admite-se como regra geral para o sistema financeiro nacional
a possibilidade de se pactuar capitalização de juros com periodicidade
inferior a um ano. Há na legislação especial que trata das Cédulas
de Crédito Bancário autorização expressa para se pactuar os termos da
capitalização, conforme exegese do artigo 28, § 1º, I da Lei 10.931/04
(REsp 973827/RS julgado pelo artigo 543-C do CPC).
VIII - Não se cogitando a configuração de sistemáticas amortizações
negativas decorrentes das cláusulas do contrato independentemente da
inadimplência do devedor, apenas com a verificação de ausência de
autorização legislativa especial e de previsão contratual, poderá ser
afastada a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos em prazo
inferior a um ano. Nesta hipótese, em se verificando o inadimplemento
de determinada prestação, os encargos moratórios previstos no contrato
incidirão somente sobre a parcela responsável por amortizar o capital,
enquanto que a contabilização dos juros remuneratórios não pagos deve
ser realizada em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção
monetária, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar
primeiramente a conta principal.
IX - Apelação parcialmente provida para assentar que a comissão de
permanência só pode incidir de maneira exclusiva.
Ementa
PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO EM EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE
CRÉDITO BANCÁRIO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. COMISSÃO DE
PERMANÊNCIA. CDC. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. ANATOCISMO. SISTEMAS DE
AMORTIZAÇÃO. TARIFAS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
I - Nas ações em que se pleiteia a revisão de cláusulas de contratos
de mútuo, em regra, incide o artigo 355, I, do novo CPC, (artigo 330,
I, do CPC/73), permitindo-se o julgamento antecipado da lide, porquanto
comumente as questões de mérito são unicamente de direito. Na hipótese
de a questão de mérito envolver análise de fatos, é do autor o ônus de
provar o fato constitutivo de seu direito, inteligência do artigo 373, I,
do novo CPC/15 (artigo 333, I, do CPC/73). Cabe ao juiz da causa avaliar
a pertinência do pedido de realização de perícia contábil, conforme
artigos 370 e 464 do novo CPC (artigos 130 e 420 do CPC/73), razão pela
qual o indeferimento de pedido para produção de prova pericial, por si
só, não representa cerceamento de defesa. Considerando as alegações da
embargante e a configuração do caso em tela, não se vislumbra o alegado
cerceamento de defesa.
II - O contrato de abertura de crédito não é título executivo mesmo quando
acompanhado de extrato de conta-corrente, documentos que permitiram apenas o
ajuizamento de ação monitória. Este tipo de contrato tampouco seria dotado
de liquidez, característica que, ademais, afastaria a autonomia da nota
promissória a ele vinculada (Súmula 233, Súmula 247 e Súmula 258 do STJ).
II - A regulamentação das Cédulas de Crédito Bancário estabeleceu
parâmetros opostos àqueles consagrados nas Súmulas 233, 247 e 258 do STJ. A
Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial se preencher
os requisitos definidos pela legislação (artigo 28, caput, § 2º, I e II,
artigo 29 da Lei 10.931/04). O artigo 28, § 3º da Lei 10.931/04 prevê que
o credor fica obrigado a pagar ao devedor o dobro do valor cobrado a maior
em execução de Cédula de Crédito Bancário promovida sem os requisitos
definidos pela legislação (REsp 1291575, STJ, julgado pelo rito do artigo
543-C do CPC). O teor do artigo 18 da LC nº 95/98 afasta qualquer defesa
que pretenda se basear em ofensa ao artigo 7º do mesmo diploma legal.
III - Uma vez pactuada, não constitui prática irregular a cobrança de
comissão de permanência quando configurado o inadimplemento contratual,
contanto que sua utilização não seja concomitante à incidência de
correção monetária, e de outros encargos moratórios e remuneratórios,
bem como de multa contratual. Mesmo ao se considerar a sua utilização
exclusiva, seu valor não pode ser superior ao montante correspondente à
somatória dos critérios que são afastados para a sua incidência. Por essas
mesmas razões, não é permitida a cumulação de cobrança de comissão
de permanência e taxa de rentabilidade (Súmula 30, Súmula 294, Súmula
296 e Súmula 472 do STJ).
IV - O Código de Defesa do Consumidor se aplica às instituições
financeiras (Súmula 297 do STJ), mas a aplicação da teoria da imprevisão
e do princípio rebus sic standibus para relativizar o pacta sunt servanda
requer a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que
sustentavam o contrato, justificando o pedido de revisão contratual. Mesmo
nos casos em que se verifica o prejuízo financeiro, a nulidade pressupõe
a incidência dos termos do artigo 6º, V, artigo 51, IV e § 1º do CDC,
sendo o contrato de adesão espécie de contrato reconhecida como regular
pelo próprio CDC em seu artigo 54.
V - Não se vislumbra a configuração de abuso pela cobrança de
tarifas previstas nos contratos celebrados na vigência da Resolução
CMN 2.303/1996. Na ocasião a orientação estatal era essencialmente não
intervencionista, facultando às instituições financeiras a cobrança pela
prestação de quaisquer tipos de serviços, com exceção daqueles que a
norma definia como básicos, desde que fossem efetivamente contratados e
prestados ao cliente, assim como respeitassem os procedimentos voltados a
assegurar a transparência da política de preços adotada pela instituição
(STJ, REsp 1255573/RS, artigo 543-C do CPC/73).
VI - A legislação sobre o anatocismo, ao mencionar "capitalização de
juros" ou "juros sobre juros", não se refere a conceitos da matemática
financeira, sendo de todo regular a utilização de taxa de juros efetiva com
capitalização mensal, derivada de taxa de juros nominal com capitalização
anual, ainda quando aquela seja ligeiramente superior a esta. Tampouco
se refere a juros compostos ou a sistemas de amortização que deles se
utilizem. Como conceito jurídico "capitalização de juros" pressupõe
o inadimplemento e um montante de juros devidos, vencidos e não pagos e
posteriormente incorporados ao capital para que incidam novos juros sobre
ele. Não há no ordenamento jurídico brasileiro proibição absoluta de
tal prática, sendo permitida mesmo pela Lei de Usura (artigo 4º do Decreto
22.626/33), com frequência anual, sendo este o critério de interpretação
da Súmula 121 do STF.
VII - Na esteira da Súmula 596 do STF, desde a MP 1.963-17/00, atual MP
2.170-36/01, admite-se como regra geral para o sistema financeiro nacional
a possibilidade de se pactuar capitalização de juros com periodicidade
inferior a um ano. Há na legislação especial que trata das Cédulas
de Crédito Bancário autorização expressa para se pactuar os termos da
capitalização, conforme exegese do artigo 28, § 1º, I da Lei 10.931/04
(REsp 973827/RS julgado pelo artigo 543-C do CPC).
VIII - Não se cogitando a configuração de sistemáticas amortizações
negativas decorrentes das cláusulas do contrato independentemente da
inadimplência do devedor, apenas com a verificação de ausência de
autorização legislativa especial e de previsão contratual, poderá ser
afastada a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos em prazo
inferior a um ano. Nesta hipótese, em se verificando o inadimplemento
de determinada prestação, os encargos moratórios previstos no contrato
incidirão somente sobre a parcela responsável por amortizar o capital,
enquanto que a contabilização dos juros remuneratórios não pagos deve
ser realizada em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção
monetária, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar
primeiramente a conta principal.
IX - Apelação parcialmente provida para assentar que a comissão de
permanência só pode incidir de maneira exclusiva.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar parcial provimento à apelação para assentar que a
comissão de permanência só pode incidir de maneira exclusiva, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
14/11/2017
Data da Publicação
:
04/12/2017
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2245374
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/12/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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