main-banner

Jurisprudência


TRF3 0013480-64.2016.4.03.0000 00134806420164030000

Ementa
ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIÇOS DE SAÚDE. RESPONSABILIDADE DOS ENTES PÚBLICOS. SERVIÇOS PRIVADOS EM CARÁTER COMPLEMENTAR. NECESSIDADE DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. RECURSO NÃO PROVIDO. - Com efeito, a Constituição de 1988 inseriu expressamente o direito à saúde no rol dos direitos fundamentais sociais (art. 6º), dispondo, ainda, que "é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação." (art. 196) - Assim, não resta a menor dúvida de que a prestação dos serviços de promoção do direito à saúde é responsabilidade do Estado, e deve ser compartilhada por todos os entes federativos, conforme estabelecido no artigo 23, inciso II, da Constituição Federal. Nessa esteira, cumpre observar que o constituinte de 1988 estabeleceu que o dever estatal com a saúde seria desincumbido através do Sistema Único de Saúde - SUS, nos termos do artigo 198. - O SUS, portanto, consiste numa política pública a ser implementada por todas as entidades federativas - União, Estados, Distrito Federal e Municípios - para o cumprimento do dever estatal de promoção do direito à saúde. Vale lembrar que o art. 24, XII, da Constituição, incluiu a saúde no rol das matérias sujeitas à competência legislativa concorrente, no âmbito da qual cabe à União Federal editar normas gerais, vinculantes aos demais entes federativos. No exercício dessa competência, a União Federal editou, em 1990, dois diplomas legais que formam a estrutura orgânico-normativa do Sistema Único de Saúde, que são a Lei nº 8.080/90 e a Lei nº 8.142/90. Assim, é a partir dessas leis que devem ser pesquisados os preceitos que regulam a atuação da iniciativa privada no âmbito do SUS. - É imperioso destacar também que o art. 7º da Lei Federal n. 8.080/90 impõe como diretriz: "II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema". - Nessa seara, o próprio texto constitucional é cristalino ao definir que o serviço público de saúde deve ser prestado diretamente pelo Poder Público. Não obstante esse fato, o artigo 199 da Constituição Federal trata da participação da iniciativa privada na área da saúde. Isto porque o constituinte reconheceu que as estruturas públicas poderiam ser insuficientes para acolher toda a demanda do SUS. Por essa razão, admitiu que o Poder Público pudesse COMPLEMENTAR o serviço público de saúde com serviços privados contratados ou conveniados. - Repise-se: a participação da iniciativa privada será em CARÁTER COMPLEMENTAR, pois a prestação do serviço público de saúde é responsabilidade direta do Estado. - Note-se, por oportuno, que o próprio legislador ordinário federal seguiu a risca esse mandamento constitucional, tendo prescrito no artigo 24 da Lei nº 8.080/90 o seguinte: "Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.Parágrafo único. A participação complementar dos serviços privados será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público." - Torna-se evidente, portanto, que o papel da iniciativa privada na prestação de serviços do SUS é acessório, coadjuvante. Conclui-se, assim, que toda e qualquer tentativa ou medida de investir a iniciativa privada no papel de protagonista ou gestora, no sistema único de saúde brasileiro, confronta com o texto constitucional e com a legislação ordinária. - No caso dos autos, restou demonstrado que o agravado é portador de coxartrose por osteonecrose da cabeça femoral esquerdo. Conforme relata a r. decisão agravada, ficou comprovada a necessidade de submissão do paciente a tratamento cirúrgico de artroplastia total de quadril esquerdo, em caráter emergencial, considerando que há a possibilidade de imobilidade em razão da dor e impotência funcional. - Demais disso, no parecer n° 0045/2016, emitido pelo Núcleo de Apoio Técnico (fls. 75/83), no item "XI - Conclusão favorável ou desfavorável ao pedido" (fl. 82), o corpo técnico do órgão apresenta parecer favorável à realização do procedimento cirúrgico na rede pública do município. - Os elementos trazidos à análise somente corroboram o acerto da r. decisão agravada, no sentido da imprescindibilidade da submissão do paciente ao procedimento cirúrgico. - Negar ao agravado o tratamento médico pretendido implica desrespeito às normas constitucionais, que garantem o direito à saúde e à vida. - Assim, exsurge inafastável a conclusão segundo a qual cabe ao Poder Público, obrigatoriamente, zelar pela saúde de todos, disponibilizando, àqueles que precisarem de prestações atinentes à saúde pública, os meios necessários à sua obtenção. - Sob a óptica de princípios constitucionais - da dignidade humana, do direito à saúde, da assistência social e da solidariedade - infere-se que a lesão grave e de difícil reparação se mostra, na verdade, na expectativa de vida do paciente, razão pela qual se impõe a realização de procedimento cirúrgico. - Não há, de forma alguma, desrespeito ao princípio da isonomia, pois, como já demonstrado, se o procedimento não for realizado em caráter emergencial, o paciente poderá sofrer com futuras complicações. - Deve ser mantida a decisão agravada no que tange à eventual multa aplicada caso não haja a realização do procedimento cirúrgico requerido pelo agravado. - Agravo de instrumento não provido.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 21/02/2018
Data da Publicação : 19/03/2018
Classe/Assunto : AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 585234
Órgão Julgador : QUARTA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/03/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão