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Jurisprudência


TRF3 0013531-12.2015.4.03.0000 00135311220154030000

Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. IMPETRAÇÃO POR LEILOEIRO DESIGNADO EM PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL. TERCEIRO ESTRANHO À LIDE. LEGITIMIDADE E ADEQUAÇÃO. DISCUSSÃO SOBRE O MÉRITO DO ATO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. DETERMINAÇÃO PARA DEVOLUÇÃO DE COMISSÃO DE LEILOEIRO. ANULAÇÃO DE ARREMATAÇÃO. QUESTÃO DE FUNDO OBJETO DE OUTRO FEITO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. CONLUIO ENTRE ARREMATANTE E EXECUTADA. NÃO COMPROVAÇÃO. DESCREDENCIAMENTO DA CENTRAL DE HASTAS PÚBLICAS UNIFICADAS. NÃO CARACTERIZAÇÃO. MERA COMUNICAÇÃO AO ÓRGÃO PARA A ADOÇÃO DAS MEDIDAS PERTINENTES. NOTÍCIA DOS FATOS AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. PERTINÊNCIA. BLOQUEIO DE BENS. BACENJUD. RENAJUD. VIABILIDADE. QUEBRA DE SIGILOS FISCAL E BANCÁRIO. INDISPONIBILIDADE DE BENS. POSSIBILIDADE, PONDERADAS AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. BEM DE FAMÍLIA. EXCLUSÃO DA ORDEM DE INDISPONIBILIDADE E BLOQUEIO. VEÍCULO DE PROPRIEDADE DA CÔNJUGE. ILEGITIMIDADE ATIVA. APLICAÇÃO DE MULTAS. ARTIGOS 461, § 4º, 600, INCISO III E 601 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/73. FINALIDADE COERCITIVA VOLTADA PARA O DEVEDOR RECALCITRANTE (PARTE NO PROCESSO JUDICIAL). AFASTAMENTO DAS SANÇÕES. 1. Admite-se o manejo do mandamus por terceiro prejudicado (que não ostenta legitimidade para recorrer no processo de origem) (STJ: RMS 30115/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 19/8/2010; REsp 2224/SC, Rel. Ministro Jose de Jesus Filho, Segunda Turma, DJ 8/2/1993, p. 1026; RMS 1114/SP, Rel. Ministro Athos Carneiro, Quarta Turma, DJ 4/11/1991, p. 15686; RMS 243/RJ, Rel. Ministro Gueiros Leite, Terceira Turma, DJ 9/10/1990, p. 10891) (TRF 3ª Região: MS 0012810-65.2012.4.03.0000 e MS 0035769-98.2010.4.03.0000). 2. O impetrante pretende a anulação das medidas que lhe foram aplicadas no processo de execução fiscal originária, em virtude do descumprimento da ordem judicial de restituição do valor percebido a título de comissão de leiloeiro oficial, tendo em conta a anulação da hasta pública e da arrematação em razão de preço vil (artigo 694, inciso V do Código de Processo Civil/73). 3. O mérito do ato judicial (anulação de arrematação e determinação para devolução da comissão de leiloeiro) é objeto de mandado de segurança anteriormente impetrado pelo ora postulante (feito nº 0007508-50.2015.403.0000), de modo que não pode ser rediscutido neste writ. 4. Cumpre apenas verificar a proporcionalidade e razoabilidade das demais medidas discutidas neste mandamus, desencadeadas pelo descumprimento de ordem judicial de devolução da comissão de leiloeiro. 5. Não prospera a alegação de ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa, visto que o impetrante, como auxiliar da Justiça, não detém legitimidade para recorrer ou postular nos autos da execução fiscal. Vale lembrar, inclusive, que este é o único fundamento a justificar sua legitimidade para impetração do presente mandamus (na condição de terceiro estranho àquela lide). Além disso, a ordem judicial de devolução da comissão visa restabelecer o equilíbrio entre as partes, com o ressarcimento a quem é de direito do valor dispendido com a arrematação anulada. Também não prospera a alegação de que o magistrado impetrado transformou o impetrante em parte no processo originário, instaurando contra ele verdadeira execução fiscal civil incidental sem a existência de título executivo e sem possibilidade do exercício do direito de defesa. O impetrante, atuando como auxiliar do Juízo, fica adstrito às determinações judiciais, não podendo discutir na ação originária a ordem. Eventuais direitos que porventura entenda violados devem ser reclamados em ação própria, e não de forma tumultuada nos autos da execução fiscal. Ademais, não se deve olvidar que o leiloeiro somente tem direito à comissão após o trânsito em julgado da decisão que a tenha arbitrado. 6. Quanto ao alegado reconhecimento da formação de grupo econômico por coordenação no âmbito da Justiça do Trabalho, em face de informações sobre o conluio entre arrematante e executada, também não prospera a argumentação do impetrante. Segundo informações prestadas pela autoridade coatora, a inclusão do arrematante no polo passivo das execuções trabalhistas, movidas contra o Guarani Futebol Clube, deu-se pela existência de parceria entre as partes e não pela repercussão da decisão que anulou a hasta pública e a arrematação. 7. Em relação ao alegado descredenciamento, verifica-se que o impetrante, na condição de leiloeiro, está vinculado à Central de Hastas Públicas Unificadas - CEHAS, de modo que cumpre ao Juízo, reputando inadequada a conduta do auxiliar da Justiça quando da atuação em processo sob sua competência - como se deu no caso concreto - dar ciência do ocorrido àquele órgão para a adoção das providências cabíveis. Nesse aspecto tal determinação judicial não implica necessariamente ordem de descredenciamento ou instauração de processo administrativo, mas tão somente a mera comunicação àquele órgão, a quem competirá, pelo juiz coordenador, adotar as medidas que entender cabíveis. 8. Justifica-se a notícia dos fatos ao Ministério Público Federal quando o Juízo entender configurado, em tese, o crime de desobediência (art. 330, CP). Como asseverou o Juízo impetrado, quando da ciência ao órgão ministerial o impetrante se recusava a devolver o valor da comissão. Além disso, compete ao Parquet Federal a análise da conduta do impetrante sob o enfoque criminal, não implicando a medida adotada pelo magistrado verdadeira e automática instauração de processo-crime. 9. No que diz com a ordem de bloqueio pelo sistema BACENJUD, o c. Superior Tribunal de Justiça, bem como esta e. Corte já sedimentaram o entendimento no sentido de que o bloqueio de ativos financeiros, quando deferido na vigência da Lei nº 11.382/2006, que deu nova redação ao artigo 655 do Código de Processo Civil/73 - como ocorreu no presente caso -, não constitui medida excepcional e prescinde do exaurimento de buscas de outros bens passíveis de constrição, visto que a legislação em comento equiparou os ativos financeiros ao dinheiro em espécie (STJ, REsp 1101288, Rel. Ministro Benedito Gonçalves; TRF 3ª Região, AI 2012.03.00.011043-7, Rel. Desembargador Federal Nery Júnior). 10. Ademais, no caso concreto mostrou-se necessário o rastreamento e o bloqueio de valores do impetrante, tanto no BACENJUD como no RENAJUD, de molde a possibilitar a garantia de cumprimento da ordem judicial, já que se verificou que o postulante evadira ativos financeiros para furtar-se à devolução da comissão de leiloeiro. 11. O direito aos sigilos bancário e fiscal insere-se no âmbito da proteção da intimidade e da vida privada, direitos fundamentais agasalhados pela Constituição Federal (artigo 5º, inciso X). Não obstante a reserva quanto à possibilidade indiscriminada de vulneração de tais direitos, o caso concreto reclama tal solução, haja vista interesse público evidenciado pela necessidade de se dar cumprimento à ordem judicial. 12. O decreto de quebra dos sigilos fiscal e bancário, assim como a ordem de indisponibilidade de bens e valores mostraram-se necessários à garantia do cumprimento da decisão judicial, notadamente considerado o vultoso montante recebido a título de comissão e a resistência do leiloeiro, ora impetrante, em cumprir espontaneamente a determinação judicial. 13. Com tais medidas judiciais foi possível apurar a existência de saldos em instituição financeira e bens em nome do impetrante e de sua dependente, ainda que insuficientes ao ressarcimento do valor total da comissão. Também permitiu verificar dois saques efetuados pelo impetrante, em dinheiro, logo após a expedição da carta precatória para intimação da devolução da comissão, configurando, em princípio, má-fé do auxiliar da Justiça em cumprir a determinação judicial. Demais disso, a medida excepcional de quebra de sigilo fiscal e bancário foi precedida de outras diligências destinadas à localização de bens e valores do impetrante. 14. Prospera a irresignação quanto à indisponibilidade do imóvel no qual reside a família do impetrante, haja vista que as medidas adotadas para evitar a frustração da ordem judicial não podem afrontar a dignidade humana (respeito ao direito de moradia), tampouco afetar sobremaneira outrem que não o auxiliar do Juízo renitente ao cumprimento do dever legal. Ademais, a proteção do bem de família encontra ainda guarida na Lei nº 8.009/1990. 15. Muito embora a ação mandamental, em regra, não seja via idônea à arguição de bem de família, deve ser aceita excepcionalmente na espécie em virtude da impossibilidade de discussão do tema no feito originário, uma vez que o impetrante e sua esposa não são partes na execução fiscal. 16. No que atina ao bloqueio do automóvel de propriedade da esposa, elencada como dependente perante o Fisco na declaração de imposto de renda, não há como se acolher o pleito do impetrante. Neste particular, o impetrante pretende, com o writ, tutelar, em nome próprio, direito alheio (o de sua esposa), o que é vedado pela legislação processual civil (art. 18 do CPC/2015). Doutrina. Precedentes. 17. No tocante à imposição de multa diária, prevista no artigo 461, § 4º do Código de Processo Civil/73, insta observar que tem por escopo forçar o cumprimento da obrigação na forma específica, com caráter inibitório. In casu, ainda que a multa diária tenha sido aplicada depois de advertido o impetrante pelo descumprimento da determinação do Juízo, visando preservar a autoridade do Poder Judiciário, não se pode perder de vista que ela carece, em princípio, de fundamento, pois a disposição na qual o Juízo se fundamentou tem campo de aplicação específica na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer a ser prestada por quem é réu (parte) em demanda judicial. A peculiar finalidade coercitiva da multa prevista no artigo 461, § 4º, CPC/73 é voltada para o devedor recalcitrante (parte no processo) que se nega a cumprir uma sentença de procedência ou decisão judicial concessiva de tutela antecipada, hipótese totalmente contrária à situação versada na espécie. 18. Mesmo raciocínio é válido em relação à multa de 10% sobre o valor da comissão, cuja imposição foi motivada pela constatação de que, além de não cumprir a ordem judicial, o impetrante, após tomar ciência da anulação da arrematação pela imprensa nacional, promoveu saques em dinheiro. Muito embora tal postura se apresente, em princípio, como atentatória à dignidade da justiça (art. 600, III, CPC/73), incabível a multa com base no artigo 601 do mesmo estatuto, eis que própria do processo executivo e aplicável a quem é parte na demanda. 19. Segurança parcialmente concedida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conceder, em parte, a segurança nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 04/10/2018
Data da Publicação : 24/10/2018
Classe/Assunto : MS - MANDADO DE SEGURANÇA - 357242
Órgão Julgador : PRIMEIRA SEÇÃO
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-694 INC-5 ART-655 ART-461 PAR-4 ART-600 INC-3 ART-601 ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-330 LEG-FED LEI-11382 ANO-2006 ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-10 LEG-FED LEI-8009 ANO-1990 ***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-18 PROC:AI 2012.03.00.011043-7/SP ÓRGÃO:TERCEIRA TURMA JUIZ:DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR AUD:06/09/2012 DATA:14/09/2012 PG:
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/10/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO: