TRF3 0013531-12.2015.4.03.0000 00135311220154030000
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. IMPETRAÇÃO POR
LEILOEIRO DESIGNADO EM PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL. TERCEIRO ESTRANHO
À LIDE. LEGITIMIDADE E ADEQUAÇÃO. DISCUSSÃO SOBRE O MÉRITO DO ATO
JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. DETERMINAÇÃO PARA DEVOLUÇÃO DE COMISSÃO
DE LEILOEIRO. ANULAÇÃO DE ARREMATAÇÃO. QUESTÃO DE FUNDO OBJETO
DE OUTRO FEITO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA
DEFESA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. CONLUIO ENTRE ARREMATANTE E EXECUTADA. NÃO
COMPROVAÇÃO. DESCREDENCIAMENTO DA CENTRAL DE HASTAS PÚBLICAS
UNIFICADAS. NÃO CARACTERIZAÇÃO. MERA COMUNICAÇÃO AO ÓRGÃO PARA A
ADOÇÃO DAS MEDIDAS PERTINENTES. NOTÍCIA DOS FATOS AO MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL. PERTINÊNCIA. BLOQUEIO DE BENS. BACENJUD. RENAJUD. VIABILIDADE. QUEBRA
DE SIGILOS FISCAL E BANCÁRIO. INDISPONIBILIDADE DE BENS. POSSIBILIDADE,
PONDERADAS AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. BEM DE FAMÍLIA. EXCLUSÃO
DA ORDEM DE INDISPONIBILIDADE E BLOQUEIO. VEÍCULO DE PROPRIEDADE DA
CÔNJUGE. ILEGITIMIDADE ATIVA. APLICAÇÃO DE MULTAS. ARTIGOS 461, § 4º,
600, INCISO III E 601 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/73. FINALIDADE COERCITIVA
VOLTADA PARA O DEVEDOR RECALCITRANTE (PARTE NO PROCESSO JUDICIAL). AFASTAMENTO
DAS SANÇÕES.
1. Admite-se o manejo do mandamus por terceiro prejudicado (que não ostenta
legitimidade para recorrer no processo de origem) (STJ: RMS 30115/SP,
Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 19/8/2010; REsp 2224/SC,
Rel. Ministro Jose de Jesus Filho, Segunda Turma, DJ 8/2/1993, p. 1026;
RMS 1114/SP, Rel. Ministro Athos Carneiro, Quarta Turma, DJ 4/11/1991,
p. 15686; RMS 243/RJ, Rel. Ministro Gueiros Leite, Terceira Turma, DJ
9/10/1990, p. 10891) (TRF 3ª Região: MS 0012810-65.2012.4.03.0000 e MS
0035769-98.2010.4.03.0000).
2. O impetrante pretende a anulação das medidas que lhe foram aplicadas no
processo de execução fiscal originária, em virtude do descumprimento da
ordem judicial de restituição do valor percebido a título de comissão
de leiloeiro oficial, tendo em conta a anulação da hasta pública e da
arrematação em razão de preço vil (artigo 694, inciso V do Código de
Processo Civil/73).
3. O mérito do ato judicial (anulação de arrematação e determinação
para devolução da comissão de leiloeiro) é objeto de mandado de
segurança anteriormente impetrado pelo ora postulante (feito nº
0007508-50.2015.403.0000), de modo que não pode ser rediscutido neste writ.
4. Cumpre apenas verificar a proporcionalidade e razoabilidade das demais
medidas discutidas neste mandamus, desencadeadas pelo descumprimento de
ordem judicial de devolução da comissão de leiloeiro.
5. Não prospera a alegação de ofensa aos princípios do contraditório
e da ampla defesa, visto que o impetrante, como auxiliar da Justiça,
não detém legitimidade para recorrer ou postular nos autos da execução
fiscal. Vale lembrar, inclusive, que este é o único fundamento a justificar
sua legitimidade para impetração do presente mandamus (na condição
de terceiro estranho àquela lide). Além disso, a ordem judicial de
devolução da comissão visa restabelecer o equilíbrio entre as partes, com
o ressarcimento a quem é de direito do valor dispendido com a arrematação
anulada. Também não prospera a alegação de que o magistrado impetrado
transformou o impetrante em parte no processo originário, instaurando contra
ele verdadeira execução fiscal civil incidental sem a existência de título
executivo e sem possibilidade do exercício do direito de defesa. O impetrante,
atuando como auxiliar do Juízo, fica adstrito às determinações judiciais,
não podendo discutir na ação originária a ordem. Eventuais direitos
que porventura entenda violados devem ser reclamados em ação própria,
e não de forma tumultuada nos autos da execução fiscal. Ademais, não
se deve olvidar que o leiloeiro somente tem direito à comissão após o
trânsito em julgado da decisão que a tenha arbitrado.
6. Quanto ao alegado reconhecimento da formação de grupo econômico por
coordenação no âmbito da Justiça do Trabalho, em face de informações
sobre o conluio entre arrematante e executada, também não prospera
a argumentação do impetrante. Segundo informações prestadas pela
autoridade coatora, a inclusão do arrematante no polo passivo das execuções
trabalhistas, movidas contra o Guarani Futebol Clube, deu-se pela existência
de parceria entre as partes e não pela repercussão da decisão que anulou
a hasta pública e a arrematação.
7. Em relação ao alegado descredenciamento, verifica-se que o impetrante,
na condição de leiloeiro, está vinculado à Central de Hastas Públicas
Unificadas - CEHAS, de modo que cumpre ao Juízo, reputando inadequada a
conduta do auxiliar da Justiça quando da atuação em processo sob sua
competência - como se deu no caso concreto - dar ciência do ocorrido
àquele órgão para a adoção das providências cabíveis. Nesse
aspecto tal determinação judicial não implica necessariamente ordem de
descredenciamento ou instauração de processo administrativo, mas tão
somente a mera comunicação àquele órgão, a quem competirá, pelo juiz
coordenador, adotar as medidas que entender cabíveis.
8. Justifica-se a notícia dos fatos ao Ministério Público Federal quando o
Juízo entender configurado, em tese, o crime de desobediência (art. 330,
CP). Como asseverou o Juízo impetrado, quando da ciência ao órgão
ministerial o impetrante se recusava a devolver o valor da comissão. Além
disso, compete ao Parquet Federal a análise da conduta do impetrante sob o
enfoque criminal, não implicando a medida adotada pelo magistrado verdadeira
e automática instauração de processo-crime.
9. No que diz com a ordem de bloqueio pelo sistema BACENJUD, o c. Superior
Tribunal de Justiça, bem como esta e. Corte já sedimentaram o entendimento
no sentido de que o bloqueio de ativos financeiros, quando deferido
na vigência da Lei nº 11.382/2006, que deu nova redação ao artigo
655 do Código de Processo Civil/73 - como ocorreu no presente caso -,
não constitui medida excepcional e prescinde do exaurimento de buscas de
outros bens passíveis de constrição, visto que a legislação em comento
equiparou os ativos financeiros ao dinheiro em espécie (STJ, REsp 1101288,
Rel. Ministro Benedito Gonçalves; TRF 3ª Região, AI 2012.03.00.011043-7,
Rel. Desembargador Federal Nery Júnior).
10. Ademais, no caso concreto mostrou-se necessário o rastreamento e o
bloqueio de valores do impetrante, tanto no BACENJUD como no RENAJUD, de
molde a possibilitar a garantia de cumprimento da ordem judicial, já que
se verificou que o postulante evadira ativos financeiros para furtar-se à
devolução da comissão de leiloeiro.
11. O direito aos sigilos bancário e fiscal insere-se no âmbito da proteção
da intimidade e da vida privada, direitos fundamentais agasalhados pela
Constituição Federal (artigo 5º, inciso X). Não obstante a reserva quanto
à possibilidade indiscriminada de vulneração de tais direitos, o caso
concreto reclama tal solução, haja vista interesse público evidenciado
pela necessidade de se dar cumprimento à ordem judicial.
12. O decreto de quebra dos sigilos fiscal e bancário, assim como a ordem de
indisponibilidade de bens e valores mostraram-se necessários à garantia do
cumprimento da decisão judicial, notadamente considerado o vultoso montante
recebido a título de comissão e a resistência do leiloeiro, ora impetrante,
em cumprir espontaneamente a determinação judicial.
13. Com tais medidas judiciais foi possível apurar a existência de saldos
em instituição financeira e bens em nome do impetrante e de sua dependente,
ainda que insuficientes ao ressarcimento do valor total da comissão. Também
permitiu verificar dois saques efetuados pelo impetrante, em dinheiro, logo
após a expedição da carta precatória para intimação da devolução da
comissão, configurando, em princípio, má-fé do auxiliar da Justiça em
cumprir a determinação judicial. Demais disso, a medida excepcional de
quebra de sigilo fiscal e bancário foi precedida de outras diligências
destinadas à localização de bens e valores do impetrante.
14. Prospera a irresignação quanto à indisponibilidade do imóvel no qual
reside a família do impetrante, haja vista que as medidas adotadas para
evitar a frustração da ordem judicial não podem afrontar a dignidade humana
(respeito ao direito de moradia), tampouco afetar sobremaneira outrem que
não o auxiliar do Juízo renitente ao cumprimento do dever legal. Ademais,
a proteção do bem de família encontra ainda guarida na Lei nº 8.009/1990.
15. Muito embora a ação mandamental, em regra, não seja via idônea à
arguição de bem de família, deve ser aceita excepcionalmente na espécie
em virtude da impossibilidade de discussão do tema no feito originário,
uma vez que o impetrante e sua esposa não são partes na execução fiscal.
16. No que atina ao bloqueio do automóvel de propriedade da esposa, elencada
como dependente perante o Fisco na declaração de imposto de renda, não
há como se acolher o pleito do impetrante. Neste particular, o impetrante
pretende, com o writ, tutelar, em nome próprio, direito alheio (o de sua
esposa), o que é vedado pela legislação processual civil (art. 18 do
CPC/2015). Doutrina. Precedentes.
17. No tocante à imposição de multa diária, prevista no artigo 461,
§ 4º do Código de Processo Civil/73, insta observar que tem por escopo
forçar o cumprimento da obrigação na forma específica, com caráter
inibitório. In casu, ainda que a multa diária tenha sido aplicada depois
de advertido o impetrante pelo descumprimento da determinação do Juízo,
visando preservar a autoridade do Poder Judiciário, não se pode perder de
vista que ela carece, em princípio, de fundamento, pois a disposição na
qual o Juízo se fundamentou tem campo de aplicação específica na ação
que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer a ser
prestada por quem é réu (parte) em demanda judicial. A peculiar finalidade
coercitiva da multa prevista no artigo 461, § 4º, CPC/73 é voltada para o
devedor recalcitrante (parte no processo) que se nega a cumprir uma sentença
de procedência ou decisão judicial concessiva de tutela antecipada,
hipótese totalmente contrária à situação versada na espécie.
18. Mesmo raciocínio é válido em relação à multa de 10% sobre o valor
da comissão, cuja imposição foi motivada pela constatação de que,
além de não cumprir a ordem judicial, o impetrante, após tomar ciência
da anulação da arrematação pela imprensa nacional, promoveu saques
em dinheiro. Muito embora tal postura se apresente, em princípio, como
atentatória à dignidade da justiça (art. 600, III, CPC/73), incabível a
multa com base no artigo 601 do mesmo estatuto, eis que própria do processo
executivo e aplicável a quem é parte na demanda.
19. Segurança parcialmente concedida.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. IMPETRAÇÃO POR
LEILOEIRO DESIGNADO EM PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL. TERCEIRO ESTRANHO
À LIDE. LEGITIMIDADE E ADEQUAÇÃO. DISCUSSÃO SOBRE O MÉRITO DO ATO
JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. DETERMINAÇÃO PARA DEVOLUÇÃO DE COMISSÃO
DE LEILOEIRO. ANULAÇÃO DE ARREMATAÇÃO. QUESTÃO DE FUNDO OBJETO
DE OUTRO FEITO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA
DEFESA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. CONLUIO ENTRE ARREMATANTE E EXECUTADA. NÃO
COMPROVAÇÃO. DESCREDENCIAMENTO DA CENTRAL DE HASTAS PÚBLICAS
UNIFICADAS. NÃO CARACTERIZAÇÃO. MERA COMUNICAÇÃO AO ÓRGÃO PARA A
ADOÇÃO DAS MEDIDAS PERTINENTES. NOTÍCIA DOS FATOS AO MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL. PERTINÊNCIA. BLOQUEIO DE BENS. BACENJUD. RENAJUD. VIABILIDADE. QUEBRA
DE SIGILOS FISCAL E BANCÁRIO. INDISPONIBILIDADE DE BENS. POSSIBILIDADE,
PONDERADAS AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. BEM DE FAMÍLIA. EXCLUSÃO
DA ORDEM DE INDISPONIBILIDADE E BLOQUEIO. VEÍCULO DE PROPRIEDADE DA
CÔNJUGE. ILEGITIMIDADE ATIVA. APLICAÇÃO DE MULTAS. ARTIGOS 461, § 4º,
600, INCISO III E 601 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/73. FINALIDADE COERCITIVA
VOLTADA PARA O DEVEDOR RECALCITRANTE (PARTE NO PROCESSO JUDICIAL). AFASTAMENTO
DAS SANÇÕES.
1. Admite-se o manejo do mandamus por terceiro prejudicado (que não ostenta
legitimidade para recorrer no processo de origem) (STJ: RMS 30115/SP,
Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 19/8/2010; REsp 2224/SC,
Rel. Ministro Jose de Jesus Filho, Segunda Turma, DJ 8/2/1993, p. 1026;
RMS 1114/SP, Rel. Ministro Athos Carneiro, Quarta Turma, DJ 4/11/1991,
p. 15686; RMS 243/RJ, Rel. Ministro Gueiros Leite, Terceira Turma, DJ
9/10/1990, p. 10891) (TRF 3ª Região: MS 0012810-65.2012.4.03.0000 e MS
0035769-98.2010.4.03.0000).
2. O impetrante pretende a anulação das medidas que lhe foram aplicadas no
processo de execução fiscal originária, em virtude do descumprimento da
ordem judicial de restituição do valor percebido a título de comissão
de leiloeiro oficial, tendo em conta a anulação da hasta pública e da
arrematação em razão de preço vil (artigo 694, inciso V do Código de
Processo Civil/73).
3. O mérito do ato judicial (anulação de arrematação e determinação
para devolução da comissão de leiloeiro) é objeto de mandado de
segurança anteriormente impetrado pelo ora postulante (feito nº
0007508-50.2015.403.0000), de modo que não pode ser rediscutido neste writ.
4. Cumpre apenas verificar a proporcionalidade e razoabilidade das demais
medidas discutidas neste mandamus, desencadeadas pelo descumprimento de
ordem judicial de devolução da comissão de leiloeiro.
5. Não prospera a alegação de ofensa aos princípios do contraditório
e da ampla defesa, visto que o impetrante, como auxiliar da Justiça,
não detém legitimidade para recorrer ou postular nos autos da execução
fiscal. Vale lembrar, inclusive, que este é o único fundamento a justificar
sua legitimidade para impetração do presente mandamus (na condição
de terceiro estranho àquela lide). Além disso, a ordem judicial de
devolução da comissão visa restabelecer o equilíbrio entre as partes, com
o ressarcimento a quem é de direito do valor dispendido com a arrematação
anulada. Também não prospera a alegação de que o magistrado impetrado
transformou o impetrante em parte no processo originário, instaurando contra
ele verdadeira execução fiscal civil incidental sem a existência de título
executivo e sem possibilidade do exercício do direito de defesa. O impetrante,
atuando como auxiliar do Juízo, fica adstrito às determinações judiciais,
não podendo discutir na ação originária a ordem. Eventuais direitos
que porventura entenda violados devem ser reclamados em ação própria,
e não de forma tumultuada nos autos da execução fiscal. Ademais, não
se deve olvidar que o leiloeiro somente tem direito à comissão após o
trânsito em julgado da decisão que a tenha arbitrado.
6. Quanto ao alegado reconhecimento da formação de grupo econômico por
coordenação no âmbito da Justiça do Trabalho, em face de informações
sobre o conluio entre arrematante e executada, também não prospera
a argumentação do impetrante. Segundo informações prestadas pela
autoridade coatora, a inclusão do arrematante no polo passivo das execuções
trabalhistas, movidas contra o Guarani Futebol Clube, deu-se pela existência
de parceria entre as partes e não pela repercussão da decisão que anulou
a hasta pública e a arrematação.
7. Em relação ao alegado descredenciamento, verifica-se que o impetrante,
na condição de leiloeiro, está vinculado à Central de Hastas Públicas
Unificadas - CEHAS, de modo que cumpre ao Juízo, reputando inadequada a
conduta do auxiliar da Justiça quando da atuação em processo sob sua
competência - como se deu no caso concreto - dar ciência do ocorrido
àquele órgão para a adoção das providências cabíveis. Nesse
aspecto tal determinação judicial não implica necessariamente ordem de
descredenciamento ou instauração de processo administrativo, mas tão
somente a mera comunicação àquele órgão, a quem competirá, pelo juiz
coordenador, adotar as medidas que entender cabíveis.
8. Justifica-se a notícia dos fatos ao Ministério Público Federal quando o
Juízo entender configurado, em tese, o crime de desobediência (art. 330,
CP). Como asseverou o Juízo impetrado, quando da ciência ao órgão
ministerial o impetrante se recusava a devolver o valor da comissão. Além
disso, compete ao Parquet Federal a análise da conduta do impetrante sob o
enfoque criminal, não implicando a medida adotada pelo magistrado verdadeira
e automática instauração de processo-crime.
9. No que diz com a ordem de bloqueio pelo sistema BACENJUD, o c. Superior
Tribunal de Justiça, bem como esta e. Corte já sedimentaram o entendimento
no sentido de que o bloqueio de ativos financeiros, quando deferido
na vigência da Lei nº 11.382/2006, que deu nova redação ao artigo
655 do Código de Processo Civil/73 - como ocorreu no presente caso -,
não constitui medida excepcional e prescinde do exaurimento de buscas de
outros bens passíveis de constrição, visto que a legislação em comento
equiparou os ativos financeiros ao dinheiro em espécie (STJ, REsp 1101288,
Rel. Ministro Benedito Gonçalves; TRF 3ª Região, AI 2012.03.00.011043-7,
Rel. Desembargador Federal Nery Júnior).
10. Ademais, no caso concreto mostrou-se necessário o rastreamento e o
bloqueio de valores do impetrante, tanto no BACENJUD como no RENAJUD, de
molde a possibilitar a garantia de cumprimento da ordem judicial, já que
se verificou que o postulante evadira ativos financeiros para furtar-se à
devolução da comissão de leiloeiro.
11. O direito aos sigilos bancário e fiscal insere-se no âmbito da proteção
da intimidade e da vida privada, direitos fundamentais agasalhados pela
Constituição Federal (artigo 5º, inciso X). Não obstante a reserva quanto
à possibilidade indiscriminada de vulneração de tais direitos, o caso
concreto reclama tal solução, haja vista interesse público evidenciado
pela necessidade de se dar cumprimento à ordem judicial.
12. O decreto de quebra dos sigilos fiscal e bancário, assim como a ordem de
indisponibilidade de bens e valores mostraram-se necessários à garantia do
cumprimento da decisão judicial, notadamente considerado o vultoso montante
recebido a título de comissão e a resistência do leiloeiro, ora impetrante,
em cumprir espontaneamente a determinação judicial.
13. Com tais medidas judiciais foi possível apurar a existência de saldos
em instituição financeira e bens em nome do impetrante e de sua dependente,
ainda que insuficientes ao ressarcimento do valor total da comissão. Também
permitiu verificar dois saques efetuados pelo impetrante, em dinheiro, logo
após a expedição da carta precatória para intimação da devolução da
comissão, configurando, em princípio, má-fé do auxiliar da Justiça em
cumprir a determinação judicial. Demais disso, a medida excepcional de
quebra de sigilo fiscal e bancário foi precedida de outras diligências
destinadas à localização de bens e valores do impetrante.
14. Prospera a irresignação quanto à indisponibilidade do imóvel no qual
reside a família do impetrante, haja vista que as medidas adotadas para
evitar a frustração da ordem judicial não podem afrontar a dignidade humana
(respeito ao direito de moradia), tampouco afetar sobremaneira outrem que
não o auxiliar do Juízo renitente ao cumprimento do dever legal. Ademais,
a proteção do bem de família encontra ainda guarida na Lei nº 8.009/1990.
15. Muito embora a ação mandamental, em regra, não seja via idônea à
arguição de bem de família, deve ser aceita excepcionalmente na espécie
em virtude da impossibilidade de discussão do tema no feito originário,
uma vez que o impetrante e sua esposa não são partes na execução fiscal.
16. No que atina ao bloqueio do automóvel de propriedade da esposa, elencada
como dependente perante o Fisco na declaração de imposto de renda, não
há como se acolher o pleito do impetrante. Neste particular, o impetrante
pretende, com o writ, tutelar, em nome próprio, direito alheio (o de sua
esposa), o que é vedado pela legislação processual civil (art. 18 do
CPC/2015). Doutrina. Precedentes.
17. No tocante à imposição de multa diária, prevista no artigo 461,
§ 4º do Código de Processo Civil/73, insta observar que tem por escopo
forçar o cumprimento da obrigação na forma específica, com caráter
inibitório. In casu, ainda que a multa diária tenha sido aplicada depois
de advertido o impetrante pelo descumprimento da determinação do Juízo,
visando preservar a autoridade do Poder Judiciário, não se pode perder de
vista que ela carece, em princípio, de fundamento, pois a disposição na
qual o Juízo se fundamentou tem campo de aplicação específica na ação
que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer a ser
prestada por quem é réu (parte) em demanda judicial. A peculiar finalidade
coercitiva da multa prevista no artigo 461, § 4º, CPC/73 é voltada para o
devedor recalcitrante (parte no processo) que se nega a cumprir uma sentença
de procedência ou decisão judicial concessiva de tutela antecipada,
hipótese totalmente contrária à situação versada na espécie.
18. Mesmo raciocínio é válido em relação à multa de 10% sobre o valor
da comissão, cuja imposição foi motivada pela constatação de que,
além de não cumprir a ordem judicial, o impetrante, após tomar ciência
da anulação da arrematação pela imprensa nacional, promoveu saques
em dinheiro. Muito embora tal postura se apresente, em princípio, como
atentatória à dignidade da justiça (art. 600, III, CPC/73), incabível a
multa com base no artigo 601 do mesmo estatuto, eis que própria do processo
executivo e aplicável a quem é parte na demanda.
19. Segurança parcialmente concedida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, conceder, em parte, a segurança nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
04/10/2018
Data da Publicação
:
24/10/2018
Classe/Assunto
:
MS - MANDADO DE SEGURANÇA - 357242
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA SEÇÃO
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-694 INC-5 ART-655 ART-461 PAR-4 ART-600
INC-3 ART-601
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-330
LEG-FED LEI-11382 ANO-2006
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-10
LEG-FED LEI-8009 ANO-1990
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-18
PROC:AI 2012.03.00.011043-7/SP ÓRGÃO:TERCEIRA TURMA
JUIZ:DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR
AUD:06/09/2012
DATA:14/09/2012 PG:
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/10/2018
..FONTE_REPUBLICACAO: