TRF3 0013767-65.2013.4.03.6100 00137676520134036100
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE
DEFESA. INEXISTÊNCIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ART. 37, § 6º,
DA CONSTITUIÇÃO. PERSEGUIÇÃO NA ÉPOCA DA DITADURA MILITAR. CABIMENTO.
1. Afastada a alegação de cerceamento de defesa, uma vez que, instadas as
partes a especificarem as provas que desejavam produzir, informou a autora
inexistência de óbice ao julgamento antecipado da lide. Portanto, não houve
manifestação de interesse em produção probatória no momento oportuno,
de modo que, neste sentido, ocorreu a preclusão do direito da autora.
2. O recebimento de indenização com amparo nos dizeres da Lei Federal n.º
10.559/02 não afasta o pleito de danos morais, haja vista que o referido
diploma normativo (Lei n.º 10.559/02) diz respeito à reparação dos
prejuízos materiais, sem esquecer que o art. 16 da legislação em comento
não exclui a possibilidade de conquista de direitos previstos em outras
normas legais ou na Carta Política. Destarte, tratando-se de indenizações
alicerçadas em fundamentos jurídicos distintos, nada obsta a percepção
simultânea.
3. A Constituição adotou, em seu art. 37, § 6º, a Teoria da
Responsabilidade Civil Objetiva da Administração Pública, na modalidade do
risco administrativo, de sorte que não há necessidade de comprovação do
dolo ou culpa dos agentes públicos para fins de obtenção da reparação
do dano sofrido, impondo-se apenas a demonstração do dano e do nexo de
causalidade.
4. Com relação ao nexo causal, os documentos apresentados nos autos
comprovam que a demandante foi perseguida durante o regime da ditadura militar,
conforme revela publicação em jornal de circulação a respeito da suspensão
e expulsão da autora da Universidade de Brasília, decorrendo a expulsão
da participação da demandante em reuniões do movimento estudantil, com
publicações de artigos em jornal acadêmico, consideradas subversivas pelo
regime militar.
5. A propósito, o ato da reitoria nº 401/76 dispõe claramente sobre a
primeira suspensão aplicada, considerando que os estudantes orientaram,
coordenaram e participaram ativamente da "assembleia" realizada na manhã
do dia 21/05/1976, no Anfiteatro 09 do Instituto Central de Ciências: de
reuniões não autorizadas, realizadas no dia 23; e na colocação de faixas
e cartazes não permitidos, com vistas à mobilização de estudantes para
a eleição do DU.
6. Após a imposição de nova suspensão, a autora foi informada de que
lhe foi aplicada a pena de exclusão, consolidando-se a sua reintegração
somente em 12/11/1985.
7. Com amparo nos dizeres da Lei nº 10.559/02, ocorreu o pagamento de 300
(trezentos) salários mínimos, não havendo controvérsia, pois, acerca dos
atos de perseguição sofridos pela demandante durante o regime de exceção,
derivando do contexto narrado a responsabilidade da ré, outrora reconhecida,
inclusive, com amparo na dicção da Lei nº 10.559/02.
8. Os prejuízos extrapatrimoniais estão estreitamente relacionados aos
denominados direitos de personalidade, tais como a identidade, a liberdade,
a reputação, a imagem, a honra, dentre outros, depreendendo-se que o objeto
do direito de personalidade diz respeito à natureza humana, à humanidade. Os
direitos de personalidade representam desdobramentos da cláusula geral
de tutela da pessoa humana estampada no art. 1º, III, da Constituição:
dignidade da pessoa humana.
9. No caso vertente, é inegável que a perseguição política sofrida
durante o regime de exceção, que perdurou por considerável lapso
temporal, implica lesões à personalidade da autora, gerando-lhe dor
e angústia. Valores caros a quaisquer cidadãos, tais como a liberdade
(não apenas de locomoção, como também de manifestação de pensamento),
a honra e a integridade físico-psíquica foram violados, gerando o direito
à indenização pleiteada, sendo de rigor, portanto, a condenação da
União à reparação dos prejuízos extrapatrimoniais.
10. No que tange ao montante da indenização, observe-se que as
lesões a direitos de personalidade não apresentam natureza econômica,
mostrando-se inviável a avaliação pecuniária precisa de sua extensão e,
consequentemente, qualquer tentativa de tarifação, ou seja, na apuração do
quantum devido, deve o julgador contemplar a reparação do dano sofrido de
forma razoável e proporcional, punindo o infrator e evitando o enriquecimento
ilícito do ofendido, analisando-se os seguintes aspectos: a) condição
social do ofensor; b) viabilidade econômica; c) grau de culpa; d) gravidade
do dano; e) reincidência.
11. Considerando o sofrimento experimentado pela autora, com a expulsão
da Universidade, o tempo decorrido e as implicações naturais decorrentes
do processo de expulsão, mostra-se adequado o pagamento de indenização
no montante de R$ 20.000,00, corrigido monetariamente, a partir da
data do arbitramento (Súmula nº 362 do C. STJ), com a incidência
de juros moratórios desde o evento danoso (Súmula nº 54 do C. STJ),
utilizando-se os índices previstos na Resolução nº 267/2013 do CJF,
excluídos os índices da poupança, tendo em vista que o C. STF entendeu
pela inconstitucionalidade do art. 5º da Lei nº 11.960/2009, adotando o
posicionamento de que a eleição legal do índice da caderneta de poupança
para fins de atualização monetária e juros de mora ofende o direito de
propriedade.
12. Invertido os ônus sucumbências, para condenar à União ao pagamento
de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da indenização.
13. Apelação provida.
Ementa
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE
DEFESA. INEXISTÊNCIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ART. 37, § 6º,
DA CONSTITUIÇÃO. PERSEGUIÇÃO NA ÉPOCA DA DITADURA MILITAR. CABIMENTO.
1. Afastada a alegação de cerceamento de defesa, uma vez que, instadas as
partes a especificarem as provas que desejavam produzir, informou a autora
inexistência de óbice ao julgamento antecipado da lide. Portanto, não houve
manifestação de interesse em produção probatória no momento oportuno,
de modo que, neste sentido, ocorreu a preclusão do direito da autora.
2. O recebimento de indenização com amparo nos dizeres da Lei Federal n.º
10.559/02 não afasta o pleito de danos morais, haja vista que o referido
diploma normativo (Lei n.º 10.559/02) diz respeito à reparação dos
prejuízos materiais, sem esquecer que o art. 16 da legislação em comento
não exclui a possibilidade de conquista de direitos previstos em outras
normas legais ou na Carta Política. Destarte, tratando-se de indenizações
alicerçadas em fundamentos jurídicos distintos, nada obsta a percepção
simultânea.
3. A Constituição adotou, em seu art. 37, § 6º, a Teoria da
Responsabilidade Civil Objetiva da Administração Pública, na modalidade do
risco administrativo, de sorte que não há necessidade de comprovação do
dolo ou culpa dos agentes públicos para fins de obtenção da reparação
do dano sofrido, impondo-se apenas a demonstração do dano e do nexo de
causalidade.
4. Com relação ao nexo causal, os documentos apresentados nos autos
comprovam que a demandante foi perseguida durante o regime da ditadura militar,
conforme revela publicação em jornal de circulação a respeito da suspensão
e expulsão da autora da Universidade de Brasília, decorrendo a expulsão
da participação da demandante em reuniões do movimento estudantil, com
publicações de artigos em jornal acadêmico, consideradas subversivas pelo
regime militar.
5. A propósito, o ato da reitoria nº 401/76 dispõe claramente sobre a
primeira suspensão aplicada, considerando que os estudantes orientaram,
coordenaram e participaram ativamente da "assembleia" realizada na manhã
do dia 21/05/1976, no Anfiteatro 09 do Instituto Central de Ciências: de
reuniões não autorizadas, realizadas no dia 23; e na colocação de faixas
e cartazes não permitidos, com vistas à mobilização de estudantes para
a eleição do DU.
6. Após a imposição de nova suspensão, a autora foi informada de que
lhe foi aplicada a pena de exclusão, consolidando-se a sua reintegração
somente em 12/11/1985.
7. Com amparo nos dizeres da Lei nº 10.559/02, ocorreu o pagamento de 300
(trezentos) salários mínimos, não havendo controvérsia, pois, acerca dos
atos de perseguição sofridos pela demandante durante o regime de exceção,
derivando do contexto narrado a responsabilidade da ré, outrora reconhecida,
inclusive, com amparo na dicção da Lei nº 10.559/02.
8. Os prejuízos extrapatrimoniais estão estreitamente relacionados aos
denominados direitos de personalidade, tais como a identidade, a liberdade,
a reputação, a imagem, a honra, dentre outros, depreendendo-se que o objeto
do direito de personalidade diz respeito à natureza humana, à humanidade. Os
direitos de personalidade representam desdobramentos da cláusula geral
de tutela da pessoa humana estampada no art. 1º, III, da Constituição:
dignidade da pessoa humana.
9. No caso vertente, é inegável que a perseguição política sofrida
durante o regime de exceção, que perdurou por considerável lapso
temporal, implica lesões à personalidade da autora, gerando-lhe dor
e angústia. Valores caros a quaisquer cidadãos, tais como a liberdade
(não apenas de locomoção, como também de manifestação de pensamento),
a honra e a integridade físico-psíquica foram violados, gerando o direito
à indenização pleiteada, sendo de rigor, portanto, a condenação da
União à reparação dos prejuízos extrapatrimoniais.
10. No que tange ao montante da indenização, observe-se que as
lesões a direitos de personalidade não apresentam natureza econômica,
mostrando-se inviável a avaliação pecuniária precisa de sua extensão e,
consequentemente, qualquer tentativa de tarifação, ou seja, na apuração do
quantum devido, deve o julgador contemplar a reparação do dano sofrido de
forma razoável e proporcional, punindo o infrator e evitando o enriquecimento
ilícito do ofendido, analisando-se os seguintes aspectos: a) condição
social do ofensor; b) viabilidade econômica; c) grau de culpa; d) gravidade
do dano; e) reincidência.
11. Considerando o sofrimento experimentado pela autora, com a expulsão
da Universidade, o tempo decorrido e as implicações naturais decorrentes
do processo de expulsão, mostra-se adequado o pagamento de indenização
no montante de R$ 20.000,00, corrigido monetariamente, a partir da
data do arbitramento (Súmula nº 362 do C. STJ), com a incidência
de juros moratórios desde o evento danoso (Súmula nº 54 do C. STJ),
utilizando-se os índices previstos na Resolução nº 267/2013 do CJF,
excluídos os índices da poupança, tendo em vista que o C. STF entendeu
pela inconstitucionalidade do art. 5º da Lei nº 11.960/2009, adotando o
posicionamento de que a eleição legal do índice da caderneta de poupança
para fins de atualização monetária e juros de mora ofende o direito de
propriedade.
12. Invertido os ônus sucumbências, para condenar à União ao pagamento
de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da indenização.
13. Apelação provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
04/02/2016
Data da Publicação
:
19/02/2016
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 2100018
Órgão Julgador
:
SEXTA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO PAULO SARNO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/02/2016
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