TRF3 0014483-72.2007.4.03.6110 00144837220074036110
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 304 C/C
ARTIGO 298 DO CP. NÃO OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO
PUNITIVA. FALSIFICAÇÃO APTA A LUDIBRIAR TERCEIROS. CRIME
IMPOSSÍVEL. INOCORRÊNCIA. PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO. DOCUMENTOS
CONSIDERADOS ORIGINAIS PARA TODOS OS EFEITOS LEGAIS. MATERIALIDADE, AUTORIA E
DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA
NÃO VERIFICADA. ARREPENDIMENTO POSTERIOR. INAPLICÁVEL. PRESTAÇÃO
PECUNIÁRIA MANTIDA e, DE OFÍCIO, DESTINADA À UNIÃO FEDERAL. CONCURSO
MATERIAL DELITOS. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS.
O acusado Pedro Abe Miyahira, agindo em concurso com Maria Cristina Peixoto
da Silva e Antonio Carlos Costa, ajuizou a ação nº 2007.63.15.003163-4
perante o Juizado Especial Federal de Sorocaba/SP e nos dias 20/03/2007
e 04/06/2007 juntou aos autos do processo eletrônico documentos falsos,
consistentes em comprovantes de endereço supostamente emitidos pelo Banco
Itau, com a finalidade de burlar as regras de competência judiciária.
Consta que o autor da ação residia, à época dos fatos, no município
de Taboão da Serra/SP, todavia, foram apresentados falsos comprovantes de
residência com o fim de comprovar o endereço do autor da ação na cidade
de São Roque/SP, abrangida na jurisdição do Juizado Especial Federal de
Sorocaba/SP.
Diante da interposição de recurso pela acusação visando à exasperação
da pena aplicada, a prescrição regula-se pelo máximo da pena privativa
de liberdade cominada ao crime.
Desse modo, seja entre a data dos fatos (20/03/2007 e 04/06/2007) e o
recebimento da denúncia (18/05/2010), seja entre o recebimento da inicial
e a publicação da sentença condenatória (14/04/2014), não transcorreu
o lapso temporal de 12 anos.
A materialidade delitiva está demonstrada através do comunicado e fatura
mensal Itaucard, ambos em nome do autor da ação previdenciária; ofício
enviado pelo Banco Itaú noticiando que o autor não era cliente daquela
instituição financeira e prova testemunhal.
Os documentos falsos são dotados de potencialidade lesiva, tanto que
efetivamente induziram em erro os servidores do Juizado Especial Federal de
Sorocaba, os quais não identificaram a falsidade de plano.
A Lei 11.419/2006 - que regula o processo judicial eletrônico - estabelece
em seu artigo 11 que os documentos produzidos eletronicamente e juntados aos
processos eletrônicos serão considerados originais para todos os efeitos
legais.
Disso resulta que, os comprovantes de residência são hábeis a caracterizar
o crime tipificado no artigo 304 c/c 298 do Código Penal, haja vista que
são considerados originais para todos os efeitos legais, inclusive para
fins penais.
Os acusados foram condenados pelo delito de uso de documento falso, sendo
irrelevante, pois, a identificação do responsável pela falsificação.
Em relação ao réu Pedro, a autoria é inconteste, já que os documentos
falsos foram juntados autos por ele na condição de advogado.
As circunstâncias em que praticado o delito evidenciam o dolo de sua
conduta. Caso não estivessem agindo com acordo de vontades para a consecução
do delito em comento, o réu, advogado com mais de quinze anos de experiência,
não ajuizaria diversas ações sem nunca ter mantido contato com os clientes
e sem conferir a veracidade dos documentos que lhe eram apresentados pela
intermediária, tampouco cederia a sua assinatura digital para a corré.
No que se refere à Maria Cristina, a autoria e o dolo também restaram
comprovados nos autos.
A ré elaborou a procuração de acordo com o comprovante de residência falso,
o que demonstra a autoria, ademais, a prova testemunhal produzida sob o crivo
do contraditório e da ampla defesa deixa claro o conluio entre a ré Maria
Cristina e Antonio Carlos, os quais, na condição de intermediários, diziam
ser mais vantajoso o ajuizamento da ação previdenciária em Sorocaba/SP,
em que pese os requerentes residirem em município diverso.
No tocante à ré, a culpabilidade revela-se normal à espécie delitiva. Já
em relação ao acusado a culpabilidade é acentuada, pois, na condição
de advogado, fez uso de documento falso a fim de manipular as regras
de competência judiciária, traindo, a confiança de seu cliente, que
sequer tinha conhecimento da fraude perpetrada pelos réus. Consigne-se
que o réu, no exercício do papel constitucional de auxiliar da Justiça,
deveria colaborar com ela e não ludibriar servidores e magistrados, como
ocorreu no caso concreto, em que optou por ajuizar a ação perante Juizado
sabidamente incompetente, valendo-se de falso comprovante de residência,
de acordo com a sua vontade pessoal.
Inaplicável a atenuante prevista no artigo 65, III, "d" do Código Penal,
pois o réu não confessou a prática delitiva, na medida em que negou
peremptoriamente que tenha agido dolosamente, afirmando que teria sido
"vítima" dos corréus.
Na ausência de norma escrita que determine o limite de tempo entre as
infrações, a jurisprudência tem entendido que este não pode ser muito
amplo, de modo a preservar a cadeia de continuidade exigida pela norma,
que demanda que os crime subsequentes, por suas circunstâncias, possam ser
identificados como continuação do primeiro.
Os documentos falsos foram utilizados em contexto fático diverso, na medida em
que o segundo foi apresentado ao Juízo com a finalidade de evitar a extinção
do feito, e, em última análise, assegurar a impunidade em relação ao crime
de uso de documento falso que já havia se consumado há mais de 70 dias.
Não se aplica o instituto do arrependimento posterior, diante da natureza
formal do delito de uso de documento falso.
O valor da prestação pecuniária não comporta redução, por se mostrar
proporcional ao delito praticado, e, ainda, para que seja atingida a finalidade
de prevenção e repressão da pena.
Redução do valor dos dias multa, em relação ao réu, em face da situação
financeira comprovada nos autos.
Prestação pecuniária, de ofício, destinada à União Federal.
Apelação ministerial provida, e apelação dos réus parcialmente provida.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 304 C/C
ARTIGO 298 DO CP. NÃO OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO
PUNITIVA. FALSIFICAÇÃO APTA A LUDIBRIAR TERCEIROS. CRIME
IMPOSSÍVEL. INOCORRÊNCIA. PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO. DOCUMENTOS
CONSIDERADOS ORIGINAIS PARA TODOS OS EFEITOS LEGAIS. MATERIALIDADE, AUTORIA E
DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA
NÃO VERIFICADA. ARREPENDIMENTO POSTERIOR. INAPLICÁVEL. PRESTAÇÃO
PECUNIÁRIA MANTIDA e, DE OFÍCIO, DESTINADA À UNIÃO FEDERAL. CONCURSO
MATERIAL DELITOS. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS.
O acusado Pedro Abe Miyahira, agindo em concurso com Maria Cristina Peixoto
da Silva e Antonio Carlos Costa, ajuizou a ação nº 2007.63.15.003163-4
perante o Juizado Especial Federal de Sorocaba/SP e nos dias 20/03/2007
e 04/06/2007 juntou aos autos do processo eletrônico documentos falsos,
consistentes em comprovantes de endereço supostamente emitidos pelo Banco
Itau, com a finalidade de burlar as regras de competência judiciária.
Consta que o autor da ação residia, à época dos fatos, no município
de Taboão da Serra/SP, todavia, foram apresentados falsos comprovantes de
residência com o fim de comprovar o endereço do autor da ação na cidade
de São Roque/SP, abrangida na jurisdição do Juizado Especial Federal de
Sorocaba/SP.
Diante da interposição de recurso pela acusação visando à exasperação
da pena aplicada, a prescrição regula-se pelo máximo da pena privativa
de liberdade cominada ao crime.
Desse modo, seja entre a data dos fatos (20/03/2007 e 04/06/2007) e o
recebimento da denúncia (18/05/2010), seja entre o recebimento da inicial
e a publicação da sentença condenatória (14/04/2014), não transcorreu
o lapso temporal de 12 anos.
A materialidade delitiva está demonstrada através do comunicado e fatura
mensal Itaucard, ambos em nome do autor da ação previdenciária; ofício
enviado pelo Banco Itaú noticiando que o autor não era cliente daquela
instituição financeira e prova testemunhal.
Os documentos falsos são dotados de potencialidade lesiva, tanto que
efetivamente induziram em erro os servidores do Juizado Especial Federal de
Sorocaba, os quais não identificaram a falsidade de plano.
A Lei 11.419/2006 - que regula o processo judicial eletrônico - estabelece
em seu artigo 11 que os documentos produzidos eletronicamente e juntados aos
processos eletrônicos serão considerados originais para todos os efeitos
legais.
Disso resulta que, os comprovantes de residência são hábeis a caracterizar
o crime tipificado no artigo 304 c/c 298 do Código Penal, haja vista que
são considerados originais para todos os efeitos legais, inclusive para
fins penais.
Os acusados foram condenados pelo delito de uso de documento falso, sendo
irrelevante, pois, a identificação do responsável pela falsificação.
Em relação ao réu Pedro, a autoria é inconteste, já que os documentos
falsos foram juntados autos por ele na condição de advogado.
As circunstâncias em que praticado o delito evidenciam o dolo de sua
conduta. Caso não estivessem agindo com acordo de vontades para a consecução
do delito em comento, o réu, advogado com mais de quinze anos de experiência,
não ajuizaria diversas ações sem nunca ter mantido contato com os clientes
e sem conferir a veracidade dos documentos que lhe eram apresentados pela
intermediária, tampouco cederia a sua assinatura digital para a corré.
No que se refere à Maria Cristina, a autoria e o dolo também restaram
comprovados nos autos.
A ré elaborou a procuração de acordo com o comprovante de residência falso,
o que demonstra a autoria, ademais, a prova testemunhal produzida sob o crivo
do contraditório e da ampla defesa deixa claro o conluio entre a ré Maria
Cristina e Antonio Carlos, os quais, na condição de intermediários, diziam
ser mais vantajoso o ajuizamento da ação previdenciária em Sorocaba/SP,
em que pese os requerentes residirem em município diverso.
No tocante à ré, a culpabilidade revela-se normal à espécie delitiva. Já
em relação ao acusado a culpabilidade é acentuada, pois, na condição
de advogado, fez uso de documento falso a fim de manipular as regras
de competência judiciária, traindo, a confiança de seu cliente, que
sequer tinha conhecimento da fraude perpetrada pelos réus. Consigne-se
que o réu, no exercício do papel constitucional de auxiliar da Justiça,
deveria colaborar com ela e não ludibriar servidores e magistrados, como
ocorreu no caso concreto, em que optou por ajuizar a ação perante Juizado
sabidamente incompetente, valendo-se de falso comprovante de residência,
de acordo com a sua vontade pessoal.
Inaplicável a atenuante prevista no artigo 65, III, "d" do Código Penal,
pois o réu não confessou a prática delitiva, na medida em que negou
peremptoriamente que tenha agido dolosamente, afirmando que teria sido
"vítima" dos corréus.
Na ausência de norma escrita que determine o limite de tempo entre as
infrações, a jurisprudência tem entendido que este não pode ser muito
amplo, de modo a preservar a cadeia de continuidade exigida pela norma,
que demanda que os crime subsequentes, por suas circunstâncias, possam ser
identificados como continuação do primeiro.
Os documentos falsos foram utilizados em contexto fático diverso, na medida em
que o segundo foi apresentado ao Juízo com a finalidade de evitar a extinção
do feito, e, em última análise, assegurar a impunidade em relação ao crime
de uso de documento falso que já havia se consumado há mais de 70 dias.
Não se aplica o instituto do arrependimento posterior, diante da natureza
formal do delito de uso de documento falso.
O valor da prestação pecuniária não comporta redução, por se mostrar
proporcional ao delito praticado, e, ainda, para que seja atingida a finalidade
de prevenção e repressão da pena.
Redução do valor dos dias multa, em relação ao réu, em face da situação
financeira comprovada nos autos.
Prestação pecuniária, de ofício, destinada à União Federal.
Apelação ministerial provida, e apelação dos réus parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da
3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação de Maria
Cristina Peixoto da Silva para reduzir a pena-base para o mínimo legal;
dar parcial provimento à apelação de Pedro Abe Miyahira para reduzir a
pena-base para o equivalente a 1 ano e 6 meses de reclusão, reduzir o valor
dos dias multa para o equivalente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo
vigente na data dos fatos e conceder os benefícios da justiça gratuita;
dar provimento à apelação do Ministério Público Federal para aplicar o
concurso material de crimes, e fixar definitivamente a pena de Maria Cristina
Peixoto da Silva em 2 anos de reclusão, em regime aberto, e 20 dias multa,
no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente na data dos fatos,
mantida a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas
de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, conforme
critérios a serem estabelecidos pelo Juízo da Execução, e prestação
pecuniária no valor de 3 salários mínimos, e fixar definitivamente
a pena de Pedro Abe Miyahira em 3 anos de reclusão, em regime aberto,
e 30 dias multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente na
data dos fatos, mantida a substituição por duas restritivas de direitos,
consistentes em prestação de serviços à comunidade, conforme critérios
a serem estabelecidos pelo Juízo da Execução, e prestação pecuniária
no valor de 5 salários mínimos; e, de ofício, destinar as prestações
pecuniárias à União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
26/07/2016
Data da Publicação
:
02/08/2016
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 65250
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO RICARDO NASCIMENTO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-298 ART-304 ART-65 INC-3 LET-D
LEG-FED LEI-11419 ANO-2006
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/08/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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