TRF3 0014553-76.2018.4.03.9999 00145537620184039999
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA
CARACTERIZADA. MISERABILIDADE COMPROVADA. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO. REMESSA OFICIAL INDEVIDA. ABATIMENTO. ARTIGO 115,
II, DA LBPS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93,
regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- A LOAS deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao
estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício
da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência
ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover
a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Na ADIN 1.232-2, de 27/08/98, publicada no DJU de 1/6/2001, Pleno, Relator
Ministro Maurício Correa, RTJ 154/818, ocasião em que o STF reputou
constitucional a restrição conformada no § 3o do art. 20 da Lei n.°
8.742/93, conforme a ementa a seguir transcrita:
- Depois, em controle difuso de constitucionalidade, o Supremo Tribunal
Federal manteve o entendimento (vide RE 213.736-SP, Rel. Min. Marco Aurélio,
informativo STF n.° 179; RE 256.594-6, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 28/4/2000,
Informativo STF n.° 186; RE n.° 280.663-3, São Paulo, j. 06/09/2001,
relator Maurício Corrêa).
- Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça, em vários precedentes,
considerou que a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual
fala a Lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição
de miserabilidade por outros meios de prova (REsp n. 435.871, 5ª Turma
Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61, REsp n. 222.764,
STJ, 5ªT., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp
n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).
- Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal reviu seu posicionamento ao
reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode
ser considerado taxativo, acórdão produzido com repercussão geral (STF, RE
n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).
- A respeito do conceito de família, o dever de sustento familiar (dos
pais em relação aos filhos e destes em relação àqueles) não pode ser
substituído pela intervenção Estatal, pois o próprio artigo 203, V,
da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o
sustento não puder ser provido pela família. Essa conclusão tem arrimo
no próprio princípio da solidariedade social, conformado no artigo 3º,
I, do Texto Magno.
- Sobre a definição de deficiência, Nair Lemos Gonçalves apresentou os
principais requisitos: "desvio acentuado dos mencionados padrões médios e
sua relação com o desenvolvimento físico, mental, sensorial ou emocional,
considerados esses aspectos do desenvolvimento separada, combinada ou
globalmente" (Verbete Excepcionais. In: Enciclopédia Saraiva de Direito,
n. XXXIV. São Paulo: Saraiva, 1999).
- A Lei nº 13.146/2015, que "institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa
com Deficiência", com início de vigência em 02/01/2016, novamente alterou
a redação do artigo 20, § 2º, da LOAS, in verbis: "§ 2o Para efeito de
concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas."
- Como apontado no item IDOSOS E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA (voto do relator),
não é qualquer limitação ou problema físico ou mental que torna possível
a percepção de benefício assistencial de prestação continuada, mesmo
porque este não pode ser postulado como mero substituto de aposentadoria por
invalidez ou auxílio-doença, por aqueles que não mais gozam da proteção
previdenciária (artigo 15 da Lei nº 8.213/91), ou dela nunca usufruíram.
- Muitos casos de incapacidade temporária ou mesmo permanente para o trabalho
devem ser tutelados exclusivamente pelo seguro social (artigo 201 da CF), à
medida que a condição de saúde do interessado (física ou mental) não gera
a segregação social ínsita à condição de pessoa com deficiência. De
fato, somente em relação ao benefício assistencial há necessidade de
abordar a questão da integração social (participação em sociedade).
- O requisito da deficiência restou caracterizado, nos termos da perícia
médica. A parte autora sofreu vários AVC´s em 2010 e encontra sérias
barreiras não apenas à obtenção de trabalho, mas também à integração
social e participação em sociedade. Resta caracterizada, assim, a
deficiência à luz do artigo 20, § 2º, da LOAS.
Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social (realizado em
07/6/2016) relata que a autora vive com o seu filho, seu pai, uma irmã, os
sobrinhos filhos da última. O pai, de 72 anos, recebe um salário mínimo
e meio de aposentadoria. O filho, com 20 anos, encontrava-se desempregado
na época do relatório social, mas possui capacidade de trabalho. A irmã
Cristina trabalha e recebe um salário mínimo e meio de remuneração,
segundo informado à assistente social. Porém, seu salário no CNIS é
muito superior. Ocorre que nem ela, nem os filhos (cada qual recebe pensão
alimentícia do pai) desta, sobrinhos da autora, integram o núcleo familiar,
à luz do artigo 20, § 1º, da LOAS.
- Infere-se que a renda mensal per capita é de ¼ (um quarto) do
salário mínimo, pois o valor de 1 (um) salário mínimo do pai deve ser
"desconsiderado", à luz do artigo 34, § único, do Estatuto do Idoso
(RE 580963).
- Consequentemente, quando da DER, o INSS não praticou qualquer
ilegalidade. Afinal, até o julgamento do RE 580963 pelo STF, em 14/11/2013
(Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225), vigoravam os efeitos
da ADIN 1.232-3 (vide supra, item 1, do voto do relator). O termo inicial
deve ser fixado em 14/11/2013, nos termos do artigo 492 do NCPC.
- Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei
n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação
de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
- Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio
por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do
CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando
esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos
artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho
de 2009, ser utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança, consoante alterações introduzidas no art. 1º-F
da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09 (Repercussão Geral no
RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
- Condena-se o INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze
por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas
até a data da sentença, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º,
3º, I, e 11, do Novo CPC e súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça,
já aplicada a majoração decorrente da fase recursal.
- O pagamento a maior, por força da antecipação dos efeitos da tutela,
deverá ser abatido na forma do artigo 115, II, da LBPS, nos termos do
disposto no artigo 302, I, do NCPC e no Resp 1.401.560/MT, submetido à
sistemática de recurso repetitivo.
- Apelação do INSS parcialmente provida.
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA
CARACTERIZADA. MISERABILIDADE COMPROVADA. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO. REMESSA OFICIAL INDEVIDA. ABATIMENTO. ARTIGO 115,
II, DA LBPS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93,
regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- A LOAS deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao
estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício
da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência
ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover
a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Na ADIN 1.232-2, de 27/08/98, publicada no DJU de 1/6/2001, Pleno, Relator
Ministro Maurício Correa, RTJ 154/818, ocasião em que o STF reputou
constitucional a restrição conformada no § 3o do art. 20 da Lei n.°
8.742/93, conforme a ementa a seguir transcrita:
- Depois, em controle difuso de constitucionalidade, o Supremo Tribunal
Federal manteve o entendimento (vide RE 213.736-SP, Rel. Min. Marco Aurélio,
informativo STF n.° 179; RE 256.594-6, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 28/4/2000,
Informativo STF n.° 186; RE n.° 280.663-3, São Paulo, j. 06/09/2001,
relator Maurício Corrêa).
- Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça, em vários precedentes,
considerou que a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual
fala a Lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição
de miserabilidade por outros meios de prova (REsp n. 435.871, 5ª Turma
Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61, REsp n. 222.764,
STJ, 5ªT., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp
n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).
- Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal reviu seu posicionamento ao
reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode
ser considerado taxativo, acórdão produzido com repercussão geral (STF, RE
n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).
- A respeito do conceito de família, o dever de sustento familiar (dos
pais em relação aos filhos e destes em relação àqueles) não pode ser
substituído pela intervenção Estatal, pois o próprio artigo 203, V,
da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o
sustento não puder ser provido pela família. Essa conclusão tem arrimo
no próprio princípio da solidariedade social, conformado no artigo 3º,
I, do Texto Magno.
- Sobre a definição de deficiência, Nair Lemos Gonçalves apresentou os
principais requisitos: "desvio acentuado dos mencionados padrões médios e
sua relação com o desenvolvimento físico, mental, sensorial ou emocional,
considerados esses aspectos do desenvolvimento separada, combinada ou
globalmente" (Verbete Excepcionais. In: Enciclopédia Saraiva de Direito,
n. XXXIV. São Paulo: Saraiva, 1999).
- A Lei nº 13.146/2015, que "institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa
com Deficiência", com início de vigência em 02/01/2016, novamente alterou
a redação do artigo 20, § 2º, da LOAS, in verbis: "§ 2o Para efeito de
concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas."
- Como apontado no item IDOSOS E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA (voto do relator),
não é qualquer limitação ou problema físico ou mental que torna possível
a percepção de benefício assistencial de prestação continuada, mesmo
porque este não pode ser postulado como mero substituto de aposentadoria por
invalidez ou auxílio-doença, por aqueles que não mais gozam da proteção
previdenciária (artigo 15 da Lei nº 8.213/91), ou dela nunca usufruíram.
- Muitos casos de incapacidade temporária ou mesmo permanente para o trabalho
devem ser tutelados exclusivamente pelo seguro social (artigo 201 da CF), à
medida que a condição de saúde do interessado (física ou mental) não gera
a segregação social ínsita à condição de pessoa com deficiência. De
fato, somente em relação ao benefício assistencial há necessidade de
abordar a questão da integração social (participação em sociedade).
- O requisito da deficiência restou caracterizado, nos termos da perícia
médica. A parte autora sofreu vários AVC´s em 2010 e encontra sérias
barreiras não apenas à obtenção de trabalho, mas também à integração
social e participação em sociedade. Resta caracterizada, assim, a
deficiência à luz do artigo 20, § 2º, da LOAS.
Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social (realizado em
07/6/2016) relata que a autora vive com o seu filho, seu pai, uma irmã, os
sobrinhos filhos da última. O pai, de 72 anos, recebe um salário mínimo
e meio de aposentadoria. O filho, com 20 anos, encontrava-se desempregado
na época do relatório social, mas possui capacidade de trabalho. A irmã
Cristina trabalha e recebe um salário mínimo e meio de remuneração,
segundo informado à assistente social. Porém, seu salário no CNIS é
muito superior. Ocorre que nem ela, nem os filhos (cada qual recebe pensão
alimentícia do pai) desta, sobrinhos da autora, integram o núcleo familiar,
à luz do artigo 20, § 1º, da LOAS.
- Infere-se que a renda mensal per capita é de ¼ (um quarto) do
salário mínimo, pois o valor de 1 (um) salário mínimo do pai deve ser
"desconsiderado", à luz do artigo 34, § único, do Estatuto do Idoso
(RE 580963).
- Consequentemente, quando da DER, o INSS não praticou qualquer
ilegalidade. Afinal, até o julgamento do RE 580963 pelo STF, em 14/11/2013
(Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225), vigoravam os efeitos
da ADIN 1.232-3 (vide supra, item 1, do voto do relator). O termo inicial
deve ser fixado em 14/11/2013, nos termos do artigo 492 do NCPC.
- Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei
n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação
de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
- Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio
por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do
CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando
esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos
artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho
de 2009, ser utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança, consoante alterações introduzidas no art. 1º-F
da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09 (Repercussão Geral no
RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
- Condena-se o INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze
por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas
até a data da sentença, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º,
3º, I, e 11, do Novo CPC e súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça,
já aplicada a majoração decorrente da fase recursal.
- O pagamento a maior, por força da antecipação dos efeitos da tutela,
deverá ser abatido na forma do artigo 115, II, da LBPS, nos termos do
disposto no artigo 302, I, do NCPC e no Resp 1.401.560/MT, submetido à
sistemática de recurso repetitivo.
- Apelação do INSS parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, conhecer da apelação e lhe dar parcial provimento, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
29/08/2018
Data da Publicação
:
13/09/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2305056
Órgão Julgador
:
NONA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/09/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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