TRF3 0015121-53.1998.4.03.6100 00151215319984036100
PROCESSUAL CIVIL: CONTRATO. SISTEMA FINANCEIRO DA
HABITAÇÃO. CDC. REVISÃO. TAXA DE JUROS. FORMA DE
AMORTIZAÇÃO. SEGURO. TR. PES. CDC. REPETIÇÃO DE INDÉBTO. TERORIA
DA IMPREVISÃO. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONSTITUCIONALIDADE. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO.
1 - Os contratos de mútuo, nos termos da Lei 4.380/64, que instituiu o Sistema
Financeiro da Habitação para aquisição da casa própria, construção ou
venda de unidades habitacionais, através de financiamento imobiliário, são
típicos contratos de adesão de longa duração, com cláusulas padrão,
sujeitos aos critérios legais em vigor à época de sua assinatura, em
que não há lugar para a autonomia da vontade na definição do conteúdo,
restando ao mutuário submeter-se às condições pré-determinadas.
2 - Muito embora o STJ venha admitindo a aplicabilidade do Código de Defesa do
Consumidor, é necessário que as irregularidades que tenham sido praticadas
estejam amparadas por provas inequívocas, sendo insuficiente a alegação
genérica.
3 - No que diz respeito à correção das prestações, os mutuários firmaram
com a Caixa Econômica Federal - CEF um contrato de mútuo habitacional,
para fins de aquisição de casa própria, o qual prevê o reajustamento
das prestações e seus acessórios, mediante a aplicação do índice
correspondente à da Taxa de remuneração básica aplicável aos depósitos
de poupança livre, sendo facultado à CEF aplicar, em substituição aos
percentuais previstos, o índice de aumento salarial da categoria profissional
do devedor, quando conhecido.
4 - Ressalte-se que deve ser respeitado um critério único durante todo o
período de execução do contrato, e não variar segundo determinação de
somente uma das partes ou aplicando-se índices em desacordo com o que foi
convencionado entre elas.
5 - Frise-se que, apesar da presente demanda versar a respeito de revisão
contratual, entre outras do reajuste das prestações e acessórios, o
reconhecimento do correto critério de reajuste das prestações, ou seja,
da aplicação dos índices da categoria profissional do mutuário apelante
ou do índice correspondente à da taxa de remuneração básica aplicável
aos depósitos de poupança livre, refletirá diretamente no critério de
análise, já que restará o reconhecimento ou não do cumprimento do PES/CP,
conforme previsto na cláusula contratual.
6 - Considerando que existe, de acordo com o contratado, a possibilidade de
mais de um critério de reajuste das prestações e acessórios, tem-se que
o reconhecimento do não cumprimento do PES/CP, na forma pretendida pelo
mutuário, requer ampla análise da real situação fática das partes
envolvidas, lastreada em robusta prova, a fim de se apurar com a certeza
necessária.
Dessa forma, perdurando dúvidas e divergências quanto ao critério de
reajuste das prestações, faz-se necessária a produção de provas para
esclarecimento da questão.
7 - É certo que o juiz não deve estar adstrito ao laudo pericial. Contudo,
nesse tipo de demanda, que envolve critérios eminentemente técnicos e
complexos do campo financeiro-econômico, resta evidente que o trabalho
deverá ser realizado por expert, em cumprimento de sentença.
8 - Sobre a correção monetária do saldo devedor das prestações,
consigne-se que a forma de reajuste deve seguir o pactuado, ou seja, a
utilização da Taxa Referencial - TR previsto expressamente no contrato
(índice utilizado para reajustamento dos depósitos de poupança), o que
não pode ser afastado, mesmo porque o Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento da ADIn nº 493/DF, Relator o e. Ministro Moreira Alves, não
decidiu pela exclusão da Taxa Referencial - TR do mundo jurídico, e sim,
impediu a sua indexação como substituto de outros índices previamente
estipulados em contratos firmados anteriormente à vigência da Lei nº
8.177/91, e consolidou a sua aplicação a contratos firmados em data
posterior à entrada em vigor da referida norma.
9 - No que toca à amortização do débito, não se observa qualquer
equívoco na forma em que as prestações são computadas para o abatimento
do principal da dívida, eis que, quando do pagamento da primeira parcela do
financiamento, já haviam transcorrido trinta dias desde a entrega do total
do dinheiro emprestado, devendo, assim, os juros e a correção monetária
incidir sobre todo o dinheiro mutuado, sem se descontar o valor da primeira
prestação, sob pena de se remunerar e corrigir valores menores do que os
efetivamente emprestados.
10 - A redação da alínea "c" do artigo 6º da Lei n.º 4.380/64, apenas
indica que as prestações mensais devem ter valores iguais, por todo o
período do financiamento, considerando-se a inexistência de reajuste,
o qual, quando incidente, alterará nominalmente o valor da prestação.
11 - Quanto à legalidade na fixação de uma taxa de juros nominal e outra
de juros efetiva cabe, a priori, destacar que nominal é a taxa de juros
remuneratórios relativa ao período decorrido, cujo valor é o resultado
de sua incidência mensal sobre o saldo devedor remanescente corrigido,
já a taxa efetiva é a taxa nominal exponencial, identificando o custo
total do financiamento.
12 - Com efeito, o cálculo dos juros se faz mediante a aplicação de um
único índice fixado, qual seja, 9,1000%, cuja incidência mês a mês,
após o período de 12 (doze) meses, resulta a taxa efetiva de 9,4893%
ao ano, não havendo fixação de juros acima do permitido por lei.
13 - O disposto no art. 6º, alínea "e", da Lei 4.380/64 não configura uma
limitação de juros, dispondo apenas sobre as condições de reajustamento
estipuladas nos contratos de mútuo previstos no art. 5º, do referido
diploma legal.
14 - Destarte, não deve ser considerada uma limitação dos juros a serem
fixados aos contratos de mútuo regidos pelas normas do Sistema Financeiro
da Habitação - SFH, conforme alegado pela parte autora, devendo ser mantido
o percentual de juros pactuado entre as partes.
15 - No que diz respeito à correção da taxa de seguro, o mutuário tem
direito à aplicação dos mesmos índices utilizados para reajuste das
prestações, devendo ser aplicadas as regras previstas no contrato, com
relação às quais, todavia, não foi juntada prova robusta a fim de se
apurar com a certeza necessária sua correta ou não aplicação.
16 - No que tange ao Decreto-lei nº 70/66, não é inconstitucional,
havendo, nesse sentido, inúmeros precedentes do E. Supremo Tribunal Federal
e do E. Superior Tribunal de Justiça, ademais, o contrato firmado entre as
partes prevê a possibilidade de execução extrajudicial do imóvel.
17 - Cabe ressaltar que a execução do débito não liquidado, com todas
as medidas coercitivas inerentes ao procedimento, é mera consequência
da inadimplência contratual, não podendo ser obstada sem a existência
correta de fundamentos para tal.
18 - A teoria da imprevisão aplica-se apenas em casos excepcionais,
ou seja, quando acontecimento não previsível pelas partes contratantes
traga grave alteração da base negocial a impossibilitar o cumprimento
da prestação. As oscilações do contrato decorrentes da inflação,
em princípio, não autorizam a invocação dessa teoria.
19 - Não se pode falar em imprevisão dos contratos quando ele dispõe
explicitamente sobre o fato que teria trazido desequilíbrio à relação,
estipulando não apenas os critérios de revisão dos termos econômicos do
contrato, como até mesmo sobre eventual comprometimento excessivo da renda.
20 - As influências da realidade econômico-financeira operam juntamente a
perda de valor real das prestações e do saldo devedor. No momento em que
é paga a primeira prestação, já houve inflação sobre o valor pactuado
na data de assinatura do contrato.
21 - Apelação parcialmente provida.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL: CONTRATO. SISTEMA FINANCEIRO DA
HABITAÇÃO. CDC. REVISÃO. TAXA DE JUROS. FORMA DE
AMORTIZAÇÃO. SEGURO. TR. PES. CDC. REPETIÇÃO DE INDÉBTO. TERORIA
DA IMPREVISÃO. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONSTITUCIONALIDADE. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO.
1 - Os contratos de mútuo, nos termos da Lei 4.380/64, que instituiu o Sistema
Financeiro da Habitação para aquisição da casa própria, construção ou
venda de unidades habitacionais, através de financiamento imobiliário, são
típicos contratos de adesão de longa duração, com cláusulas padrão,
sujeitos aos critérios legais em vigor à época de sua assinatura, em
que não há lugar para a autonomia da vontade na definição do conteúdo,
restando ao mutuário submeter-se às condições pré-determinadas.
2 - Muito embora o STJ venha admitindo a aplicabilidade do Código de Defesa do
Consumidor, é necessário que as irregularidades que tenham sido praticadas
estejam amparadas por provas inequívocas, sendo insuficiente a alegação
genérica.
3 - No que diz respeito à correção das prestações, os mutuários firmaram
com a Caixa Econômica Federal - CEF um contrato de mútuo habitacional,
para fins de aquisição de casa própria, o qual prevê o reajustamento
das prestações e seus acessórios, mediante a aplicação do índice
correspondente à da Taxa de remuneração básica aplicável aos depósitos
de poupança livre, sendo facultado à CEF aplicar, em substituição aos
percentuais previstos, o índice de aumento salarial da categoria profissional
do devedor, quando conhecido.
4 - Ressalte-se que deve ser respeitado um critério único durante todo o
período de execução do contrato, e não variar segundo determinação de
somente uma das partes ou aplicando-se índices em desacordo com o que foi
convencionado entre elas.
5 - Frise-se que, apesar da presente demanda versar a respeito de revisão
contratual, entre outras do reajuste das prestações e acessórios, o
reconhecimento do correto critério de reajuste das prestações, ou seja,
da aplicação dos índices da categoria profissional do mutuário apelante
ou do índice correspondente à da taxa de remuneração básica aplicável
aos depósitos de poupança livre, refletirá diretamente no critério de
análise, já que restará o reconhecimento ou não do cumprimento do PES/CP,
conforme previsto na cláusula contratual.
6 - Considerando que existe, de acordo com o contratado, a possibilidade de
mais de um critério de reajuste das prestações e acessórios, tem-se que
o reconhecimento do não cumprimento do PES/CP, na forma pretendida pelo
mutuário, requer ampla análise da real situação fática das partes
envolvidas, lastreada em robusta prova, a fim de se apurar com a certeza
necessária.
Dessa forma, perdurando dúvidas e divergências quanto ao critério de
reajuste das prestações, faz-se necessária a produção de provas para
esclarecimento da questão.
7 - É certo que o juiz não deve estar adstrito ao laudo pericial. Contudo,
nesse tipo de demanda, que envolve critérios eminentemente técnicos e
complexos do campo financeiro-econômico, resta evidente que o trabalho
deverá ser realizado por expert, em cumprimento de sentença.
8 - Sobre a correção monetária do saldo devedor das prestações,
consigne-se que a forma de reajuste deve seguir o pactuado, ou seja, a
utilização da Taxa Referencial - TR previsto expressamente no contrato
(índice utilizado para reajustamento dos depósitos de poupança), o que
não pode ser afastado, mesmo porque o Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento da ADIn nº 493/DF, Relator o e. Ministro Moreira Alves, não
decidiu pela exclusão da Taxa Referencial - TR do mundo jurídico, e sim,
impediu a sua indexação como substituto de outros índices previamente
estipulados em contratos firmados anteriormente à vigência da Lei nº
8.177/91, e consolidou a sua aplicação a contratos firmados em data
posterior à entrada em vigor da referida norma.
9 - No que toca à amortização do débito, não se observa qualquer
equívoco na forma em que as prestações são computadas para o abatimento
do principal da dívida, eis que, quando do pagamento da primeira parcela do
financiamento, já haviam transcorrido trinta dias desde a entrega do total
do dinheiro emprestado, devendo, assim, os juros e a correção monetária
incidir sobre todo o dinheiro mutuado, sem se descontar o valor da primeira
prestação, sob pena de se remunerar e corrigir valores menores do que os
efetivamente emprestados.
10 - A redação da alínea "c" do artigo 6º da Lei n.º 4.380/64, apenas
indica que as prestações mensais devem ter valores iguais, por todo o
período do financiamento, considerando-se a inexistência de reajuste,
o qual, quando incidente, alterará nominalmente o valor da prestação.
11 - Quanto à legalidade na fixação de uma taxa de juros nominal e outra
de juros efetiva cabe, a priori, destacar que nominal é a taxa de juros
remuneratórios relativa ao período decorrido, cujo valor é o resultado
de sua incidência mensal sobre o saldo devedor remanescente corrigido,
já a taxa efetiva é a taxa nominal exponencial, identificando o custo
total do financiamento.
12 - Com efeito, o cálculo dos juros se faz mediante a aplicação de um
único índice fixado, qual seja, 9,1000%, cuja incidência mês a mês,
após o período de 12 (doze) meses, resulta a taxa efetiva de 9,4893%
ao ano, não havendo fixação de juros acima do permitido por lei.
13 - O disposto no art. 6º, alínea "e", da Lei 4.380/64 não configura uma
limitação de juros, dispondo apenas sobre as condições de reajustamento
estipuladas nos contratos de mútuo previstos no art. 5º, do referido
diploma legal.
14 - Destarte, não deve ser considerada uma limitação dos juros a serem
fixados aos contratos de mútuo regidos pelas normas do Sistema Financeiro
da Habitação - SFH, conforme alegado pela parte autora, devendo ser mantido
o percentual de juros pactuado entre as partes.
15 - No que diz respeito à correção da taxa de seguro, o mutuário tem
direito à aplicação dos mesmos índices utilizados para reajuste das
prestações, devendo ser aplicadas as regras previstas no contrato, com
relação às quais, todavia, não foi juntada prova robusta a fim de se
apurar com a certeza necessária sua correta ou não aplicação.
16 - No que tange ao Decreto-lei nº 70/66, não é inconstitucional,
havendo, nesse sentido, inúmeros precedentes do E. Supremo Tribunal Federal
e do E. Superior Tribunal de Justiça, ademais, o contrato firmado entre as
partes prevê a possibilidade de execução extrajudicial do imóvel.
17 - Cabe ressaltar que a execução do débito não liquidado, com todas
as medidas coercitivas inerentes ao procedimento, é mera consequência
da inadimplência contratual, não podendo ser obstada sem a existência
correta de fundamentos para tal.
18 - A teoria da imprevisão aplica-se apenas em casos excepcionais,
ou seja, quando acontecimento não previsível pelas partes contratantes
traga grave alteração da base negocial a impossibilitar o cumprimento
da prestação. As oscilações do contrato decorrentes da inflação,
em princípio, não autorizam a invocação dessa teoria.
19 - Não se pode falar em imprevisão dos contratos quando ele dispõe
explicitamente sobre o fato que teria trazido desequilíbrio à relação,
estipulando não apenas os critérios de revisão dos termos econômicos do
contrato, como até mesmo sobre eventual comprometimento excessivo da renda.
20 - As influências da realidade econômico-financeira operam juntamente a
perda de valor real das prestações e do saldo devedor. No momento em que
é paga a primeira prestação, já houve inflação sobre o valor pactuado
na data de assinatura do contrato.
21 - Apelação parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação interposto,
apenas no que tange à determinação de um critério único, durante todo
o período de execução do contrato, de correção das prestações e seus
acessórios, a ser identificado através de perícia, a ser realizada em
cumprimento de sentença, mantendo, quanto ao mais, a decisão recorrida,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
08/11/2016
Data da Publicação
:
18/11/2016
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1487159
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/11/2016
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