TRF3 0016910-38.1999.4.03.6105 00169103819994036105
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. APELAÇÕES E REMESSA OFICIAL. PRELIMINARES E PREJUDICIAIS
DE MÉRITO AFASTADAS. AGENTES DE INSPEÇÃO DO TRABALHO. EXERCÍCIO
DE ATIVIDADE EM EMPRESAS PRIVADAS SUJEITAS À FISCALIZAÇÃO PELOS
PRÓPRIOS AGENTES PÚBLICOS. ATO ÍMPROBO. CONFIGURAÇÃO. ART. 9º,
VIII, DA LEI 8.429/92. DECLARAÇÃO FALSA. ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO. ART. 11 DA MESMA LEI. IRRETROATIVIDADE DA LEI 8.429/92
SOBRE FATOS ANTERIORES À SUA VIGÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO PARCIALMENTE
PROVIDO. APELAÇÕES DESPROVIDAS COM RESSALVA DE FUNDAMENTAÇÃO. MEDIDA
CAUTELAR PREJUDICADA.
1. Não há falar-se em inconstitucionalidade da Lei 8.429/92, dado tratar-se
de norma que veio dar completude ao art. 37, § 4º, da Constituição da
República; ademais, sob a ótica formal, o C. STF, no julgamento da ADIN
2182/DF, declarou a constitucionalidade dessa Lei.
2. A jurisprudência do C. STJ pacificou entendimento de que a ação
civil pública consubstancia meio processual adequado para se postular
responsabilização por atos de improbidade administrativa, tendo o Ministério
Público legitimidade ativa para tanto, posto o seu dever constitucional de
promover, quando necessária, a reparação do erário, bem como a defesa
do patrimônio público (Súmula 139/STJ).
3. A admissão da União Federal como litisconsorte ativa do Ministério
Público Federal configura motivo suficiente à atração da competência
da Justiça Federal, consoante o art. 109, I, da Constituição Federal.
4. O art. 2º, caput, da Lei da Ação Civil Pública dispõe que "as ações
previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano,
cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa".
4. Como o local originário dos fatos - Jundiaí/SP - não era, à época
do ajuizamento, sede de Vara de Justiça Federal, reputa-se correto que a
ação tenha sido promovida ante a Subseção Judiciária de Campinas/SP,
que na oportunidade abarcava aquele município. Nesse sentido: STF, RE
228.955-9/RS, DJ: 24.03.2000.
5. A responsabilização decorrente de atos improbidade administrativa é
independente das sanções penais, civis e administrativas decorrentes dos
mesmos fatos.
6. Inexistiu violação ao preceito da identidade física do juiz, pois,
consoante jurisprudência do C. STJ, entre as exceções à aplicação desse
princípio, previstas no art. 132 do CPC, insere-se o afastamento por motivo
de férias, período em que é possível ao substituto proferir sentença,
ainda que colhida prova oral em audiência de instrução e julgamento pelo
magistrado originário, que a presidiu.
7. Mérito: ação civil pública pela qual o MPF e a União Federal
pleiteiam a aplicação, aos recorrentes, das sanções previstas na Lei de
Improbidade Administrativa, em razão de enriquecimento ilícito oriundo
de irregular acumulação de cargos públicos com atividades privadas,
inclusive com conflito de interesses, eis que, por ofício, os apelantes
deveriam fiscalizar as empresas privadas nas quais trabalhavam.
8. A Lei 8.429/92 é de natureza eminentemente sancionatória, não podendo
retroagir para alcançar fatos anteriores à respectiva vigência, ainda que
cometidos sob a égide da Constituição da República de 1988; portanto,
contrariamente ao registrado na sentença, somente as condutas perpetradas
após 03.06.1992, data em que essa Lei entrou em vigor, é que poderão ser
objeto de análise nesta ação civil pública.
9. Conforme bem demonstrado pelas provas coligidas, os recorrentes, servidores
públicos da área da fiscalização do trabalho, exerceram, dolosamente,
vínculo profissional externo em empresas privadas sujeitas a fiscalização
pelos próprios órgãos em que exerciam função pública.
10. Dentre as hipóteses de enriquecimento ilícito, objetivamente descritas no
art. 9º da Lei 8.429/92, destaca-se a prevista no seu inciso VIII: "aceitar
emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para
pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido
ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente
público, durante a atividade".
11. A improbidade descrita no art. 9º, VIII, da Lei 8.429/92, prescinde de
comprovação de que o uso da função pública tenha efetivamente gerado
benefícios às empresas privadas, ou de que algum ato de corrupção ou
desvio funcional tenha se concretizado, bastando, para a configuração
desse ilícito, a comprovação da dupla jornada com atuação dolosa,
em cenário de conflito de interesses. Doutrina e jurisprudência.
12. Evidente o cometimento, de forma dolosa, de atos de improbidade
administrativa configuradores de enriquecimento ilícito, impõe-se o
correspondente sancionamento, nos moldes previstos no art. 12, I, da Lei
8.429/92.
13. Um dos corréus, para além da ação ímproba descrita no art. 9º,
VIII, e visando atuar nos quadros da Caixa Econômica Federal como avaliador,
prestou falsa declaração de que não desempenhava função pública com
dedicação exclusiva. Ato desleal, configurador da improbidade administrativa
violadora dos princípios da administração pública descrita no art. 11,
caput e inc. I, da Lei 8.429/92, que fica reconhecida como consequência da
análise do reexame necessário, que nos casos das ações civis públicas
por improbidade administrativa, ocorre "pro societate".
14. Mantidas, nos termos do art. 12 da Lei de Improbidade, as penas de perda
de bens e valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função
pública, suspensão dos direitos políticos por oito anos, pagamento de
multa civil no patamar de duas vezes o valor do acréscimo patrimonial,
proibição de licitar e contratar com o poder público pelo prazo de dez
anos, eis que impostas em atenção às circunstâncias e gravidade dos fatos,
bem como ao proveito patrimonial auferido pelos agentes públicos.
15. Remessa necessária parcialmente provida, unicamente para fixar
a condenação de I. F. S. nos termos do art. 9º, caput e inc. VIII,
c/c art. 11, caput e inc. I, da Lei 8.429/92. Desprovidos os recursos
de apelação e prejudicada a apelação interposta na Medida Cautelar
1999.61.05.016910-2, em apenso.
Ementa
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. APELAÇÕES E REMESSA OFICIAL. PRELIMINARES E PREJUDICIAIS
DE MÉRITO AFASTADAS. AGENTES DE INSPEÇÃO DO TRABALHO. EXERCÍCIO
DE ATIVIDADE EM EMPRESAS PRIVADAS SUJEITAS À FISCALIZAÇÃO PELOS
PRÓPRIOS AGENTES PÚBLICOS. ATO ÍMPROBO. CONFIGURAÇÃO. ART. 9º,
VIII, DA LEI 8.429/92. DECLARAÇÃO FALSA. ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO. ART. 11 DA MESMA LEI. IRRETROATIVIDADE DA LEI 8.429/92
SOBRE FATOS ANTERIORES À SUA VIGÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO PARCIALMENTE
PROVIDO. APELAÇÕES DESPROVIDAS COM RESSALVA DE FUNDAMENTAÇÃO. MEDIDA
CAUTELAR PREJUDICADA.
1. Não há falar-se em inconstitucionalidade da Lei 8.429/92, dado tratar-se
de norma que veio dar completude ao art. 37, § 4º, da Constituição da
República; ademais, sob a ótica formal, o C. STF, no julgamento da ADIN
2182/DF, declarou a constitucionalidade dessa Lei.
2. A jurisprudência do C. STJ pacificou entendimento de que a ação
civil pública consubstancia meio processual adequado para se postular
responsabilização por atos de improbidade administrativa, tendo o Ministério
Público legitimidade ativa para tanto, posto o seu dever constitucional de
promover, quando necessária, a reparação do erário, bem como a defesa
do patrimônio público (Súmula 139/STJ).
3. A admissão da União Federal como litisconsorte ativa do Ministério
Público Federal configura motivo suficiente à atração da competência
da Justiça Federal, consoante o art. 109, I, da Constituição Federal.
4. O art. 2º, caput, da Lei da Ação Civil Pública dispõe que "as ações
previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano,
cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa".
4. Como o local originário dos fatos - Jundiaí/SP - não era, à época
do ajuizamento, sede de Vara de Justiça Federal, reputa-se correto que a
ação tenha sido promovida ante a Subseção Judiciária de Campinas/SP,
que na oportunidade abarcava aquele município. Nesse sentido: STF, RE
228.955-9/RS, DJ: 24.03.2000.
5. A responsabilização decorrente de atos improbidade administrativa é
independente das sanções penais, civis e administrativas decorrentes dos
mesmos fatos.
6. Inexistiu violação ao preceito da identidade física do juiz, pois,
consoante jurisprudência do C. STJ, entre as exceções à aplicação desse
princípio, previstas no art. 132 do CPC, insere-se o afastamento por motivo
de férias, período em que é possível ao substituto proferir sentença,
ainda que colhida prova oral em audiência de instrução e julgamento pelo
magistrado originário, que a presidiu.
7. Mérito: ação civil pública pela qual o MPF e a União Federal
pleiteiam a aplicação, aos recorrentes, das sanções previstas na Lei de
Improbidade Administrativa, em razão de enriquecimento ilícito oriundo
de irregular acumulação de cargos públicos com atividades privadas,
inclusive com conflito de interesses, eis que, por ofício, os apelantes
deveriam fiscalizar as empresas privadas nas quais trabalhavam.
8. A Lei 8.429/92 é de natureza eminentemente sancionatória, não podendo
retroagir para alcançar fatos anteriores à respectiva vigência, ainda que
cometidos sob a égide da Constituição da República de 1988; portanto,
contrariamente ao registrado na sentença, somente as condutas perpetradas
após 03.06.1992, data em que essa Lei entrou em vigor, é que poderão ser
objeto de análise nesta ação civil pública.
9. Conforme bem demonstrado pelas provas coligidas, os recorrentes, servidores
públicos da área da fiscalização do trabalho, exerceram, dolosamente,
vínculo profissional externo em empresas privadas sujeitas a fiscalização
pelos próprios órgãos em que exerciam função pública.
10. Dentre as hipóteses de enriquecimento ilícito, objetivamente descritas no
art. 9º da Lei 8.429/92, destaca-se a prevista no seu inciso VIII: "aceitar
emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para
pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido
ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente
público, durante a atividade".
11. A improbidade descrita no art. 9º, VIII, da Lei 8.429/92, prescinde de
comprovação de que o uso da função pública tenha efetivamente gerado
benefícios às empresas privadas, ou de que algum ato de corrupção ou
desvio funcional tenha se concretizado, bastando, para a configuração
desse ilícito, a comprovação da dupla jornada com atuação dolosa,
em cenário de conflito de interesses. Doutrina e jurisprudência.
12. Evidente o cometimento, de forma dolosa, de atos de improbidade
administrativa configuradores de enriquecimento ilícito, impõe-se o
correspondente sancionamento, nos moldes previstos no art. 12, I, da Lei
8.429/92.
13. Um dos corréus, para além da ação ímproba descrita no art. 9º,
VIII, e visando atuar nos quadros da Caixa Econômica Federal como avaliador,
prestou falsa declaração de que não desempenhava função pública com
dedicação exclusiva. Ato desleal, configurador da improbidade administrativa
violadora dos princípios da administração pública descrita no art. 11,
caput e inc. I, da Lei 8.429/92, que fica reconhecida como consequência da
análise do reexame necessário, que nos casos das ações civis públicas
por improbidade administrativa, ocorre "pro societate".
14. Mantidas, nos termos do art. 12 da Lei de Improbidade, as penas de perda
de bens e valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função
pública, suspensão dos direitos políticos por oito anos, pagamento de
multa civil no patamar de duas vezes o valor do acréscimo patrimonial,
proibição de licitar e contratar com o poder público pelo prazo de dez
anos, eis que impostas em atenção às circunstâncias e gravidade dos fatos,
bem como ao proveito patrimonial auferido pelos agentes públicos.
15. Remessa necessária parcialmente provida, unicamente para fixar
a condenação de I. F. S. nos termos do art. 9º, caput e inc. VIII,
c/c art. 11, caput e inc. I, da Lei 8.429/92. Desprovidos os recursos
de apelação e prejudicada a apelação interposta na Medida Cautelar
1999.61.05.016910-2, em apenso.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária, negar provimento
às apelações e julgar prejudicada a Medida Cautelar 1999.61.05.016910-2,
em apenso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Data do Julgamento
:
14/12/2017
Data da Publicação
:
21/12/2017
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 743267
Órgão Julgador
:
SEXTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** LIA-92 LEI DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
LEG-FED LEI-8429 ANO-1992 ART-9 INC-8 ART-11 INC-1 ART-12 INC-1
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-37 PAR-4 ART-109 INC-1
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-139
***** LACP-85 LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA
LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-2
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-132
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/12/2017
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