TRF3 0017884-75.2008.4.03.6100 00178847520084036100
CIVIL E PROCESSO CIVIL. RESCISÃO DE CONTRATO FIRMADO NO ÂMBITO DO
SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. INÉCIA DA INICIAL. DENUNCIAÇÃO DA
LIDE. LEGITIMIDADE DA CEF. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. RESPONSABILIDADE DA
CEF E DOS VENDEDORES. SUCUMBÊNCIA.
1. Inépcia da inicial. Não prospera a alegação de que a inicial deveria
ter sido indeferida por ausência de causa de pedir e de pedido. A parte
autora formulou como pedido principal a rescisão do contrato de financiamento
imobiliário firmado no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação - SFH,
em razão de vícios de construção, e, consequentemente, na condenação da
ré à devolução dos valores pagos por força do contrato (prestações do
financiamento), inclusive a recomposição dos recursos do FGTS utilizados,
e, além disso, formulou um segundo pedido, cumulado, de condenação da
ré ao pagamento de indenização por danos morais. E a causa de pedir é
o surgimento de vícios de construção, conforme narração de fl. 04.
2. Denunciação da lide. Não se trata de denunciação da lide, pois a
denunciação da lide é fundada em direito de regresso do réu contra a pessoa
denunciada à lide. E, no caso, o que fundamentou a inclusão dos apelantes
no polo passivo não foi direito de regresso da CEF (ré indicada pela parte
autora) contra os apelantes TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e JOSÉ LUIZ DO
NASCIMENTO, mas sim a existência de litisconsórcio passivo necessário entres
todos os contratantes em relação ao pedido de rescisão do contrato. Com
efeito, depreende-se do contrato que: a) os apelantes TEREZINHA BEZERRA DO
NASCIMENTO e JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO figuraram no contrato como vendedores;
b) os autores, MARIA APARECIDA ALVES DE OLIVEIRA e CARLOS BEZERRA DA SILVA,
figuraram no contrato como devedores, compradores e devedores hipotecários;
e c) a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF figurou no contrato como credora do
financiamento e da garantia hipotecária. Assim, em síntese, os vendedores
comprometeram-se a vender o imóvel aos compradores, e, por sua vez, a CEF
comprometeu-se a financiar a aquisição do imóvel e liberar recursos do
FGTS, pagando o valor do imóvel aos vendedores, e, por fim, os compradores
comprometeram-se a efetuar o pagamento das prestações do financiamento à
CEF. Como se vê, trata-se de espécie de contrato complexo, isto é, aqueles
provenientes da combinação de elementos de diversos contratos típicos,
reunidos em novas figuras não previstas na norma jurídica, o qual, ademais,
envolve vários contratantes e diversas obrigações contrapostas. Portanto,
entende-se que a relação entre a CEF, os vendedores do imóvel e os
mutuários deve ser entendida como um negócio jurídico uno. Considerando que
a pretensão principal da parte autora é a rescisão deste contrato complexo,
que deve ser concebido de forma una, conclui-se que é imprescindível que
todos os contratantes integrem o polo passivo da presente ação, isto é,
que tanto a CEF quanto os vendedores integrem o polo passivo da presente
ação. Trata-se, portanto, de litisconsórcio passivo necessário entre
os demais contratantes, pois, em razão da natureza da relação jurídica
controvertida, a eficácia da sentença depende da citação de todos que devam
ser litisconsortes, conforme dispõe o art. 114 do Código de Processo Civil
de 2015, que corrigiu a imprecisão do códex anterior quanto à definição
do instituto, acolhendo o conceito há muito adotado pela doutrina. E a
apreciação do mérito deste processo (direito ou não à rescisão do
contrato e suas consequências) inevitavelmente afetará os vendedores, pois
eles foram um das contratantes. Ademais, o art. 472 do Código de Processo
Civil de 1973 veda que a sentença atinja terceiros que não participaram
do processo. Assim, não é possível analisar o pedido da parte autora sem
que a construtora seja incluída no polo passivo da ação. Aliás, no caso,
o litisconsórcio passivo não é apenas necessário, mas também é unitário,
porquanto, em razão da natureza da relação jurídica, o juiz tem de decidir
o mérito de modo uniforme para todos os litisconsortes, conforme dispõe o
art. 116 do Código de Processo Civil de 2015, que corrigiu a imprecisão do
códex anterior quanto à definição do instituto, acolhendo o conceito há
muito adotado pela doutrina. Isso porque, ou, se preenchidos os requisitos
para a rescisão, determina-se a rescisão do contrato em relação a todos
os contratantes e, consequentemente, determina-se o retorno ao status quo
anterior à realização do contrato. Ou, se não preenchidos os requisitos
para a rescisão, não se rescinde o contrato em relação a nenhum dos
contratantes. O que não é possível é a rescisão do contrato em relação
a uma parte dos contratantes, deixando de rescindi-lo em relação aos demais
contratantes. Vale dizer, em razão da natureza da relação jurídica,
o julgamento deve, necessariamente, ser uniforme para todos os litisconsortes.
3. Legitimidade da CEF. Em relação ao primeiro pedido (rescisão do
contrato de compra e venda do imóvel com financiamento e garantias), é
evidente que a CEF é parte legítima porquanto figurou no contrato. Inclusive,
depreende-se do contrato que a mutuária efetuava o pagamento das prestações
diretamente à CEF e esta repassa parte dos valores aos vendedores. Já em
relação ao segundo pedido (indenização por anos morais em decorrência
dos danos oriundos de vícios de construção), cumpre esclarecer o
seguinte. O Superior Tribunal de justiça firmou o entendimento no sentido
de que o ingresso da Caixa Econômica federal nos feitos em que se discute
indenização securitária no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação
não é automático, mas restrito aos contratos celebrados entre 02.12.1988 e
29.12.2009, e nas hipóteses em que o instrumento estiver vinculado ao Fundo de
Compensação de Variações Salariais - FCVS (apólices públicas, ramo 66),
desde que haja demonstração do comprometimento do FCVS, com risco efetivo de
exaurimento da reserva técnica do Fundo de Equalização de Sinistralidade
da Apólice - FESA. Portanto, para os contratos com apólice privada (Ramo
68), bem como para os contratos com cobertura do FCVS (apólices públicas,
Ramo 66), celebrados antes de 02.12.1988, não há interesse jurídico
firmado da CEF. No caso dos autos, o contrato de financiamento foi firmado
em 05/08/2005, estando compreendido no lapso temporal firmado pelo STJ. E,
tratando-se de contrato assinado posteriormente à vigência da Lei nº
7.682/1988, em período no qual a apólice é necessariamente pública e
garantida pelo FCVS, há potencial comprometimento dos recursos do FCVS,
razão pela qual resta confirmado o interesse da CEF na lide. Assim, resta
configurada a legitimidade passiva da CEF e, consequentemente, a competência
da Justiça Federal para processar e julgar a presente demanda.
4. Decadência e prescrição. Com relação ao prazo prescricional do
segundo pedido (pretensão indenizatória), havia, o termo inicial do prazo
prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve
ciência dos riscos materiais, pois a regra geral é que o termo inicial da
prescrição corresponde à ciência do fato gerador da pretensão, como
de todo modo estabelece o art. 206, § 1º, II, b, do Código Civil. No
caso dos autos, não se sabe ao certo a data em que apareceram os vícios
de construção, o sinistro foi comunicado pela mutuária à seguradora em
10/12/2005 e 10/04/2006, a CAIXAS SEGUROS S/A realizou vistoria no imóvel
em 23/10/2006, o termo de negativa de sinistro foi emitido em 27/10/2006,
a CEF contestou administrativamente a recusa de cobertura em 22/06/2007, a
CAIXAS SEGUROS S/A ratificou a recusa em 06/08/2007, o que foi informado aos
autores por meio de email juntado à fl. 118 (contudo, sem data) e, por fim, a
ação foi ajuizada em 24/07/2008. Assim, não transcorreu sequer um ano entre
a intimação dos autores acerca da ratificação da recusa e a propositura
da presente ação. Ademais, há de se ter em mente que, no caso, os danos
são progressivos e continuam a se agravar com o decorrer do tempo. Assim,
a segunda pretensão não se encontra fulminada pela prescrição. E, com
relação ao primeiro pedido (rescisão do contrato por vício redibitório),
a CEF suscita a ocorrência de decadência, nos termos do art. 445, §1º,
do CC. E, com relação ao primeiro pedido (rescisão do contrato por vício
redibitório), a CEF suscita a ocorrência de decadência, nos termos do
art. 445, §1º, do CC. Embora este dispositivo, de fato, estipule que o
adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no
prazo de um ano para os bens imóveis, quando o vício, por sua natureza,
só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em
que dele tiver ciência, entendo que, diante das peculiaridades do caso,
o prazo deve ser contado da data em que os autores tiveram ciência da
rejeição da contestação realizada pela CEF e confirmação da recusa
de cobertura pela CAIXA SEGUROS S/A. Isso porque, conforme se explicará
melhor do próximo tópico, o direito à redibição do contrato de compra e
venda surge com a aparição de vício oculto que atinge o próprio objeto
do contrato (imóvel), tornando-o impróprio ao uso a que é destinado
(vício redibitório). Assim, enquanto inexistente decisão definitiva
quanto à recusa de cobertura, não é possível considerar que o imóvel
havia se tornado impróprio ao uso a que é destinado, tendo em vista que,
se a seguradora tivesse realizado a recuperação do imóvel, ele não teria
se tornado improprio para moradia. Por esta razão, entendo que o imóvel
somente se tornou inequivocamente impróprio ao uso a que é destinado com
a ratificação da recusa pela CAIXA SEGUROS S/A em 06/08/2007, o que foi
informado aos autores por meio de email juntado à fl. 118 (contudo, sem
data). Portanto, tendo a ação sido ajuizada em 24/07/2008, o primeiro pedido
(rescisão do contrato por vício redibitório) não se encontrava decaído.
5. Primeiro pedido: rescisão do contrato.
5.1. Requisitos para a rescisão. São 5 os requisitos da resolução do
contrato por vícios redibitórios: "a) que a coisa tenha sido recebida em
virtude de contrato comutativo, ou de doação com encargo; b) que se ressinta
de defeitos prejudiciais à sua utilização, ou lhe diminuam o valor; c)
que esses defeitos sejam ocultos; d) que sejam graves; e) que já existam no
momento da celebração do contrato". No caso dos autos, estão preenchidos
os requisitos para a resolução do contrato. O contrato de compra e venda é
o típico contrato cumutativo, em que há prestações certas, recíprocas e
equivalentes. Os vícios de construção que atingem a estrutura do imóvel,
criando, inclusive, risco de desabamento, conforme atestado pelas vistorias
e perícia judicial, tornam o imóvel impróprio para habitação (isto é,
para o fim ao qual se destina). Conforme confirmado pelas partes, os vícios
de construção não eram visíveis no momento da celebração do contrato
de compra e venda com financiamento da CEF. Considerando o iminente risco de
desabamento, é evidente que os vícios são graves. E, por fim, tratando-se
de vícios de construção, eles estavam presentes no imóvel desde a sua
construção. Ressalto, ainda, que os vendedores, Sra. TEREZINHA BEZERRA DO
NASCIMENTO e Sr. JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO, em suas razões de apelação,
primeiro afirmam que os compradores, Sra. MARIA APARECIDA ALVES DE OLIVEIRA
e Sr. CARLOS BEZERRA DA SILVA, tinham ciência dos vícios no momento da
compra, pois "Os vícios eram aparentes, ou seja, perceptíveis a individuo
de mediana determinação" (fl. 439), e, em seguida, sustenta que o imóvel
não possuía vícios, pois "embora o imóvel tivesse um modesto acabamento,
apresentada boas condições de habitação" (fl. 439). Consigno que tais
afirmações são contraditórias: ou a apelante reconhece que havia
vícios, mas defende que estes eram aparentes e, portanto, não geram
direito à redibição, pois os autores já tinham ciência deles quando
da compra, ou afirma que não havia vícios aparentes no momento da venda,
apresentando o imóvel boas condições de habitação. Não obstante isto,
passo à apreciação das alegações. Com relação a primeira, verifico
que a parte apelante não trouxe qualquer prova aos autos de que os vícios
eram aparentes e que os autores já tinham ciência deles quando da compra,
tratando de mera alegação, desprovida de qualquer prova. O laudo invocado
pelos apelantes, que afirma que os vícios eram aparentes, foi elaborado em
20/05/2007, isto é, muito após a data em que isto é, muito após a data
em que à data do contrato de compra e venda (05/08/2005). Assim sendo,
este laudo não é capaz de comprovar que os vícios já fossem aparentes
no momento da contratação, sendo possível que estes tenham aparecido na
data alegada pelos compradores, isto é, em 10/04/2006, conforme o aviso de
sinistro de fl. 63. Com relação à segunda alegação de que, no momento da
venda, o imóvel estava em plenas condições de habitação, sem quaisquer
vícios, friso apenas que isso é irrelevante, pois, tratando-se de vícios
de construção, eles estavam presentes (embora ocultos) desde o momento da
construção do imóvel e o Código Civil prevê o direito à redibição
nestes casos. Ademais, quanto à ciência dos vendedores, ora apelantes,
consigno que, nos termos do art. 443 do Código Civil de 2002, se o vendedor
não tinha ciência do vicio oculto ele responde pela restituição o
valor recebido e ressarcimento das despesas do contrato, porém, se o
vendedor tinha ciência do vício, além de responder pela restituição
o valor recebido e ressarcimento das despesas do contrato, responderá por
perdas e danos. Assim, resta claro que a rescisão do contrato não é uma
punição por qualquer conduta culposa ou dolosa ou ilícita do vendedor. Mas
apenas a consequência jurídica que o ordenamento impõe para os casos de
constatação de vícios redibitórios. Sem prejuízo, poderão os apelantes
(vendedores) buscar a reparação de seus prejuízos junto à Construtora ou
quem tenha culpa pelos vícios de construção, em ação autônoma. Portanto,
a rescisão do contrato, determinada pela sentença, deve ser mantida.
5.2. Consequências da rescisão. A consequência da rescisão do contrato
pela constatação de vícios redibitórios é o retorno ao statu quo
ante, isto é, as partes devem retornar à posição jurídica em que se
encontravam antes da celebração do contrato. É por esta razão que, de
um lado, deve o alienante devolver ao comprador as parcelas recebidas em
razão do contrato rescindido, e, de outro, deve o comprador devolver o bem
ao alienante, consoante se depreende do art. 1.103 do Código Civil de 1916
(equivalente ao Código Civil de 2002). Estes dispositivos determinam que:
(i) se o alienante conhecia o vício, ou o defeito, restituirá o que
recebeu e ainda pagará indenização por perdas e danos, e; (ii) se o
não conhecia, tão somente restituirá o valor recebido, mais as despesas
do contrato. Ademais, não se pode admitir que o alienante, que recebeu
valores em decorrência de contrato rescindido, permaneça com tais valores,
em atenção ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Isto
pois, uma vez rescindido o negócio jurídico que ensejou o pagamento
destes valores, desaparece a causa jurídica que justificava o domínio/a
titularidade do alienante sobre estes valores. No caso dos autos, conforme se
depreende do contrato, tanto a CEF quanto os réus, Sra. TEREZINHA BEZERRA DO
NASCIMENTO e Sr. JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO, receberam os valores pagos pelos
mutuários/compradores/autores através das prestações mensais. Assim, não
se pode admitir que os réus, Sra. TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e Sr. JOSÉ
LUIZ DO NASCIMENTO, e a ré CEF permaneçam na titularidade dos valores que
lhe forem entregues em razão de um negócio jurídico não mais existente,
sob pena de enriquecimento sem causa destes réus. Portanto, a condenação
da CEF e dos réus, Sra. TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e Sr. JOSÉ LUIZ
DO NASCIMENTO, à devolução dos valores recebidos em razão do contrato,
devidamente atualizados e acrescidos de juros, estipulada na sentença,
deve ser mantida. E, considerando que foram utilizados no contrato recursos
do FGTS da conta vinculada da autora, também está correta a determinação
da sentença de restituição à conta do FGTS dos valores dela retirados,
pois necessária ao retorno ao status quo ante.
6. Segundo pedido: indenização e/ou cobertura securitária.
6.1. Responsabilidade da CEF. Nos termos da jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça, é possível haver responsabilidade da CEF por
vícios de construção em imóveis adquiridos no âmbito do Sistema
Financeiro de Habitação - SFH. Todavia, a responsabilidade dependerá das
circunstâncias em que se verifica sua intervenção no caso concreto: a)
inexistirá responsabilidade da CEF, quando ela atuar como agente financeiro
em sentido estrito; b) existirá responsabilidade da CEF, quando ela como
agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para
pessoas de baixa ou baixíssima renda, isto é, nas hipóteses em que tenha
atuado, de algum modo, na elaboração do projeto, na escolha do terreno,
na execução das obras (construção) ou na fiscalização das obras do
empreendimento. No caso dos autos, de acordo com o contrato de fls. 13/22,
a CEF não financiou, no caso, nenhum empreendimento em construção, com
prazo de entrega. Ao contrário, trata-se de contrato de compra e venda com
garantia hipotecária e com utilização de recursos do FGTS dos compradores,
pelo qual os autores obtiveram recursos para financiar a compra de imóvel
de terceiros particulares (fls. 13 e 14). Assim, uma vez que do contrato se
vê claramente que a CEF não financia, no caso, um imóvel em construção,
mas tão somente libera recursos financeiros para que o comprador adquira de
terceiros imóvel já erigido, não há que se falar em responsabilidade da CEF
pelos vícios apresentados pelo imóvel financiado, já que não participou
do empreendimento, tendo atuado estritamente como agente financeiro. É
entendimento pacífico que, nestas hipóteses em que a CEF atua estritamente
como agente financeiro, a vistoria/perícia designada pela CEF não tem por
objetivo atestar a solidez ou a regularidade da obra, mas sim resguardar o
interesse da instituição financeira, uma vez que o imóvel financiado lhe
será dado em garantia. Logo, no caso, não há responsabilidade da CEF pelos
vícios de construção. Ressalto ainda que a ausência de responsabilidade
da CEF não afasta sua legitimidade para figurar no pólo passivo e, por
conseguinte, a competência da justiça federal. Isto pois a legitimidade é
questão preliminar, que deve ser analisada à luz dos critérios firmados
pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp repetitivo nº
1.091.393, ao passo que a responsabilidade é questão de mérito, apreciada
somente após a constatação da existência de legitimidade.
6.2. Responsabilidade dos vendedores do imóvel. Conforme já explicado acima,
nos termos do art. 443 do Código Civil de 2002, (i) se o vendedor não tinha
ciência do vicio oculto ele responde pela restituição o valor recebido
e ressarcimento das despesas do contrato; (ii) porém, se o vendedor tinha
ciência do vício, além de responder pela restituição o valor recebido e
ressarcimento das despesas do contrato, responderá por perdas e danos. Vale
dizer, os vendedores do imóvel que venha a apresentar vício oculto somente
responderá se tinha ciência do vício oculto no momento da venda e não
cientificou os compradores. No caso dos autos, não há qualquer prova de
que os vendedores tinham ciência do vício oculto no momento da venda do
imóvel, portanto também não há responsabilidade dos vendedores pelo
pagamento de indenização.
6.3. Responsabilidade da seguradora e da construtora. No caso dos autos,
a parte autora não incluiu no polo passivo a seguradora (que recusara a
cobertura na via administrativa) que poderia vir a responder pelos vícios
de construção em razão do contrato de seguro habitacional, tampouco a
construtora do imóvel, que também poderia vir a responder pelos vícios de
construção. Por esta razão, estando tão somente a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
- CEF, a Sra. TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e o Sr. JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO
no polo passivo, o fato de eles não possuírem responsabilidade em relação
ao pagamento de indenização leva à improcedência do segundo pedido.
7. Sucumbência. Considerando que a parte autora obteve êxito em um de
seus pedidos e no outro não, é caso de sucumbência recíproca. Assim,
tratando-se de sucumbência recíproca, determino o rateio das custas e
despesas processuais e a compensação dos honorários advocatícios.
8. Apelação dos réus TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e JOSÉ LUIZ DO
NASCIMENTO desprovida. Apelação da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL provida apenas
para julgar improcedente o pedido indenizatório (segundo pedido), determinando
o rateio das custas e despesas processuais e a compensação dos honorários
advocatícios. Prejudicado o recurso de apelação da parte autora.
Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. RESCISÃO DE CONTRATO FIRMADO NO ÂMBITO DO
SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. INÉCIA DA INICIAL. DENUNCIAÇÃO DA
LIDE. LEGITIMIDADE DA CEF. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. RESPONSABILIDADE DA
CEF E DOS VENDEDORES. SUCUMBÊNCIA.
1. Inépcia da inicial. Não prospera a alegação de que a inicial deveria
ter sido indeferida por ausência de causa de pedir e de pedido. A parte
autora formulou como pedido principal a rescisão do contrato de financiamento
imobiliário firmado no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação - SFH,
em razão de vícios de construção, e, consequentemente, na condenação da
ré à devolução dos valores pagos por força do contrato (prestações do
financiamento), inclusive a recomposição dos recursos do FGTS utilizados,
e, além disso, formulou um segundo pedido, cumulado, de condenação da
ré ao pagamento de indenização por danos morais. E a causa de pedir é
o surgimento de vícios de construção, conforme narração de fl. 04.
2. Denunciação da lide. Não se trata de denunciação da lide, pois a
denunciação da lide é fundada em direito de regresso do réu contra a pessoa
denunciada à lide. E, no caso, o que fundamentou a inclusão dos apelantes
no polo passivo não foi direito de regresso da CEF (ré indicada pela parte
autora) contra os apelantes TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e JOSÉ LUIZ DO
NASCIMENTO, mas sim a existência de litisconsórcio passivo necessário entres
todos os contratantes em relação ao pedido de rescisão do contrato. Com
efeito, depreende-se do contrato que: a) os apelantes TEREZINHA BEZERRA DO
NASCIMENTO e JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO figuraram no contrato como vendedores;
b) os autores, MARIA APARECIDA ALVES DE OLIVEIRA e CARLOS BEZERRA DA SILVA,
figuraram no contrato como devedores, compradores e devedores hipotecários;
e c) a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF figurou no contrato como credora do
financiamento e da garantia hipotecária. Assim, em síntese, os vendedores
comprometeram-se a vender o imóvel aos compradores, e, por sua vez, a CEF
comprometeu-se a financiar a aquisição do imóvel e liberar recursos do
FGTS, pagando o valor do imóvel aos vendedores, e, por fim, os compradores
comprometeram-se a efetuar o pagamento das prestações do financiamento à
CEF. Como se vê, trata-se de espécie de contrato complexo, isto é, aqueles
provenientes da combinação de elementos de diversos contratos típicos,
reunidos em novas figuras não previstas na norma jurídica, o qual, ademais,
envolve vários contratantes e diversas obrigações contrapostas. Portanto,
entende-se que a relação entre a CEF, os vendedores do imóvel e os
mutuários deve ser entendida como um negócio jurídico uno. Considerando que
a pretensão principal da parte autora é a rescisão deste contrato complexo,
que deve ser concebido de forma una, conclui-se que é imprescindível que
todos os contratantes integrem o polo passivo da presente ação, isto é,
que tanto a CEF quanto os vendedores integrem o polo passivo da presente
ação. Trata-se, portanto, de litisconsórcio passivo necessário entre
os demais contratantes, pois, em razão da natureza da relação jurídica
controvertida, a eficácia da sentença depende da citação de todos que devam
ser litisconsortes, conforme dispõe o art. 114 do Código de Processo Civil
de 2015, que corrigiu a imprecisão do códex anterior quanto à definição
do instituto, acolhendo o conceito há muito adotado pela doutrina. E a
apreciação do mérito deste processo (direito ou não à rescisão do
contrato e suas consequências) inevitavelmente afetará os vendedores, pois
eles foram um das contratantes. Ademais, o art. 472 do Código de Processo
Civil de 1973 veda que a sentença atinja terceiros que não participaram
do processo. Assim, não é possível analisar o pedido da parte autora sem
que a construtora seja incluída no polo passivo da ação. Aliás, no caso,
o litisconsórcio passivo não é apenas necessário, mas também é unitário,
porquanto, em razão da natureza da relação jurídica, o juiz tem de decidir
o mérito de modo uniforme para todos os litisconsortes, conforme dispõe o
art. 116 do Código de Processo Civil de 2015, que corrigiu a imprecisão do
códex anterior quanto à definição do instituto, acolhendo o conceito há
muito adotado pela doutrina. Isso porque, ou, se preenchidos os requisitos
para a rescisão, determina-se a rescisão do contrato em relação a todos
os contratantes e, consequentemente, determina-se o retorno ao status quo
anterior à realização do contrato. Ou, se não preenchidos os requisitos
para a rescisão, não se rescinde o contrato em relação a nenhum dos
contratantes. O que não é possível é a rescisão do contrato em relação
a uma parte dos contratantes, deixando de rescindi-lo em relação aos demais
contratantes. Vale dizer, em razão da natureza da relação jurídica,
o julgamento deve, necessariamente, ser uniforme para todos os litisconsortes.
3. Legitimidade da CEF. Em relação ao primeiro pedido (rescisão do
contrato de compra e venda do imóvel com financiamento e garantias), é
evidente que a CEF é parte legítima porquanto figurou no contrato. Inclusive,
depreende-se do contrato que a mutuária efetuava o pagamento das prestações
diretamente à CEF e esta repassa parte dos valores aos vendedores. Já em
relação ao segundo pedido (indenização por anos morais em decorrência
dos danos oriundos de vícios de construção), cumpre esclarecer o
seguinte. O Superior Tribunal de justiça firmou o entendimento no sentido
de que o ingresso da Caixa Econômica federal nos feitos em que se discute
indenização securitária no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação
não é automático, mas restrito aos contratos celebrados entre 02.12.1988 e
29.12.2009, e nas hipóteses em que o instrumento estiver vinculado ao Fundo de
Compensação de Variações Salariais - FCVS (apólices públicas, ramo 66),
desde que haja demonstração do comprometimento do FCVS, com risco efetivo de
exaurimento da reserva técnica do Fundo de Equalização de Sinistralidade
da Apólice - FESA. Portanto, para os contratos com apólice privada (Ramo
68), bem como para os contratos com cobertura do FCVS (apólices públicas,
Ramo 66), celebrados antes de 02.12.1988, não há interesse jurídico
firmado da CEF. No caso dos autos, o contrato de financiamento foi firmado
em 05/08/2005, estando compreendido no lapso temporal firmado pelo STJ. E,
tratando-se de contrato assinado posteriormente à vigência da Lei nº
7.682/1988, em período no qual a apólice é necessariamente pública e
garantida pelo FCVS, há potencial comprometimento dos recursos do FCVS,
razão pela qual resta confirmado o interesse da CEF na lide. Assim, resta
configurada a legitimidade passiva da CEF e, consequentemente, a competência
da Justiça Federal para processar e julgar a presente demanda.
4. Decadência e prescrição. Com relação ao prazo prescricional do
segundo pedido (pretensão indenizatória), havia, o termo inicial do prazo
prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve
ciência dos riscos materiais, pois a regra geral é que o termo inicial da
prescrição corresponde à ciência do fato gerador da pretensão, como
de todo modo estabelece o art. 206, § 1º, II, b, do Código Civil. No
caso dos autos, não se sabe ao certo a data em que apareceram os vícios
de construção, o sinistro foi comunicado pela mutuária à seguradora em
10/12/2005 e 10/04/2006, a CAIXAS SEGUROS S/A realizou vistoria no imóvel
em 23/10/2006, o termo de negativa de sinistro foi emitido em 27/10/2006,
a CEF contestou administrativamente a recusa de cobertura em 22/06/2007, a
CAIXAS SEGUROS S/A ratificou a recusa em 06/08/2007, o que foi informado aos
autores por meio de email juntado à fl. 118 (contudo, sem data) e, por fim, a
ação foi ajuizada em 24/07/2008. Assim, não transcorreu sequer um ano entre
a intimação dos autores acerca da ratificação da recusa e a propositura
da presente ação. Ademais, há de se ter em mente que, no caso, os danos
são progressivos e continuam a se agravar com o decorrer do tempo. Assim,
a segunda pretensão não se encontra fulminada pela prescrição. E, com
relação ao primeiro pedido (rescisão do contrato por vício redibitório),
a CEF suscita a ocorrência de decadência, nos termos do art. 445, §1º,
do CC. E, com relação ao primeiro pedido (rescisão do contrato por vício
redibitório), a CEF suscita a ocorrência de decadência, nos termos do
art. 445, §1º, do CC. Embora este dispositivo, de fato, estipule que o
adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no
prazo de um ano para os bens imóveis, quando o vício, por sua natureza,
só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em
que dele tiver ciência, entendo que, diante das peculiaridades do caso,
o prazo deve ser contado da data em que os autores tiveram ciência da
rejeição da contestação realizada pela CEF e confirmação da recusa
de cobertura pela CAIXA SEGUROS S/A. Isso porque, conforme se explicará
melhor do próximo tópico, o direito à redibição do contrato de compra e
venda surge com a aparição de vício oculto que atinge o próprio objeto
do contrato (imóvel), tornando-o impróprio ao uso a que é destinado
(vício redibitório). Assim, enquanto inexistente decisão definitiva
quanto à recusa de cobertura, não é possível considerar que o imóvel
havia se tornado impróprio ao uso a que é destinado, tendo em vista que,
se a seguradora tivesse realizado a recuperação do imóvel, ele não teria
se tornado improprio para moradia. Por esta razão, entendo que o imóvel
somente se tornou inequivocamente impróprio ao uso a que é destinado com
a ratificação da recusa pela CAIXA SEGUROS S/A em 06/08/2007, o que foi
informado aos autores por meio de email juntado à fl. 118 (contudo, sem
data). Portanto, tendo a ação sido ajuizada em 24/07/2008, o primeiro pedido
(rescisão do contrato por vício redibitório) não se encontrava decaído.
5. Primeiro pedido: rescisão do contrato.
5.1. Requisitos para a rescisão. São 5 os requisitos da resolução do
contrato por vícios redibitórios: "a) que a coisa tenha sido recebida em
virtude de contrato comutativo, ou de doação com encargo; b) que se ressinta
de defeitos prejudiciais à sua utilização, ou lhe diminuam o valor; c)
que esses defeitos sejam ocultos; d) que sejam graves; e) que já existam no
momento da celebração do contrato". No caso dos autos, estão preenchidos
os requisitos para a resolução do contrato. O contrato de compra e venda é
o típico contrato cumutativo, em que há prestações certas, recíprocas e
equivalentes. Os vícios de construção que atingem a estrutura do imóvel,
criando, inclusive, risco de desabamento, conforme atestado pelas vistorias
e perícia judicial, tornam o imóvel impróprio para habitação (isto é,
para o fim ao qual se destina). Conforme confirmado pelas partes, os vícios
de construção não eram visíveis no momento da celebração do contrato
de compra e venda com financiamento da CEF. Considerando o iminente risco de
desabamento, é evidente que os vícios são graves. E, por fim, tratando-se
de vícios de construção, eles estavam presentes no imóvel desde a sua
construção. Ressalto, ainda, que os vendedores, Sra. TEREZINHA BEZERRA DO
NASCIMENTO e Sr. JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO, em suas razões de apelação,
primeiro afirmam que os compradores, Sra. MARIA APARECIDA ALVES DE OLIVEIRA
e Sr. CARLOS BEZERRA DA SILVA, tinham ciência dos vícios no momento da
compra, pois "Os vícios eram aparentes, ou seja, perceptíveis a individuo
de mediana determinação" (fl. 439), e, em seguida, sustenta que o imóvel
não possuía vícios, pois "embora o imóvel tivesse um modesto acabamento,
apresentada boas condições de habitação" (fl. 439). Consigno que tais
afirmações são contraditórias: ou a apelante reconhece que havia
vícios, mas defende que estes eram aparentes e, portanto, não geram
direito à redibição, pois os autores já tinham ciência deles quando
da compra, ou afirma que não havia vícios aparentes no momento da venda,
apresentando o imóvel boas condições de habitação. Não obstante isto,
passo à apreciação das alegações. Com relação a primeira, verifico
que a parte apelante não trouxe qualquer prova aos autos de que os vícios
eram aparentes e que os autores já tinham ciência deles quando da compra,
tratando de mera alegação, desprovida de qualquer prova. O laudo invocado
pelos apelantes, que afirma que os vícios eram aparentes, foi elaborado em
20/05/2007, isto é, muito após a data em que isto é, muito após a data
em que à data do contrato de compra e venda (05/08/2005). Assim sendo,
este laudo não é capaz de comprovar que os vícios já fossem aparentes
no momento da contratação, sendo possível que estes tenham aparecido na
data alegada pelos compradores, isto é, em 10/04/2006, conforme o aviso de
sinistro de fl. 63. Com relação à segunda alegação de que, no momento da
venda, o imóvel estava em plenas condições de habitação, sem quaisquer
vícios, friso apenas que isso é irrelevante, pois, tratando-se de vícios
de construção, eles estavam presentes (embora ocultos) desde o momento da
construção do imóvel e o Código Civil prevê o direito à redibição
nestes casos. Ademais, quanto à ciência dos vendedores, ora apelantes,
consigno que, nos termos do art. 443 do Código Civil de 2002, se o vendedor
não tinha ciência do vicio oculto ele responde pela restituição o
valor recebido e ressarcimento das despesas do contrato, porém, se o
vendedor tinha ciência do vício, além de responder pela restituição
o valor recebido e ressarcimento das despesas do contrato, responderá por
perdas e danos. Assim, resta claro que a rescisão do contrato não é uma
punição por qualquer conduta culposa ou dolosa ou ilícita do vendedor. Mas
apenas a consequência jurídica que o ordenamento impõe para os casos de
constatação de vícios redibitórios. Sem prejuízo, poderão os apelantes
(vendedores) buscar a reparação de seus prejuízos junto à Construtora ou
quem tenha culpa pelos vícios de construção, em ação autônoma. Portanto,
a rescisão do contrato, determinada pela sentença, deve ser mantida.
5.2. Consequências da rescisão. A consequência da rescisão do contrato
pela constatação de vícios redibitórios é o retorno ao statu quo
ante, isto é, as partes devem retornar à posição jurídica em que se
encontravam antes da celebração do contrato. É por esta razão que, de
um lado, deve o alienante devolver ao comprador as parcelas recebidas em
razão do contrato rescindido, e, de outro, deve o comprador devolver o bem
ao alienante, consoante se depreende do art. 1.103 do Código Civil de 1916
(equivalente ao Código Civil de 2002). Estes dispositivos determinam que:
(i) se o alienante conhecia o vício, ou o defeito, restituirá o que
recebeu e ainda pagará indenização por perdas e danos, e; (ii) se o
não conhecia, tão somente restituirá o valor recebido, mais as despesas
do contrato. Ademais, não se pode admitir que o alienante, que recebeu
valores em decorrência de contrato rescindido, permaneça com tais valores,
em atenção ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Isto
pois, uma vez rescindido o negócio jurídico que ensejou o pagamento
destes valores, desaparece a causa jurídica que justificava o domínio/a
titularidade do alienante sobre estes valores. No caso dos autos, conforme se
depreende do contrato, tanto a CEF quanto os réus, Sra. TEREZINHA BEZERRA DO
NASCIMENTO e Sr. JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO, receberam os valores pagos pelos
mutuários/compradores/autores através das prestações mensais. Assim, não
se pode admitir que os réus, Sra. TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e Sr. JOSÉ
LUIZ DO NASCIMENTO, e a ré CEF permaneçam na titularidade dos valores que
lhe forem entregues em razão de um negócio jurídico não mais existente,
sob pena de enriquecimento sem causa destes réus. Portanto, a condenação
da CEF e dos réus, Sra. TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e Sr. JOSÉ LUIZ
DO NASCIMENTO, à devolução dos valores recebidos em razão do contrato,
devidamente atualizados e acrescidos de juros, estipulada na sentença,
deve ser mantida. E, considerando que foram utilizados no contrato recursos
do FGTS da conta vinculada da autora, também está correta a determinação
da sentença de restituição à conta do FGTS dos valores dela retirados,
pois necessária ao retorno ao status quo ante.
6. Segundo pedido: indenização e/ou cobertura securitária.
6.1. Responsabilidade da CEF. Nos termos da jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça, é possível haver responsabilidade da CEF por
vícios de construção em imóveis adquiridos no âmbito do Sistema
Financeiro de Habitação - SFH. Todavia, a responsabilidade dependerá das
circunstâncias em que se verifica sua intervenção no caso concreto: a)
inexistirá responsabilidade da CEF, quando ela atuar como agente financeiro
em sentido estrito; b) existirá responsabilidade da CEF, quando ela como
agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para
pessoas de baixa ou baixíssima renda, isto é, nas hipóteses em que tenha
atuado, de algum modo, na elaboração do projeto, na escolha do terreno,
na execução das obras (construção) ou na fiscalização das obras do
empreendimento. No caso dos autos, de acordo com o contrato de fls. 13/22,
a CEF não financiou, no caso, nenhum empreendimento em construção, com
prazo de entrega. Ao contrário, trata-se de contrato de compra e venda com
garantia hipotecária e com utilização de recursos do FGTS dos compradores,
pelo qual os autores obtiveram recursos para financiar a compra de imóvel
de terceiros particulares (fls. 13 e 14). Assim, uma vez que do contrato se
vê claramente que a CEF não financia, no caso, um imóvel em construção,
mas tão somente libera recursos financeiros para que o comprador adquira de
terceiros imóvel já erigido, não há que se falar em responsabilidade da CEF
pelos vícios apresentados pelo imóvel financiado, já que não participou
do empreendimento, tendo atuado estritamente como agente financeiro. É
entendimento pacífico que, nestas hipóteses em que a CEF atua estritamente
como agente financeiro, a vistoria/perícia designada pela CEF não tem por
objetivo atestar a solidez ou a regularidade da obra, mas sim resguardar o
interesse da instituição financeira, uma vez que o imóvel financiado lhe
será dado em garantia. Logo, no caso, não há responsabilidade da CEF pelos
vícios de construção. Ressalto ainda que a ausência de responsabilidade
da CEF não afasta sua legitimidade para figurar no pólo passivo e, por
conseguinte, a competência da justiça federal. Isto pois a legitimidade é
questão preliminar, que deve ser analisada à luz dos critérios firmados
pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp repetitivo nº
1.091.393, ao passo que a responsabilidade é questão de mérito, apreciada
somente após a constatação da existência de legitimidade.
6.2. Responsabilidade dos vendedores do imóvel. Conforme já explicado acima,
nos termos do art. 443 do Código Civil de 2002, (i) se o vendedor não tinha
ciência do vicio oculto ele responde pela restituição o valor recebido
e ressarcimento das despesas do contrato; (ii) porém, se o vendedor tinha
ciência do vício, além de responder pela restituição o valor recebido e
ressarcimento das despesas do contrato, responderá por perdas e danos. Vale
dizer, os vendedores do imóvel que venha a apresentar vício oculto somente
responderá se tinha ciência do vício oculto no momento da venda e não
cientificou os compradores. No caso dos autos, não há qualquer prova de
que os vendedores tinham ciência do vício oculto no momento da venda do
imóvel, portanto também não há responsabilidade dos vendedores pelo
pagamento de indenização.
6.3. Responsabilidade da seguradora e da construtora. No caso dos autos,
a parte autora não incluiu no polo passivo a seguradora (que recusara a
cobertura na via administrativa) que poderia vir a responder pelos vícios
de construção em razão do contrato de seguro habitacional, tampouco a
construtora do imóvel, que também poderia vir a responder pelos vícios de
construção. Por esta razão, estando tão somente a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
- CEF, a Sra. TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e o Sr. JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO
no polo passivo, o fato de eles não possuírem responsabilidade em relação
ao pagamento de indenização leva à improcedência do segundo pedido.
7. Sucumbência. Considerando que a parte autora obteve êxito em um de
seus pedidos e no outro não, é caso de sucumbência recíproca. Assim,
tratando-se de sucumbência recíproca, determino o rateio das custas e
despesas processuais e a compensação dos honorários advocatícios.
8. Apelação dos réus TEREZINHA BEZERRA DO NASCIMENTO e JOSÉ LUIZ DO
NASCIMENTO desprovida. Apelação da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL provida apenas
para julgar improcedente o pedido indenizatório (segundo pedido), determinando
o rateio das custas e despesas processuais e a compensação dos honorários
advocatícios. Prejudicado o recurso de apelação da parte autora.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação dos réus TEREZINHA
BEZERRA DO NASCIMENTO e JOSÉ LUIZ DO NASCIMENTO, dar provimento ao recurso
de apelação da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL apenas para julgar improcedente
o pedido indenizatório (segundo pedido), determinando o rateio das custas
e despesas processuais e a compensação dos honorários advocatícios,
restando prejudicado o recurso de apelação da parte autora, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
20/08/2018
Data da Publicação
:
29/08/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1774691
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/08/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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