TRF3 0019244-31.2016.4.03.0000 00192443120164030000
PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. EXAME TOXICOLÓGICO. APLICAÇÃO
AOS CONDUTORES DE CATEGORIAS ESPECÍFICAS. INFRAÇÃO AO
PRINCÍPIO DA ISONOMIA. INEXISTÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL DO MOTORISTA
PROFISSIONAL. INDUÇÃO AO CONSUMO DE DROGAS. EXIGÊNCIA DE TESTE NA OBTENÇÃO
DE CNH E NOS CONTRATOS DE TRABALHO. INSTRUMENTO COMPLEMENTAR DE SEGURANÇA
NO TRÂNSITO. CREDENCIAMENTO DOS LABORATÓRIOS PELO DENATRAN. AUSÊNCIA DE
USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA. REVOGAÇÃO DE TUTELA PROVISÓRIA. AGRAVO DE
INSTRUMENTO PROVIDO.
I. A ABRATOX detém legitimidade recursal. Enquanto pessoa jurídica que
reúne entidades credenciadas pelo DENATRAN e interessadas, portanto,
juridicamente na manutenção do exame toxicológico, possui a condição
de terceiro prejudicado e pode recorrer das decisões proferidas na ação
(artigo 996 do CPC).
II. A exigência de exame toxicológico na obtenção e renovação de CNH
dos condutores das categorias C, D e E, bem como na admissão e demissão
de motorista profissional, não fere os princípios da isonomia, eficiência
e razoabilidade.
III. Embora o consumo de substâncias psicotrópicas seja também possível
nas categorias A e B, os motoristas profissionais exercem uma atividade que
potencializa o uso de drogas na direção de veículos automotores: viagens por
longa distância, condução noturna, sedentarismo, velocidade de maior risco
(rodovia), pavimentação precária, remuneração proporcional às entregas.
IV. Esses fatores tornam particularmente extenuante o transporte rodoviário,
forçando, para viabilidade do trabalho e da renda do trabalhador, a ingestão
de produtos estupefacientes e incrementando as possibilidades de acidentes. As
estatísticas oficiais revelam o grande envolvimento de veículos de carga
pesada nas fatalidades do trânsito.
V. Para garantir a segurança do transportador e dos membros da coletividade
- os atritos de ônibus e caminhões resultam, geralmente, na morte de maior
número de pessoas -, a Lei 13.103/2015 passou a exigir exame toxicológico
na obtenção e renovação de CNH (Resolução CONTRAN n° 583/2016). Não
se trata de discriminação da categoria, mas de medida necessária ao
desempenho seguro da atividade, abalado pela associação cientificamente
comprovada entre uso de drogas e colisões com meios de transporte pesados.
VI. O teste toxicológico naturalmente não se propõe ao papel de garantidor
exclusivo de segurança no trânsito. Como toda política pública, está
sujeito a insuficiências e burlas - suspensão do consumo nos nove dias
anteriores à avaliação médica. Entretanto, será exigido no momento da
própria habilitação profissional, alcançando um número considerável
de negligentes ou de usuários que não puderem iniciar uma abstinência e
complementando outras ações de fiscalização - abordagem, bafômetro.
VII. A necessidade de exame na admissão e demissão de motoristas
empregados amplia o campo de efetividade do instrumento (artigo 6° da Lei
n° 13.103/2015 e Portaria MTPS n° 116/2015), porquanto a contratação e
a dispensa representam eventos menos previsíveis e podem reduzir as margens
de manipulação.
VIII. Na verdade, o questionamento sobre a eficácia do teste ultrapassa os
limites do conflito apreciável pelo Poder Judiciário, ao qual não compete
a formulação de políticas públicas, inclusive através de supressão
de providências já tomadas. Os Poderes Legislativo e Executivo possuem
atribuições para definir o melhor modo de satisfação do interesse público
no trânsito.
IX. A imposição de análise toxicológica nos contratos de trabalho tampouco
gera discriminação em relação ao trabalhador autônomo. Este está
sujeito, da mesma forma, ao controle de consumo de drogas - na obtenção
e renovação da CNH. A sujeição não constitui exclusividade do empregado.
X. O legislador simplesmente estendeu a exigência para a admissão e
demissão, porque a segurança do ambiente de trabalho representa dever do
empregador, na forma de medicina preventiva (artigo 168, §6°, da CLT). O
mecanismo visa a possibilitar a execução segura do ofício em regime de
subordinação, evitando danos à saúde do profissional e à dos membros
da coletividade - deveres inexistentes na contratação de autônomo.
XI. A demarcação das competências para a operacionalização do exame
toxicológico também não demonstra irregularidade. Além de a atribuição
ao DENATRAN do credenciamento dos laboratórios decorrer diretamente da
própria Lei n° 13.103/2015 - em atenção à pertinência temática com
trânsito -, as atividades da ANVISA não restaram superadas.
XII. A Resolução CONTRAN n° 583/2016 prevê que a autarquia credenciará os
postos de coleta de material biológico, o que corresponde a uma típica medida
de vigilância sanitária - controle de serviços que envolvem a saúde humana,
nos termos do artigo 6°, §1°, da Lei n° 8.080/1990. Já o credenciamento
dos laboratórios para o próprio teste compreende basicamente aspectos
de metrologia legal, especificamente segurança técnica do procedimento
(artigo 2°, §1°, da Lei n° 9.933/1999).
XIII. Segundo a Portaria MTPS n° 116/2015, o ato do DENATRAN depende de
prévia acreditação da entidade junto ao INMETRO. Com a demonstração da
conformidade do serviço oferecido, o órgão executivo de trânsito da União
autorizará a realização de análise voltada à segurança no trânsito,
conforme as especificações técnicas do setor.
XIV. Como se percebe, inexiste a apropriação de competência de outro
órgão ou entidade, mas o exercício de atribuições próprias, que
respeitam a intervenção do único organismo exigível (INMETRO).
XV. Ademais, em termos de estruturação operacional do serviço, o site
do DENATRAN informa que seis laboratórios foram credenciados, com grande
capacidade de atendimento, e novas habilitações ocorrerão brevemente. Os
postos de coleta de material biológico também estão disseminados por
diversos municípios.
XVI. Nessas circunstâncias, prevalece a presunção de legitimidade do ato
administrativo, que não restou destruída por menções genéricas a uma
suposta deficiência operacional ou "lobby" das entidades credenciadas.
XVII. Agravo de instrumento a que se dá provimento. Revogação de tutela
provisória.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. EXAME TOXICOLÓGICO. APLICAÇÃO
AOS CONDUTORES DE CATEGORIAS ESPECÍFICAS. INFRAÇÃO AO
PRINCÍPIO DA ISONOMIA. INEXISTÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL DO MOTORISTA
PROFISSIONAL. INDUÇÃO AO CONSUMO DE DROGAS. EXIGÊNCIA DE TESTE NA OBTENÇÃO
DE CNH E NOS CONTRATOS DE TRABALHO. INSTRUMENTO COMPLEMENTAR DE SEGURANÇA
NO TRÂNSITO. CREDENCIAMENTO DOS LABORATÓRIOS PELO DENATRAN. AUSÊNCIA DE
USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA. REVOGAÇÃO DE TUTELA PROVISÓRIA. AGRAVO DE
INSTRUMENTO PROVIDO.
I. A ABRATOX detém legitimidade recursal. Enquanto pessoa jurídica que
reúne entidades credenciadas pelo DENATRAN e interessadas, portanto,
juridicamente na manutenção do exame toxicológico, possui a condição
de terceiro prejudicado e pode recorrer das decisões proferidas na ação
(artigo 996 do CPC).
II. A exigência de exame toxicológico na obtenção e renovação de CNH
dos condutores das categorias C, D e E, bem como na admissão e demissão
de motorista profissional, não fere os princípios da isonomia, eficiência
e razoabilidade.
III. Embora o consumo de substâncias psicotrópicas seja também possível
nas categorias A e B, os motoristas profissionais exercem uma atividade que
potencializa o uso de drogas na direção de veículos automotores: viagens por
longa distância, condução noturna, sedentarismo, velocidade de maior risco
(rodovia), pavimentação precária, remuneração proporcional às entregas.
IV. Esses fatores tornam particularmente extenuante o transporte rodoviário,
forçando, para viabilidade do trabalho e da renda do trabalhador, a ingestão
de produtos estupefacientes e incrementando as possibilidades de acidentes. As
estatísticas oficiais revelam o grande envolvimento de veículos de carga
pesada nas fatalidades do trânsito.
V. Para garantir a segurança do transportador e dos membros da coletividade
- os atritos de ônibus e caminhões resultam, geralmente, na morte de maior
número de pessoas -, a Lei 13.103/2015 passou a exigir exame toxicológico
na obtenção e renovação de CNH (Resolução CONTRAN n° 583/2016). Não
se trata de discriminação da categoria, mas de medida necessária ao
desempenho seguro da atividade, abalado pela associação cientificamente
comprovada entre uso de drogas e colisões com meios de transporte pesados.
VI. O teste toxicológico naturalmente não se propõe ao papel de garantidor
exclusivo de segurança no trânsito. Como toda política pública, está
sujeito a insuficiências e burlas - suspensão do consumo nos nove dias
anteriores à avaliação médica. Entretanto, será exigido no momento da
própria habilitação profissional, alcançando um número considerável
de negligentes ou de usuários que não puderem iniciar uma abstinência e
complementando outras ações de fiscalização - abordagem, bafômetro.
VII. A necessidade de exame na admissão e demissão de motoristas
empregados amplia o campo de efetividade do instrumento (artigo 6° da Lei
n° 13.103/2015 e Portaria MTPS n° 116/2015), porquanto a contratação e
a dispensa representam eventos menos previsíveis e podem reduzir as margens
de manipulação.
VIII. Na verdade, o questionamento sobre a eficácia do teste ultrapassa os
limites do conflito apreciável pelo Poder Judiciário, ao qual não compete
a formulação de políticas públicas, inclusive através de supressão
de providências já tomadas. Os Poderes Legislativo e Executivo possuem
atribuições para definir o melhor modo de satisfação do interesse público
no trânsito.
IX. A imposição de análise toxicológica nos contratos de trabalho tampouco
gera discriminação em relação ao trabalhador autônomo. Este está
sujeito, da mesma forma, ao controle de consumo de drogas - na obtenção
e renovação da CNH. A sujeição não constitui exclusividade do empregado.
X. O legislador simplesmente estendeu a exigência para a admissão e
demissão, porque a segurança do ambiente de trabalho representa dever do
empregador, na forma de medicina preventiva (artigo 168, §6°, da CLT). O
mecanismo visa a possibilitar a execução segura do ofício em regime de
subordinação, evitando danos à saúde do profissional e à dos membros
da coletividade - deveres inexistentes na contratação de autônomo.
XI. A demarcação das competências para a operacionalização do exame
toxicológico também não demonstra irregularidade. Além de a atribuição
ao DENATRAN do credenciamento dos laboratórios decorrer diretamente da
própria Lei n° 13.103/2015 - em atenção à pertinência temática com
trânsito -, as atividades da ANVISA não restaram superadas.
XII. A Resolução CONTRAN n° 583/2016 prevê que a autarquia credenciará os
postos de coleta de material biológico, o que corresponde a uma típica medida
de vigilância sanitária - controle de serviços que envolvem a saúde humana,
nos termos do artigo 6°, §1°, da Lei n° 8.080/1990. Já o credenciamento
dos laboratórios para o próprio teste compreende basicamente aspectos
de metrologia legal, especificamente segurança técnica do procedimento
(artigo 2°, §1°, da Lei n° 9.933/1999).
XIII. Segundo a Portaria MTPS n° 116/2015, o ato do DENATRAN depende de
prévia acreditação da entidade junto ao INMETRO. Com a demonstração da
conformidade do serviço oferecido, o órgão executivo de trânsito da União
autorizará a realização de análise voltada à segurança no trânsito,
conforme as especificações técnicas do setor.
XIV. Como se percebe, inexiste a apropriação de competência de outro
órgão ou entidade, mas o exercício de atribuições próprias, que
respeitam a intervenção do único organismo exigível (INMETRO).
XV. Ademais, em termos de estruturação operacional do serviço, o site
do DENATRAN informa que seis laboratórios foram credenciados, com grande
capacidade de atendimento, e novas habilitações ocorrerão brevemente. Os
postos de coleta de material biológico também estão disseminados por
diversos municípios.
XVI. Nessas circunstâncias, prevalece a presunção de legitimidade do ato
administrativo, que não restou destruída por menções genéricas a uma
suposta deficiência operacional ou "lobby" das entidades credenciadas.
XVII. Agravo de instrumento a que se dá provimento. Revogação de tutela
provisória.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
20/09/2017
Data da Publicação
:
28/09/2017
Classe/Assunto
:
AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 589900
Órgão Julgador
:
TERCEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/09/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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