TRF3 0019571-34.2001.4.03.6100 00195713420014036100
APELAÇÃO. REMESSA OFICIAL. AGRAVO RETIDO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE
ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONSUMIDOR. SERVIÇO DE TELEFONIA. ILEGALIDADE
DO PARÁGRAFO ÚNICO, DO ARTIGO 70, DA RESOLUÇÃO DA ANATEL Nº
85/98. RESOLUÇÃO REVOGADA. TEOR DA NORMA MANTIDA PELA RESOLUÇÃO Nº
632/2014 DA ANATEL. INCLUSÃO DE CONSUMIDORES INADIMPLENTES EM CADASTRO DE
SISTEMA DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA. PRELIMINAR
DE LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RECONHECIDA. AGRAVO RETIDO
NÃO PROVIDO. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO IMPROVIDAS.
1. A Lei da Ação Civil Pública e a Lei da Ação Popular integram o
microssistema processual coletivo. Portanto, apesar de a Lei nº 7347/85
não ter expressa previsão acerca da remessa oficial, aplica-se nos casos
de improcedência e carência da ação, por analogia, o artigo 19, da Lei
nº 4.717/65 (Lei da Ação Popular), uma vez que referida norma deve ser
aplicada em todo o microssistema, naquilo que for útil aos interesses da
sociedade. Nesse sentido é o entendimento sedimentado do E. Superior Tribunal
de Justiça. Assim, a r. sentença deve ser submetida ao reexame necessário.
2. Trata-se de recurso de apelação e remessa oficial contra sentença
proferida em Ação Civil Pública que extinguiu o feito sem resolução de
mérito, com fulcro no artigo 267, §3º, do Código de Processo Civil de
1973, acolhendo a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público
Federal sob o fundamento que a impugnação com relação à resolução da
ANATEL atinge interesses individuais dos interessados.
3. Ao analisar os autos percebe-se que a Ação Civil Pública objetiva a
proteção de interesse coletivo, uma vez que o Ministério Público Federal
requer a nulidade do parágrafo único, do artigo 70, da resolução 85 da
Anatel, o qual estabelece a possibilidade da prestadora dos serviços de
telefonia incluir os consumidores inadimplentes em sistemas de proteção
ao crédito.
4. Não há dúvidas que a norma contida em Resolução da Anatel afeta
os usuários dos serviços de telefonia coletivamente. Por conseguinte,
trata-se de interesse de natureza indivisível, tendo como titulares todos os
consumidores que possuem uma relação jurídica base com a concessionária
do serviço de telefonia.
5. Conforme previsão do artigo 129, incisos II e III da Constituição
Federal, art. 1º, incisos II e IV, C.C artigo 5º, ambos da Lei nº
7.347/85, bem como dos arts. 81 e 82, I, do Código de Defesa do Consumidor,
o Ministério Público possui legitimidade ativa para promover a defesa dos
direitos coletivos dos consumidores, inclusive no que se refere à prestação
de serviços públicos, haja vista a presunção de relevância da questão
para a coletividade. Precedentes do STJ. Assim, impõe-se o acolhimento da
preliminar.
6. O caso em tela trata-se de questão exclusivamente de direito, uma vez
que a análise de mérito comporta tão somente a análise de questão
de direito acerca da legalidade de norma de resolução da ANATEL à luz
da Constituição Federal, da Lei de Ação Civil Pública (Lei 7347/85),
do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), Código Civil e
da Lei Geral de Telecomunicações (Lei nº 9.472/97). Portanto, cabível
a análise do mérito conforme previsto no artigo 1013, § 3º, do NCPC
(correspondente ao artigo 515, §3º, do CPC de 1973).
7. A Resolução nº 85 da ANATEL foi revogada pela Resolução nº 426/2005,
a qual no que concerne aos direitos e obrigações dos consumidores e cobrança
de serviço foi revogada pela Resolução nº 632/2014 da ANATEL. No entanto,
a ação não perdeu o objeto, uma vez que o conteúdo do ato impugnado
foi repetido em sua essência na Resolução nº 632/2014 da ANATEL, a qual
continuou com a previsão de possibilidade de inserção do nome do consumidor
inadimplente em sistemas de proteção ao crédito nos artigos 91, inciso IV,
97, parágrafo único, e artigo 103.
8. Inexistência de ilegalidade da norma, uma vez que a inclusão do nome de
consumidores de serviços de telefonia inadimplentes em sistema de proteção
ao crédito não viola a dignidade da pessoa humana, os princípios previstos
no Código de Defesa do Consumidor, assim como não extrapola os limites da
Lei Geral de Telecomunicações.
9. A norma que prevê a inclusão do nome de consumidor inadimplente em
cadastro restritivo não pode ser considerada abusiva, muito menos fomenta ato
arbitrário da prestadora de serviço, não constituindo a norma impugnada
violação ao artigo 51 do Código de Defesa de Consumidor, não sendo a
norma incompatível com a boa-fé e a equidade.
10. Não se pode afirmar que a norma é abusiva por configurar dupla punição
ao consumidor, pelo fato de devido ao inadimplemento ocorrer a suspensão da
prestação de serviços. A suspensão dos serviços de telefonia tem o fim
de interromper um serviço a um consumidor que cumpriu com sua obrigação,
não beneficiando um consumidor inadimplente e impossibilitando com que ele
continue com a referida prática em detrimento da prestadora de serviços
públicos e consequentemente de toda a coletividade. Por sua vez, a inserção
do nome do consumidor em sistema de proteção ao crédito objetiva que
este pague a sua dívida, não deixando de ser uma sanção ao mal pagador,
bem como constitui o instrumento para que os empresários possam analisar
a credibilidade do consumidor.
11. A suspensão dos serviços de telefonia não configura violação ao
princípio da continuidade do serviço público, muito menos ao princípio
da supremacia do interesse público sobre o privado. Precedentes do E.STJ.
12. Preliminar acolhida para reconhecer a legitimidade ativa do Ministério
Público Federal.
13. Agravo retido conhecido e não provido. Remessa oficial, tida por
interposta, e apelação improvidas.
Ementa
APELAÇÃO. REMESSA OFICIAL. AGRAVO RETIDO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE
ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONSUMIDOR. SERVIÇO DE TELEFONIA. ILEGALIDADE
DO PARÁGRAFO ÚNICO, DO ARTIGO 70, DA RESOLUÇÃO DA ANATEL Nº
85/98. RESOLUÇÃO REVOGADA. TEOR DA NORMA MANTIDA PELA RESOLUÇÃO Nº
632/2014 DA ANATEL. INCLUSÃO DE CONSUMIDORES INADIMPLENTES EM CADASTRO DE
SISTEMA DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA. PRELIMINAR
DE LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RECONHECIDA. AGRAVO RETIDO
NÃO PROVIDO. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO IMPROVIDAS.
1. A Lei da Ação Civil Pública e a Lei da Ação Popular integram o
microssistema processual coletivo. Portanto, apesar de a Lei nº 7347/85
não ter expressa previsão acerca da remessa oficial, aplica-se nos casos
de improcedência e carência da ação, por analogia, o artigo 19, da Lei
nº 4.717/65 (Lei da Ação Popular), uma vez que referida norma deve ser
aplicada em todo o microssistema, naquilo que for útil aos interesses da
sociedade. Nesse sentido é o entendimento sedimentado do E. Superior Tribunal
de Justiça. Assim, a r. sentença deve ser submetida ao reexame necessário.
2. Trata-se de recurso de apelação e remessa oficial contra sentença
proferida em Ação Civil Pública que extinguiu o feito sem resolução de
mérito, com fulcro no artigo 267, §3º, do Código de Processo Civil de
1973, acolhendo a preliminar de ilegitimidade ativa do Ministério Público
Federal sob o fundamento que a impugnação com relação à resolução da
ANATEL atinge interesses individuais dos interessados.
3. Ao analisar os autos percebe-se que a Ação Civil Pública objetiva a
proteção de interesse coletivo, uma vez que o Ministério Público Federal
requer a nulidade do parágrafo único, do artigo 70, da resolução 85 da
Anatel, o qual estabelece a possibilidade da prestadora dos serviços de
telefonia incluir os consumidores inadimplentes em sistemas de proteção
ao crédito.
4. Não há dúvidas que a norma contida em Resolução da Anatel afeta
os usuários dos serviços de telefonia coletivamente. Por conseguinte,
trata-se de interesse de natureza indivisível, tendo como titulares todos os
consumidores que possuem uma relação jurídica base com a concessionária
do serviço de telefonia.
5. Conforme previsão do artigo 129, incisos II e III da Constituição
Federal, art. 1º, incisos II e IV, C.C artigo 5º, ambos da Lei nº
7.347/85, bem como dos arts. 81 e 82, I, do Código de Defesa do Consumidor,
o Ministério Público possui legitimidade ativa para promover a defesa dos
direitos coletivos dos consumidores, inclusive no que se refere à prestação
de serviços públicos, haja vista a presunção de relevância da questão
para a coletividade. Precedentes do STJ. Assim, impõe-se o acolhimento da
preliminar.
6. O caso em tela trata-se de questão exclusivamente de direito, uma vez
que a análise de mérito comporta tão somente a análise de questão
de direito acerca da legalidade de norma de resolução da ANATEL à luz
da Constituição Federal, da Lei de Ação Civil Pública (Lei 7347/85),
do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), Código Civil e
da Lei Geral de Telecomunicações (Lei nº 9.472/97). Portanto, cabível
a análise do mérito conforme previsto no artigo 1013, § 3º, do NCPC
(correspondente ao artigo 515, §3º, do CPC de 1973).
7. A Resolução nº 85 da ANATEL foi revogada pela Resolução nº 426/2005,
a qual no que concerne aos direitos e obrigações dos consumidores e cobrança
de serviço foi revogada pela Resolução nº 632/2014 da ANATEL. No entanto,
a ação não perdeu o objeto, uma vez que o conteúdo do ato impugnado
foi repetido em sua essência na Resolução nº 632/2014 da ANATEL, a qual
continuou com a previsão de possibilidade de inserção do nome do consumidor
inadimplente em sistemas de proteção ao crédito nos artigos 91, inciso IV,
97, parágrafo único, e artigo 103.
8. Inexistência de ilegalidade da norma, uma vez que a inclusão do nome de
consumidores de serviços de telefonia inadimplentes em sistema de proteção
ao crédito não viola a dignidade da pessoa humana, os princípios previstos
no Código de Defesa do Consumidor, assim como não extrapola os limites da
Lei Geral de Telecomunicações.
9. A norma que prevê a inclusão do nome de consumidor inadimplente em
cadastro restritivo não pode ser considerada abusiva, muito menos fomenta ato
arbitrário da prestadora de serviço, não constituindo a norma impugnada
violação ao artigo 51 do Código de Defesa de Consumidor, não sendo a
norma incompatível com a boa-fé e a equidade.
10. Não se pode afirmar que a norma é abusiva por configurar dupla punição
ao consumidor, pelo fato de devido ao inadimplemento ocorrer a suspensão da
prestação de serviços. A suspensão dos serviços de telefonia tem o fim
de interromper um serviço a um consumidor que cumpriu com sua obrigação,
não beneficiando um consumidor inadimplente e impossibilitando com que ele
continue com a referida prática em detrimento da prestadora de serviços
públicos e consequentemente de toda a coletividade. Por sua vez, a inserção
do nome do consumidor em sistema de proteção ao crédito objetiva que
este pague a sua dívida, não deixando de ser uma sanção ao mal pagador,
bem como constitui o instrumento para que os empresários possam analisar
a credibilidade do consumidor.
11. A suspensão dos serviços de telefonia não configura violação ao
princípio da continuidade do serviço público, muito menos ao princípio
da supremacia do interesse público sobre o privado. Precedentes do E.STJ.
12. Preliminar acolhida para reconhecer a legitimidade ativa do Ministério
Público Federal.
13. Agravo retido conhecido e não provido. Remessa oficial, tida por
interposta, e apelação improvidas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria,
conhecer do reexame necessário, nos termos do voto do Des. Fed. Marcelo
Saraiva (Relator), com quem votou o Des. Fed. André Nabarrete. Vencida
a Des. Fed. Marli Ferreira, que entendia que a remessa seria incabível,
não se aplicando o art. 19 da Lei n.º 4.717/65. E, à unanimidade,
acolheu a preliminar para reconhecer a legitimidade ativa do Ministério
Público Federal, negar provimento ao agravo retido interposto pela TELESP
CELULAR S/A., e negar provimento à remessa oficial, tida por interposta,
e ao recurso de apelação interposto pelo Ministério Público Federal,
nos termos do voto do des. Fed. Marcelo Saraiva (Relator).
Data do Julgamento
:
19/07/2017
Data da Publicação
:
21/08/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1147077
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFESA DO CONSUMIDOR. SERVIÇO DE
TELECOMUNICAÇÃO. RELAÇÃO DE CONSUMO.
Referência
legislativa
:
LEG-FED RES-85 ANO-1998 ART-70 PAR-ÚNICO
ANATEL
LEG-FED RES-632 ANO-2014 ART-91 INC-4 ART-97 PAR-ÚNICO ART-103
ANATEL
***** LAP-65 LEI DE AÇÃO POPULAR
LEG-FED LEI-4717 ANO-1965 ART-19
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-267 PAR-3
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-129 INC-2 INC-3
***** LACP-85 LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA
LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-1 INC-2 INC-4 ART-5
***** CDC-90 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-51
***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002
LEG-FED LEI-10406 ANO-2002
LEG-FED LEI-9472 ANO-1997
ORGANIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-1013 PAR-3
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-515 PAR-3
LEG-FED RES-426 ANO-2005
ANATEL
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2017
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