TRF3 0020265-51.2011.4.03.6100 00202655120114036100
ADMINISTRATIVO. AÇÃO COLETIVA. DANOS CAUSADOS SUPOSTAMENTE PELA
OMISSÃO DO ESTADO. CANCELAMENTO DE REPASSE DE VERBA PARA FINANCIAMENTO
DE MORADIA POPULAR. EXIGÊNCIA QUE O TERRENO FOSSE PÚBLICO. ÓBICE
INSTRANSPONÍVEL. AFASTADA A APLICAÇÃO DO CDC. APLICAÇÃO DO ART. 37,
§ 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. OBSERVÂNCIA DA LEGALIDADE ESTRITA PELA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO OU ATO COMISSIVO CAPAZ
DE GERAR DANO.
- Não se justifica a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e
do Código Civil ao presente caso, conforme suscitado pela apelante, uma
vez que não há relação de consumo entre as partes. A realização de
convênio para implementação de programas sociais é serviço público,
que pode ser definido como a atividade prestada direta ou indiretamente
pela Administração, que foi criada por lei específica e é regida por um
regime jurídico público para atender as necessidades da população. Não
se discute nesta ação um contrato habitacional, na maneira alegada pela
apelante, e sim um convênio que é um instrumento de ajustes de vontade,
com objetivo comum entre as partes particulares, sem a natureza de contrato.
- O art. 37, §6º, da Constituição Federal, consagra a responsabilidade
do Estado de indenizar os danos causados por atos, omissivos ou comissivos,
praticados pelos seus agentes a terceiros, independentemente de dolo ou culpa.
- Ademais, o ordenamento jurídico brasileiro adotou a "Teoria do Risco
Administrativo", pela qual a responsabilidade do Estado em indenizar é
objetiva, de modo que é suficiente a demonstração do nexo causal entre a
conduta lesiva imputável à administração e o dano. Desnecessário provar
a culpa do Estado, pois esta é presumida. Inverte-se o ônus da prova ao
Estado que, para se eximir da obrigação deverá provar que o evento danoso
ocorreu por culpa exclusiva da vítima.
- A 4ª Turma desta Corte já se posicionou no sentido de que, para fazer
jus ao ressarcimento em juízo, cabe à vítima provar o nexo de causalidade
entre o fato ofensivo (que, segundo a orientação do Supremo Tribunal Federal,
pode ser comissivo ou omissivo) e o dano, assim como o seu montante. De outro
lado, o poder público somente se desobrigará se provar a culpa exclusiva
do lesado.
- O ponto controvertido diz respeito ao reconhecimento, ou não, da
responsabilidade dos apelados por rescisão de convênio, considerado como
omissão dos entes públicos pela apelante, para fins de condenação em
pagamento de indenização.
- Os convênios são regidos pelo artigo 116 da Lei nº 8.666/93 e, de
acordo com este artigo, para serem firmados os convênios existem diversas
condições a serem observadas e, em caso eventuais impropriedades, o
convênio pode ser suspenso. Existe a possibilidade de rescisão do convênio.
- A apelante relatou que para se incluir no projeto da CDHU com a Igreja
Católica, a associação foi constituída para atender a exigência da
Lei nº 9.142, de 09 de março de 1995, do Estado de São Paulo, sendo que
os associados foram condicionados a um sistema de compras de terreno, com
compra e venda do terreno em 06/04/1996, com escritura lavrada em 11/01/2002,
mas por não ter sido o mutirão viabilizado pela CDHU, a associação foi
recadastrada pela COHAB, com encaminhamento para o convênio discutido na
presente ação, que iniciou no ano de 2004.
- A Lei n. 9.142, de 09 de março de 1995, do Estado de São Paulo, visava
direcionar os recursos existentes no Fundo de Financiamento e Investimento
para o Desenvolvimento Habitacional e Urbano, de que trata a Lei n. 6.756,
de 14 de março de 1990, e os recursos provenientes do ICMS, de acordo com a
Lei n. 7.646, de 26 de dezembro de 1991, ou de novas leis com teor similar,
para utilização exclusivamente em programas habitacionais sociais, para
população de baixa renda, sendo que parte desses recursos seria destinada
às Associações Comunitárias de Construção por Mutirão ou Cooperativas
Habitacionais sem fins lucrativos, cabendo à CDHU analisar os projetos
antes da aprovação.
- Os alegados danos materiais informados pela apelante seriam os valores
dispendidos pelos associados na compra do terreno para inclusão no projeto da
CDHU e a expectativa criada pelos associados em se inserir em algum programa
habitacional.
- Cada ente da administração pública responde exclusivamente pelas
condutas de seus agentes. Os apelados não cometeram qualquer ato ilícito
que possua ligação com os alegados danos materiais ou moral sofridos, pois o
convênio discutido na presente ação, que foi frustrado, iniciou anos após
a compra do imóvel pela apelante. É evidente que os associados da apelante
suportaram transtornos em razão de o programa de habitação não ter sido
implementado. Tal circunstância, sem sombra de dúvidas, é compreensível e
lamentável. Porém, tal situação não caracteriza negligência, imperícia
ou imprudência dos agentes das apeladas. Inegavelmente os associados da
apelante são pessoas carentes e necessitam de moradia.
- No entanto, existe um planejamento, que inclui decisão acerca da forma
como os projetos sociais serão elaborados, suas condições e os gastos
decorrentes.
- Assim, são desenvolvidos projetos para atendimento das pessoas carentes,
a exemplo do Sistema Financeiro da Habitação - SFH, que foi criado pela Lei
n. 4.380, de 21 de agosto de 1964, com a destinação de facilitar e promover
a construção e a aquisição da casa própria, especialmente pelas classes
de menor renda da população, ou do o Programa de Arrendamento Residencial -
PAR, instituído pela Lei n. 10.188/01, para o arrendamento de bens imóveis,
com opção de compra. Este programa visa atender famílias com renda de
até seis salários mínimos por mês, possibilitando uma substituição do
pagamento de aluguel por uma taxa de arrendamento, que poderá ser aproveitada
ao final do prazo do contrato caso haja opção pela compra do imóvel,
bem como do Programa Auxílio Aluguel, mantido pelo Município de São Paulo.
- Não há como se exigir da Administração Pública que sejam firmados
convênios, sem a observância das disposições legais, para financiar a
construção de imóveis em terreno de propriedade particular da apelante.
- A dissolução da associação, venda judicial do imóvel, levantamento da
hipoteca e renovação do mandato do presidente não dependem da intervenção
do Poder Judiciário. Tais procedimentos não são vinculados a nenhum dos
apelados e não houve qualquer interferência ou exigência dos mesmos de
manutenção da associação.
- Apelação improcedente.
Ementa
ADMINISTRATIVO. AÇÃO COLETIVA. DANOS CAUSADOS SUPOSTAMENTE PELA
OMISSÃO DO ESTADO. CANCELAMENTO DE REPASSE DE VERBA PARA FINANCIAMENTO
DE MORADIA POPULAR. EXIGÊNCIA QUE O TERRENO FOSSE PÚBLICO. ÓBICE
INSTRANSPONÍVEL. AFASTADA A APLICAÇÃO DO CDC. APLICAÇÃO DO ART. 37,
§ 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. OBSERVÂNCIA DA LEGALIDADE ESTRITA PELA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO OU ATO COMISSIVO CAPAZ
DE GERAR DANO.
- Não se justifica a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e
do Código Civil ao presente caso, conforme suscitado pela apelante, uma
vez que não há relação de consumo entre as partes. A realização de
convênio para implementação de programas sociais é serviço público,
que pode ser definido como a atividade prestada direta ou indiretamente
pela Administração, que foi criada por lei específica e é regida por um
regime jurídico público para atender as necessidades da população. Não
se discute nesta ação um contrato habitacional, na maneira alegada pela
apelante, e sim um convênio que é um instrumento de ajustes de vontade,
com objetivo comum entre as partes particulares, sem a natureza de contrato.
- O art. 37, §6º, da Constituição Federal, consagra a responsabilidade
do Estado de indenizar os danos causados por atos, omissivos ou comissivos,
praticados pelos seus agentes a terceiros, independentemente de dolo ou culpa.
- Ademais, o ordenamento jurídico brasileiro adotou a "Teoria do Risco
Administrativo", pela qual a responsabilidade do Estado em indenizar é
objetiva, de modo que é suficiente a demonstração do nexo causal entre a
conduta lesiva imputável à administração e o dano. Desnecessário provar
a culpa do Estado, pois esta é presumida. Inverte-se o ônus da prova ao
Estado que, para se eximir da obrigação deverá provar que o evento danoso
ocorreu por culpa exclusiva da vítima.
- A 4ª Turma desta Corte já se posicionou no sentido de que, para fazer
jus ao ressarcimento em juízo, cabe à vítima provar o nexo de causalidade
entre o fato ofensivo (que, segundo a orientação do Supremo Tribunal Federal,
pode ser comissivo ou omissivo) e o dano, assim como o seu montante. De outro
lado, o poder público somente se desobrigará se provar a culpa exclusiva
do lesado.
- O ponto controvertido diz respeito ao reconhecimento, ou não, da
responsabilidade dos apelados por rescisão de convênio, considerado como
omissão dos entes públicos pela apelante, para fins de condenação em
pagamento de indenização.
- Os convênios são regidos pelo artigo 116 da Lei nº 8.666/93 e, de
acordo com este artigo, para serem firmados os convênios existem diversas
condições a serem observadas e, em caso eventuais impropriedades, o
convênio pode ser suspenso. Existe a possibilidade de rescisão do convênio.
- A apelante relatou que para se incluir no projeto da CDHU com a Igreja
Católica, a associação foi constituída para atender a exigência da
Lei nº 9.142, de 09 de março de 1995, do Estado de São Paulo, sendo que
os associados foram condicionados a um sistema de compras de terreno, com
compra e venda do terreno em 06/04/1996, com escritura lavrada em 11/01/2002,
mas por não ter sido o mutirão viabilizado pela CDHU, a associação foi
recadastrada pela COHAB, com encaminhamento para o convênio discutido na
presente ação, que iniciou no ano de 2004.
- A Lei n. 9.142, de 09 de março de 1995, do Estado de São Paulo, visava
direcionar os recursos existentes no Fundo de Financiamento e Investimento
para o Desenvolvimento Habitacional e Urbano, de que trata a Lei n. 6.756,
de 14 de março de 1990, e os recursos provenientes do ICMS, de acordo com a
Lei n. 7.646, de 26 de dezembro de 1991, ou de novas leis com teor similar,
para utilização exclusivamente em programas habitacionais sociais, para
população de baixa renda, sendo que parte desses recursos seria destinada
às Associações Comunitárias de Construção por Mutirão ou Cooperativas
Habitacionais sem fins lucrativos, cabendo à CDHU analisar os projetos
antes da aprovação.
- Os alegados danos materiais informados pela apelante seriam os valores
dispendidos pelos associados na compra do terreno para inclusão no projeto da
CDHU e a expectativa criada pelos associados em se inserir em algum programa
habitacional.
- Cada ente da administração pública responde exclusivamente pelas
condutas de seus agentes. Os apelados não cometeram qualquer ato ilícito
que possua ligação com os alegados danos materiais ou moral sofridos, pois o
convênio discutido na presente ação, que foi frustrado, iniciou anos após
a compra do imóvel pela apelante. É evidente que os associados da apelante
suportaram transtornos em razão de o programa de habitação não ter sido
implementado. Tal circunstância, sem sombra de dúvidas, é compreensível e
lamentável. Porém, tal situação não caracteriza negligência, imperícia
ou imprudência dos agentes das apeladas. Inegavelmente os associados da
apelante são pessoas carentes e necessitam de moradia.
- No entanto, existe um planejamento, que inclui decisão acerca da forma
como os projetos sociais serão elaborados, suas condições e os gastos
decorrentes.
- Assim, são desenvolvidos projetos para atendimento das pessoas carentes,
a exemplo do Sistema Financeiro da Habitação - SFH, que foi criado pela Lei
n. 4.380, de 21 de agosto de 1964, com a destinação de facilitar e promover
a construção e a aquisição da casa própria, especialmente pelas classes
de menor renda da população, ou do o Programa de Arrendamento Residencial -
PAR, instituído pela Lei n. 10.188/01, para o arrendamento de bens imóveis,
com opção de compra. Este programa visa atender famílias com renda de
até seis salários mínimos por mês, possibilitando uma substituição do
pagamento de aluguel por uma taxa de arrendamento, que poderá ser aproveitada
ao final do prazo do contrato caso haja opção pela compra do imóvel,
bem como do Programa Auxílio Aluguel, mantido pelo Município de São Paulo.
- Não há como se exigir da Administração Pública que sejam firmados
convênios, sem a observância das disposições legais, para financiar a
construção de imóveis em terreno de propriedade particular da apelante.
- A dissolução da associação, venda judicial do imóvel, levantamento da
hipoteca e renovação do mandato do presidente não dependem da intervenção
do Poder Judiciário. Tais procedimentos não são vinculados a nenhum dos
apelados e não houve qualquer interferência ou exigência dos mesmos de
manutenção da associação.
- Apelação improcedente.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
21/02/2019
Data da Publicação
:
07/03/2019
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2310218
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Referência
legislativa
:
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-37 PAR-6
***** LC-93 LEI DE LICITAÇÕES
LEG-FED LEI-8666 ANO-1993 ART-116
LEG-EST LEI-9142 ANO-1995
SÃO PAULO
LEG-FED LEI-6756 ANO-1990
LEG-FED LEI-7646 ANO-1991
LEG-FED LEI-4380 ANO-1964
LEG-FED LEI-10188 ANO-2001
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/03/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão