TRF3 0020814-91.2017.4.03.9999 00208149120174039999
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSA. MISERABILIDADE
NÃO CONFIGURADA. AUXÍLIO DA FAMÍLIA. TRÊS IRMÃOS TITULARES DE
BENEFÍCIOS. RENDA TOTAL DE QUATRO SALÁRIOS MÍNIMOS. SUBSIDIARIEDADE
DA ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. HONORÁRIOS DE
ADVOGADO. APELAÇÃO PROVIDA, RESTANDO PREJUDICADO O AGRAVO INTERNO. REMESSA
OFICIAL NÃO CONHECIDA.
- A remessa oficial não deve ser conhecida, por ter sido proferida a sentença
na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do
duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico
for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. No caso, a toda evidência
não se excede esse montante.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93,
regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- A LOAS deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao
estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício
da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência
ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover
a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Quanto ao requisito da idade avançada, restou comprovado à luz dos
documentos constantes dos autos.
- No que toca à hipossuficiência, consta do estudo social que a autora
vive - em imóvel próprio - com três irmãos, todos eles titulares de
benefícios previdenciários ou assistencial, com renda total de 4 (quatro)
salários mínimos. Consta do CNIS que Iorismar e Idorival recebem benefícios
de aposentadoria por idade rural de um salário mínimo. Francisco recebe
aposentadoria por idade rural e pensão por morte, cada qual no valor de um
salário mínimo.
- Nos termos do artigo 20, § 1º, da LOAS, em princípio o irmão não
integraria o núcleo familiar. Todavia, no caso concreto, a autora vive em
família em situação de auxílio recíproco, pois ela cuida da saúde dos
mesmos. Não há como se olvidar a realidade social e simplesmente fingir
que a autora não recebe amparo da família.
- O critério do artigo 20, § 3º, da LOAS não é taxativo, consoante
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, devendo a hipossuficiência
ser aferida caso a caso (RE n. 580963). Logo, também a regra do artigo 20,
§ 1º, da LOAS não pode ser considerada "taxativa".
- Não há razoabilidade na interpretação que relativiza o parágrafo 3º
mas não relativiza o § 1º, pois ambos disciplinam, em última análise,
a questão da miserabilidade.
- Mesmo com a aplicação do artigo 34, § único, do Estatuto do Idoso,
a renda per capita é de 1 (um) salário mínimo.
- Não cabe ao Estado substituir as pessoas em suas respectivas obrigações
legais, mesmo porque os direitos sociais devem ser interpretados do ponto
de vista da sociedade, não do indivíduo.
- Não há dúvida de que se trata de família pobre, mas não pode ser
considerado miserável para fins assistenciais.
- Resta consignar que a Assistência Social, tal como regulada na
Constituição Federal e na Lei nº 8.742/93, tem caráter subsidiário em
relação às demais técnicas de proteção social (previdência social,
previdência privada, caridade, família, poupança etc), dada a gratuidade
de suas prestações.
- Com efeito, levando-se em conta o alto custo do pretendido "Estado de
bem-estar social", forjado no Brasil pela Constituição Federal de 1988
quando a grande maioria dos países europeus já haviam reconhecido sua
inviabilidade financeira, lícito é inferir que só deve ser prestada em
casos de real necessidade, dentro das estritas regras do direito material,
sob pena de comprometer a mesma proteção social não apenas das futuras
gerações, mas também da atual.
- Nesse diapasão, a proteção social baseada na solidariedade legal não
tem como finalidade cobrir contingências encontradas somente na letra da
lei (dever-ser) e não no mundo dos fatos (ser). Cabe, em casos que tais, à
sociedade (solidariedade social) prestar na medida do possível assistência
aos próximos.
- Pertinente, in casu, o ensinamento do professor de direito previdenciário
Wagner Balera, quando pondera a respeito da dimensão do princípio da
subsidiariedade: "O Estado é, sobretudo, o guardião dos direitos e garantias
dos indivíduos. Cumpre-lhe, assinala Leão XIII, agir em favor dos fracos
e dos indigentes exigindo que sejam, por todos respeitados os direitos dos
pequenos. Mas, segundo o princípio da subsidiariedade - que é noção
fundamental para a compreensão do conteúdo da doutrina social cristã - o
Estado não deve sobrepor-se aos indivíduos e aos grupos sociais na condução
do interesse coletivo. Há de se configurar uma permanente simbiose entre
o Estado e a sociedade, de tal sorte que ao primeiro não cabe destruir,
nem muito menos exaurir a dinâmica da vida social I (é o magistério de
Pio XI, na Encíclica comemorativa dos quarenta anos da 'Rerum Novarum', a
'Quadragésimo Anno', pontos 79-80)." (Centenárias Situações e Novidade da
'Rerum Novarum', p. 545).
- Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na
impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados
(artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam
possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não
terem renda ou de ser essa insignificante.
- Percebe-se, assim, que a autora, pobre embora, tem acesso aos mínimos
sociais, não se encontrando em situação de vulnerabilidade social.
- Remessa oficial não conhecida.
- Apelação do INSS provida.
- Diante da improcedência do pedido, resta prejudicado o agravo interno.
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSA. MISERABILIDADE
NÃO CONFIGURADA. AUXÍLIO DA FAMÍLIA. TRÊS IRMÃOS TITULARES DE
BENEFÍCIOS. RENDA TOTAL DE QUATRO SALÁRIOS MÍNIMOS. SUBSIDIARIEDADE
DA ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. HONORÁRIOS DE
ADVOGADO. APELAÇÃO PROVIDA, RESTANDO PREJUDICADO O AGRAVO INTERNO. REMESSA
OFICIAL NÃO CONHECIDA.
- A remessa oficial não deve ser conhecida, por ter sido proferida a sentença
na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do
duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico
for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. No caso, a toda evidência
não se excede esse montante.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93,
regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- A LOAS deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao
estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício
da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência
ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover
a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Quanto ao requisito da idade avançada, restou comprovado à luz dos
documentos constantes dos autos.
- No que toca à hipossuficiência, consta do estudo social que a autora
vive - em imóvel próprio - com três irmãos, todos eles titulares de
benefícios previdenciários ou assistencial, com renda total de 4 (quatro)
salários mínimos. Consta do CNIS que Iorismar e Idorival recebem benefícios
de aposentadoria por idade rural de um salário mínimo. Francisco recebe
aposentadoria por idade rural e pensão por morte, cada qual no valor de um
salário mínimo.
- Nos termos do artigo 20, § 1º, da LOAS, em princípio o irmão não
integraria o núcleo familiar. Todavia, no caso concreto, a autora vive em
família em situação de auxílio recíproco, pois ela cuida da saúde dos
mesmos. Não há como se olvidar a realidade social e simplesmente fingir
que a autora não recebe amparo da família.
- O critério do artigo 20, § 3º, da LOAS não é taxativo, consoante
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, devendo a hipossuficiência
ser aferida caso a caso (RE n. 580963). Logo, também a regra do artigo 20,
§ 1º, da LOAS não pode ser considerada "taxativa".
- Não há razoabilidade na interpretação que relativiza o parágrafo 3º
mas não relativiza o § 1º, pois ambos disciplinam, em última análise,
a questão da miserabilidade.
- Mesmo com a aplicação do artigo 34, § único, do Estatuto do Idoso,
a renda per capita é de 1 (um) salário mínimo.
- Não cabe ao Estado substituir as pessoas em suas respectivas obrigações
legais, mesmo porque os direitos sociais devem ser interpretados do ponto
de vista da sociedade, não do indivíduo.
- Não há dúvida de que se trata de família pobre, mas não pode ser
considerado miserável para fins assistenciais.
- Resta consignar que a Assistência Social, tal como regulada na
Constituição Federal e na Lei nº 8.742/93, tem caráter subsidiário em
relação às demais técnicas de proteção social (previdência social,
previdência privada, caridade, família, poupança etc), dada a gratuidade
de suas prestações.
- Com efeito, levando-se em conta o alto custo do pretendido "Estado de
bem-estar social", forjado no Brasil pela Constituição Federal de 1988
quando a grande maioria dos países europeus já haviam reconhecido sua
inviabilidade financeira, lícito é inferir que só deve ser prestada em
casos de real necessidade, dentro das estritas regras do direito material,
sob pena de comprometer a mesma proteção social não apenas das futuras
gerações, mas também da atual.
- Nesse diapasão, a proteção social baseada na solidariedade legal não
tem como finalidade cobrir contingências encontradas somente na letra da
lei (dever-ser) e não no mundo dos fatos (ser). Cabe, em casos que tais, à
sociedade (solidariedade social) prestar na medida do possível assistência
aos próximos.
- Pertinente, in casu, o ensinamento do professor de direito previdenciário
Wagner Balera, quando pondera a respeito da dimensão do princípio da
subsidiariedade: "O Estado é, sobretudo, o guardião dos direitos e garantias
dos indivíduos. Cumpre-lhe, assinala Leão XIII, agir em favor dos fracos
e dos indigentes exigindo que sejam, por todos respeitados os direitos dos
pequenos. Mas, segundo o princípio da subsidiariedade - que é noção
fundamental para a compreensão do conteúdo da doutrina social cristã - o
Estado não deve sobrepor-se aos indivíduos e aos grupos sociais na condução
do interesse coletivo. Há de se configurar uma permanente simbiose entre
o Estado e a sociedade, de tal sorte que ao primeiro não cabe destruir,
nem muito menos exaurir a dinâmica da vida social I (é o magistério de
Pio XI, na Encíclica comemorativa dos quarenta anos da 'Rerum Novarum', a
'Quadragésimo Anno', pontos 79-80)." (Centenárias Situações e Novidade da
'Rerum Novarum', p. 545).
- Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na
impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados
(artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam
possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não
terem renda ou de ser essa insignificante.
- Percebe-se, assim, que a autora, pobre embora, tem acesso aos mínimos
sociais, não se encontrando em situação de vulnerabilidade social.
- Remessa oficial não conhecida.
- Apelação do INSS provida.
- Diante da improcedência do pedido, resta prejudicado o agravo interno.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, conhecer da apelação e
lhe dar provimento e julgar, consequentemente, prejudicado o agravo interno,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
24/01/2018
Data da Publicação
:
08/02/2018
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2251052
Órgão Julgador
:
NONA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/02/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão