TRF3 0021613-71.2016.4.03.9999 00216137120164039999
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTE
NOCIVO RUÍDO. DO USO DE EPI. INAPLICABILIDADE DO ART. 57, § 8º, DA LEI
8.213/91. DA CORREÇÃO MONETÁRIA.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo
Civil de 1973, consigno que as situações jurídicas consolidadas serão
apreciadas em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina
o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.
2. O Código de Processo Civil de 1973 afasta a submissão da sentença
proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de
direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for
inferior a 60 (sessenta) salários mínimos (art. 475, inciso I e parágrafo
2º).
3. In casu, considerando os elementos dos autos - o INSS foi condenado a
implantar e pagar a aposentadoria especial desde 03/05//2011 (fls. 27, 48,
80), em virtude da condenação da autarquia ré, ocorrida em 31/03/2015,
por força de sentença que julgou a demanda procedente.
4. Em consulta ao extrato do CNIS (que ora determino a juntada), tem-se
que o último valor registrado de sua remuneração perfez R$ 4.016,13 em
abril/2018.
5. Assim, vislumbram-se nos autos elementos concretos que norteiam o valor
total da condenação. Pode-se estabelecer, portanto, que a sua proporção
com o valor do salário mínimo da época autoriza a concluir que a sentença,
de fato, sujeita-se ao reexame necessário, excedendo o valor de alçada de
60 salários mínimos que impõe a remessa oficial.
6. O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será
devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições),
ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20
(vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando
a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i)
a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter
exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente
nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve,
em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor,
admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de
reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não
previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade;
(iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem
intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas
normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP,
SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
7. A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas
alterações. Diante de tal evolução normativa e do princípio tempus
regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de
acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB
(até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior
a 85 dB, a partir de 19/11/2003. O C. STJ, quando do julgamento do Recurso
Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a
tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003:
"O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de
serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a
18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto
3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003,
que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB
(ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
8. O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese
segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento
de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço
especial para aposentadoria".
9. Não merece acolhida a alegação do INSS quanto ao uso de EPI, pois,
conforme já destacado, no caso de ruído, o fornecimento de equipamentos
de proteção individual não é suficiente para neutralizar a nocividade
do agente, tendo tal tema sido definido pelo E. STF quando do julgamento do
ARE 664335. Logo, não se divisa a alegada violação aos artigos 57 e 58,
da Lei 8.213/91.
10. Reitere-se que, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que
o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor
quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se
sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte
de custeio e de desequilíbrio financeiro e atuarial do Sistema Previdenciário
(195, §§ 5° e 6°, e art. 201, caput e §1°, ambos da CF/88 e artigo
57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da
respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim
à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
11. A sentença reconheceu como especial o período de 06/03/1997 a 04/05/2011,
em que o autor laborou na empresa Agrindus S/A Empresa Agrícola Pastoril,
estando exposto a ruído acima da tolerância legal.
12. O PPP de fls. 42/43 revela que, no período em apreço, a parte autora
se expôs, permanentemente, na forma do artigo 65, do RPS, a ruído de 90,0
dB a 92,5dB, na função de tratorista.
13. Considerando que se reconhece como especial o trabalho sujeito a ruído
superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a
18/11/2003); e superior a 85 dB (a partir de 19/11/2003), constata-se que
a decisão recorrida andou bem ao reconhecer o período em destaque, já
que neste a parte autora esteve exposta a níveis acima do tolerado pela
respectiva legislação de regência.
14. Para a caracterização da natureza especial da atividade sujeita ao
ruído, deve restar comprovada a exposição do segurado ao referido agente
nocivo de forma permanente, e não ocasional nem intermitente, em patamares
superiores aos definidos pelo REsp nº 1.398.260/PR.
15. Assim, considerada a função e o tempo da atividade exercida (tratorista,
de maio/1986 a maio/2011), com muito mais razão não se pode precisar,
em especial no período de 05/03/1997 a 18/11/2003, se o agente esteve
exposto ao agente nocivo dentro da tolerância legal quando há registro,
concomitante, de nocividade no mesmo período.
16. Bem por isso, inclusive aponto que há registro de observação da
periodicidade e trocas definidas por programas ambientais no PPP, condutas
típicas de atividades que estão sujeitas a agentes agressivos, não havendo
como concluir diversamente do raciocínio expendido pelo juízo singular, pela
condenação do INSS, no reconhecimento do período como atividade especial.
17. Considerando período de tempo enquadrado neste feito, tem-se que a parte
autora comprovou o labor em condições especiais por período superior a 25
anos, de sorte que ela faz jus à aposentadoria especial, a qual é devida
desde a data do requerimento administrativo, em função do quanto estabelecido
no artigo 57, §2° c.c. o artigo 49, I, b, ambos da Lei 8.213/91.
18. A inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido
pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que
foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão
geral). Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp
repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério
de correção monetária, não pode subsistir a sentença na parte em
que determinou a sua aplicação, porque em confronto com o julgado acima
mencionado, impondo-se a sua modificação, inclusive, de ofício.
19. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se,
até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça
Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando
a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo
C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em
20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral. De acordo com a decisão
do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de
remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo
1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e
a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-E.
20. A limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se
aplica à hipótese dos autos, em que a aposentadoria especial foi deferida
apenas judicialmente.
21. Tal dispositivo estabelece que "Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado
aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou
operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida
no art. 58 desta Lei". Já o artigo 46, da Lei 8.231/91, determina que "o
aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá
sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
22. A inteligência do artigo 57, §8° c.c o artigo 46, ambos da Lei
8.231/91, revela que o segurado que estiver recebendo aposentadoria especial
terá tal benefício cancelado se retornar voluntariamente ao exercício da
atividade especial. Logo, só há que se falar em cancelamento do benefício
e, consequentemente, em incompatibilidade entre o recebimento deste e a
continuidade do exercício da atividade especial se houver (i) a concessão
do benefício e, posteriormente, (ii) o retorno ao labor especial.
23. No caso, não houve a concessão da aposentadoria especial, tampouco o
posterior retorno ao labor especial. A parte autora requereu o benefício; o
INSS o indeferiu na esfera administrativa, circunstância que, evidentemente,
levou o segurado a continuar a trabalhar, até mesmo para poder prover a
sua subsistência e da sua família.
24. Considerando que a aposentadoria especial só foi concedida na esfera
judicial e que o segurado não retornou ao trabalho em ambiente nocivo, mas
sim continuou nele trabalhando após o INSS ter indeferido seu requerimento
administrativo, tem-se que a situação fática verificada in casu não se
amolda ao disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, de sorte que esse
dispositivo não pode ser aplicado ao caso vertente, ao menos até que ocorra
o trânsito em julgado da decisão que concedeu a aposentadoria especial.
25. De fato, o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, tem como finalidade proteger
a saúde do trabalhador, vedando que o beneficiário de uma aposentadoria
especial continue trabalhando num ambiente nocivo. Sendo assim, considerando
que tal norma visa proteger o trabalhador, ela não pode ser utilizada para
prejudicar aquele que se viu na contingência de continuar trabalhando pelo
fato de o INSS ter indevidamente indeferido seu benefício.
26. A par disso, negar ao segurado os valores correspondentes à aposentadoria
especial do período em que ele, após o indevido indeferimento do benefício
pelo INSS, continuou trabalhando em ambiente nocivo significa, a um só tempo,
beneficiar o INSS por um equívoco seu - já que, nesse cenário, a autarquia
deixaria de pagar valores a que o segurado fazia jus por ter indeferido
indevidamente o requerido - e prejudicar duplamente o trabalhador - que se
viu na contingência de continuar trabalhando em ambiente nocivo mesmo quando
já tinha direito ao benefício que fora indevidamente indeferido pelo INSS -
o que colide com os princípios da proporcionalidade e da boa-fé objetiva
(venire contra factum proprium).
27. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento das verbas honorárias, ora
mantidas em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença,
até porque razoavelmente fixadas, na forma da Súmula 111 do STJ.
28. Apelação do INSS desprovida. Reexame necessário conhecido e
desprovido. Correção monetária corrigida de ofício.
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTE
NOCIVO RUÍDO. DO USO DE EPI. INAPLICABILIDADE DO ART. 57, § 8º, DA LEI
8.213/91. DA CORREÇÃO MONETÁRIA.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo
Civil de 1973, consigno que as situações jurídicas consolidadas serão
apreciadas em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina
o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.
2. O Código de Processo Civil de 1973 afasta a submissão da sentença
proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de
direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for
inferior a 60 (sessenta) salários mínimos (art. 475, inciso I e parágrafo
2º).
3. In casu, considerando os elementos dos autos - o INSS foi condenado a
implantar e pagar a aposentadoria especial desde 03/05//2011 (fls. 27, 48,
80), em virtude da condenação da autarquia ré, ocorrida em 31/03/2015,
por força de sentença que julgou a demanda procedente.
4. Em consulta ao extrato do CNIS (que ora determino a juntada), tem-se
que o último valor registrado de sua remuneração perfez R$ 4.016,13 em
abril/2018.
5. Assim, vislumbram-se nos autos elementos concretos que norteiam o valor
total da condenação. Pode-se estabelecer, portanto, que a sua proporção
com o valor do salário mínimo da época autoriza a concluir que a sentença,
de fato, sujeita-se ao reexame necessário, excedendo o valor de alçada de
60 salários mínimos que impõe a remessa oficial.
6. O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será
devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições),
ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20
(vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando
a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i)
a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter
exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente
nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve,
em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor,
admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de
reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não
previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade;
(iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem
intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas
normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP,
SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
7. A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas
alterações. Diante de tal evolução normativa e do princípio tempus
regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de
acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB
(até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior
a 85 dB, a partir de 19/11/2003. O C. STJ, quando do julgamento do Recurso
Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a
tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003:
"O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de
serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a
18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto
3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003,
que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB
(ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
8. O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese
segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento
de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço
especial para aposentadoria".
9. Não merece acolhida a alegação do INSS quanto ao uso de EPI, pois,
conforme já destacado, no caso de ruído, o fornecimento de equipamentos
de proteção individual não é suficiente para neutralizar a nocividade
do agente, tendo tal tema sido definido pelo E. STF quando do julgamento do
ARE 664335. Logo, não se divisa a alegada violação aos artigos 57 e 58,
da Lei 8.213/91.
10. Reitere-se que, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP de que
o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do labor
quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo como se
sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia fonte
de custeio e de desequilíbrio financeiro e atuarial do Sistema Previdenciário
(195, §§ 5° e 6°, e art. 201, caput e §1°, ambos da CF/88 e artigo
57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da
respectiva contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim
à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
11. A sentença reconheceu como especial o período de 06/03/1997 a 04/05/2011,
em que o autor laborou na empresa Agrindus S/A Empresa Agrícola Pastoril,
estando exposto a ruído acima da tolerância legal.
12. O PPP de fls. 42/43 revela que, no período em apreço, a parte autora
se expôs, permanentemente, na forma do artigo 65, do RPS, a ruído de 90,0
dB a 92,5dB, na função de tratorista.
13. Considerando que se reconhece como especial o trabalho sujeito a ruído
superior a 80 dB (até 05/03/1997); superior a 90 dB (de 06/03/1997 a
18/11/2003); e superior a 85 dB (a partir de 19/11/2003), constata-se que
a decisão recorrida andou bem ao reconhecer o período em destaque, já
que neste a parte autora esteve exposta a níveis acima do tolerado pela
respectiva legislação de regência.
14. Para a caracterização da natureza especial da atividade sujeita ao
ruído, deve restar comprovada a exposição do segurado ao referido agente
nocivo de forma permanente, e não ocasional nem intermitente, em patamares
superiores aos definidos pelo REsp nº 1.398.260/PR.
15. Assim, considerada a função e o tempo da atividade exercida (tratorista,
de maio/1986 a maio/2011), com muito mais razão não se pode precisar,
em especial no período de 05/03/1997 a 18/11/2003, se o agente esteve
exposto ao agente nocivo dentro da tolerância legal quando há registro,
concomitante, de nocividade no mesmo período.
16. Bem por isso, inclusive aponto que há registro de observação da
periodicidade e trocas definidas por programas ambientais no PPP, condutas
típicas de atividades que estão sujeitas a agentes agressivos, não havendo
como concluir diversamente do raciocínio expendido pelo juízo singular, pela
condenação do INSS, no reconhecimento do período como atividade especial.
17. Considerando período de tempo enquadrado neste feito, tem-se que a parte
autora comprovou o labor em condições especiais por período superior a 25
anos, de sorte que ela faz jus à aposentadoria especial, a qual é devida
desde a data do requerimento administrativo, em função do quanto estabelecido
no artigo 57, §2° c.c. o artigo 49, I, b, ambos da Lei 8.213/91.
18. A inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido
pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que
foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão
geral). Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp
repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério
de correção monetária, não pode subsistir a sentença na parte em
que determinou a sua aplicação, porque em confronto com o julgado acima
mencionado, impondo-se a sua modificação, inclusive, de ofício.
19. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se,
até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça
Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando
a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo
C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em
20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral. De acordo com a decisão
do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de
remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo
1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e
a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-E.
20. A limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se
aplica à hipótese dos autos, em que a aposentadoria especial foi deferida
apenas judicialmente.
21. Tal dispositivo estabelece que "Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado
aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou
operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida
no art. 58 desta Lei". Já o artigo 46, da Lei 8.231/91, determina que "o
aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá
sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
22. A inteligência do artigo 57, §8° c.c o artigo 46, ambos da Lei
8.231/91, revela que o segurado que estiver recebendo aposentadoria especial
terá tal benefício cancelado se retornar voluntariamente ao exercício da
atividade especial. Logo, só há que se falar em cancelamento do benefício
e, consequentemente, em incompatibilidade entre o recebimento deste e a
continuidade do exercício da atividade especial se houver (i) a concessão
do benefício e, posteriormente, (ii) o retorno ao labor especial.
23. No caso, não houve a concessão da aposentadoria especial, tampouco o
posterior retorno ao labor especial. A parte autora requereu o benefício; o
INSS o indeferiu na esfera administrativa, circunstância que, evidentemente,
levou o segurado a continuar a trabalhar, até mesmo para poder prover a
sua subsistência e da sua família.
24. Considerando que a aposentadoria especial só foi concedida na esfera
judicial e que o segurado não retornou ao trabalho em ambiente nocivo, mas
sim continuou nele trabalhando após o INSS ter indeferido seu requerimento
administrativo, tem-se que a situação fática verificada in casu não se
amolda ao disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, de sorte que esse
dispositivo não pode ser aplicado ao caso vertente, ao menos até que ocorra
o trânsito em julgado da decisão que concedeu a aposentadoria especial.
25. De fato, o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, tem como finalidade proteger
a saúde do trabalhador, vedando que o beneficiário de uma aposentadoria
especial continue trabalhando num ambiente nocivo. Sendo assim, considerando
que tal norma visa proteger o trabalhador, ela não pode ser utilizada para
prejudicar aquele que se viu na contingência de continuar trabalhando pelo
fato de o INSS ter indevidamente indeferido seu benefício.
26. A par disso, negar ao segurado os valores correspondentes à aposentadoria
especial do período em que ele, após o indevido indeferimento do benefício
pelo INSS, continuou trabalhando em ambiente nocivo significa, a um só tempo,
beneficiar o INSS por um equívoco seu - já que, nesse cenário, a autarquia
deixaria de pagar valores a que o segurado fazia jus por ter indeferido
indevidamente o requerido - e prejudicar duplamente o trabalhador - que se
viu na contingência de continuar trabalhando em ambiente nocivo mesmo quando
já tinha direito ao benefício que fora indevidamente indeferido pelo INSS -
o que colide com os princípios da proporcionalidade e da boa-fé objetiva
(venire contra factum proprium).
27. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento das verbas honorárias, ora
mantidas em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença,
até porque razoavelmente fixadas, na forma da Súmula 111 do STJ.
28. Apelação do INSS desprovida. Reexame necessário conhecido e
desprovido. Correção monetária corrigida de ofício.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, conhecer do reexame
necessário e negar-lhe provimento e, de ofício, corrigir a correção
monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Data do Julgamento
:
30/07/2018
Data da Publicação
:
13/08/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2170965
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/08/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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