TRF3 0022510-94.2014.4.03.0000 00225109420144030000
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO
BIENAL PARA O AJUIZAMENTO. OBSERVÂNCIA. MILITAR. CONCURSO PARA SARGENTO DA
AERONÁUTICA. REPROVAÇÃO. REQUISITOS DA INSPEÇÃO DE SAÚDE FIXADOS EM
NORMAS INFRALEGAIS. IMPOSSIBILIDADE. DECRETO Nº 703/92. REGUMENTAÇÃO DE
MATÉRIA DIVERSA. AUSÊNCIA DE MENÇÃO NO INSTRUMENTO EDITALÍCIO. ARTIGO
142, § 3º, INCISO X DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICAÇÃO. ARTIGO 10 DA
LEI Nº 6.880/80. NÃO RECEPÇÃO PELA CARTA DE 88 NO TOCANTE À EXPRESSÃO
"NOS REGULAMENTOS DA MARINHA, DO EXÉRCITO E DA AERONÁUTICA". AFASTAMENTO
DA EXIGÊNCIA POSTA EM NORMA DE CALIBRE HIERÁRQUICO INFERIOR.
1. A ação rescisória foi ajuizada em 8 de setembro de 2014, dentro,
portanto, do prazo bienal previsto no então vigente artigo 495 do Código
de Processo Civil/1973, já que a decisão rescidenda transitou em julgado
em junho de 2014.
2. O julgamento que se pretende rescindir pela presente ação foi ultimado
pela Terceira Turma, integrante da Segunda Seção deste Tribunal. Não se
vislumbra, contudo, empecilho para o julgamento da presente rescisória,
considerando que a apreciação da matéria debatida cabe a esta c. Primeira
Seção, por força do disposto no artigo 10, § 1º, inciso VI do Regimento
desta e. Corte.
3. O acórdão que se pretende rescindir concluiu expressamente pela validade
da exclusão do autor do certame para Sargento, partindo da premissa de que
o respectivo edital estava fundamentado em previsão legal e regulamentar.
4. A previsão legal foi tomada pelo julgador como sendo o Decreto nº
703/92. O referido decreto, no entanto - sobre não ser expressamente referido
no edital do concurso a que se submeteu o autor, além de encetar a discussão
quanto à natureza do ato legislativo, vale dizer, se lei em sentido formal
-, não pode ser entendido como supedâneo para as exigências relativas
à inspeção de saúde veiculadas no instrumento editalício. Isso porque
o Decreto nº 703/92 expressamente se propôs a modificar a redação do
"Capítulo IV e os Anexos I, II, III e V das 'Instruções Gerais para a
Inspeção de Saúde de Conscritos nas Forças Armadas (IGISC)', aprovadas
pelos Decreto n° 60.822, de 7 de junho de 1967 e alteradas pelo Decreto n°
63.078, de 5 de agosto de 1968", aplicando-se, portanto, aos ingressantes
do serviço militar inicial, que não corresponde ao caso do autor.
5. De todo modo, ainda que pudesse ser superado o ponto, constata-se que o
edital do concurso não se encontra baseado no citado decreto. Os documentos
colacionados aos autos de origem, não impugnados pela União quer naquele
feito, quer nesta rescisória, dão conta de que o certame cogitado estava
"fundamentado pelas Instruções Gerais para os Concursos de Admissão
atribuídos ao Departamento de Ensino da Aeronáutica, aprovados pela Portaria
nº 128/GC3, de 1º de março de 2001, e publicadas [...] bem como pelas
Instruções Complementares para os Concursos de Admissão atribuídos ao
Departamento de Ensino da Aeronáutica, aprovadas pela Portaria nº 34/DE-2,
de 29 de março de 2001, e publicadas [...]", o que denota que a inspeção
de saúde prevista no edital que rege o concurso militar em questão vem
fundada em normas infralegais.
6. O artigo 142, § 3º, inciso X da Constituição Federal impõe a edição
de lei para dispor "sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de
idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para
a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e
outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades
de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos
internacionais e de guerra".
7. Por sua vez, o Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880/80) prevê em
seu artigo 10 que "O ingresso nas Forças Armadas é facultado, mediante
incorporação, matrícula ou nomeação, a todos os brasileiros que preencham
os requisitos estabelecidos em lei e nos regulamentos da Marinha, do Exército
e da Aeronáutica".
8. O E. Supremo Tribunal Federal assentou a não recepção, pela
Constituição Federal de 1988, da expressão "nos regulamentos da Marinha,
do Exército e da Aeronáutica" constante do artigo 10 da Lei nº 6.880/80
(RE 600885). Portanto, após o advento da nova Carta Magna, não se admite
que os critérios de ingresso nas Forças Armadas possam ser delineados por
mero regulamento, sem que antes tenham sido traçados estritamente por lei
(considerado o termo em seu sentido formal).
9. A exigência relativa à aprovação em inspeção de saúde para ingresso
no Curso de Formação de Sargentos a que aspirava o autor teve mera previsão
nas instruções específicas previstas no edital, a saber, Portarias
nºs. 128/GC3/2001 e 34/DE-2/2001, sem âncora, portanto, em lei. Assim,
é de rigor a rescisão da decisão proferida com esteio na validade
da referida exigência, já que imperioso o reconhecimento de que violou
literal disposição de lei (na dicção do Código de Processo Civil/1973)
ou, como mais adequadamente prevê o CPC/2015, afrontou "manifestamente norma
jurídica", à vista do entendimento firmado pelo E. Supremo Tribunal Federal.
10. Com a rescisão do julgado, deve ser assegurada ao autor a sua recondução
ao posto de Sargento, desde que aprovado nas demais etapas do concurso. No
entanto, não colhe o pleito para que lhe sejam asseguradas todas as
progressões funcionais e os reflexos financeiros daí decorrentes, já que
para a percepção da retribuição pecuniária respectiva - e mesmo para
movimentação na carreira -, mostra-se imprescindível o efetivo exercício
do cargo, consoante jurisprudência assentada pelo C. Superior Tribunal de
Justiça em casos análogos. Precedentes.
11. Tutela de urgência concedida nos termos do artigo 300 e seguintes do
CPC/2015 para assegurar que o autor seja reconduzido ao posto de Sargento,
desde que aprovado nas demais etapas do concurso, devendo a ré implementar,
incontinenti, a referida promoção tão logo intimada do presente julgamento.
12. Ação rescisória julgada parcialmente procedente. Agravo regimental
prejudicado.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO
BIENAL PARA O AJUIZAMENTO. OBSERVÂNCIA. MILITAR. CONCURSO PARA SARGENTO DA
AERONÁUTICA. REPROVAÇÃO. REQUISITOS DA INSPEÇÃO DE SAÚDE FIXADOS EM
NORMAS INFRALEGAIS. IMPOSSIBILIDADE. DECRETO Nº 703/92. REGUMENTAÇÃO DE
MATÉRIA DIVERSA. AUSÊNCIA DE MENÇÃO NO INSTRUMENTO EDITALÍCIO. ARTIGO
142, § 3º, INCISO X DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICAÇÃO. ARTIGO 10 DA
LEI Nº 6.880/80. NÃO RECEPÇÃO PELA CARTA DE 88 NO TOCANTE À EXPRESSÃO
"NOS REGULAMENTOS DA MARINHA, DO EXÉRCITO E DA AERONÁUTICA". AFASTAMENTO
DA EXIGÊNCIA POSTA EM NORMA DE CALIBRE HIERÁRQUICO INFERIOR.
1. A ação rescisória foi ajuizada em 8 de setembro de 2014, dentro,
portanto, do prazo bienal previsto no então vigente artigo 495 do Código
de Processo Civil/1973, já que a decisão rescidenda transitou em julgado
em junho de 2014.
2. O julgamento que se pretende rescindir pela presente ação foi ultimado
pela Terceira Turma, integrante da Segunda Seção deste Tribunal. Não se
vislumbra, contudo, empecilho para o julgamento da presente rescisória,
considerando que a apreciação da matéria debatida cabe a esta c. Primeira
Seção, por força do disposto no artigo 10, § 1º, inciso VI do Regimento
desta e. Corte.
3. O acórdão que se pretende rescindir concluiu expressamente pela validade
da exclusão do autor do certame para Sargento, partindo da premissa de que
o respectivo edital estava fundamentado em previsão legal e regulamentar.
4. A previsão legal foi tomada pelo julgador como sendo o Decreto nº
703/92. O referido decreto, no entanto - sobre não ser expressamente referido
no edital do concurso a que se submeteu o autor, além de encetar a discussão
quanto à natureza do ato legislativo, vale dizer, se lei em sentido formal
-, não pode ser entendido como supedâneo para as exigências relativas
à inspeção de saúde veiculadas no instrumento editalício. Isso porque
o Decreto nº 703/92 expressamente se propôs a modificar a redação do
"Capítulo IV e os Anexos I, II, III e V das 'Instruções Gerais para a
Inspeção de Saúde de Conscritos nas Forças Armadas (IGISC)', aprovadas
pelos Decreto n° 60.822, de 7 de junho de 1967 e alteradas pelo Decreto n°
63.078, de 5 de agosto de 1968", aplicando-se, portanto, aos ingressantes
do serviço militar inicial, que não corresponde ao caso do autor.
5. De todo modo, ainda que pudesse ser superado o ponto, constata-se que o
edital do concurso não se encontra baseado no citado decreto. Os documentos
colacionados aos autos de origem, não impugnados pela União quer naquele
feito, quer nesta rescisória, dão conta de que o certame cogitado estava
"fundamentado pelas Instruções Gerais para os Concursos de Admissão
atribuídos ao Departamento de Ensino da Aeronáutica, aprovados pela Portaria
nº 128/GC3, de 1º de março de 2001, e publicadas [...] bem como pelas
Instruções Complementares para os Concursos de Admissão atribuídos ao
Departamento de Ensino da Aeronáutica, aprovadas pela Portaria nº 34/DE-2,
de 29 de março de 2001, e publicadas [...]", o que denota que a inspeção
de saúde prevista no edital que rege o concurso militar em questão vem
fundada em normas infralegais.
6. O artigo 142, § 3º, inciso X da Constituição Federal impõe a edição
de lei para dispor "sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de
idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para
a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e
outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades
de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos
internacionais e de guerra".
7. Por sua vez, o Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880/80) prevê em
seu artigo 10 que "O ingresso nas Forças Armadas é facultado, mediante
incorporação, matrícula ou nomeação, a todos os brasileiros que preencham
os requisitos estabelecidos em lei e nos regulamentos da Marinha, do Exército
e da Aeronáutica".
8. O E. Supremo Tribunal Federal assentou a não recepção, pela
Constituição Federal de 1988, da expressão "nos regulamentos da Marinha,
do Exército e da Aeronáutica" constante do artigo 10 da Lei nº 6.880/80
(RE 600885). Portanto, após o advento da nova Carta Magna, não se admite
que os critérios de ingresso nas Forças Armadas possam ser delineados por
mero regulamento, sem que antes tenham sido traçados estritamente por lei
(considerado o termo em seu sentido formal).
9. A exigência relativa à aprovação em inspeção de saúde para ingresso
no Curso de Formação de Sargentos a que aspirava o autor teve mera previsão
nas instruções específicas previstas no edital, a saber, Portarias
nºs. 128/GC3/2001 e 34/DE-2/2001, sem âncora, portanto, em lei. Assim,
é de rigor a rescisão da decisão proferida com esteio na validade
da referida exigência, já que imperioso o reconhecimento de que violou
literal disposição de lei (na dicção do Código de Processo Civil/1973)
ou, como mais adequadamente prevê o CPC/2015, afrontou "manifestamente norma
jurídica", à vista do entendimento firmado pelo E. Supremo Tribunal Federal.
10. Com a rescisão do julgado, deve ser assegurada ao autor a sua recondução
ao posto de Sargento, desde que aprovado nas demais etapas do concurso. No
entanto, não colhe o pleito para que lhe sejam asseguradas todas as
progressões funcionais e os reflexos financeiros daí decorrentes, já que
para a percepção da retribuição pecuniária respectiva - e mesmo para
movimentação na carreira -, mostra-se imprescindível o efetivo exercício
do cargo, consoante jurisprudência assentada pelo C. Superior Tribunal de
Justiça em casos análogos. Precedentes.
11. Tutela de urgência concedida nos termos do artigo 300 e seguintes do
CPC/2015 para assegurar que o autor seja reconduzido ao posto de Sargento,
desde que aprovado nas demais etapas do concurso, devendo a ré implementar,
incontinenti, a referida promoção tão logo intimada do presente julgamento.
12. Ação rescisória julgada parcialmente procedente. Agravo regimental
prejudicado.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, julgar parcialmente procedente o pedido e julgar prejudicado o
agravo regimental, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
03/05/2018
Data da Publicação
:
15/05/2018
Classe/Assunto
:
AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 10051
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA SEÇÃO
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/05/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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