TRF3 0022725-21.2005.4.03.6100 00227252120054036100
PROCESSUAL CIVIL: CONTRATO. SISTEMA FINANCEIRO
DA HABITAÇÃO. REVISÃO. CES. TAXA DE JUROS. FORMA DE
AMORTIZAÇÃO. SEGURO. TR. UPC. ANATOCISMO. PRICE. PERÍCIA. CDC. REPETIÇÃO
DE INDÉBITO. FCVS. QUITAÇÃO. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. UNIÃO. PRELIMINAR
REJEITADA. RECURSOS IMPROVIDOS.
1 - A partir da leitura do contrato firmado entre as partes, verifica-se
que nele se faz presente cláusula que dispõe a respeito da cobertura do
saldo devedor pelo Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS,
e, conforme cópia da planilha demonstrativa de débito acostada aos autos,
os mutuários efetuaram o pagamento de 179 (cento e setenta e nove) parcelas
das 180 (cento e oitenta) do financiamento contratado, ou seja, cumpriram com
suas obrigações pontualmente por praticamente todo o período estipulado
para quitação da dívida.
2 - Destarte, há que se reconhecer a legitimidade da Caixa Econômica Federal
- CEF para figurar no polo passivo da demanda proposta, uma vez que o interesse
da empresa pública federal restou evidenciado pelo comprometimento do Fundo
de Compensação de Variações Salariais - FCVS.
3 - Levando-se em conta o caráter social do contrato de financiamento
imobiliário, com base no SFH, presente nas disposições que condicionam
a equivalência das prestações ao poder aquisitivo do mutuário (artigo
5º e §§ da Lei nº 4.380/64), caso não seja observado o princípio da
proporcionalidade entre a prestação a ser paga e a renda ou o salário do
adquirente, verificada na data da assinatura do contrato e a permanecer ao
longo do contrato, é prevista e autorizada, a qualquer tempo, a solicitação
da revisão de tal relação.
4 - É garantido ao mutuário o direito à renegociação da dívida, junto ao
agente financeiro (§6º do artigo 9º do Decreto-Lei nº 2.164/84 e o artigo
4º, §3º da Lei nº 8.692/93) no caso de não haver a proporcionalidade
inicial ante a redução da renda por mudança de emprego ou por alteração
na composição da renda familiar em decorrência da exclusão de um ou mais
coadquirentes.
5 - Num caso como esse, é dada oportunidade ao mutuário de, através da
renegociação, manter a capacidade em pagar as prestações, diminuindo-as,
na sua relação inicial entre prestação/salário (Lei nº 8.692, artigos
4º, §4º, 13 e 14), e não sendo penalizado, se deixar de pagar os encargos
mensais, tendo requerido sua revisão, com a juntada de comprovantes das
variações da renda e a instituição financeira não responder formalmente,
após 60 (sessenta) dias do pedido.
6 - Tratando-se de matéria de direito e de fato há a necessidade de fazer
a produção da prova pericial, vez que o mutuário tem direito de ter o
valor da sua prestação reajustada pelo pactuado.
7 - O Magistrado não deve estar adstrito ao laudo pericial, contudo, nesse
tipo de demanda, que envolve critérios eminentemente técnicos e complexos
do campo financeiro-econômico, há que ser prestigiado o trabalho realizado
pelo expert.
8 - Quanto à questão sobre se a instituição financeira contratante
observou o Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - PES
ou o salário mínimo para o reajustamento das prestações, a mesma deve
ser analisada à luz do contrato, dos documentos acostados e do trabalho do
perito.
9 - Com efeito, o agente credor, segundo declarações do Sr. Perito, se
tivesse aplicado aos valores das prestações os percentuais de reajustamentos
dos salários do mutuário, os valores das prestações seriam maiores do
que aqueles efetivamente cobrados.
10 - No tocante à incidência do Coeficiente de Equiparação Salarial -
CES na 1ª (primeira) parcela do financiamento, não assiste razão as
instituições financeiras.
11 - O entendimento jurisprudencial é no sentido de que o Coeficiente de
Equiparação Salarial - CES deve incidir sobre os contratos de mútuo
vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação - SFH, nos casos em que
houver disposição expressa no instrumento acerca de sua aplicação,
ainda que celebrados anteriormente à vigência da Lei nº 8.692/93.
12 - Da análise da cópia do contrato firmado, verifica-se que não
há disposição expressa dando conta da incidência do Coeficiente de
Equiparação Salarial - CES no financiamento.
13 - Desta feita, não há que se reconhecer a aplicação do CES nos
cálculos das prestações do financiamento, o que deve ser respeitado,
inclusive, em homenagem ao princípio da força obrigatória dos contratos.
14 - O contrato avençado entre as partes estabelece como sistema de
amortização, o método conhecido como Tabela PRICE ou Sistema Francês de
Amortização.
15 - A aplicação da Tabela PRICE consiste em plano de amortização e uma
dívida em prestações periódicas, iguais e sucessivas, em que o valor de
cada prestação, ou pagamento, é composto por duas parcelas distintas: uma de
juros e outra de amortização do capital, motivo pelo qual a sua utilização
não é vedada pelo ordenamento jurídico e não traz a capitalização dos
juros, vê-se que o valor da prestação é decrescente até a liquidação
que se dará na última prestação avençada.
16 - Muito embora o STJ venha admitindo a aplicabilidade do Código de
Defesa do Consumidor, é necessário que as irregularidades que tenham sido
praticadas estejam amparadas por provas inequívocas, sendo insuficiente a
alegação genérica.
17 - Assim, não havendo prova nos autos que a entidade financeira tenha
praticado violação contratual, resta afastada a aplicação do art. 42 do
Código de Defesa do Consumidor.
18 - Ressalte-se que a restituição de valores pagos a maior pelo mutuário,
segundo o artigo 23 da Lei 8.004/90, é feita geralmente mediante a
compensação com prestações vincendas, ou, se já não houver nem vencidas
nem vincendas em aberto, a devolução em espécie ao mutuário. Não havendo,
portanto, que apreciar a questão da devolução de valores pagos a maior.
19 - Os contratos de mútuo, nos termos da Lei 4.380/64, que instituiu
o Sistema Financeiro da Habitação para aquisição da casa própria,
construção ou venda de unidades habitacionais, através de financiamento
imobiliário, são típicos contratos de adesão de longa duração,
com cláusulas padrão, sujeitos aos critérios legais em vigor à época
de sua assinatura, em que não há lugar para a autonomia da vontade na
definição do conteúdo, restando ao mutuário submeter-se às condições
pré-determinadas.
20 - O mutuário, nesse tipo de contrato, subordina-se às condições
pré-estabelecidas quanto às taxas ou índices de correção monetária e
o montante a ser reajustado, não podendo discuti-las e dispor do bem, mas
outorgando poderes ao agente financeiro para alienar o imóvel a terceiro,
em seu nome determinar o preço, imitir o adquirente na posse do imóvel etc.
21 - No caso das prestações, é o Poder Executivo que formula as políticas
de reajustamento e estabelece as taxas ou os índices de correção monetária
da moeda.
21 - A própria origem dos recursos que sustentam o sistema leva à finalidade
social. Destaca-se a arrecadação proveniente do Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço FGTS, criado pela antiga Lei 5170 de 13/09/66, formado pelos
depósitos de 8% sobre a folha mensal dos salários das empresas. Essas
contas são capitalizadas com juros e correção monetária, em que a CEF é
a encarregada da administração dos valores. Captam-se ainda, as somas nos
depósitos específicos em cadernetas de poupança, que podem ser abertas
em quaisquer agências das Caixas Econômicas, nas sociedades de crédito
imobiliário e nas associações de poupança e empréstimo.
22 - O caráter social transparece nos princípios determinantes: facilitar
e promover a construção e a aquisição da moradia, especialmente para
as camadas sociais de menor renda e nas disposições que condicionam a
equivalência das prestações ao poder aquisitivo do mutuário, artigos 1º,
5º e 9° da Lei n° 4380/64.
23 - De se ver, portanto, que não pode o mutuário unilateralmente -
simplesmente por mera conveniência - exigir a aplicação de critério
diversos do estabelecido contratualmente, devendo ser respeitado o que foi
convencionado entre as partes.
24 - O contrato de mútuo habitacional estabeleceu a taxa anual de juros
nominal de 9,400% e a efetiva de 9,816%. Os mutuários alegam de forma
genérica, vaga e imprecisa que o agente credor não aplicou o percentual
estabelecido no contrato, deixando de carrear o mínimo de elementos capazes
de corroborar a tese por eles defendida, a qual não deve prevalecer.
25 - O disposto no art. 6º, alínea "e", da Lei 4.380/64 não configura uma
limitação de juros, dispondo apenas sobre as condições de reajustamento
estipuladas nos contratos de mútuo previstos no art. 5º, do referido
diploma legal.
26 - Destarte não deve ser considerada uma limitação dos juros a serem
fixados aos contratos de mútuo regidos pelas normas do Sistema Financeiro
da Habitação - SFH, conforme alegado pela parte autora, devendo ser mantido
o percentual de juros pactuado entre as partes.
27 - Quanto à legalidade na fixação de uma taxa de juros nominal e outra
de juros efetiva cabe, a priori, destacar que nominal é a taxa de juros
remuneratórios relativos ao período decorrido, cujo valor é o resultado
de sua incidência mensal sobre o saldo devedor remanescente corrigido,
já a taxa efetiva é a taxa nominal exponencial, identificando o custo
total do financiamento.
28 - Com efeito, o cálculo dos juros se faz mediante a aplicação de
um único índice fixado, qual seja 9,4000%, conforme quadro resumo, cuja
incidência mês a mês, após o período de 12 (doze) meses, resulta a taxa
efetiva de 9,816% ao ano, não havendo fixação de juros acima do permitido
por lei.
29 - Com a Resolução 1, de 24/04/77, do Conselho Administrativo do BNH a UPC
passou a ser aplicada como fator de atualização não só, trimestralmente,
do saldo devedor, como também de reajuste, anualmente, das prestações,
que eram reajustadas pelo salário mínimo.
30 - O fato das prestações serem reajustadas pela UPC não descaracteriza
o sentido da equivalência salarial, pois tal reajuste não pode ultrapassar
os percentuais de aumento do salário mínimo, sem contar o fato de que os
índices de correção eram inferiores aos aumentos do salário mínimo.
31 - Sobre a correção monetária do saldo devedor, consigno que a forma
de reajuste deve seguir o pactuado, ou seja, à utilização da UPC como
índice, conforme dispõe a CLÁUSULA SEXTA, caput e parágrafos QUINTO,
do contrato firmado entre as partes.
32 - Desta feita, correta a decisão do Juízo a quo ao não conhecer o
pedido de recálculo do saldo devedor pelo INPC por falta de interesse de
agir, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil.
33 - Os mutuários questionam a aplicação do índice de 84,32% para
atualização do saldo devedor referente ao mês de março de 1990, entendendo
que o correto seria a correção pela variação do Bônus do Tesouro Nacional
Fiscal - BTNF do referido mês.
34 - Entretanto, tal entendimento não deve ser admitido, vez que o Superior
Tribunal de Justiça firmou posição no sentido de que o índice de 84,32%
é o que deve ser utilizado para atualização do saldo devedor para o mês
de março de 1990, no que se refere aos contratos de mútuo habitacional.
35 - Nos contratos de mútuo para aquisição de imóvel, firmados no âmbito
do Sistema Financeiro da Habitação, o índice aplicável ao saldo devedor,
com a criação do Plano Collor, no mês de março de 1990, é o IPC no
percentual de 84,32%, vez que este índice serviu de correção para todos
os valores da poupança e é consagrado por este E. Tribunal como fator de
correção do FGTS.
36 - Nos contratos de mútuo regidos pelo SFH, as partes não têm margem de
liberdade para contratar, já que os fundos por ele utilizados são verbas
públicas.
37 - Tal regra também é aplicável no que diz respeito ao seguro, que
deve ser contratado, por força da Circular SUPEP 111, de 03 de dezembro de
1999, visando cobrir eventuais sinistros ocorridos no imóvel e de morte
ou invalidez dos mutuantes, motivo pelo qual, não pode ser comparado aos
seguros habitacionais que possuem outros valores.
38 - Portanto, não há como considerar ilegal a cobrança do seguro, uma
vez que não se trata de venda casada nem foi demonstrado eventual abuso.
39 - Sendo assim, não há nenhuma razão plausível para que as cláusulas
sejam consideradas nulas.
40 - No que tange ao Decreto-lei nº 70/66, não é inconstitucional, havendo,
nesse sentido, inúmeros precedentes do E. Supremo Tribunal Federal e do
E. Superior Tribunal de Justiça. Ademais, a cláusula 27ª do contrato
firmado entre as partes prevê a possibilidade de execução extrajudicial
do imóvel nos termos do Decreto-lei nº 70/66.
41 - No que toca à amortização do débito, não se observa qualquer
equívoco na forma em que as prestações são computadas para o abatimento
do principal da dívida, eis que, quando do pagamento da primeira parcela do
financiamento, já haviam transcorrido trinta dias desde a entrega do total
do dinheiro emprestado, devendo, assim, os juros e a correção monetária
incidir sobre todo o dinheiro mutuado, sem se descontar o valor da primeira
prestação, sob pena de se remunerar e corrigir valores menores do que os
efetivamente emprestados.
42 - A redação da alínea "c" do artigo 6º da Lei n.º 4.380/64, apenas
indica que as prestações mensais devem ter valores iguais, por todo o
período do financiamento, considerando-se a inexistência de reajuste,
o qual, quando incidente, alterará nominalmente o valor da prestação.
43 - A pretensão dos mutuários em ver amortizada a parcela paga antes da
correção monetária do saldo devedor não procede, posto que inexiste a
alegada quebra do equilíbrio financeiro, controvérsia esta que já restou
pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.
44 - Conforme informação nos autos, dado o lapso temporal decorrido entre a
sentença recorrida e o julgamento dos presentes recursos, tendo em vista as
características do contrato, os elementos trazidos aos autos, a constatação
da cobrança irregular no valor das prestações, ante o acréscimo do CES,
não previsto contratualmente, desde a primeira prestação paga e por todo
o período estipulado para quitação da dívida, não há que se falar em
decisão condicional uma vez que decorreu prazo suficiente para a quitação
de uma única parcela vincenda.
45 - Mister apontar que o § 1º do artigo 9º da Lei 4.380/64, que determinava
a não possibilidade de aquisição de imóvel por financiamento, pelo SFH,
no caso da existência de mais de um imóvel na mesma localidade, nada dispõe
sobre restrições à cobertura de saldo devedor residual pelo FCVS, de modo
que não cabe impor ao mutuário a perda do direito de quitação da dívida,
pelo fundo, por tal motivo.
46 - Observa-se que a restrição de cobertura pelo FCVS de apenas um saldo
devedor remanescente ao final do contrato, imposta pelo § 1º do artigo 3º
da Lei nº 8100, de 05/11/90, aplica-se aos contratos firmados a partir de
sua vigência, não retroagindo para alcançar contratos anteriores.
47 - Destaca-se que a Lei nº 10.150/2000, que alterou o artigo 3º da lei
acima citada, ressalta a possibilidade de quitação, pelo FCVS, de mais de um
saldo devedor remanescente por mutuário, relativos aos contratos anteriores a
05/12/1990 e jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é uniforme
no sentido de que o artigo 9º, §1º, da Lei nº 4.380/64 não afasta a
quitação de um segundo imóvel financiado pelo mutuário, situado na mesma
localidade, utilizando os recursos do FCVS (REsp 1.133.769/RN submetido à
sistemática dos recursos repetitivos, nos termos do artigo 543-C do CPC/73).
48 - Note-se que todas as prestações pagas pelo mutuário foram acrescidas
de parcela destinada ao fundo, não havendo como admitir que a instituição
financeira determine, eventualmente, a perda do direito à quitação
do saldo devedor pelo fundo, como sanção frente ao não cumprimento de
cláusula contratual outra, aplicação esta não prevista tanto na norma
acima citada como no contrato firmado.
49 - Nesse passo, é descabido reputar válido o contrato naquilo que o agente
financeiro e o fundo aproveitam, ou seja, o recebimento das prestações e
das parcelas destinadas ao FCVS, respectivamente, e inválido naquilo que
em hipótese lhe prejudica, ou seja, a cobertura do saldo devedor residual
pelo FCVS, impondo aos mutuários a perda do direito de quitação da dívida.
50 - Diante de tal quadro, revela-se perfeitamente aplicável ao caso concreto
o reconhecimento do direito dos mutuários à quitação do financiamento
contratado, bem como a respectiva baixa da hipoteca incidente sobre o
imóvel em questão, após o pagamento das prestações avençadas e as
contribuições ao fundo pagas até a data do requerimento administrativo,
cabendo a restituição, pelo agente financeiro, aos apelados, do total
dos valores pagos a parte que diz respeito especificamente com relação
ao Coeficiente de Equiparação Salarial acrescido às prestações desde
o início do contrato.
51 - É evidente que a liberação da garantia hipotecária só se dá
com o pagamento do financiamento nas formas previstas em lei, cabendo ao
agente financeiro a prática de todos os atos necessários para que referida
liquidação aconteça, sendo a forma e o prazo da cobertura pelo Fundo de
Compensação da Variação Salarial objeto de execução na 1ª instância.
52 - Preliminar rejeitada. Apelações improvidas.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL: CONTRATO. SISTEMA FINANCEIRO
DA HABITAÇÃO. REVISÃO. CES. TAXA DE JUROS. FORMA DE
AMORTIZAÇÃO. SEGURO. TR. UPC. ANATOCISMO. PRICE. PERÍCIA. CDC. REPETIÇÃO
DE INDÉBITO. FCVS. QUITAÇÃO. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. UNIÃO. PRELIMINAR
REJEITADA. RECURSOS IMPROVIDOS.
1 - A partir da leitura do contrato firmado entre as partes, verifica-se
que nele se faz presente cláusula que dispõe a respeito da cobertura do
saldo devedor pelo Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS,
e, conforme cópia da planilha demonstrativa de débito acostada aos autos,
os mutuários efetuaram o pagamento de 179 (cento e setenta e nove) parcelas
das 180 (cento e oitenta) do financiamento contratado, ou seja, cumpriram com
suas obrigações pontualmente por praticamente todo o período estipulado
para quitação da dívida.
2 - Destarte, há que se reconhecer a legitimidade da Caixa Econômica Federal
- CEF para figurar no polo passivo da demanda proposta, uma vez que o interesse
da empresa pública federal restou evidenciado pelo comprometimento do Fundo
de Compensação de Variações Salariais - FCVS.
3 - Levando-se em conta o caráter social do contrato de financiamento
imobiliário, com base no SFH, presente nas disposições que condicionam
a equivalência das prestações ao poder aquisitivo do mutuário (artigo
5º e §§ da Lei nº 4.380/64), caso não seja observado o princípio da
proporcionalidade entre a prestação a ser paga e a renda ou o salário do
adquirente, verificada na data da assinatura do contrato e a permanecer ao
longo do contrato, é prevista e autorizada, a qualquer tempo, a solicitação
da revisão de tal relação.
4 - É garantido ao mutuário o direito à renegociação da dívida, junto ao
agente financeiro (§6º do artigo 9º do Decreto-Lei nº 2.164/84 e o artigo
4º, §3º da Lei nº 8.692/93) no caso de não haver a proporcionalidade
inicial ante a redução da renda por mudança de emprego ou por alteração
na composição da renda familiar em decorrência da exclusão de um ou mais
coadquirentes.
5 - Num caso como esse, é dada oportunidade ao mutuário de, através da
renegociação, manter a capacidade em pagar as prestações, diminuindo-as,
na sua relação inicial entre prestação/salário (Lei nº 8.692, artigos
4º, §4º, 13 e 14), e não sendo penalizado, se deixar de pagar os encargos
mensais, tendo requerido sua revisão, com a juntada de comprovantes das
variações da renda e a instituição financeira não responder formalmente,
após 60 (sessenta) dias do pedido.
6 - Tratando-se de matéria de direito e de fato há a necessidade de fazer
a produção da prova pericial, vez que o mutuário tem direito de ter o
valor da sua prestação reajustada pelo pactuado.
7 - O Magistrado não deve estar adstrito ao laudo pericial, contudo, nesse
tipo de demanda, que envolve critérios eminentemente técnicos e complexos
do campo financeiro-econômico, há que ser prestigiado o trabalho realizado
pelo expert.
8 - Quanto à questão sobre se a instituição financeira contratante
observou o Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - PES
ou o salário mínimo para o reajustamento das prestações, a mesma deve
ser analisada à luz do contrato, dos documentos acostados e do trabalho do
perito.
9 - Com efeito, o agente credor, segundo declarações do Sr. Perito, se
tivesse aplicado aos valores das prestações os percentuais de reajustamentos
dos salários do mutuário, os valores das prestações seriam maiores do
que aqueles efetivamente cobrados.
10 - No tocante à incidência do Coeficiente de Equiparação Salarial -
CES na 1ª (primeira) parcela do financiamento, não assiste razão as
instituições financeiras.
11 - O entendimento jurisprudencial é no sentido de que o Coeficiente de
Equiparação Salarial - CES deve incidir sobre os contratos de mútuo
vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação - SFH, nos casos em que
houver disposição expressa no instrumento acerca de sua aplicação,
ainda que celebrados anteriormente à vigência da Lei nº 8.692/93.
12 - Da análise da cópia do contrato firmado, verifica-se que não
há disposição expressa dando conta da incidência do Coeficiente de
Equiparação Salarial - CES no financiamento.
13 - Desta feita, não há que se reconhecer a aplicação do CES nos
cálculos das prestações do financiamento, o que deve ser respeitado,
inclusive, em homenagem ao princípio da força obrigatória dos contratos.
14 - O contrato avençado entre as partes estabelece como sistema de
amortização, o método conhecido como Tabela PRICE ou Sistema Francês de
Amortização.
15 - A aplicação da Tabela PRICE consiste em plano de amortização e uma
dívida em prestações periódicas, iguais e sucessivas, em que o valor de
cada prestação, ou pagamento, é composto por duas parcelas distintas: uma de
juros e outra de amortização do capital, motivo pelo qual a sua utilização
não é vedada pelo ordenamento jurídico e não traz a capitalização dos
juros, vê-se que o valor da prestação é decrescente até a liquidação
que se dará na última prestação avençada.
16 - Muito embora o STJ venha admitindo a aplicabilidade do Código de
Defesa do Consumidor, é necessário que as irregularidades que tenham sido
praticadas estejam amparadas por provas inequívocas, sendo insuficiente a
alegação genérica.
17 - Assim, não havendo prova nos autos que a entidade financeira tenha
praticado violação contratual, resta afastada a aplicação do art. 42 do
Código de Defesa do Consumidor.
18 - Ressalte-se que a restituição de valores pagos a maior pelo mutuário,
segundo o artigo 23 da Lei 8.004/90, é feita geralmente mediante a
compensação com prestações vincendas, ou, se já não houver nem vencidas
nem vincendas em aberto, a devolução em espécie ao mutuário. Não havendo,
portanto, que apreciar a questão da devolução de valores pagos a maior.
19 - Os contratos de mútuo, nos termos da Lei 4.380/64, que instituiu
o Sistema Financeiro da Habitação para aquisição da casa própria,
construção ou venda de unidades habitacionais, através de financiamento
imobiliário, são típicos contratos de adesão de longa duração,
com cláusulas padrão, sujeitos aos critérios legais em vigor à época
de sua assinatura, em que não há lugar para a autonomia da vontade na
definição do conteúdo, restando ao mutuário submeter-se às condições
pré-determinadas.
20 - O mutuário, nesse tipo de contrato, subordina-se às condições
pré-estabelecidas quanto às taxas ou índices de correção monetária e
o montante a ser reajustado, não podendo discuti-las e dispor do bem, mas
outorgando poderes ao agente financeiro para alienar o imóvel a terceiro,
em seu nome determinar o preço, imitir o adquirente na posse do imóvel etc.
21 - No caso das prestações, é o Poder Executivo que formula as políticas
de reajustamento e estabelece as taxas ou os índices de correção monetária
da moeda.
21 - A própria origem dos recursos que sustentam o sistema leva à finalidade
social. Destaca-se a arrecadação proveniente do Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço FGTS, criado pela antiga Lei 5170 de 13/09/66, formado pelos
depósitos de 8% sobre a folha mensal dos salários das empresas. Essas
contas são capitalizadas com juros e correção monetária, em que a CEF é
a encarregada da administração dos valores. Captam-se ainda, as somas nos
depósitos específicos em cadernetas de poupança, que podem ser abertas
em quaisquer agências das Caixas Econômicas, nas sociedades de crédito
imobiliário e nas associações de poupança e empréstimo.
22 - O caráter social transparece nos princípios determinantes: facilitar
e promover a construção e a aquisição da moradia, especialmente para
as camadas sociais de menor renda e nas disposições que condicionam a
equivalência das prestações ao poder aquisitivo do mutuário, artigos 1º,
5º e 9° da Lei n° 4380/64.
23 - De se ver, portanto, que não pode o mutuário unilateralmente -
simplesmente por mera conveniência - exigir a aplicação de critério
diversos do estabelecido contratualmente, devendo ser respeitado o que foi
convencionado entre as partes.
24 - O contrato de mútuo habitacional estabeleceu a taxa anual de juros
nominal de 9,400% e a efetiva de 9,816%. Os mutuários alegam de forma
genérica, vaga e imprecisa que o agente credor não aplicou o percentual
estabelecido no contrato, deixando de carrear o mínimo de elementos capazes
de corroborar a tese por eles defendida, a qual não deve prevalecer.
25 - O disposto no art. 6º, alínea "e", da Lei 4.380/64 não configura uma
limitação de juros, dispondo apenas sobre as condições de reajustamento
estipuladas nos contratos de mútuo previstos no art. 5º, do referido
diploma legal.
26 - Destarte não deve ser considerada uma limitação dos juros a serem
fixados aos contratos de mútuo regidos pelas normas do Sistema Financeiro
da Habitação - SFH, conforme alegado pela parte autora, devendo ser mantido
o percentual de juros pactuado entre as partes.
27 - Quanto à legalidade na fixação de uma taxa de juros nominal e outra
de juros efetiva cabe, a priori, destacar que nominal é a taxa de juros
remuneratórios relativos ao período decorrido, cujo valor é o resultado
de sua incidência mensal sobre o saldo devedor remanescente corrigido,
já a taxa efetiva é a taxa nominal exponencial, identificando o custo
total do financiamento.
28 - Com efeito, o cálculo dos juros se faz mediante a aplicação de
um único índice fixado, qual seja 9,4000%, conforme quadro resumo, cuja
incidência mês a mês, após o período de 12 (doze) meses, resulta a taxa
efetiva de 9,816% ao ano, não havendo fixação de juros acima do permitido
por lei.
29 - Com a Resolução 1, de 24/04/77, do Conselho Administrativo do BNH a UPC
passou a ser aplicada como fator de atualização não só, trimestralmente,
do saldo devedor, como também de reajuste, anualmente, das prestações,
que eram reajustadas pelo salário mínimo.
30 - O fato das prestações serem reajustadas pela UPC não descaracteriza
o sentido da equivalência salarial, pois tal reajuste não pode ultrapassar
os percentuais de aumento do salário mínimo, sem contar o fato de que os
índices de correção eram inferiores aos aumentos do salário mínimo.
31 - Sobre a correção monetária do saldo devedor, consigno que a forma
de reajuste deve seguir o pactuado, ou seja, à utilização da UPC como
índice, conforme dispõe a CLÁUSULA SEXTA, caput e parágrafos QUINTO,
do contrato firmado entre as partes.
32 - Desta feita, correta a decisão do Juízo a quo ao não conhecer o
pedido de recálculo do saldo devedor pelo INPC por falta de interesse de
agir, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil.
33 - Os mutuários questionam a aplicação do índice de 84,32% para
atualização do saldo devedor referente ao mês de março de 1990, entendendo
que o correto seria a correção pela variação do Bônus do Tesouro Nacional
Fiscal - BTNF do referido mês.
34 - Entretanto, tal entendimento não deve ser admitido, vez que o Superior
Tribunal de Justiça firmou posição no sentido de que o índice de 84,32%
é o que deve ser utilizado para atualização do saldo devedor para o mês
de março de 1990, no que se refere aos contratos de mútuo habitacional.
35 - Nos contratos de mútuo para aquisição de imóvel, firmados no âmbito
do Sistema Financeiro da Habitação, o índice aplicável ao saldo devedor,
com a criação do Plano Collor, no mês de março de 1990, é o IPC no
percentual de 84,32%, vez que este índice serviu de correção para todos
os valores da poupança e é consagrado por este E. Tribunal como fator de
correção do FGTS.
36 - Nos contratos de mútuo regidos pelo SFH, as partes não têm margem de
liberdade para contratar, já que os fundos por ele utilizados são verbas
públicas.
37 - Tal regra também é aplicável no que diz respeito ao seguro, que
deve ser contratado, por força da Circular SUPEP 111, de 03 de dezembro de
1999, visando cobrir eventuais sinistros ocorridos no imóvel e de morte
ou invalidez dos mutuantes, motivo pelo qual, não pode ser comparado aos
seguros habitacionais que possuem outros valores.
38 - Portanto, não há como considerar ilegal a cobrança do seguro, uma
vez que não se trata de venda casada nem foi demonstrado eventual abuso.
39 - Sendo assim, não há nenhuma razão plausível para que as cláusulas
sejam consideradas nulas.
40 - No que tange ao Decreto-lei nº 70/66, não é inconstitucional, havendo,
nesse sentido, inúmeros precedentes do E. Supremo Tribunal Federal e do
E. Superior Tribunal de Justiça. Ademais, a cláusula 27ª do contrato
firmado entre as partes prevê a possibilidade de execução extrajudicial
do imóvel nos termos do Decreto-lei nº 70/66.
41 - No que toca à amortização do débito, não se observa qualquer
equívoco na forma em que as prestações são computadas para o abatimento
do principal da dívida, eis que, quando do pagamento da primeira parcela do
financiamento, já haviam transcorrido trinta dias desde a entrega do total
do dinheiro emprestado, devendo, assim, os juros e a correção monetária
incidir sobre todo o dinheiro mutuado, sem se descontar o valor da primeira
prestação, sob pena de se remunerar e corrigir valores menores do que os
efetivamente emprestados.
42 - A redação da alínea "c" do artigo 6º da Lei n.º 4.380/64, apenas
indica que as prestações mensais devem ter valores iguais, por todo o
período do financiamento, considerando-se a inexistência de reajuste,
o qual, quando incidente, alterará nominalmente o valor da prestação.
43 - A pretensão dos mutuários em ver amortizada a parcela paga antes da
correção monetária do saldo devedor não procede, posto que inexiste a
alegada quebra do equilíbrio financeiro, controvérsia esta que já restou
pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.
44 - Conforme informação nos autos, dado o lapso temporal decorrido entre a
sentença recorrida e o julgamento dos presentes recursos, tendo em vista as
características do contrato, os elementos trazidos aos autos, a constatação
da cobrança irregular no valor das prestações, ante o acréscimo do CES,
não previsto contratualmente, desde a primeira prestação paga e por todo
o período estipulado para quitação da dívida, não há que se falar em
decisão condicional uma vez que decorreu prazo suficiente para a quitação
de uma única parcela vincenda.
45 - Mister apontar que o § 1º do artigo 9º da Lei 4.380/64, que determinava
a não possibilidade de aquisição de imóvel por financiamento, pelo SFH,
no caso da existência de mais de um imóvel na mesma localidade, nada dispõe
sobre restrições à cobertura de saldo devedor residual pelo FCVS, de modo
que não cabe impor ao mutuário a perda do direito de quitação da dívida,
pelo fundo, por tal motivo.
46 - Observa-se que a restrição de cobertura pelo FCVS de apenas um saldo
devedor remanescente ao final do contrato, imposta pelo § 1º do artigo 3º
da Lei nº 8100, de 05/11/90, aplica-se aos contratos firmados a partir de
sua vigência, não retroagindo para alcançar contratos anteriores.
47 - Destaca-se que a Lei nº 10.150/2000, que alterou o artigo 3º da lei
acima citada, ressalta a possibilidade de quitação, pelo FCVS, de mais de um
saldo devedor remanescente por mutuário, relativos aos contratos anteriores a
05/12/1990 e jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é uniforme
no sentido de que o artigo 9º, §1º, da Lei nº 4.380/64 não afasta a
quitação de um segundo imóvel financiado pelo mutuário, situado na mesma
localidade, utilizando os recursos do FCVS (REsp 1.133.769/RN submetido à
sistemática dos recursos repetitivos, nos termos do artigo 543-C do CPC/73).
48 - Note-se que todas as prestações pagas pelo mutuário foram acrescidas
de parcela destinada ao fundo, não havendo como admitir que a instituição
financeira determine, eventualmente, a perda do direito à quitação
do saldo devedor pelo fundo, como sanção frente ao não cumprimento de
cláusula contratual outra, aplicação esta não prevista tanto na norma
acima citada como no contrato firmado.
49 - Nesse passo, é descabido reputar válido o contrato naquilo que o agente
financeiro e o fundo aproveitam, ou seja, o recebimento das prestações e
das parcelas destinadas ao FCVS, respectivamente, e inválido naquilo que
em hipótese lhe prejudica, ou seja, a cobertura do saldo devedor residual
pelo FCVS, impondo aos mutuários a perda do direito de quitação da dívida.
50 - Diante de tal quadro, revela-se perfeitamente aplicável ao caso concreto
o reconhecimento do direito dos mutuários à quitação do financiamento
contratado, bem como a respectiva baixa da hipoteca incidente sobre o
imóvel em questão, após o pagamento das prestações avençadas e as
contribuições ao fundo pagas até a data do requerimento administrativo,
cabendo a restituição, pelo agente financeiro, aos apelados, do total
dos valores pagos a parte que diz respeito especificamente com relação
ao Coeficiente de Equiparação Salarial acrescido às prestações desde
o início do contrato.
51 - É evidente que a liberação da garantia hipotecária só se dá
com o pagamento do financiamento nas formas previstas em lei, cabendo ao
agente financeiro a prática de todos os atos necessários para que referida
liquidação aconteça, sendo a forma e o prazo da cobertura pelo Fundo de
Compensação da Variação Salarial objeto de execução na 1ª instância.
52 - Preliminar rejeitada. Apelações improvidas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida pela Caixa Econômica Federal -
CEF e, no mérito, negar provimento aos recursos de apelação interpostos,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
14/03/2017
Data da Publicação
:
28/03/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1713949
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/03/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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