TRF3 0024236-20.2006.4.03.6100 00242362020064036100
CONSTITUCIONAL. ADCT. ANISTIADO. IMPRESCRITIBILIDADE. TORTURA. REGIME
MILITAR. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MATERIAIS E MORAIS. INDENIZAÇÃO. CARÁTER
DÚPLICE. INOCORRENTE. BIS IN IDEM. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. JUROS
MORATÓRIOS.
1. Imprescritíveis as ações de reparação de danos decorrentes de
perseguição política durante o regime da ditadura militar, não havendo
que se falar no prazo prescricional quinquenal previsto pelo art. 1º do
Decreto 20.910/32, bem como o entendimento de que o advento da Lei 10.559/02
implicou renúncia tácita à prescrição. Precedentes.
2. A responsabilidade objetiva do Estado está estampada no artigo 37, §6º
da Constituição Federal e, na forma do texto constitucional, o Estado e
a pessoa jurídica de direito privado prestadora do serviço respondem a
terceiros pelo dano causado, independente de dolo ou culpa.
3. A responsabilidade objetiva do Estado restou devidamente caracterizada
e reconhecida, até em razão da concessão administrativa de indenização
tanto na esfera federal quanto na estadual, não existindo controvérsia a
esse respeito.
4. Havia entendimento de que a indenização prevista pela Lei 10.559/02
englobava tanto valores relativos a danos materiais quanto morais,
portanto possuindo dúplice caráter indenizatório, uma vez que tanto
o texto constitucional transitório quanto da lei específica utiliza
apenas a expressão "reparação econômica de caráter indenizatório",
sem maiores especificações. Ato contínuo, entendia-se que, à hipótese,
a proposição de demanda com o intuito de obtenção de indenização por
danos morais não seria admissível, sob pena de infração do princípio
do bis in idem - nesse sentido, o Acórdão proferido no âmbito do REsp
1.323.405/DF, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima (DJe 01.04.2013)
- inclusive em razão disposto pelo art. 16 da mencionada Lei. No entanto,
recentemente houve modificação do entendimento: em sentido diverso, a
reparação econômica não possuiria caráter dúplice, mas tão somente
material, não constituindo óbice sua acumulação com indenização por
dano moral; assim, ainda que possuindo causa comum, diversos seriam seus
fundamentos e finalidades, ou seja, recomposição patrimonial de um lado e
reparação por ofensa aos direitos da personalidade, por outro. Precedentes.
5. Quanto ao valor da indenização, entendo ser razoável o montante de
R$100.000,00, valor que de fato é amiúde arbitrado nesta Corte, cabendo
o pagamento de R$50.000,00 por parte de cada um dos apelados. Precedentes
desta Corte.
6. Quanto à atualização monetária, o e. Superior Tribunal de Justiça
editou a Súmula 362/STJ: "A correção monetária do valor da indenização
do dano moral incide desde a data do arbitramento." Os juros moratórios
incidem a partir do evento danoso, a teor da Súmula 54/STJ.
7. No tocante aos juros moratórios e atualização monetária em específico,
considerando que ainda não houve pronunciamento expresso do Egrégio Supremo
Tribunal Federal quanto à constitucionalidade ou não do artigo 1º-F
da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, entendo
pela aplicação dos critérios insculpidos no Manual de Orientação
para os Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião do julgado -
especificamente, a Resolução 134/2010-CJF, com as modificações introduzidas
pela Resolução 267/2013-CJF, ou seja, "correção monetária, a partir
de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15 / IBGE)
e, a título de juros de mora: até dez/2002, incidem juros de 0,5% ao mês
(artigos 1062 a 1064 do CC/1916); de jan/2003 a jun/2009 aplica-se a Selic
(Art. 406 da Lei n.10.406/2002 - Código Civil); de jul/2009 a abr/2012,
aplica-se a taxa de 0,5% ao mês (Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de
setembro de 1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de
2009, combinado com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991); e a partir de
maio/2012 incide o mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta
de poupança, capitalizados de forma simples (Art. 1º.-F da Lei n. 9.494,
de 10 de setembro de 1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29
de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991,
com alterações da MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei
n. 12.703, de 07 de agosto de 2012). Ressalte-se que nessa especificação
de índices já está considerado o resultado das ADI Nº 4357 e 4425,
bem como a respectiva modulação de seus efeitos pelo STF.
8. Quanto aos honorários advocatícios, trata-se de hipótese em que restou
vencida a Fazenda Pública, incidindo o §4º do art. 20 do CPC/73; não
obstante, arbitro honorários no montante de 10% do valor da condenação,
cabendo o pagamento de 5% por parte de cada um dos apelados.
9. Apelo provido.
Ementa
CONSTITUCIONAL. ADCT. ANISTIADO. IMPRESCRITIBILIDADE. TORTURA. REGIME
MILITAR. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MATERIAIS E MORAIS. INDENIZAÇÃO. CARÁTER
DÚPLICE. INOCORRENTE. BIS IN IDEM. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. JUROS
MORATÓRIOS.
1. Imprescritíveis as ações de reparação de danos decorrentes de
perseguição política durante o regime da ditadura militar, não havendo
que se falar no prazo prescricional quinquenal previsto pelo art. 1º do
Decreto 20.910/32, bem como o entendimento de que o advento da Lei 10.559/02
implicou renúncia tácita à prescrição. Precedentes.
2. A responsabilidade objetiva do Estado está estampada no artigo 37, §6º
da Constituição Federal e, na forma do texto constitucional, o Estado e
a pessoa jurídica de direito privado prestadora do serviço respondem a
terceiros pelo dano causado, independente de dolo ou culpa.
3. A responsabilidade objetiva do Estado restou devidamente caracterizada
e reconhecida, até em razão da concessão administrativa de indenização
tanto na esfera federal quanto na estadual, não existindo controvérsia a
esse respeito.
4. Havia entendimento de que a indenização prevista pela Lei 10.559/02
englobava tanto valores relativos a danos materiais quanto morais,
portanto possuindo dúplice caráter indenizatório, uma vez que tanto
o texto constitucional transitório quanto da lei específica utiliza
apenas a expressão "reparação econômica de caráter indenizatório",
sem maiores especificações. Ato contínuo, entendia-se que, à hipótese,
a proposição de demanda com o intuito de obtenção de indenização por
danos morais não seria admissível, sob pena de infração do princípio
do bis in idem - nesse sentido, o Acórdão proferido no âmbito do REsp
1.323.405/DF, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima (DJe 01.04.2013)
- inclusive em razão disposto pelo art. 16 da mencionada Lei. No entanto,
recentemente houve modificação do entendimento: em sentido diverso, a
reparação econômica não possuiria caráter dúplice, mas tão somente
material, não constituindo óbice sua acumulação com indenização por
dano moral; assim, ainda que possuindo causa comum, diversos seriam seus
fundamentos e finalidades, ou seja, recomposição patrimonial de um lado e
reparação por ofensa aos direitos da personalidade, por outro. Precedentes.
5. Quanto ao valor da indenização, entendo ser razoável o montante de
R$100.000,00, valor que de fato é amiúde arbitrado nesta Corte, cabendo
o pagamento de R$50.000,00 por parte de cada um dos apelados. Precedentes
desta Corte.
6. Quanto à atualização monetária, o e. Superior Tribunal de Justiça
editou a Súmula 362/STJ: "A correção monetária do valor da indenização
do dano moral incide desde a data do arbitramento." Os juros moratórios
incidem a partir do evento danoso, a teor da Súmula 54/STJ.
7. No tocante aos juros moratórios e atualização monetária em específico,
considerando que ainda não houve pronunciamento expresso do Egrégio Supremo
Tribunal Federal quanto à constitucionalidade ou não do artigo 1º-F
da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, entendo
pela aplicação dos critérios insculpidos no Manual de Orientação
para os Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião do julgado -
especificamente, a Resolução 134/2010-CJF, com as modificações introduzidas
pela Resolução 267/2013-CJF, ou seja, "correção monetária, a partir
de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15 / IBGE)
e, a título de juros de mora: até dez/2002, incidem juros de 0,5% ao mês
(artigos 1062 a 1064 do CC/1916); de jan/2003 a jun/2009 aplica-se a Selic
(Art. 406 da Lei n.10.406/2002 - Código Civil); de jul/2009 a abr/2012,
aplica-se a taxa de 0,5% ao mês (Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de
setembro de 1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de
2009, combinado com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991); e a partir de
maio/2012 incide o mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta
de poupança, capitalizados de forma simples (Art. 1º.-F da Lei n. 9.494,
de 10 de setembro de 1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29
de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991,
com alterações da MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei
n. 12.703, de 07 de agosto de 2012). Ressalte-se que nessa especificação
de índices já está considerado o resultado das ADI Nº 4357 e 4425,
bem como a respectiva modulação de seus efeitos pelo STF.
8. Quanto aos honorários advocatícios, trata-se de hipótese em que restou
vencida a Fazenda Pública, incidindo o §4º do art. 20 do CPC/73; não
obstante, arbitro honorários no montante de 10% do valor da condenação,
cabendo o pagamento de 5% por parte de cada um dos apelados.
9. Apelo provido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
maioria, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Des. Fed. Marcelo
Saraiva (Relator), com quem votaram o Des. Fed. André Nabarrete e, na forma
dos artigos 53 e 260, §1.º do RITRF3, a Des. Fed. Consuelo Yoshida e o
Des. Fed. Johonson Di Salvo (com ressalva de posicionamento pessoal). Vencida
a Des. Fed. Marli Ferreira, que acompanhava o e. Relator quanto ao montante
indenizatório de R$100.000,00, descontando-se, contudo, eventuais valores
recebidos administrativamente (R$ 22.000,00 do Estado de SP - fls.89 e R$
26.400,00 da União Federal - fls. 314), devidamente atualizados.
Data do Julgamento
:
07/12/2017
Data da Publicação
:
08/02/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1621156
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED DEC-20910 ANO-1932 ART-1
LEG-FED LEI-10559 ANO-2002 ART-16
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-37 PAR-6
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-362
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-54
LEG-FED LEI-9494 ANO-1997 ART-1F
LEG-FED LEI-11960 ANO-2009
***** MCR-10 MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS PARA OS CÁLCULOS NA JF
LEG-FED RCJF-134 ANO-2010
***** MCR-13 MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS PARA OS CÁLCULOS NA JF
LEG-FED RCJF-267 ANO-2013
***** CC-16 CÓDIGO CIVIL DE 1916
LEG-FED LEI-3071 ANO-1916 ART-1062 ART-1063 ART-1064
***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002
LEG-FED LEI-10406 ANO-2002 ART-406
LEG-FED LEI-8177 ANO-1991
LEG-FED MPR-567 ANO-2012
LEG-FED LEI-12703 ANO-2012
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-20 PAR-4
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/02/2018
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