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Jurisprudência


TRF3 0028088-18.2007.4.03.6100 00280881820074036100

Ementa
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RADIODIFUSÃO. VIOLAÇÃO AO LIMITE LEGAL DE 25% DE PUBLICIDADE NA PROGRAMAÇÃO TELEVISIVA. RECEPÇÃO DA LEI 4.117/1962 PELA CF/88. CÓDIGO BRASILEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES AINDA É A LEGISLAÇÃO QUE REGE A MATÉRIA. ADI 561 MC/DF. APLICAÇÃO DIRETA DA PENA DE CASSAÇÃO. DESCABIMENTO. CONDENAÇÃO EM DANOS MORAIS COLETIVOS. DESCABIMENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO DANO E DO NEXO DE CAUSALIDADE. ART. 927, CC/2002. PRECEDENTES. AGRAVO RETIDO E REMESSA OFICIAL NÃO PROVIDOS. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. 1. Agravo retido conhecido, posto que reiterado em apelação. 2. A preliminar de ilegitimidade ativa ad causam merece ser afastada, uma vez que os arts. 5º, V, "a", e 21, ambos da Lei n.º 7.347/85, c/c o art. 82, IV, da Lei n.º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) legitimam as associações para propor Ações Civis Públicas. 3. Outrossim, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva de Shop Tour TV Ltda, visto que há unidade de condutas entre as rés, bem assim litisconsórcio necessário entre elas, nos termos do art. 47 do CPC/73, vigente à época da propositura da ação. 4. No que tange à ausência de provas a embasarem a condenação e a alegada "indevida inversão do ônus da prova" acerca da extrapolação do limite de 25% de publicidade na programação, não assiste razão aos apelantes. 5. A produção de prova foi suficiente para formação da cognição do magistrado, visto que a União, por meio do Ministério das Comunicações, trouxe aos autos documentos acostados às fls. 514/642, em que constam processos administrativos de apuração de infração instaurados para a verificação das irregularidades apontadas. Tais processos contém, inclusive, degravação da programação das rés, em que se comprova o quanto alegado pela autora na inicial. 6. Em relação à rejeição genérica dos Embargos de Declaração, também não assiste razão aos apelantes, vez que a sentença embargada não contém as hipóteses descritas no art. 535 do CPC/73. 7. Quanto à alegação de que o Código Brasileiro de Telecomunicações foi recepcionado apenas no que toca a seus aspectos "conceituais" e se encontra defasado, tal matéria já foi apreciada por esta Corte e pelo e. STF e não comporta provimento. 8. O Acórdão proferido na ADI 561 MC/DF pela Corte Constitucional é bastante claro ao reconhecer que a Lei n.º 4.117/62 (Código Brasileiro de Telecomunicações) foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 em seus aspectos gerais e "ainda configura o estatuto jurídico básico disciplinador dos serviços de telecomunicações". 9. Não há que se falar, pois, em não recepção de tal instituto pela Constituição Federal. Nem se diga que o ordenamento jurídico pátrio não acompanhou a evolução dos meios de comunicação e da produção de conteúdo televisivo. 10. Com efeito, seis anos após o julgamento da referida ADI entrou em vigência a Lei n.º 12.485/2011, que normatizou a comunicação audiovisual de acesso condicionado, incluindo dispositivos que regulam sua publicidade e os chamados "infomerciais". 11. Referida lei preconiza que os canais de acesso condicionado também têm o dever de respeitar o limite de 25% de publicidade comercial em sua grade horária, com exceção dos canais exclusivos de publicidade comercial, de vendas e de infomerciais. 12. Dito isso, há que se delimitar a questão controvertida nos autos: o conteúdo veiculado sob a forma de acesso condicionado está abrigado pela exceção do parágrafo único do artigo 24 da Lei n.º 12.485/2011. O conteúdo de publicidade comercial veiculado nas transmissões de radiodifusão em sinal aberto, que é o objeto dos autos, continua com a publicidade limitada aos 25% estabelecidos pela Lei n.º 4.117/1962. 13. No que concerne à pena de cassação da concessão estabelecida na sentença para a hipótese de descumprimento do limite de publicidade, assiste razão às apelantes. 14. Ocorre que a Lei n.º 4.117/1962 prevê expressamente as hipóteses e condições para aplicação da pena de cassação da concessão. 15. Como se vê, não há previsão de aplicação de pena de cassação diretamente para a hipótese de descumprimento do art. 124 da Lei 4.114/62. Aliás, para a hipótese em testilha sequer é possível a aplicação direta da pena de cassação antes da prévia aplicação da pena de suspensão prevista no art. 63 da referida norma de regência. 16. Apenas na hipótese de reincidência na infração de desrespeito ao limite de publicidade anteriormente punida com suspensão (art. 64, "a" da Lei 4.114/62), ou na ausência de correção tempestiva da infração motivadora da suspensão anteriormente imposta (art. 64, "e", da indigitada norma), é possível a aplicação da pena de cassação da concessão. 17. Destarte, merece reforma a r. sentença na parte em que estabeleceu punição direta em desrespeito à gradação prevista em lei. 18. Quanto à alegada ausência de dano moral coletivo, igualmente assiste razão às apelantes. 19. Apesar de ter havido apuração pelo Ministério das Comunicações de desrespeito ao limite de 25% de publicidade comercial na grade horária das rés, a autora não logrou demonstrar, nem com os documentos acostados nos autos, nem com sua argumentação, qual seria o efetivo dano moral experimentado pela coletividade. 20. Muito embora in abstrato o dano moral coletivo seja reconhecível pelo magistrado, no caso em comento não restaram configuradas as hipóteses de responsabilidade civil previstas no Código Civil. 21. Ressalto, neste quesito, os entendimentos adotados pelo c. STJ, que já decidiu tanto pela incompatibilidade entre o dano moral e a transindividualidade do direito tutelado na Ação Civil Pública, quanto pelo pontual cabimento de indenização por dano moral coletivo em casos específicos. 22. Não obstante parte da jurisprudência do c. STJ admita em determinados casos a existência de dano moral coletivo "transindividual" (com sujeito passivo indeterminável e ofensa e reparação indivisíveis), é sempre necessária a demonstração de todos os requisitos para configuração da responsabilidade civil (dano, culpa e nexo de causalidade), como disposto no art. 927 e ss., do Código Civil. 23. Assim, não demonstrado pela parte o dano causado (seja ele sofrimento, ou mesmo prejuízo à moral ou à imagem da coletividade), tampouco o nexo de causalidade entre conduta das rés e o suposto dano moral, impossível reconhecer a existência de dever de indenizar. 24. Por fim, não comporta provimento o reexame necessário, submetido em razão da condenação da União no dever de fiscalizar, porquanto demonstrada a omissão da Administração Pública na fiscalização, que só veio a ocorrer no curso do processo. 25. Assim, uma vez evidenciada a ocorrência de descumprimento do art. 124 do Código Brasileiro de Telecomunicações pelas concessionárias rés, bem como a omissão da União na fiscalização, é de rigor: (I) a manutenção da condenação das concessionárias rés à readequação de sua grade de programação no prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de aplicação gradativa das sanções previstas na Lei 4.114/62, com respeito ao devido processo legal e aos critérios previstos na referida norma de regência, assim como (II) a manutenção da condenação da União no dever de fiscalizar o integral cumprimento da medida na forma da Lei de regência. 26. Com a reforma parcial da r. sentença e consequente sucumbência da associação autora na maior parte de seus pedidos, há de ser afastada a condenação dos réus na verba honorária. Ressalto que, não havendo litigância de má-fé, é descabida a condenação da parte autora em honorários advocatícios, por força do art. 17 da Lei 7.347/85. 27. Afastada a condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, a penalização direta de cassação das concessões para radiodifusão estabelecida pela sentença em desacordo com o art. 64 da Lei 4.114/62, bem assim excluída a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos da fundamentação. 28. Agravo retido e remessa oficial não providos. Apelações parcialmente providas.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido e à remessa oficial e dar parcial provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 21/02/2018
Data da Publicação : 02/03/2018
Classe/Assunto : ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2008510
Órgão Julgador : TERCEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CBT-62 CÓDIGO BRASILEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES LEG-FED LEI-4117 ANO-1962 ART-124 ART-63 ART-64 LET-A LET-E ***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002 LEG-FED LEI-10406 ANO-2002 ART-927 ***** LACP-85 LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-5 INC-5 LET-A ART-17 ART-21 ***** CDC-90 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-82 INC-4 ***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-47 ART-535 LEG-FED LEI-12485 ANO-2001 ART-24
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/03/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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