TRF3 0028283-86.2015.4.03.0000 00282838620154030000
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. INTERNET. PROVEDOR DE
COMPARTILHAMENTO DE VÍDEOS. IMAGEM DE CONTEÚDO OFENSIVO. ATO DE LIBERDADE
DE EXPRESSÃO E MANIFESTAÇÃO DE PENSAMENTO. CENSURA. HONRA E IMAGEM. AGRAVO
DE INSTRUMENTO PROVIDO.
1. A visualização do vídeo permite verificar que o autor não trata de
questões relativas à intimidade ou vida privada, mas de supostos ilícitos
praticados no âmbito da Administração Pública, inclusive com indicação de
nome de servidores, envolvendo ações e práticas investigadas pela Operação
Zelotes. O autor do vídeo, que informa ter sido fiscal da Receita Federal,
lançou imputações, buscando associar a sua demissão do cargo público
a perseguições em razão de críticas e oposição a práticas ilícitas
verificadas, denunciadas tanto à Receita Federal, como Polícia Federal e
Ministério Público Federal, que teriam deixado de investigar e apurar os
fatos.
2. As narrativas, imputações, qualificações e acusações, no quanto
lesivas à honra e imagem de servidores públicos e membros do Ministério
Público Federal, devem ser objeto de discussão e providências em via
própria, o que, porém, não torna a veiculação do vídeo, enquanto
ato de manifestação de pensamento, expressão e crítica, passível
de censura. Em momento algum, o autor do vídeo ocultou sua identidade,
registrada tanto de forma escrita como verbal na divulgação do conteúdo,
sendo descritos vários nomes e situações relativas a fatos funcionais,
não cabendo aqui formular juízo de reprovabilidade civil ou penal.
3. A partir do momento em que veiculada, por vídeo na internet, tais
narrativas, imputações, qualificações e acusações, o autor responde
pela conduta praticada na esfera civil e penal, dentro do sistema, adotado
pela Constituição de 1988, baseado na liberdade com responsabilidade. A
liberdade de expressão e de manifestação do pensamento, que independe
de censura ou licença, não pode ser coibida judicialmente, sem embargo
do direito à indenização a partir do momento em que do exercício de tal
liberdade resulte a violação da honra e da imagem das pessoas.
4. Em relação à honra e imagem das pessoas nominadas no vídeo, a União
não tem legitimidade ativa para a respectiva defesa, mesmo que relativos a
atos funcionais praticados. No tocante à honra e imagem das instituições,
o Ministério Público tem personalidade jurídica própria para atuar em sua
defesa institucional. Somente a Receita Federal do Brasil e o Departamento
de Polícia Federal, enquanto meros órgãos, desprovidos de personalidade
jurídica própria, poderiam ser representados, em Juízo, pela União,
porém a violação da honra e imagem institucional em razão de acusações
de ilícitos praticados por seus agentes não é tese de fácil constatação
e apuração, especialmente em juízo de antecipação de tutela.
5. O vídeo foi publicado na internet em 02/07/2015, ao passo que a ação foi
ajuizada em 01/10/2015, o que é muito, em termos de tempo na era digital,
revelando que o acesso de modo espontâneo já ocorreu. A prática da
censura, que se pretende viabilizar, além de inconstitucional, tem efeito
colateral grave, pois tende a ampliar, promover e impulsionar a publicidade
e a curiosidade pública sobre o material, de sorte a atrair atenção e
repercussão muito além do que verificado até então.
6. A jurisprudência é criteriosa e seletiva na limitação do exercício
da liberdade constitucional de expressão e manifestação do pensamento
e informação, admitindo a exclusão da veiculação de conteúdo apenas
quando possam suscitar perigo social ou à ordem pública, como, por exemplo,
ocorre na divulgação de mensagens de ódio racial.
7. Embora a liberdade de manifestação e expressão do pensamento e da
informação não permite a censura preconizada, evidencia-se, por outro
lado, que eventual dano que decorra de tal divulgação pode gerar discussão
judicial de responsabilidade civil extensível à agravante, na ótica de que
o risco do negócio é de quem o explora e continua a explorá-lo ainda depois
de advertido, por via judicial, de eventual dano à honra ou imagem alheia.
8. Agravo de instrumento provido.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. INTERNET. PROVEDOR DE
COMPARTILHAMENTO DE VÍDEOS. IMAGEM DE CONTEÚDO OFENSIVO. ATO DE LIBERDADE
DE EXPRESSÃO E MANIFESTAÇÃO DE PENSAMENTO. CENSURA. HONRA E IMAGEM. AGRAVO
DE INSTRUMENTO PROVIDO.
1. A visualização do vídeo permite verificar que o autor não trata de
questões relativas à intimidade ou vida privada, mas de supostos ilícitos
praticados no âmbito da Administração Pública, inclusive com indicação de
nome de servidores, envolvendo ações e práticas investigadas pela Operação
Zelotes. O autor do vídeo, que informa ter sido fiscal da Receita Federal,
lançou imputações, buscando associar a sua demissão do cargo público
a perseguições em razão de críticas e oposição a práticas ilícitas
verificadas, denunciadas tanto à Receita Federal, como Polícia Federal e
Ministério Público Federal, que teriam deixado de investigar e apurar os
fatos.
2. As narrativas, imputações, qualificações e acusações, no quanto
lesivas à honra e imagem de servidores públicos e membros do Ministério
Público Federal, devem ser objeto de discussão e providências em via
própria, o que, porém, não torna a veiculação do vídeo, enquanto
ato de manifestação de pensamento, expressão e crítica, passível
de censura. Em momento algum, o autor do vídeo ocultou sua identidade,
registrada tanto de forma escrita como verbal na divulgação do conteúdo,
sendo descritos vários nomes e situações relativas a fatos funcionais,
não cabendo aqui formular juízo de reprovabilidade civil ou penal.
3. A partir do momento em que veiculada, por vídeo na internet, tais
narrativas, imputações, qualificações e acusações, o autor responde
pela conduta praticada na esfera civil e penal, dentro do sistema, adotado
pela Constituição de 1988, baseado na liberdade com responsabilidade. A
liberdade de expressão e de manifestação do pensamento, que independe
de censura ou licença, não pode ser coibida judicialmente, sem embargo
do direito à indenização a partir do momento em que do exercício de tal
liberdade resulte a violação da honra e da imagem das pessoas.
4. Em relação à honra e imagem das pessoas nominadas no vídeo, a União
não tem legitimidade ativa para a respectiva defesa, mesmo que relativos a
atos funcionais praticados. No tocante à honra e imagem das instituições,
o Ministério Público tem personalidade jurídica própria para atuar em sua
defesa institucional. Somente a Receita Federal do Brasil e o Departamento
de Polícia Federal, enquanto meros órgãos, desprovidos de personalidade
jurídica própria, poderiam ser representados, em Juízo, pela União,
porém a violação da honra e imagem institucional em razão de acusações
de ilícitos praticados por seus agentes não é tese de fácil constatação
e apuração, especialmente em juízo de antecipação de tutela.
5. O vídeo foi publicado na internet em 02/07/2015, ao passo que a ação foi
ajuizada em 01/10/2015, o que é muito, em termos de tempo na era digital,
revelando que o acesso de modo espontâneo já ocorreu. A prática da
censura, que se pretende viabilizar, além de inconstitucional, tem efeito
colateral grave, pois tende a ampliar, promover e impulsionar a publicidade
e a curiosidade pública sobre o material, de sorte a atrair atenção e
repercussão muito além do que verificado até então.
6. A jurisprudência é criteriosa e seletiva na limitação do exercício
da liberdade constitucional de expressão e manifestação do pensamento
e informação, admitindo a exclusão da veiculação de conteúdo apenas
quando possam suscitar perigo social ou à ordem pública, como, por exemplo,
ocorre na divulgação de mensagens de ódio racial.
7. Embora a liberdade de manifestação e expressão do pensamento e da
informação não permite a censura preconizada, evidencia-se, por outro
lado, que eventual dano que decorra de tal divulgação pode gerar discussão
judicial de responsabilidade civil extensível à agravante, na ótica de que
o risco do negócio é de quem o explora e continua a explorá-lo ainda depois
de advertido, por via judicial, de eventual dano à honra ou imagem alheia.
8. Agravo de instrumento provido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
03/03/2016
Data da Publicação
:
10/03/2016
Classe/Assunto
:
AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 572023
Órgão Julgador
:
TERCEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/03/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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