TRF3 0029899-81.2005.4.03.6100 00298998120054036100
CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. FGTS. SAQUE
INDEVIDO. PRESCRIÇÃO. BOA-FÉ. ERRO ADMINISTRATIVO DA
CEF. RESTITUIÇÃO. DESNECESSIDADE. CARÁTER ALIMENTAR. SENTENÇA
REFORMADA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. A pretensão de restituição formulada na presente ação monitória
pela CEF possui como fundamento jurídico a vedação ao enriquecimento
sem causa e a obrigação de restituir, previstos no art. 876 do Código
Civil. Dessa forma, o prazo prescricional a ser aplicado é aquele previsto
no próprio Código Civil. Destarte, diante da alteração do Código Civil,
cumpre esclarecer que: (i) o art. 177 do Código de Civil de 1916 previa
prazo prescricional vintenário (20 anos) para as ações pessoais; (ii) o
Código Civil de 2002, no art. 206, §3º, IV, reduziu para 3 (três) anos
o prazo prescricional da pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem
causa. A regra de transição veio prevista no art. 2.028 do Código Civil de
2002, segundo a qual (i) se aplicam os prazos previstos no Código revogado,
quando, na data de sua entrada em vigor (11/01/2003), já houver transcorrido
mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada; (ii) todavia, se não
havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional previsto no Código
revogado, aplica-se o prazo previsto no Código Civil de 2002, a contar da
entrada em vigor deste último diploma legal. No caso dos autos, depreende-se
que o saque indevido ocorreu em 02/07/1996 e a presente ação de cobrança foi
proposta em 29/12/2005. Portanto, como não havia decorrido mais da metade
do prazo previsto no Código Civil de 1916 até a data em que o Código
Civil de 2002 entrou em vigor, aplica-se a regra de transição, devendo
ser contado o prazo de 3 (três) anos previsto no novo Código Civil da data
em que ele entrou em vigor, de modo que o prazo prescricional findar-se-ia
somente em 11/01/2006. A presente ação fora ajuizada antes desta data,
não estando a pretensão fulminada pela prescrição. Preliminar rejeitada.
2. A questão debatida cinge-se à obrigatoriedade de devolução dos valores
indevidamente sacados da conta vinculada do FGTS por fundista.
3. Narra a CEF que o réu, Sr. Antonio Vizarro Filho, levantou, em 02/07/1996,
o valor de R$ 9.270,11 da conta de FGTS nº 6961300020639/97000, posteriormente
convertido na conta nº 06966800499991/1048080. Contudo, apurou-se em
procedimento administrativo que este valor foi equivocadamente creditado na
conta do réu, no período de migração das contas do Banco COMIND para
a CEF, porquanto o Banco COMIND já havia transferido tais valores para o
Banco Itaú S/A por liberalidade do empregador.
4. Inicialmente, verifico que, no caso dos autos, não está cabalmente
comprovado que os valores sacados pelo apelado não lhe pertenciam, porquanto
não há prova de que a totalidade dos valores constantes na conta do FGTS
junto ao Banco COMIND foi transferida ao Banco Itaú S/A em 20/03/1979. Isso
porque não há qualquer documento que demonstre os valores transferidos ao
Banco Itaú S/A e os extratos juntados referem-se ao período posterior a
junho/1993.
5. Ademais, como se vê, o referido saque realizado pelo trabalhador na sua
conta fundiária ocorreu de boa-fé, haja vista que a autora reconheceu que
os valores integrantes do saque indevido advieram de erro administrativo,
sem qualquer participação do réu para a ocorrência daquela falha. Razão
pela qual não se mostra razoável, após decorrido 20 anos, condená-lo
a devolver referida importância, sobretudo porque o FGTS, direito social
assegurado constitucionalmente, derivado da remuneração e utilizado em
situações de dificuldades econômicas do trabalhador e sua família,
como a demissão, possui caráter alimentar.
6. Da mesma forma, não seria razoável considerar que o apelante possuía
a obrigação de ter conferido os valores, eis que não possível ter o
controle dos depósitos, tampouco das transferências que ocorreram entre as
instituições financeiras, sem contar as alterações de moeda. Incumbia,
em verdade, à CEF ter verificado a veracidade das informações fornecidas
pelo Banco COMIND antes de autorizar o levantamento dos valores.
7. Ademais, conforme reconhece a própria parte apelada, a responsabilidade
pelo "desfalque" havido no FGTS é imputável exclusivamente ao Banco COMIND,
que não informou a CEF que os valores depositados na conta da parte ré
já haviam sido transferidos para o Banco Itaú S/A. Logo, se a CEF merece
ser ressarcida, é o Banco COMIND quem deveria fazê-lo.
8. Por todas essas razões, não há como prosperar a pretensão de cobrança
promovida pelo Agente Operador do Fundo.
9. Em decorrência, inverto o ônus sucumbencial, devendo a CEF arcar com o
pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, fixados
em 10% sobre o valor da causa, atualizado.
10. Apelação da parte ré provida, para julgar improcedente o pedido
formulado na inicial da ação indenizatória, condenando a autora ao pagamento
das despesas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10%
sobre o valor da causa, atualizado, nos termos do voto.
Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. FGTS. SAQUE
INDEVIDO. PRESCRIÇÃO. BOA-FÉ. ERRO ADMINISTRATIVO DA
CEF. RESTITUIÇÃO. DESNECESSIDADE. CARÁTER ALIMENTAR. SENTENÇA
REFORMADA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. A pretensão de restituição formulada na presente ação monitória
pela CEF possui como fundamento jurídico a vedação ao enriquecimento
sem causa e a obrigação de restituir, previstos no art. 876 do Código
Civil. Dessa forma, o prazo prescricional a ser aplicado é aquele previsto
no próprio Código Civil. Destarte, diante da alteração do Código Civil,
cumpre esclarecer que: (i) o art. 177 do Código de Civil de 1916 previa
prazo prescricional vintenário (20 anos) para as ações pessoais; (ii) o
Código Civil de 2002, no art. 206, §3º, IV, reduziu para 3 (três) anos
o prazo prescricional da pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem
causa. A regra de transição veio prevista no art. 2.028 do Código Civil de
2002, segundo a qual (i) se aplicam os prazos previstos no Código revogado,
quando, na data de sua entrada em vigor (11/01/2003), já houver transcorrido
mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada; (ii) todavia, se não
havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional previsto no Código
revogado, aplica-se o prazo previsto no Código Civil de 2002, a contar da
entrada em vigor deste último diploma legal. No caso dos autos, depreende-se
que o saque indevido ocorreu em 02/07/1996 e a presente ação de cobrança foi
proposta em 29/12/2005. Portanto, como não havia decorrido mais da metade
do prazo previsto no Código Civil de 1916 até a data em que o Código
Civil de 2002 entrou em vigor, aplica-se a regra de transição, devendo
ser contado o prazo de 3 (três) anos previsto no novo Código Civil da data
em que ele entrou em vigor, de modo que o prazo prescricional findar-se-ia
somente em 11/01/2006. A presente ação fora ajuizada antes desta data,
não estando a pretensão fulminada pela prescrição. Preliminar rejeitada.
2. A questão debatida cinge-se à obrigatoriedade de devolução dos valores
indevidamente sacados da conta vinculada do FGTS por fundista.
3. Narra a CEF que o réu, Sr. Antonio Vizarro Filho, levantou, em 02/07/1996,
o valor de R$ 9.270,11 da conta de FGTS nº 6961300020639/97000, posteriormente
convertido na conta nº 06966800499991/1048080. Contudo, apurou-se em
procedimento administrativo que este valor foi equivocadamente creditado na
conta do réu, no período de migração das contas do Banco COMIND para
a CEF, porquanto o Banco COMIND já havia transferido tais valores para o
Banco Itaú S/A por liberalidade do empregador.
4. Inicialmente, verifico que, no caso dos autos, não está cabalmente
comprovado que os valores sacados pelo apelado não lhe pertenciam, porquanto
não há prova de que a totalidade dos valores constantes na conta do FGTS
junto ao Banco COMIND foi transferida ao Banco Itaú S/A em 20/03/1979. Isso
porque não há qualquer documento que demonstre os valores transferidos ao
Banco Itaú S/A e os extratos juntados referem-se ao período posterior a
junho/1993.
5. Ademais, como se vê, o referido saque realizado pelo trabalhador na sua
conta fundiária ocorreu de boa-fé, haja vista que a autora reconheceu que
os valores integrantes do saque indevido advieram de erro administrativo,
sem qualquer participação do réu para a ocorrência daquela falha. Razão
pela qual não se mostra razoável, após decorrido 20 anos, condená-lo
a devolver referida importância, sobretudo porque o FGTS, direito social
assegurado constitucionalmente, derivado da remuneração e utilizado em
situações de dificuldades econômicas do trabalhador e sua família,
como a demissão, possui caráter alimentar.
6. Da mesma forma, não seria razoável considerar que o apelante possuía
a obrigação de ter conferido os valores, eis que não possível ter o
controle dos depósitos, tampouco das transferências que ocorreram entre as
instituições financeiras, sem contar as alterações de moeda. Incumbia,
em verdade, à CEF ter verificado a veracidade das informações fornecidas
pelo Banco COMIND antes de autorizar o levantamento dos valores.
7. Ademais, conforme reconhece a própria parte apelada, a responsabilidade
pelo "desfalque" havido no FGTS é imputável exclusivamente ao Banco COMIND,
que não informou a CEF que os valores depositados na conta da parte ré
já haviam sido transferidos para o Banco Itaú S/A. Logo, se a CEF merece
ser ressarcida, é o Banco COMIND quem deveria fazê-lo.
8. Por todas essas razões, não há como prosperar a pretensão de cobrança
promovida pelo Agente Operador do Fundo.
9. Em decorrência, inverto o ônus sucumbencial, devendo a CEF arcar com o
pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, fixados
em 10% sobre o valor da causa, atualizado.
10. Apelação da parte ré provida, para julgar improcedente o pedido
formulado na inicial da ação indenizatória, condenando a autora ao pagamento
das despesas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10%
sobre o valor da causa, atualizado, nos termos do voto.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação da parte ré, para
julgar improcedente o pedido formulado na inicial da ação indenizatória,
condenando a autora ao pagamento das despesas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, atualizado, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
07/08/2017
Data da Publicação
:
15/08/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1753730
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/08/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão