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Jurisprudência


TRF3 0030475-75.2009.4.03.9999 00304757520094039999

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REGISTRO EMPREGATÍCIO DE NATUREZA RURAL. PROVA ORAL CONSISTENTE. LABOR RURAL DEMONSTRADO. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO TOTAL E PERMANENTE. DATA DE INÍCIO DA INCAPACIDADE LABORAL. DEFORMIDADE CONGÊNITA DE CARÁTER EVOLUTIVO. CONCESSÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS. ADEQUAÇÃO, DE OFÍCIO, DA CORREÇÃO MONETÁRIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. REsp 1205946/SP. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal. 2 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência. 3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis). 4 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017). 5 - Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91. 6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia. 7 - Necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual pode ser prorrogado por 24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos do art. 15 e §1º da Lei. 8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017). 9 - Depois da edição da Lei n. 8.213/91, a situação do rurícola modificou-se, já que passou a integrar um Sistema Único, com os mesmos direitos e obrigações dos trabalhadores urbanos, tornando-se segurado obrigatório da Previdência Social. 10 - Quanto ao desenvolvimento de atividade laboral, exige a Lei n. 8.213/91 início de prova material para comprovar a condição de rurícola, excluindo-se a prova exclusivamente testemunhal para esse fim, entendimento consagrado igualmente pela Súmula 149 do STJ. Sobre essa questão, é necessário destacar que o rol previsto no artigo 106 da Lei n. 8.213/91 não é taxativo, podendo, portanto, o postulante provar materialmente o exercício de atividade rural por meio de documentos não mencionados no referido dispositivo. 11 - Em princípio, os trabalhadores rurais, na qualidade de empregados, não necessitam comprovar os recolhimentos das contribuições previdenciárias, enquanto que aqueles que sobrevivem em regime de economia familiar não precisam, sequer, contribuir, devendo apenas provar o exercício da atividade laboral no campo pelo prazo da carência estipulado pela lei, tal como exigido para o segurado especial. Assim dispõe o art. 11, VII c/c art. 39, I, da Lei 8.213/91. 12 - No laudo pericial de fls. 72/77, elaborado em 13/2/2008 (fl. 68), o perito judicial diagnosticou a parte autora como portadora de "deformidade osteo articular na mão esquerda" (resposta ao quesito n. 1 da autora - fl. 76). Concluiu pela existência de incapacidade laboral total e permanente (tópico Conclusão - fl. 75). 13 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010. 14 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade. 15 - A autora afirma que era segurada especial e que sempre trabalhou nas lides campesinas desde a tenra idade. Como início razoável de prova material do exercício de labor rural, ela apresentou os seguintes documentos: cópia de sua Carteira de Trabalho e Previdência Social de fls. 09/10, na qual está registrado um vínculo empregatício, de natureza rural, no período de 01/4/1995 a 16/7/1995; certidão de seu casamento, realizado em 09/4/1988, na qual a atividade profissional de seu cônjuge está qualificada como "lavrador", e a dela como "do lar" (fl. 11); certidões de nascimento de seus filhos, lavradas em 07/2/1988, 02/6/1992, 11/6/1993 e 11/4/1996, nas quais a atividade profissional de seu cônjuge está qualificada como "lavrador", e a dela como "do lar" (fl. 12/15); cópia da Carteira de Trabalho e Previdência Social de seu cônjuge, na qual estão registrados vínculos empregatícios, de natureza rural, de 05/3/1988 a 30/3/1990, de 01/10/1995 a 30/8/1997 e um que, iniciado em 01/3/1998, não possui anotação da data de encerramento (fls. 16/18); recibo de pagamento do salário do cônjuge, como contraprestação do trabalho efetuado na Fazenda São Luiz, referente ao mês de agosto de 2006 (fl. 19); cópia do contrato de locação, realizada pelo casal, referente a imóvel residencial localizado na Fazenda São Luiz, em bairro rural do município de Timburi (fl. 20). 16 - Examinando-se a vasta documentação que acompanha a petição inicial, verifica-se que a cópia da Carteira de Trabalho e Previdência Social da demandante, de fls. 09/10, na qual está registrado um vínculo empregatício, de natureza rural, no período de 01/4/1995 a 16/7/1995, em nome da própria autora, constitui início razoável de prova material do exercício de labor rural. 17 - O extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais de fls. 144/145 não registra a existência de nenhum vínculo empregatício, de natureza urbana, mantido pela demandante. 18 - Por outro lado, na Audiência de Instrução de fls. 92/95 e 99/109, realizada em 26/11/2008, as testemunhas afirmaram que a autora sempre atuou nas lides rurais, apesar da deformidade congênita de que era portadora, em virtude da necessidade econômica da família. 19 - Em seu depoimento pessoal de fls. 107/109, a autora reafirmou que sempre trabalhou nas lides rurais, apesar da dificuldade para a realização da atividade braçal imposta por sua deficiência congênita. Esclareceu que a patologia provocou "inflamação dos dedos e do desgaste dos dois braços, devido ao esforço que eu faço para carpir o café e, abanar o café e, eu tento fazer tudo e, eu não estudei muito e, até já tentei uns três concursos e, me sinto rejeitada e, eu fiz até a quinta série e, já tentei procurar alguma coisa que não esforçasse tanto, mas eu tenho um pedacinho de terra que meu pai me deixou de herança" (sic). Reiterou que o problema foi se agravando com o decorrer dos anos, "aumentando a inflamação na mão que tem o problema" (fl. 109). 20 - Por sua vez, o extrato do Sistema Único de Benefícios/DATAPREV da fl. 146 demonstra que a autora usufruiu da concessão do benefício assistencial de prestação continuada, em virtude de sua deficiência, de 23/9/1996 a 01/5/2003, ou seja, no período imediatamente posterior à extinção de seu vínculo empregatício, de natureza rural, em 16/7/1995. Insta destacar que constitui requisito para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada a demonstração da existência de incapacidade do postulante para o trabalho e para a vida independente, nos termos do artigo 20, §2º, da Lei 8.742/93. 21 - Além disso, embora tenha afirmado ser a restrição congênita, o vistor oficial não soube precisar a data em que a limitação da autora se tornou efetivamente impeditiva para o exercício de sua atividade laboral, apenas assinalando que se trata de deformidade de caráter evolutivo, que agrava com o decorrer dos anos, e que não se encontrava no estágio inicial na data do exame. (resposta aos quesitos n. 3, 5 e 6 da autora - fl. 76). 22 - Dessa forma, a prova testemunhal, aliada às informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais e do laudo pericial, revela que, embora a deficiência seja congênita, isso não impediu a autora de realizar sua atividade laboral habitual ao longo da vida, até que o agravamento efetivamente consolidou um quadro de incapacidade total e permanente, reconhecido administrativamente por ocasião da concessão do benefício assistencial de prestação continuada, em 23/9/1996, de modo que não pode ser aplicada à autora as vedações previstas nos artigos 59, parágrafo único, e 42, §2º, da Lei 8.213/91. 23 - Presente início razoável de prova material do exercício de atividade campesina, o qual foi corroborado pela prova oral, deve ser reconhecida a condição de trabalhadora rural da autora na época em que eclodiu sua incapacidade para o trabalho, em 1996. 24 - Destarte, como a demandante é incapaz e totalmente insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez. 25 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante. 26 - De acordo com o entendimento desta Turma, a verba honorária deve ser arbitrada moderadamente em 10% (dez por cento) sobre a condenação, entendida como o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça), posto que, de um lado, o encargo será suportado por toda a sociedade - vencida no feito a Fazenda Pública - e, do outro, diante da necessidade de se remunerar adequadamente o profissional, em consonância com o disposto no art. 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil. Ademais, os honorários advocatícios devem incidir somente sobre o valor das parcelas devidas até a prolação da sentença, ainda que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Na hipótese de procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão pólos distintos em relação ao que foi decidido. Portanto, não parece lógico e razoável referido discrímen, a ponto de justificar o pleiteado tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que exercem suas funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação. 27 - A Autarquia Securitária deve ser isentada do pagamento de custas processuais, pois a parte autora é beneficiária da assistência judiciária gratuita (fl. 23). 28 - Em observância ao entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1205946/SP, submetido ao regime do artigo 543-c do Código de Processo Civil de 1973, devem ser adequados, de ofício, os critérios de cálculo da correção monetária, por se tratar de matéria de ordem pública e de natureza processual, com incidência imediata sobre os processos em curso. 29 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento. 30 - Apelação do INSS parcialmente provida. Sentença parcialmente reformada. Ação julgada procedente.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS para isentá-lo do pagamento de custas processuais, fixar os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e, de ofício, em observância ao entendimento firmado no REsp 1205946/SP, submetido ao regime do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 27/11/2017
Data da Publicação : 06/12/2017
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1447363
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/12/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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