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Jurisprudência


TRF3 0035143-79.2015.4.03.9999 00351437920154039999

Ementa
CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. CUSTAS PROCESSUAIS DA AUTARQUIA. LEI ESTADUAL Nº 3.779/2009 DO MATO GROSSO DO SUL. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ESTRANGEIRO. RE Nº 587.970. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DESDE QUE PREENCHIDOS OS REQUISITOS LEGAIS. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PAGO AO IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03. APLICAÇÃO POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.742/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE EM CONJUNTO COM DEMAIS FATORES. IDOSO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS. PREQUESTIONAMENTO. RECURSO DESPROVIDO. 1 - Custas processuais suportadas pela autarquia nos termos do artigo 24, §§ 1º e 2º, da Lei Estadual do Mato Grosso do Sul nº 3.779/2009. O recolhimento somente deve ser exigido ao final da demanda, se sucumbente, conforme artigos 20, § 2º e 27, ambos do Código de Processo Civil de 1973. 2 - Controvérsia no que tange à concessão do benefício ao alienígena. Há justas e defensáveis ponderações em prol de ambas as teses; por um lado, a Constituição Federal não promove o discrimen, para efeito da concessão desse benefício, entre estrangeiros residentes no país e brasileiros, sendo o benefício assistencial de prestação continuada devido "a quem dela necessitar", em observância ao princípio da universalidade de cobertura, mas remete a regulamentação do benefício à legislação infraconstitucional. Esta, por sua vez, traz expressa vedação à concessão do benefício a estrangeiros, conforme disposto no art. 7º do Decreto nº 6.214/04, seja em sua redação original, seja naquela atribuída pelo Decreto nº 8.805/16. 3- O Supremo Tribunal Federal, por seu Tribunal Pleno, em julgamento do RE nº 587.970, decidiu que a condição de estrangeiro residente no Brasil não impede o recebimento do benefício assistencial, desde que atendidos os requisitos necessários a tanto. 4 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 5 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo. 6 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015. 7 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia. 8 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. 9 - Todavia, a mera aplicação do referido dispositivo não enseja, automaticamente, a concessão do benefício, uma vez que o requisito da miserabilidade não pode ser analisado tão somente levando-se em conta o valor per capita e a famigerada situação de "renda zero", sob pena de nos depararmos com decisões completamente apartadas da realidade. Destarte, a ausência, ou presença, desta condição econômica deve ser aferida por meio da análise de todo o conjunto probatório. 10 - A presente demanda fora intentada por Marcelino Villa Ruiz, cidadão de nacionalidade paraguaia, conforme Carteira de Identidade para Estrangeiro de fl. 16. O benefício em questão, regulado pela Lei nº 8.742/93, possui matriz constitucional no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988 e fora instituído para conferir efetividade ao princípio da dignidade humana. 11 - O demandante, nascido em 1940, reside em território nacional desde 1978 (fl. 16), tendo aqui constituído família e, inclusive obteve RG, CPF e Carteira de Trabalho em seu nome, conforme documentos juntados às fls. 16/21, de modo que é possível inferir que se encontra em situação regular no país. 12 - O estudo social realizado em 27 de fevereiro de 2014 (fls. 97/100) informou ser o núcleo familiar composto pelo autor e sua cônjuge, ambos idosos, os quais residem em imóvel feito de alvenaria e madeira, composto de dois quartos, uma cozinha, uma sala e um banheiro. Apesar de servida por energia elétrica e água encanada, a residência apresenta estrutura precária. A mobília e os objetos no interior da casa são básicos, isto é, são apenas os essenciais, como cama, cômoda, guarda-roupa, fogão, geladeira e televisão. Todos são velhos, sendo que alguns deles também estão bem deteriorados. 13 - A renda familiar decorre dos rendimentos auferidos pelo autor, proveniente da atividade desenvolvida em pequena marcenaria existente nos fundos da residência. Por se tratar de trabalho informal, não há renda fixa, mas apenas esporádica, sem que se tenha precisado valores específicos dos ganhos auferidos. O cônjuge, consoante autodeclaração, é do lar, portanto, não contribui financeiramente com qualquer ganho. Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais, que passam a integrar o presente voto, demonstram que o requerente apenas recebe o benefício assistencial deferido nestes autos a título de antecipação de tutela. A sua esposa sequer está cadastrada na base de dados do Sistema. 14 - As despesas foram quantificadas, em média, em R$ 43,00 de água, R$ 90,00 de energia elétrica e R$ 200,00 de alimentação. Entretanto, durante a visita domiciliar, a assistente social certificou que "a alimentação é bem restrita em decorrência do pouco ganho que obtém na marcenaria." 15 - Por fim, interessante também acrescentar que, considerando a ausência de estabilidade profissional do autor, e sobretudo em razão da atividade que desenvolve (marcenaria), que requer força e precisão no seu desempenho, a esta altura da vida, com mais de setenta anos, naturalmente aumentam as dificuldades de seu exercício, o que demonstra a impossibilidade de continuar obtendo os já insuficientes rendimentos para o resguardo da dignidade de sua família. 16 - Tendo sido constatados que o autor é idoso, bem como o estado de hipossuficiência econômica da parte autora, de rigor a manutenção da sentença que deferiu o benefício. 17 - Honorários advocatícios mantidos em 10% do valor da condenação. 18 - Inocorrência de violação a dispositivo legal, a justificar o prequestionamento suscitado pela autarquia. 19 - Apelação do INSS desprovida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 05/06/2017
Data da Publicação : 13/06/2017
Classe/Assunto : AC - APELAÇÃO CÍVEL - 2100266
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/06/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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