TRF3 0035971-07.2017.4.03.9999 00359710720174039999
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA
RURAL. BENEFÍCIOS NÃO CONTRIBUTIVOS. ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. NORMA
TRANSITÓRIA. TRABALHADOR RURAL. BOIA-FRIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL FRÁGIL. NÃO COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL ATÉ O ADVENTO DA
INCAPACIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. TUTELA
JURÍDICA PROVISÓRIA REVOGADA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
- A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do art. 42 da
Lei n. 8.213/91, é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível
de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência. O auxílio-doença, benefício pago se a incapacidade for
temporária, é disciplinado pelo art. 59 da Lei n. 8.213/91, e a aposentadoria
por invalidez tem seus requisitos previstos no art. 42 da Lei 8.213/91.
- Para os trabalhadores rurais segurados especiais, a legislação prevê o
pagamento de alguns benefícios não contributivos, no valor de um salário
mínimo (artigo 39, I, da Lei nº 8.213/91). Depois da edição da Lei
n. 8.213/91, a situação do rurícola modificou-se, pois passou a integrar
sistema único, com os mesmos direitos e obrigações dos trabalhadores
urbanos, tornando-se segurado obrigatório da Previdência Social. A partir
do advento da Constituição da República de 1988 não mais há distinção
entre trabalhadores urbanos e rurais (artigos 5º, caput, e 7º, da CF/88),
cujos critérios de concessão e cálculo de benefícios previdenciários
regem-se pelas mesmas regras. Assim, a concessão dos benefícios de
aposentadoria por invalidez e auxílio-doença para os trabalhadores rurais,
se atendidos os requisitos essenciais, encontra respaldo na jurisprudência
do egrégio Superior Tribunal de Justiça e nesta Corte.
- Entendo, pessoalmente, que somente os trabalhadores rurais, na qualidade
de segurados especiais, não necessitam comprovar os recolhimentos das
contribuições previdenciárias, devendo apenas provar o exercício da
atividade laboral no campo, ainda que de forma descontínua, pelo prazo da
carência estipulado pela lei, tal como exigido para o segurado especial. Assim
dispõe o art. 11, VII, c/c art. 39, I, da Lei 8.213/91. Consequentemente,
uma vez ausente a comprovação de exercício de atividade rural na forma
do inciso I do artigo 39 da Lei nº 8.213/91, não se lhe pode conceder
aposentadoria por invalidez rural.
- À míngua da previsão legal de concessão de benefício previdenciário
não contributivo, não cabe ao Poder Judiciário estender a previsão
legal a outros segurados que não sejam "segurados especiais", sob pena
de afrontar o princípio da distributividade (artigo 194, § único, III,
da Constituição Federal). O artigo 143 da Lei nº 8.213/91, que permite
a concessão de benefício sem o recolhimento de contribuições, referia-se
somente à aposentadoria por idade. Ainda assim, trata-se de norma transitória
com eficácia já exaurida.
- Enfim, penso que, quanto aos boias-frias ou diaristas - enquadrados como
trabalhadores eventuais, ou seja, contribuintes individuais na legislação
previdenciária, na forma do artigo 11, V, "g", da LBPS - não há previsão
legal de cobertura previdenciária no caso de benefícios por incapacidade,
exatamente porque o artigo 39, I, da LBPS só oferta cobertura aos segurados
especiais. Todavia, com a ressalva de meu entendimento pessoal, curvo-me ao
entendimento da jurisprudência francamente dominante nos Tribunais Federais,
nos sentido de que também o trabalhador boia-fria, diarista ou volante faz
jus aos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença não
contributivos.
- No caso dos autos, a perícia judicial concluiu pela incapacidade parcial
e permanente da parte autora, desde 2015.
- A autora alega ter exercido o labor rural como trabalhadora
diarista/boia-fria sem registro em carteira até o advento da incapacidade
laboral.
- Com o intuito de trazer aos autos início de prova material, a autora trouxe
apenas ficha de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Tupi
(28/2/2008); comprovantes de pagamentos de contribuições sindicais (entre
2008 e 2013) e declaração de exercício de atividade rural desse sindicato.
- Contudo, tais provas não são meios seguros de que a autora exerça de
fato a agricultura, eis que não há fiscalização efetiva da atividade,
sendo comum pessoas filiarem-se ao sindicato sem exercerem realmente tal
labor, na busca de uma aposentadoria.
- Ademais, as declarações do Sindicato de Trabalhadores Rurais somente
fazem prova do quanto nelas alegado se devidamente homologadas pelo Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS, nos exatos termos do que dispõe o art. 106,
III da Lei 8.213/91, o que não é o caso dos autos.
- Vale salientar que a cópia de ficha cadastral da loja "Losango" (f. 35),
na qual a parte autora declarou ser "trabalhadora rural", constitui documento
particular, representando mera declaração unilateral. Declarações de
particulares não têm eficácia como início de prova material, porquanto
não foram extraídas de assento ou de registro preexistentes.
- Por sua vez, a prova oral foi assaz genérica, simplória e mal
circunstanciada, pois as testemunhas se reportaram genericamente ao trabalho
rural da autora e, portanto, insuficiente para comprovar o mourejo asseverado.
- Nesse passo, entendo não demonstrado o efetivo exercício de trabalho
campesino da parte autora até o advento de sua incapacidade laboral, sendo
indevida, portanto, a concessão do benefício pretendido.
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas
processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento)
sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal,
conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo
CPC. Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º,
do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
- Tutela antecipatória de urgência revogada.
- Apelação do INSS conhecida e provida.
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA
RURAL. BENEFÍCIOS NÃO CONTRIBUTIVOS. ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. NORMA
TRANSITÓRIA. TRABALHADOR RURAL. BOIA-FRIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL FRÁGIL. NÃO COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL ATÉ O ADVENTO DA
INCAPACIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. TUTELA
JURÍDICA PROVISÓRIA REVOGADA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
- A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do art. 42 da
Lei n. 8.213/91, é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível
de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência. O auxílio-doença, benefício pago se a incapacidade for
temporária, é disciplinado pelo art. 59 da Lei n. 8.213/91, e a aposentadoria
por invalidez tem seus requisitos previstos no art. 42 da Lei 8.213/91.
- Para os trabalhadores rurais segurados especiais, a legislação prevê o
pagamento de alguns benefícios não contributivos, no valor de um salário
mínimo (artigo 39, I, da Lei nº 8.213/91). Depois da edição da Lei
n. 8.213/91, a situação do rurícola modificou-se, pois passou a integrar
sistema único, com os mesmos direitos e obrigações dos trabalhadores
urbanos, tornando-se segurado obrigatório da Previdência Social. A partir
do advento da Constituição da República de 1988 não mais há distinção
entre trabalhadores urbanos e rurais (artigos 5º, caput, e 7º, da CF/88),
cujos critérios de concessão e cálculo de benefícios previdenciários
regem-se pelas mesmas regras. Assim, a concessão dos benefícios de
aposentadoria por invalidez e auxílio-doença para os trabalhadores rurais,
se atendidos os requisitos essenciais, encontra respaldo na jurisprudência
do egrégio Superior Tribunal de Justiça e nesta Corte.
- Entendo, pessoalmente, que somente os trabalhadores rurais, na qualidade
de segurados especiais, não necessitam comprovar os recolhimentos das
contribuições previdenciárias, devendo apenas provar o exercício da
atividade laboral no campo, ainda que de forma descontínua, pelo prazo da
carência estipulado pela lei, tal como exigido para o segurado especial. Assim
dispõe o art. 11, VII, c/c art. 39, I, da Lei 8.213/91. Consequentemente,
uma vez ausente a comprovação de exercício de atividade rural na forma
do inciso I do artigo 39 da Lei nº 8.213/91, não se lhe pode conceder
aposentadoria por invalidez rural.
- À míngua da previsão legal de concessão de benefício previdenciário
não contributivo, não cabe ao Poder Judiciário estender a previsão
legal a outros segurados que não sejam "segurados especiais", sob pena
de afrontar o princípio da distributividade (artigo 194, § único, III,
da Constituição Federal). O artigo 143 da Lei nº 8.213/91, que permite
a concessão de benefício sem o recolhimento de contribuições, referia-se
somente à aposentadoria por idade. Ainda assim, trata-se de norma transitória
com eficácia já exaurida.
- Enfim, penso que, quanto aos boias-frias ou diaristas - enquadrados como
trabalhadores eventuais, ou seja, contribuintes individuais na legislação
previdenciária, na forma do artigo 11, V, "g", da LBPS - não há previsão
legal de cobertura previdenciária no caso de benefícios por incapacidade,
exatamente porque o artigo 39, I, da LBPS só oferta cobertura aos segurados
especiais. Todavia, com a ressalva de meu entendimento pessoal, curvo-me ao
entendimento da jurisprudência francamente dominante nos Tribunais Federais,
nos sentido de que também o trabalhador boia-fria, diarista ou volante faz
jus aos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença não
contributivos.
- No caso dos autos, a perícia judicial concluiu pela incapacidade parcial
e permanente da parte autora, desde 2015.
- A autora alega ter exercido o labor rural como trabalhadora
diarista/boia-fria sem registro em carteira até o advento da incapacidade
laboral.
- Com o intuito de trazer aos autos início de prova material, a autora trouxe
apenas ficha de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Tupi
(28/2/2008); comprovantes de pagamentos de contribuições sindicais (entre
2008 e 2013) e declaração de exercício de atividade rural desse sindicato.
- Contudo, tais provas não são meios seguros de que a autora exerça de
fato a agricultura, eis que não há fiscalização efetiva da atividade,
sendo comum pessoas filiarem-se ao sindicato sem exercerem realmente tal
labor, na busca de uma aposentadoria.
- Ademais, as declarações do Sindicato de Trabalhadores Rurais somente
fazem prova do quanto nelas alegado se devidamente homologadas pelo Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS, nos exatos termos do que dispõe o art. 106,
III da Lei 8.213/91, o que não é o caso dos autos.
- Vale salientar que a cópia de ficha cadastral da loja "Losango" (f. 35),
na qual a parte autora declarou ser "trabalhadora rural", constitui documento
particular, representando mera declaração unilateral. Declarações de
particulares não têm eficácia como início de prova material, porquanto
não foram extraídas de assento ou de registro preexistentes.
- Por sua vez, a prova oral foi assaz genérica, simplória e mal
circunstanciada, pois as testemunhas se reportaram genericamente ao trabalho
rural da autora e, portanto, insuficiente para comprovar o mourejo asseverado.
- Nesse passo, entendo não demonstrado o efetivo exercício de trabalho
campesino da parte autora até o advento de sua incapacidade laboral, sendo
indevida, portanto, a concessão do benefício pretendido.
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas
processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento)
sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal,
conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo
CPC. Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º,
do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
- Tutela antecipatória de urgência revogada.
- Apelação do INSS conhecida e provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, conhecer da apelação e lhe dar provimento, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
24/01/2018
Data da Publicação
:
08/02/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2276402
Órgão Julgador
:
NONA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/02/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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