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Jurisprudência


TRF3 0036541-95.2014.4.03.9999 00365419520144039999

Ementa
CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. CRIANÇA E ADOLESCENTE. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. IMPACTO NA LIMITAÇÃO DO DESEMPENHO DE ATIVIDADES E RESTRIÇÃO SOCIAL COMPATÍVEL COM A IDADE. FAMÍLIA. CAPACIDADE FINANCEIRA. DEVER DE ASSISTÊNCIA. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO DEMONSTRADA. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. 1 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo. 3 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015. 4 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia. 5 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. 6 - Tratando-se de criança ou adolescente, a análise da deficiência deve ser feita sob a óptica do art. 4º, § 1º, do Decreto nº 6.214/2007, com redação dada pelo Decreto nº 7.617/2011. A avaliação da existência de deficiência, com impacto na limitação do desempenho de atividade e restrição da participação social, deve ser compatível com a idade. 7 - O laudo pericial diagnosticou o requerente como portador de "Mucopolissacaridose Tipo I de origem genética, cursando com retardo no desenvolvimento neuropsicomotor (...), apresentando também infecções pulmonares frequentes e insuficiência cardíaca congestiva". O profissional médico concluiu que "existe, pois, a alegada incapacidade para a vida independente com barreira grave nas funções corpóreas e também atividades de participação", se afigurando presente o impedimento de longo prazo, nos termos da legislação pertinente. 8 - O estudo social realizado em 17 de dezembro de 2013 informou ser o núcleo familiar composto pelo autor, por seus genitores e duas irmãs, os quais "residem em casa própria, composta por 3 quartos, 2 banheiros, cozinha, copa e lavanderia". A renda familiar decorre dos proventos auferidos pelo pai do autor, "como operador de máquinas da Mahle", "com rendimento mensal de R$2.200,00 (dois mil e duzentos reais)". A assistente social noticiou que a genitora do demandante (Sra. Maria Adriana Ferreira Lázaro) "não pode trabalhar fora", pois a criança "é totalmente dependente de seus cuidados". 9 - Quanto às despesas mensais, o relatório socioeconômico não apresenta planilha com dados mais específicos, mas traz elementos que indicam o custo elevado do tratamento de saúde do requerente, ao mesmo tempo em que esclarece ser ele beneficiado pelo fornecimento gratuito de medicamentos da rede pública de saúde. 10 - Informações atualizadas, extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS e do Sistema Único de Benefícios/Dataprev, demonstram que o pai do demandante mantém o vínculo empregatício, mencionado no estudo social, desde 03/07/2000, sendo que, nos anos de 2012 e 2013, obteve renda equivalente a R$2.500,00, em média, e, na competência dezembro/2013 (quando foi realizada visita à residência do autor), recebeu remuneração no valor de R$ 3.201,48, o que corresponde a quase 5 salários mínimos, considerando o valor nominal vigente à época (R$678,00). 11 - Apesar de ser portador de patologia que, conforme narrado à assistente social, provoca seu "afastamento da empresa" em determinados períodos, verifica-se que o Sr. Paulo Sérgio sempre esteve amparado por benefícios previdenciários, sendo que atualmente, além da remuneração pelo trabalho desempenhado na "Mahle Metal Leve S.A" (R$3.600,22 - 08/2016), recebe também auxílio acidente no valor de R$1.516,98. 12 - Alie-se como elemento de convicção o fato de que o pai do requerente dispõe de convênio médico, oferecido pela empresa onde trabalha, que permite o acesso do seu filho às diversas especialidades médicas indicadas no tratamento da doença que apresenta. Por fim, o relatório informa a propriedade de um veículo Monza, modelo 1994, fato que, por si só, não é auto-excludente da possibilidade de concessão do benefício assistencial, mas que, em contrapartida, é elemento que milita contrariamente à ideia de miserabilidade. 13 - Não se afigura razoável atribuir ao Estado a responsabilidade pela sobrevivência do autor, comprovadamente incapaz, quando os próprios parentes próximos possuem capacidade financeira para tanto. Isso, aliás, é o que dispõem os artigos 1.694, 1.695 e 1.696 do Código Civil, evidenciando o caráter supletivo da atuação estatal. 14 - O benefício assistencial da prestação continuada é auxílio que deve ser prestado pelo Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis, ou seja, nas específicas situações que preencham os requisitos legais estritos, bem como se e quando a situação de quem o pleiteia efetivamente o recomende, no que se refere ao pouco deixado pelo legislador para a livre interpretação do Poder Judiciário. 15 - O benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à complementação da renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata tarefa de distinguir faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem por finalidade precípua prover a subsistência daquele que o requer. 16 - Tendo sido constatada, mediante estudo social e demais elementos de prova, a ausência de hipossuficiência econômica, de rigor o indeferimento do pedido. 17 - Inversão do ônus sucumbencial, com a condenação da parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (CPC/73, art. 20, §3º), ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC. 18 - Apelação provida. Sentença reformada. Ação julgada improcedente. Revogação dos efeitos da tutela antecipada.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 05/12/2016
Data da Publicação : 16/12/2016
Classe/Assunto : AC - APELAÇÃO CÍVEL - 2021053
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/12/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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