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Jurisprudência


TRF3 0039953-39.2011.4.03.9999 00399533920114039999

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE LABOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. ATIVIDADES ESPECIAIS. PERÍCIA POR SIMILARIDADE COM INCONSISTÊNCIAS. NÃO ENQUADRAMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. APOSENTADORIA PROPORCIONAL POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. ISENÇÃO DE CUSTAS PROCESSUAIS. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS. APELAÇÃO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDA. 1 - No caso, o INSS foi condenado a reconhecer o labor rural e o labor especial. Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ. 2 - Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de período de labor rural e especial. 3 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça. 4 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado. 5 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea. 6 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. 7 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, é histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos. 8 - Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960). 9 - Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor pudesse o menor exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante. 10 - Para comprovar o suposto labor rural, foram apresentados os seguintes documentos: a) Cópia de título eleitoral, emitido em 11/02/1972, constando a qualificação do autor como lavrador (fl. 18). 11 - Além da documentação trazida como início de prova material hábil para comprovar o exercício de labor rural, foram ouvidas três testemunhas. 12 - A testemunha Alfeu Catharina dos Santos, afirmou que "Conhece o autor há 45 anos pois trabalhavam juntos na lavoura. Trabalharam cerca de oito anos, sempre para empreiteiros. O autor tinha cerca de 12 anos. O autor ia trabalhar com seus pais. Tinha outras crianças esta idade. Não conhece a irmã do autor. Depois do período em que trabalharam juntos, não sabe o que o autor fez." 13 - A testemunha Walter Marques afirmou que "Conhece o autor há 44 anos pois trabalharam juntos na lavoura. Laborou com o autor por cerca de sete anos, sempre para empreiteiros. O autor ainda era novo quando começou a trabalhar. Não trabalhou com mais ninguém da família do autor, como pais e irmãs, sendo que não os conhece. Depois de trabalharem juntos, o autor foi trabalhar na usina, não sabendo a função que ele exercia. Trabalharam juntos nas Fazendas São Luiz, Perobas, Santa Branca e para os empreiteiros Ari Felipe, Ari Arantes e 'Ditão Preto'. Conhece a testemunha Alfeu pois ele carregava o caminhão de cana. Ele também trabalhou com o autor." 14 - Finalmente, a testemunha Sebastião Aparecido Piovezan asseverou que "Começou a trabalhar na roça com cerca de 13 anos junto com o autor Trabalhou com o autor por seis ou sete anos. Trabalhavam para empreiteiros. O autor, às vezes, ia com as irmãs de nomes Fátima, Ana, Lourdes e Aparecida. Depois da lavoura, o autor passou a trabalhar como motorista de caminhão canavieiro." 15 - Assim, a prova oral reforça o labor no campo e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, tornando possível o reconhecimento do labor rural em todo o interregno vindicado, de 01/01/1966 a 15/06/1973. 16 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. 17 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor. 18 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ. 19 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais. 20 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais. 21 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003. 22 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais. 23 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região. 24 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais. 25 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior. 26 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91. 27 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça. 28 - Para comprovar a natureza especial das atividades, foi realizada perícia judicial, supostamente in loco em algumas empresas e por similaridade em outras (fls. 116/125). 29 - Saliente-se que é pacífico o entendimento desta Turma no sentido da possibilidade de realização de prova pericial indireta, desde que demonstrada a inexistência da empresa, com a aferição dos dados em estabelecimentos paradigmas, observada a similaridade do objeto social e das condições ambientais de trabalho. 30 - Contudo, no caso dos autos, a utilização da referida prova - laudo de insalubridade relativo a empresas diversas daquelas em que laborou - não é possível, porquanto não demonstrada a inexistência das empresas nas quais trabalhou, nem tampouco observada a similaridade do objeto social e das condições ambientais de trabalho. 31 - Destaque-se que as atividades exercidas na empresa "Nélio José Ribeiro", nos períodos de 02/05/1979 a 31/12/1980 e de 02/03/1981 a 01/10/1985, foram consideradas especiais no laudo pericial em razão de perícia realizada na empresa Cia Açucareira Vale do Rosário. Entretanto, conforme se verifica nas cópias das carteiras de trabalho do autor (fls. 19/38), a primeira empresa é estabelecimento da espécie "agropecuária", sendo que a segunda é estabelecimento da espécie "industrial". 32 - Além disso, no laudo pericial constou que no interregno de 02/03/1981 a 01/10/1985 o autor exerceu a função de motorista, mas no registro em CTPS consta que exerceu o cargo de rurícola-rural (fl. 231), sendo que nas anotações de alteração salarial consta a mesma função de rurícola até o final do referido vínculo empregatício (fl. 24), padecendo de credibilidade as informações contidas no laudo judicial. 33 - Assim, não é possível o enquadramento como especial dos interregnos de 02/05/1979 a 31/12/1980 e de 02/03/1981 a 01/10/1985. 34 - Quanto aos períodos de 01/02/1995 a 01/06/1997 e de 15/05/2000 a 04/09/2000, laborados nas empresas "Nataliatur Transportes e Turismo Ltda" e "P.W. Tur Transportes Ltda", respectivamente, o laudo pericial também não pode ser considerado. 35 - No caso, a perícia foi supostamente realizada na empresa "Nataliatur", utilizada como paradigma da empresa "P.W. Tur Transportes Ltda". Ocorre que não há comprovação da inexistência desta, sendo que consta a informação no laudo de que a perícia não foi realizada in loco pelo fato de a empresa estar localizada em outro município. 36 - Quanto a perícia realizada na empresa "Nataliatur", consta do laudo que referida empresa está localizada na cidade de Franca, Avenida Dom Pedro I, Jardim Petranha. Contudo, na CTPS, consta o endereço da empresa no município de Orlândia/SP, não havendo nenhuma informação sobre eventual mudança de endereço. Ademais, em pesquisa ao sítio do "Google", constatou-se que referida empresa está ativa sob o nome "Paz Transportes e Turismo - Natalia Transportes e Turismo Ltda", no mesmo endereço constante da CTPS, na Avenida Marginal Direita, nº 550, Orlândia/SP. No caso, as informações prestadas no laudo pericial apresentam inconsistências substanciais, que maculam sua força probante. 37 - Assim, também se mostra inviável o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 01/02/1995 a 01/06/1997 e de 15/05/2000 a 04/09/2000. 38 - Somando-se o período de atividade rural (01/01/1966 a 15/06/1973), ora reconhecido, aos períodos incontroversos constantes da CTPS (fls. 19/38) e do extrato do CNIS, ora anexado, verifica-se que, até 16/12/1998, data de publicação da Emenda Constitucional 20/98, o autor contava com 22 anos, 06 meses e 15 dias; insuficiente para a concessão do benefício de aposentadoria. 39 - Computando-se períodos posteriores, verifica-se que na data do requerimento administrativo (15/07/200 - fl. 41), o autor contava com 30 anos, 08 meses e 29 dias de tempo de atividade; e na data da citação (23/01/2009 - fl. 57), com 31 anos, 3 meses e 7 dias de tempo de atividade, insuficientes para a concessão do benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição. 40 - Observa-se, entretanto, que o autor permaneceu laborando, completando, em 10/10/2010, 32 anos, 11 meses e 24 dias de tempo de atividade; suficiente para fazer jus ao benefício de aposentadoria proporcional, a partir desta data. 41 - Por fim, esclareço que se sagrou vitoriosa a parte autora ao ver reconhecido o período de labor rural em sua totalidade. Por outro lado, nenhum período foi considerado especial e no momento do ajuizamento não fazia jus à aposentadoria pleiteada. Desta feita, mantida a sucumbência recíproca determinada na sentença. Sem condenação das partes em custas, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS delas isento. 40 - Remessa necessária e apelação do INSS parcialmente providas. Apelação do autor parcialmente provida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS para afastar o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 02/05/1979 a 31/12/1980, 02/03/1981 a 01/10/1985, 01/02/1995 a 01/06/1997 e de 15/05/2000 a 04/09/2000, e isentar a autarquia do pagamento de custas processuais, e dar parcial provimento à apelação do autor, para reconhecer o exercício do labor rural no período de 01/01/1966 a 31/01/1972, e condenar o INSS a implantar em seu favor o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, a partir de 10/10/2010, acrescidas as parcelas em atraso de correção monetária calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o mesmo Manual; mantendo, no mais, a r. sentença proferida em 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 10/09/2018
Data da Publicação : 19/09/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1685957
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/09/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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