TRF3 0041436-07.2011.4.03.9999 00414360720114039999
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. CONDIÇÕES DE JULGAMENTO
IMEDIATO PELO TRIBUNAL. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL NÃO CORROBORA O LABOR CAMPESINO. ANOTAÇÕES CTPS. AFASTADA A
PRESUNÇÃO DE LABOR ININTERRUPTO NA CONDIÇÃO DE RURÍCOLA. RECONHECIMENTO
RURAL IMPROCEDENTE. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. PARCIAL ENQUADRAMENTO COMO
ESPECIAL. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. BENEFÍCIO INDEVIDO. SUCUMBÊNCIA
RECÍPROCA. ISENÇÃO DE CUSTAS PROCESSUAIS. REMESSA NECESSÁRIA PROVIDA PARA
ANULAR A SENTENÇA, PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE E APELAÇÃO DO
INSS PREJUDICADA.
1 - Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, mediante o reconhecimento de período de labor rural e
reconhecimento da natureza especial de períodos de labor.
2 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado
decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do
pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015. Em sua decisão,
o juiz a quo, apesar do reconhecimento dos períodos especiais de apesar do
reconhecimento do labor rural entre abril/1966 a 1973, e do reconhecimento dos
períodos especiais de 18/03/1973 a 26/074/1974, 18/02/1976 a 31/10/1976 e de
01/11/1976 a 10/05/1978, determinou à Autarquia que concedesse a aposentadoria
por tempo de contribuição, se atingido o tempo mínimo necessário. Desta
forma, está-se diante de sentença condicional, eis que expressamente não
foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da
congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015. O
caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez
que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo
quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013,
§ 3º, II, do Código de Processo Civil. Considerando que a causa encontra-se
madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde -
e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação
válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual
aplicável, passa-se ao exame do mérito da demanda.
3 - Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, desde o requerimento administrativo, em 21/02/2008, mediante
o reconhecimento de labor rural, desde os 07 anos de idade, e reconhecimento
de labor especial, nos períodos de 18/03/1973 a 26/07/1974, 18/02/1976 a
31/10/1976 e de 01/11/1976 a 10/05/1978.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação
do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de
prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula
nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos
os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim,
a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com
potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma
desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem
ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP
nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de
Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento
de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado
no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento
das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário,
desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei
nº 8.213/91.
8 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, é histórica
a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967,
a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida
evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores,
as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
9 - Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade
incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina,
via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, se
encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67,
época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950
e 55% na década de 1960).
10 - Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e
eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável
supor pudesse o menor exercer plenamente a atividade rural, inclusive por
não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
11 - Para comprovar o suposto labor rural, foram apresentados os seguintes
documentos: a) Cópia de certificado de dispensa de incorporação, emitido
em 25/07/1967, constando sua qualificação profissional como agricultor
(fl. 30); b) Cópia de comprovante de ITR, emitido em 15/06/1970, em nome
de seu genitor (fl. 31); c) Cópia de "Declaração para Cadastro de Imóvel
Rural", datada de 10/05/1972 (fls. 32/36); d) extrato da DATAPREV, relativo
á benefício de amparo previdenciário por invalidez de trabalhador rural,
que seu genitor recebeu no interregno de 05/07/1985 a 07/03/1997; e) Cópia
da certidão de casamento do autor, celebrado em 02/05/1974, constando sua
profissão como lavrador (fl. 38).
12 - O extrato da DATAPREV em nome do genitor não configura início de prova
material do labor rural, eis que relativo a período estranho ao interregno
vindicado na inicial. No mesmo sentido, a certidão de casamento do autor,
pois a cópia da CTPS comprova vínculos empregatícios em atividades urbanas
a partir de janeiro de 1973, motivo pelo qual a qualificação como lavrador
no ano de 1974 não pode ser considerada.
13 - Assim, configuram início de prova material do trabalho rural o
certificado de dispensa de incorporação, comprovante de ITR em nome do
genitor e a Declaração para Cadastro de Imóvel Rural em nome do genitor.
14 - A prova oral não corrobora o labor rural no período pretendido, isto
é, desde os 07 anos de idade (1955) até 1972 (ano anterior ao início dos
vínculos empregatícios urbanos).
15 - Isso porque a primeira testemunha, Sr. Claudionor Ferreira da Silva,
asseverou que conhece o autor há 35 anos. Dado que a audiência de instrução
foi realizada no dia 24/09/2010, constata-se que a testemunha conhece o autor
desde 1975, época na qual já trabalhava com vínculos empregatícios urbanos,
conforme anotações em CTPS (fl. 113 e 39-57).
16 - No mesmo sentido, o depoimento da segunda testemunha, Sr. Bendito dos
Santos, asseverou conhecer o autor há 23 anos, isto é, desde 1987, não
sendo o testemunho apto para comprovar labor rural no período anterior ao
início dos vínculos empregatícios urbanos, a partir de 1973.
17 - Quanto aos demais períodos questionados pelo autor, não merece acolhida
o pleito, na medida em que a existência de contratos de trabalho anotados em
CTPS afasta a presunção de que o labor tenha sido ininterrupto, tornando
indefensável a tese de que, nos intervalos de tais contratos, o demandante
tenha laborado, por "extensão", na condição de rurícola.
18 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos,
resta inviável o reconhecimento do labor rural nos interregnos vindicados,
cabendo apenas computar os períodos em que houve o competente recolhimento
previdenciário na condição de autônomo.
19 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e
em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço
sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à
contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na
forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha
a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
20 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria
especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram
concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação
inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos
I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo
técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído
e calor.
21 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da
Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir
a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo
suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade
do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional
considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do
tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
22 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a
agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995,
é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional,
sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c)
a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe
a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por
profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP),
preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos
profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração
biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições
laborais.
23 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente
nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo
de condições ambientais.
24 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB,
até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003;
e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
25 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei
nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao
responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos,
o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em
condições especiais.
26 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo
ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF
3º Região.
27 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova
da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos
e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo
diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF
excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda
que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
28 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma
extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se
supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de
redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído
acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora,
forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
29 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente
da data do exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28
da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
30 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70
do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior
Tribunal de Justiça.
31 - Para comprovar a natureza especial das atividades, a parte autora
apresentou a seguinte documentação: Períodos 18/03/1973 a 26/07/1974,
cópia de Perfil Profissiográfico Previdenciário (fl. 70), incompleto, sem
constar a segunda folha e, portanto, sem data, sem a assinatura do responsável
e sem indicar o engenheiro ou médico do trabalho responsável pelos registros
ambientais. Destaque-se, ainda, que na CTPS referido vínculo empregatício
consta como iniciado apenas em 18/08/1973, pairando dúvida sobre a veracidade
das informações prestadas. A atividade não é enquadrada como especial.
32 - Períodos de 18/02/1976 a 31/10/1976 e de 01/11/1976 a 10/05/1978,
cópia de Perfil Profissiográfico Previdenciário (fls. 71/72), emitido pela
empresa "Amplimatic S/A Industria e Comércio", informando que exerceu as
funções de "servente" e "auxiliar eletricista", com exposição a ruído
de 84,6 dB(A) e 82 dB(A). Reputo enquadrados como especiais os períodos,
eis que desempenhado com sujeição a nível de pressão sonora superior ao
limite de tolerância vigente à época da prestação dos serviços.
33 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos,
reputo enquadrados como especiais os períodos de 18/02/1976 a 31/10/1976
e de 01/11/1976 a 10/05/1978.
34 - Somando-se os períodos de atividades especiais (18/02/1976 a 31/10/1976
e de 01/11/1976 a 10/05/1978), reconhecidos nesta demanda, aos períodos
incontroversos constantes do CNIS ora anexado, do Resumo de Documentos
para Cálculo de Tempo de Contribuição, e das cópias das carteiras de
trabalho (fls. 39/57), verifica-se que na data da publicação da EC 20/98
(16/12/1998), o autor contava com 21 anos, 7 meses e 4 dias de tempo de
atividade, insuficiente para a concessão do benefício de aposentadoria.
35 - Computando-se períodos posteriores, verifica-se que na data do
requerimento administrativo, em 21/02/2008 (fl. 73), o autor contava com
30 anos, 09 meses e 10 dias de tempo de atividade, e na data da citação
(16/10/2009 - fl. 89), com 32 anos, 3 meses e 19 dias de tempo de atividade;
insuficientes para a concessão do benefício de aposentadoria proporcional
por tempo de contribuição.
36 - Indevida, portanto, qualquer análise no tocante ao pedido de
indenização por danos morais, dado que o indeferimento do benefício na via
administrativa foi correto, pois a parte autora não preenche os requisitos
para concessão da aposentadoria requerida.
37 - A parte autora sagrou vitoriosa ao ver reconhecidos alguns períodos
especiais vindicados. Por outro lado, o labor rural não foi averbado
e no momento do ajuizamento não fazia jus à aposentadoria pleiteada,
restando vencedora nesse ponto a autarquia. Desta feita, dou os honorários
advocatícios por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca
(art. 21 do CPC/73), e deixo de condenar qualquer delas no reembolso das
custas, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS
delas isento.
38 - Remessa necessária provida para anular a sentença. Pedido julgado
parcialmente procedente. Apelação do INSS prejudicada.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. CONDIÇÕES DE JULGAMENTO
IMEDIATO PELO TRIBUNAL. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL NÃO CORROBORA O LABOR CAMPESINO. ANOTAÇÕES CTPS. AFASTADA A
PRESUNÇÃO DE LABOR ININTERRUPTO NA CONDIÇÃO DE RURÍCOLA. RECONHECIMENTO
RURAL IMPROCEDENTE. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. PARCIAL ENQUADRAMENTO COMO
ESPECIAL. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. BENEFÍCIO INDEVIDO. SUCUMBÊNCIA
RECÍPROCA. ISENÇÃO DE CUSTAS PROCESSUAIS. REMESSA NECESSÁRIA PROVIDA PARA
ANULAR A SENTENÇA, PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE E APELAÇÃO DO
INSS PREJUDICADA.
1 - Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, mediante o reconhecimento de período de labor rural e
reconhecimento da natureza especial de períodos de labor.
2 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado
decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do
pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015. Em sua decisão,
o juiz a quo, apesar do reconhecimento dos períodos especiais de apesar do
reconhecimento do labor rural entre abril/1966 a 1973, e do reconhecimento dos
períodos especiais de 18/03/1973 a 26/074/1974, 18/02/1976 a 31/10/1976 e de
01/11/1976 a 10/05/1978, determinou à Autarquia que concedesse a aposentadoria
por tempo de contribuição, se atingido o tempo mínimo necessário. Desta
forma, está-se diante de sentença condicional, eis que expressamente não
foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da
congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015. O
caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez
que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo
quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013,
§ 3º, II, do Código de Processo Civil. Considerando que a causa encontra-se
madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde -
e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação
válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual
aplicável, passa-se ao exame do mérito da demanda.
3 - Pretende a parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, desde o requerimento administrativo, em 21/02/2008, mediante
o reconhecimento de labor rural, desde os 07 anos de idade, e reconhecimento
de labor especial, nos períodos de 18/03/1973 a 26/07/1974, 18/02/1976 a
31/10/1976 e de 01/11/1976 a 10/05/1978.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação
do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de
prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula
nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos
os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim,
a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com
potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma
desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem
ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP
nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de
Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento
de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado
no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento
das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário,
desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei
nº 8.213/91.
8 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, é histórica
a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967,
a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida
evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores,
as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
9 - Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade
incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina,
via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, se
encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67,
época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950
e 55% na década de 1960).
10 - Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e
eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável
supor pudesse o menor exercer plenamente a atividade rural, inclusive por
não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
11 - Para comprovar o suposto labor rural, foram apresentados os seguintes
documentos: a) Cópia de certificado de dispensa de incorporação, emitido
em 25/07/1967, constando sua qualificação profissional como agricultor
(fl. 30); b) Cópia de comprovante de ITR, emitido em 15/06/1970, em nome
de seu genitor (fl. 31); c) Cópia de "Declaração para Cadastro de Imóvel
Rural", datada de 10/05/1972 (fls. 32/36); d) extrato da DATAPREV, relativo
á benefício de amparo previdenciário por invalidez de trabalhador rural,
que seu genitor recebeu no interregno de 05/07/1985 a 07/03/1997; e) Cópia
da certidão de casamento do autor, celebrado em 02/05/1974, constando sua
profissão como lavrador (fl. 38).
12 - O extrato da DATAPREV em nome do genitor não configura início de prova
material do labor rural, eis que relativo a período estranho ao interregno
vindicado na inicial. No mesmo sentido, a certidão de casamento do autor,
pois a cópia da CTPS comprova vínculos empregatícios em atividades urbanas
a partir de janeiro de 1973, motivo pelo qual a qualificação como lavrador
no ano de 1974 não pode ser considerada.
13 - Assim, configuram início de prova material do trabalho rural o
certificado de dispensa de incorporação, comprovante de ITR em nome do
genitor e a Declaração para Cadastro de Imóvel Rural em nome do genitor.
14 - A prova oral não corrobora o labor rural no período pretendido, isto
é, desde os 07 anos de idade (1955) até 1972 (ano anterior ao início dos
vínculos empregatícios urbanos).
15 - Isso porque a primeira testemunha, Sr. Claudionor Ferreira da Silva,
asseverou que conhece o autor há 35 anos. Dado que a audiência de instrução
foi realizada no dia 24/09/2010, constata-se que a testemunha conhece o autor
desde 1975, época na qual já trabalhava com vínculos empregatícios urbanos,
conforme anotações em CTPS (fl. 113 e 39-57).
16 - No mesmo sentido, o depoimento da segunda testemunha, Sr. Bendito dos
Santos, asseverou conhecer o autor há 23 anos, isto é, desde 1987, não
sendo o testemunho apto para comprovar labor rural no período anterior ao
início dos vínculos empregatícios urbanos, a partir de 1973.
17 - Quanto aos demais períodos questionados pelo autor, não merece acolhida
o pleito, na medida em que a existência de contratos de trabalho anotados em
CTPS afasta a presunção de que o labor tenha sido ininterrupto, tornando
indefensável a tese de que, nos intervalos de tais contratos, o demandante
tenha laborado, por "extensão", na condição de rurícola.
18 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos,
resta inviável o reconhecimento do labor rural nos interregnos vindicados,
cabendo apenas computar os períodos em que houve o competente recolhimento
previdenciário na condição de autônomo.
19 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e
em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço
sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à
contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na
forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha
a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
20 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria
especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram
concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação
inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos
I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo
técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído
e calor.
21 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da
Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir
a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos,
químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo
suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade
do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional
considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do
tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
22 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a
agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995,
é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional,
sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c)
a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe
a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por
profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP),
preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos
profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração
biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições
laborais.
23 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente
nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo
de condições ambientais.
24 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB,
até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003;
e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
25 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei
nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao
responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos,
o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em
condições especiais.
26 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo
ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF
3º Região.
27 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova
da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos
e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo
diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF
excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda
que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
28 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma
extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se
supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de
redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído
acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora,
forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
29 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente
da data do exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28
da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
30 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70
do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior
Tribunal de Justiça.
31 - Para comprovar a natureza especial das atividades, a parte autora
apresentou a seguinte documentação: Períodos 18/03/1973 a 26/07/1974,
cópia de Perfil Profissiográfico Previdenciário (fl. 70), incompleto, sem
constar a segunda folha e, portanto, sem data, sem a assinatura do responsável
e sem indicar o engenheiro ou médico do trabalho responsável pelos registros
ambientais. Destaque-se, ainda, que na CTPS referido vínculo empregatício
consta como iniciado apenas em 18/08/1973, pairando dúvida sobre a veracidade
das informações prestadas. A atividade não é enquadrada como especial.
32 - Períodos de 18/02/1976 a 31/10/1976 e de 01/11/1976 a 10/05/1978,
cópia de Perfil Profissiográfico Previdenciário (fls. 71/72), emitido pela
empresa "Amplimatic S/A Industria e Comércio", informando que exerceu as
funções de "servente" e "auxiliar eletricista", com exposição a ruído
de 84,6 dB(A) e 82 dB(A). Reputo enquadrados como especiais os períodos,
eis que desempenhado com sujeição a nível de pressão sonora superior ao
limite de tolerância vigente à época da prestação dos serviços.
33 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos,
reputo enquadrados como especiais os períodos de 18/02/1976 a 31/10/1976
e de 01/11/1976 a 10/05/1978.
34 - Somando-se os períodos de atividades especiais (18/02/1976 a 31/10/1976
e de 01/11/1976 a 10/05/1978), reconhecidos nesta demanda, aos períodos
incontroversos constantes do CNIS ora anexado, do Resumo de Documentos
para Cálculo de Tempo de Contribuição, e das cópias das carteiras de
trabalho (fls. 39/57), verifica-se que na data da publicação da EC 20/98
(16/12/1998), o autor contava com 21 anos, 7 meses e 4 dias de tempo de
atividade, insuficiente para a concessão do benefício de aposentadoria.
35 - Computando-se períodos posteriores, verifica-se que na data do
requerimento administrativo, em 21/02/2008 (fl. 73), o autor contava com
30 anos, 09 meses e 10 dias de tempo de atividade, e na data da citação
(16/10/2009 - fl. 89), com 32 anos, 3 meses e 19 dias de tempo de atividade;
insuficientes para a concessão do benefício de aposentadoria proporcional
por tempo de contribuição.
36 - Indevida, portanto, qualquer análise no tocante ao pedido de
indenização por danos morais, dado que o indeferimento do benefício na via
administrativa foi correto, pois a parte autora não preenche os requisitos
para concessão da aposentadoria requerida.
37 - A parte autora sagrou vitoriosa ao ver reconhecidos alguns períodos
especiais vindicados. Por outro lado, o labor rural não foi averbado
e no momento do ajuizamento não fazia jus à aposentadoria pleiteada,
restando vencedora nesse ponto a autarquia. Desta feita, dou os honorários
advocatícios por compensados entre as partes, ante a sucumbência recíproca
(art. 21 do CPC/73), e deixo de condenar qualquer delas no reembolso das
custas, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS
delas isento.
38 - Remessa necessária provida para anular a sentença. Pedido julgado
parcialmente procedente. Apelação do INSS prejudicada.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar provimento à remessa necessária para anular a
r. sentença de 1º grau, por se tratar de sentença condicional e, com
supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgar
parcialmente procedente o pedido, para condenar o INSS a reconhecer e averbar
a especialidade do labor exercido nos períodos de 18/02/1976 a 31/10/1976 e
de 01/11/1976 a 10/05/1978, com possibilidade de conversão para tempo comum,
dando os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante
a sucumbência recíproca, deixando de condenar qualquer delas no reembolso
das custas, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o INSS
delas isento, restando prejudicada a análise da apelação do INSS, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
27/08/2018
Data da Publicação
:
03/09/2018
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1688594
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/09/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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