TRF3 0041658-72.2011.4.03.9999 00416587220114039999
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA
E MISERABILIDADE CONFIGURADAS. COMPROVAÇÃO SUPERVENIENTE
DOS REQUISITOS SUBJETIVO E OBJETIVO. TERMO INICIAL. PERÍCIA
MÉDICA. SUCUMBÊNCIA. APELAÇÕES IMPROVIDAS.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93,
regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- A LOAS deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao
estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício
da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência
ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover
a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Na ADIN 1.232-2, de 27/08/98, publicada no DJU de 1/6/2001, Pleno, Relator
Ministro Maurício Correa, RTJ 154/818, ocasião em que o STF reputou
constitucional a restrição conformada no § 3o do art. 20 da Lei n.°
8.742/93, conforme a ementa a seguir transcrita:
- Depois, em controle difuso de constitucionalidade, o Supremo Tribunal
Federal manteve o entendimento (vide RE 213.736-SP, Rel. Min. Marco Aurélio,
informativo STF n.° 179; RE 256.594-6, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 28/4/2000,
Informativo STF n.° 186; RE n.° 280.663-3, São Paulo, j. 06/09/2001,
relator Maurício Corrêa).
- Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça, em vários precedentes,
considerou que a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual
fala a Lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição
de miserabilidade por outros meios de prova (REsp n. 435.871, 5ª Turma
Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61, REsp n. 222.764,
STJ, 5ªT., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp
n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).
- Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal reviu seu posicionamento ao
reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode
ser considerado taxativo, acórdão produzido com repercussão geral (STF, RE
n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).
- A respeito do conceito de família, o dever de sustento familiar (dos
pais em relação aos filhos e destes em relação àqueles) não pode ser
substituído pela intervenção Estatal, pois o próprio artigo 203, V,
da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o
sustento não puder ser provido pela família. Essa conclusão tem arrimo
no próprio princípio da solidariedade social, conformado no artigo 3º,
I, do Texto Magno.
- Sobre a definição de deficiência, Nair Lemos Gonçalves apresentou os
principais requisitos: "desvio acentuado dos mencionados padrões médios e
sua relação com o desenvolvimento físico, mental, sensorial ou emocional,
considerados esses aspectos do desenvolvimento separada, combinada ou
globalmente" (Verbete Excepcionais. In: Enciclopédia Saraiva de Direito,
n. XXXIV. São Paulo: Saraiva, 1999).
- A Lei nº 13.146/2015, que "institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa
com Deficiência", com início de vigência em 02/01/2016, novamente alterou
a redação do artigo 20, § 2º, da LOAS, in verbis: "§ 2o Para efeito de
concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas."
- Como apontado no item IDOSOS E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA (voto do relator),
não é qualquer limitação ou problema físico ou mental que torna possível
a percepção de benefício assistencial de prestação continuada, mesmo
porque este não pode ser postulado como mero substituto de aposentadoria por
invalidez ou auxílio-doença, por aqueles que não mais gozam da proteção
previdenciária (artigo 15 da Lei nº 8.213/91), ou dela nunca usufruíram.
- No caso vertente, segundo o laudo pericial, a autora, nascida em 1954,
encontra-se incapacitada para o trabalho de modo total e permanecer, por ser
portadora de câncer de mama. O relator entende tratar-se de caso reservado
à previdência social, porquanto não se trata de deficiência, mas de
invalidez (artigo 201, I, da CF). Não obstante, como o próprio INSS concedeu
o benefício na via administrativa, dá-se por cumprido o requisito subjetivo.
- Sobre o aspecto subjetivo, no caso vertente, segundo o laudo pericial, a
autora, nascida em 25/9/1951, encontra-se incapacitada para o trabalho de modo
total e permanecer, por ser portadora de males cardíacos e diabetes. Refere
o perito que a autora submeteu-se a tratamento de câncer de mama (2002)
bem sucedido e que tal fato não foi incapacitante.
- As doenças da autora, somadas à idade hoje avançada, tornam-na pessoa com
barreiras à integração social, de modo que resta configurado o requisito
subjetivo previsto no artigo 20, § 2º, da LOAS, mas somente a partir
de da Lei nº 12.470/2011 (vide item 4 do voto do relator), que alterou a
redação do referido artigo e não mais exigiu a incapacidade para a vida
independente como requisito à concessão do benefício. A autora jamais foi
incapaz para a vida independente, que fique claro, de modo que, no contexto
da propositura da ação, o benefício era indevido.
- Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social revela que a autora
vive sozinha, em apartamento da COHAB, momentaneamente recebendo auxílio
de um filho que com ela vivia, declarando este renda de aproximadamente
meio salário mínimo. Segundo se dessume dos autos, os filhos da autora
vivem em outras cidades. Pela análise do CNIS, os filhos da autora não
possuem vínculo formal há algum tempo, provavelmente sobrevivendo no
mercado informal, sem condições de auxílio à mãe. Infere-se, assim,
que ele vive em situação de vulnerabilidade social.
- Preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício
de prestação continuada, previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93 e
regulamentado pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- O termo inicial fica mantido na data da perícia médica, porque: a) quando
da propositura da ação, a autora não era considerada pessoa com deficiência
(vide item 4 do voto do relator); b) no mesmo período, a autora vivia com a
mãe que recebia benefício previdenciário, com renda mensal per capita de ½
(meio) salário mínimo, nos termos da própria inicial. E, nessa época estava
em pleno vigor os efeitos da ADIN 1.232-2 (vide item 1 do voto do relator),
com efeitos erga omnes, de modo não há possibilidade de retroação; c)
o primeiro relatório social só foi realizado em 12/02/2014 (f. 415/416),
não havendo qualquer prova nos autos a respeito da situação financeira da
autora de 2007 (propositura da ação) até 2014; d) o benefício deve ser
revisto a cada 2 (dois) anos, consoante artigo 21 da mesma lei, não havendo
comprovação, repetindo, da miserabilidade no período anterior a 2014.
- Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno ambas as
partes a pagar honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 10%
(dez por cento) sobre o valor da condenação, a incidir sobre as prestações
vencidas até a data da sentença (ou acórdão), conforme critérios
do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC. Todavia, em relação à parte
autora, fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º,
do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
- Apelações improvidas.
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA
E MISERABILIDADE CONFIGURADAS. COMPROVAÇÃO SUPERVENIENTE
DOS REQUISITOS SUBJETIVO E OBJETIVO. TERMO INICIAL. PERÍCIA
MÉDICA. SUCUMBÊNCIA. APELAÇÕES IMPROVIDAS.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93,
regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- A LOAS deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao
estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício
da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência
ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover
a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Na ADIN 1.232-2, de 27/08/98, publicada no DJU de 1/6/2001, Pleno, Relator
Ministro Maurício Correa, RTJ 154/818, ocasião em que o STF reputou
constitucional a restrição conformada no § 3o do art. 20 da Lei n.°
8.742/93, conforme a ementa a seguir transcrita:
- Depois, em controle difuso de constitucionalidade, o Supremo Tribunal
Federal manteve o entendimento (vide RE 213.736-SP, Rel. Min. Marco Aurélio,
informativo STF n.° 179; RE 256.594-6, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 28/4/2000,
Informativo STF n.° 186; RE n.° 280.663-3, São Paulo, j. 06/09/2001,
relator Maurício Corrêa).
- Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça, em vários precedentes,
considerou que a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual
fala a Lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição
de miserabilidade por outros meios de prova (REsp n. 435.871, 5ª Turma
Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61, REsp n. 222.764,
STJ, 5ªT., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp
n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).
- Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal reviu seu posicionamento ao
reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode
ser considerado taxativo, acórdão produzido com repercussão geral (STF, RE
n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).
- A respeito do conceito de família, o dever de sustento familiar (dos
pais em relação aos filhos e destes em relação àqueles) não pode ser
substituído pela intervenção Estatal, pois o próprio artigo 203, V,
da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o
sustento não puder ser provido pela família. Essa conclusão tem arrimo
no próprio princípio da solidariedade social, conformado no artigo 3º,
I, do Texto Magno.
- Sobre a definição de deficiência, Nair Lemos Gonçalves apresentou os
principais requisitos: "desvio acentuado dos mencionados padrões médios e
sua relação com o desenvolvimento físico, mental, sensorial ou emocional,
considerados esses aspectos do desenvolvimento separada, combinada ou
globalmente" (Verbete Excepcionais. In: Enciclopédia Saraiva de Direito,
n. XXXIV. São Paulo: Saraiva, 1999).
- A Lei nº 13.146/2015, que "institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa
com Deficiência", com início de vigência em 02/01/2016, novamente alterou
a redação do artigo 20, § 2º, da LOAS, in verbis: "§ 2o Para efeito de
concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas."
- Como apontado no item IDOSOS E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA (voto do relator),
não é qualquer limitação ou problema físico ou mental que torna possível
a percepção de benefício assistencial de prestação continuada, mesmo
porque este não pode ser postulado como mero substituto de aposentadoria por
invalidez ou auxílio-doença, por aqueles que não mais gozam da proteção
previdenciária (artigo 15 da Lei nº 8.213/91), ou dela nunca usufruíram.
- No caso vertente, segundo o laudo pericial, a autora, nascida em 1954,
encontra-se incapacitada para o trabalho de modo total e permanecer, por ser
portadora de câncer de mama. O relator entende tratar-se de caso reservado
à previdência social, porquanto não se trata de deficiência, mas de
invalidez (artigo 201, I, da CF). Não obstante, como o próprio INSS concedeu
o benefício na via administrativa, dá-se por cumprido o requisito subjetivo.
- Sobre o aspecto subjetivo, no caso vertente, segundo o laudo pericial, a
autora, nascida em 25/9/1951, encontra-se incapacitada para o trabalho de modo
total e permanecer, por ser portadora de males cardíacos e diabetes. Refere
o perito que a autora submeteu-se a tratamento de câncer de mama (2002)
bem sucedido e que tal fato não foi incapacitante.
- As doenças da autora, somadas à idade hoje avançada, tornam-na pessoa com
barreiras à integração social, de modo que resta configurado o requisito
subjetivo previsto no artigo 20, § 2º, da LOAS, mas somente a partir
de da Lei nº 12.470/2011 (vide item 4 do voto do relator), que alterou a
redação do referido artigo e não mais exigiu a incapacidade para a vida
independente como requisito à concessão do benefício. A autora jamais foi
incapaz para a vida independente, que fique claro, de modo que, no contexto
da propositura da ação, o benefício era indevido.
- Quanto à hipossuficiência econômica, o estudo social revela que a autora
vive sozinha, em apartamento da COHAB, momentaneamente recebendo auxílio
de um filho que com ela vivia, declarando este renda de aproximadamente
meio salário mínimo. Segundo se dessume dos autos, os filhos da autora
vivem em outras cidades. Pela análise do CNIS, os filhos da autora não
possuem vínculo formal há algum tempo, provavelmente sobrevivendo no
mercado informal, sem condições de auxílio à mãe. Infere-se, assim,
que ele vive em situação de vulnerabilidade social.
- Preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício
de prestação continuada, previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93 e
regulamentado pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- O termo inicial fica mantido na data da perícia médica, porque: a) quando
da propositura da ação, a autora não era considerada pessoa com deficiência
(vide item 4 do voto do relator); b) no mesmo período, a autora vivia com a
mãe que recebia benefício previdenciário, com renda mensal per capita de ½
(meio) salário mínimo, nos termos da própria inicial. E, nessa época estava
em pleno vigor os efeitos da ADIN 1.232-2 (vide item 1 do voto do relator),
com efeitos erga omnes, de modo não há possibilidade de retroação; c)
o primeiro relatório social só foi realizado em 12/02/2014 (f. 415/416),
não havendo qualquer prova nos autos a respeito da situação financeira da
autora de 2007 (propositura da ação) até 2014; d) o benefício deve ser
revisto a cada 2 (dois) anos, consoante artigo 21 da mesma lei, não havendo
comprovação, repetindo, da miserabilidade no período anterior a 2014.
- Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno ambas as
partes a pagar honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 10%
(dez por cento) sobre o valor da condenação, a incidir sobre as prestações
vencidas até a data da sentença (ou acórdão), conforme critérios
do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC. Todavia, em relação à parte
autora, fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º,
do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
- Apelações improvidas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento às apelações, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
21/11/2018
Data da Publicação
:
12/12/2018
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1689060
Órgão Julgador
:
NONA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/12/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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