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Jurisprudência


TRF3 0047857-27.1998.4.03.6100 00478572719984036100

Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS DE APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSOCIAÇÃO CIVIL. CONJUNTO HABITACIONAL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. DIREITOS COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. SENTENÇA DE MÉRITO RESTRITA AOS LIMITES DO NÚCLEO DE HOMOGENEIDADE DOS DIREITOS INDIVIDUAIS. CONDENAÇÃO GENÉRICA. IMPOSSIBILIDADE DE INDIVIDUALIZAÇÃO DO PROVIMENTO JURISDICIONAL. NULIDADE DO CAPÍTULO INDIVIDUALIZADO DA SENTENÇA. LEGITIMAÇÃO ADEQUADA DA PARTE AUTORA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. VINCULAÇÃO DA SENTENÇA AOS LIMITES DA DEMANDA. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA. NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. REGULARIZAÇÃO DE CONTRATOS PARTICULARES FIRMADOS ENTRE MUTUÁRIOS E TERCEIROS CONDICIONADA À VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS DO SFH. ATRASO NA ENTREGA DOS IMÓVEIS. PRESUNÇÃO DE PREJUÍZO AO PROMITENTE COMPRADOR. REAJUSTE DAS PARCELAS DO CONTRATO. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL. INDEXADOR. TR. INCIDÊNCIA DA URV. HONORÁRIOS PERICIAIS E ADVOCATÍCIOS IMPUTADOS À ASSOCIAÇÃO AUTORA. NÃO CABIMENTO. ART. 18 DA LEI 7.347/85. PEDIDOS DE DESISTÊNCIA INDIVIDUAL FORMULADOS POR MUTUÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSOS DE APELAÇÃO INTERPOSTOS PELA ACETEL E COHAB PARCIALMENTE PROVIDOS. DEMAIS RECURSOS NÃO PROVIDOS. 1. A tutela coletiva de direitos tem como pressuposto a homogeneidade dos direitos subjacentes, de modo a possibilitar sua tutela coletiva, mediante a prolação de um provimento genérico, em face de uma tese jurídica geral, cuja sentença produzirá efeitos erga omnes, para beneficiar a todas as vítimas e seus sucessores, mediante a extensão secundum eventum litis da coisa julgada do plano coletivo para o individual (art. 103, inc. III, do CDC). Da mesma forma, tratando-se de direitos difusos ou coletivos stricto sensu, a sentença também deverá fixar uma tese jurídica geral, cuja atividade cognitiva será, quando cabível, complementada em sede de liquidação, seguindo a regra da extensão in utilibus da coisa julgada (art. 103, § 3º, do CDC). 2. A sentença proferida na fase de conhecimento deverá abranger tão somente os elementos comuns, integrantes do núcleo de homogeneidade do direito coletivamente tutelado, sendo reservada à ação de liquidação a individualização completa do objeto da prestação, mediante cognição específica sobre as situações individuais de cada um dos lesados (margem de heterogeneidade). Precedente (STF, RE nº 631.111/GO, Tribunal Pleno, DJe 29/10/2014). 3. O juízo de mérito proferido na sentença recorrida estendeu-se à apreciação das peculiaridades de cada relação jurídica individual. Nesse ponto, a decisão deve ser anulada, suprimindo-se o capítulo da sentença em que o juízo de cognição excedeu as questões fáticas e jurídicas relacionadas com o núcleo de homogeneidade dos direitos tutelados e procedeu à apreciação das situações particulares dos titulares dos direitos individuais, singularmente considerados. 4. Não subsiste a exclusão dos mutuários que não efetuaram as diligências necessárias à realização de prova pericial, vez que poderão fazê-lo em sede de liquidação e execução. 5. Legitimidade ativa demonstrada. Encontram-se devidamente preenchidos os critérios de aferição ope legis da legitimação ativa ad causam para a ação coletiva (art. 5º, inc. V, da Lei 7.347/85; e art. 82, inc. IV, da Lei 8.078/90), bem como devidamente demonstrada a adequação da legitimação da ACETEL no caso concreto. 6. Em relação aos associados moradores de outros conjuntos habitacionais que não o Santa Etelvina, é de rigor a manutenção da extinção do feito sem resolução do mérito, porquanto não se encontram vinculados à situação fático-jurídica comum aos demais associados, cujo núcleo de homogeneidade justifica a tutela coletiva do direito afirmado em juízo por meio da ACETEL. 7. É patente a pertinência subjetiva da CEF para figurar no polo passivo das demandas derivadas dos contratos de financiamento regidos pelo SFH, que versem sobre as normas gerais do referido Sistema, tendo em vista a sua condição de sucessora dos direitos e obrigações do Banco Nacional da Habitação (BNH) e responsável pelo Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS). Precedentes. 8. A sentença impôs à CEF a obrigação de ajustar o contrato celebrado com a COHAB, relativamente ao saldo do FCVS. O acolhimento da pretensão deduzida na exordial implica no ajuste do contrato celebrado pela COHAB com a CEF, no que se refere ao saldo do FCVS, como decorrência lógica do pedido de revisão dos contratos celebrados entre mutuários e a COHAB pelo Plano de Equivalência Salarial, tratando-se de consequência que decorre diretamente da interpretação do conjunto da postulação. 9. Nulidade por cerceamento de defesa não caracterizada. Declara a nulidade do capítulo individualizado da decisão recorrida, remanescendo apenas o provimento jurisdicional genérico, consubstanciado em tese jurídica geral, não subsiste qualquer nulidade eventualmente decorrente da prova pericial produzida, por não influir no provimento final de mérito, inexistindo prejuízo às partes. 10. A regularização dos contratos particulares de cessão de direitos deve ser condicionada à verificação, em cada caso, do enquadramento dos cessionários nos requisitos exigidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, sendo possível, ainda, a cobrança de taxa administrativa do novo compromissário comprador a cada transferência a ser realizada. 11. O descumprimento do prazo para entrega do imóvel objeto de compromisso de compra e venda enseja presunção de prejuízo ao promitente comprador, impondo-se a recomposição pelos danos sofridos. Na situação em exame, o atraso na conclusão do empreendimento ensejou a elevação do custo final da obra, impondo-se a revisão do contrato para supressão dos efeitos financeiros decorrentes do retardamento da obra. Precedentes. 12. O critério adotado na sentença para reajuste das parcelas do contrato encontra-se fundamentado em dispositivo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Deve ser observada a cláusula contratual que determina que o reajustamento das prestações obedecerá à variação salarial dos mutuários. As prestações mensais, assim como o saldo devedor, devem ser reajustados de acordo com o Plano de Equivalência Salarial. 13. Em relação ao saldo devedor, impõe-se a aplicação da Taxa Referencial (TR), como índice de correção monetária. No que tange às prestações mensais, seu reajuste deve se dar de acordo com o Plano de Equivalência Salarial (PES), observando-se, ainda, a incidência da Unidade Real de Valor (URV). Precedentes. 14. O decurso do prazo de 120 (cento e vinte) dias, estabelecido na sentença recorrida, para que a COHAB atenda às obrigações impostas, somente terá início a partir da apresentação, pelos mutuários, da documentação necessária às respectivas revisões. 15. O microssistema processual coletivo concede aos legitimados para promoção da ação civil pública a exoneração do adiantamento de despesas processuais, inclusive dos honorários periciais, assim como impede a condenação do autor coletivo aos encargos da sucumbência, ressalvada, apenas, a hipótese de litigância de má-fé (artigos 17 e 18, da Lei 7.347/85). O Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento de processo afetado à sistemática dos recursos repetitivos, estabeleceu que, nas ações civis públicas, as despesas com a verba honorária dos peritos particulares devem ser impostas à Fazenda Pública (REsp. 1.253.844/SC, DJe 17.10.2013). 16. Impõe-se o afastamento da condenação da Associação Autora ao pagamento de honorários periciais, bem como de verba honorária e custas processuais em favor da União Federal e do Banco Central do Brasil. Imputa-se à Fazenda Nacional a responsabilidade pela remuneração ao perito particular nomeado nos autos, incumbindo-lhe o pagamento dos respectivos honorários periciais. 17. Os pedidos de desistência e levantamento dos depósitos judiciais formulados, individualmente, por determinados mutuários, devem ser indeferidos. Por um lado, não cabe a homologação de desistência de substituídos/representados, uma vez que não integram o polo ativo da relação jurídico-processual, bem como, por outro lado, não é juridicamente possível a desistência da ação após a sentença (art. 485, § 5º, do Código de Processo Civil), remanescendo apenas a possibilidade de renúncia ao direito de recorrer ou desistência do recurso de apelação. Ademais, os titulares individuais do direito afirmado na ação não exercem o direito de desistir da demanda individualmente, dado que esta possibilidade é assegurada tão somente ao legitimado coletivo que propõe a ação. Por conseguinte, caso o associado não tenha mais interesse na pretensão buscada na demanda em curso, deverá comunicar à Associação Autora. 18. Declarada a nulidade parcial da sentença, no capítulo em que procedeu à apreciação da situação específica de cada um dos mutuários, individualmente considerados, subsistindo o provimento apenas na parte em que fixou tese jurídica geral. 19. Dado parcial provimento à apelação da ACETEL, para que seja afastada a condenação da Associação Autora ao pagamento de verba honorária e custas processuais em favor da União Federal e do Banco Central do Brasil, bem como de honorários periciais, imputando-se a verba pericial à Fazenda Nacional. 20. Dado parcial provimento ao recurso da COHAB, para que a regularização dos contratos particulares de cessão de direitos, firmados entre mutuários e terceiros, seja condicionada à verificação, em cada caso, do enquadramento dos cessionários nos requisitos exigidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, sendo permitida, ainda, a cobrança de taxa administrativa do novo compromissário comprador a cada transferência a ser realizada. Em relação ao saldo devedor, impõe-se a aplicação da Taxa Referencial (TR), como índice de correção monetária. No que tange às prestações mensais, seu reajuste deve se dar de acordo com o Plano de Equivalência Salarial (PES), observando-se, ainda, a incidência da Unidade Real de Valor (URV). Por fim, o prazo de 120 (cento e vinte) dias, estabelecido na sentença recorrida para que a COHAB atenda às obrigações impostas, somente terá início a partir da apresentação, pelos mutuários, da documentação necessária às respectivas revisões. 21. Negado provimento aos recursos de apelação do Banco Central do Brasil e da Caixa Econômica Federal. 22. Indeferidos os pedidos de desistência da ação e levantamento dos depósitos, deduzidos individualmente pelos mutuários.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os integrantes da Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, declarar parcialmente nula a sentença; dar parcial provimento aos recursos de apelação da ACETEL e da COHAB; e negar provimento aos recursos de apelação do Banco Central do Brasil e da Caixa Econômica Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 07/08/2018
Data da Publicação : 13/08/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 938449
Órgão Julgador : PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** LACP-85 LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-18 ART-17 ***** CDC-90 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-103 INC-3 PAR-3 ART-82 INC-4 ***** LACP-85 LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA LEG-FED LEI-7347 ANO-1985 ART-5 INC-5 ***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-485 PAR-5
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/08/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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