TRF5 0000055-59.2013.4.05.8102 00000555920134058102
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CAPITULAÇÃO EQUIVOCADA NA PEÇA INAUGURAL. CORREÇÃO POSTERIOR. DESCRIÇÃO DOS FATOS COM PRECISÃO PELA ACUSAÇÃO. TESE DE INÉPCIA E MÁCULA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. RÉU QUE APRESENTA DOCUMENTOS REQUERIDOS
PELO FISCO. POSTERIOR ALEGAÇÃO DE QUEBRA DE SIGILO ILEGAL. INOCORRÊNCIA. DENÚNCIA QUE DESCREVE AS CONDUTAS E O LIAME SUBJETIVO. CRIME TRIBUTÁRIO. DESNECESSIDADE DE DESCRIÇÃO MINUNCIOSA. SUFICIÊNCIA DA DESCRIÇÃO CONTIDA NA PEÇA ACUSATÓRIA. MATERIALIDADE
E AUTORIA DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1) Entendeu, o juízo, que, após a merecida instrução processual penal, teria restado comprovado que o apelante, de modo consciente e voluntário, na condição de administrador da empresa R. PAES MARTINS ME., teria omitido receitas recebidas durante o ano
de 2005, no valor total de R$ 4.459.185,48, o que teria originado um crédito tributário de R$ 1.318.808,89, montante este sonegado e que caracterizaria o crime previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8137/90, c/c art. 71 do CPB.
2) Inconformado com o decreto condenatório, a defesa apresentou apelação. Em suas razões, aduziu, resumidamente, como preliminares: 1) a inépcia da denúncia, já que esta teria capitulado os fatos em dispositivo legal que não faria referência a qualquer
crime, qual seja, art. 1º da Lei n. 9.430; 2) a ausência de individualização da conduta, já que a denúncia, em momento algum, teria dito que o apelante havia prestado declarações falsas; 3) a ilegitimidade passiva do réu, já que a acusação não o teria
apontado como o autor da "omissão de receitas"; 4) a nulidade do feito em face de ter havido quebra de sigilo bancário sem autorização judicial; 5) cerceamento ao direito de defesa, ao argumento de que os advogados não teriam sido intimados e/ou
comunicados acerca da designação de audiência realizada em 24.03.2015 em Nova Olinda/CE, para a oitiva das testemunhas. No mérito, destacou: 6) a inexistência de crime; 7) a inexistência de materialidade delitiva; 8) a inexistência de autoria delitiva;
bem como 9) a inexistência de continuidade delitiva.
3) Por equívoco, a peça acusatória imputou originariamente as condutas perpetradas pelo apelante no art. 1º, I e II, da Lei n. 9.430/96. Todavia, verificando o equívoco cometido, o MPF o sanou, capitulando os fatos no art. 1º, I e II, da Lei n.
8.137/90.
4) O feito seguiu o trâmite regular, tendo a instrução processual penal e a defesa sido realizadas tendo por norte o art. 1º da Lei n. 8.137/90 e não o originariamente declinado pelo parquet. Logo, não houve qualquer nulidade decorrente da capitulação
erroneamente sugerida pelo MPF na peça inaugural, seja porque o MPF a corrigiu; seja porque toda a instrução processual penal se deu com base na capitulação correta; seja, enfim, porque, como se sabe, o acusado não se defende do dispositivo a si
cominado, senão dos fatos.
5) A denúncia foi precisa ao declinar que o réu, na condição de microempresário, teria deixado de informar ao Fisco (omitido, portanto), movimentações financeiras que, por razões óbvias, gerariam a incidência de tributos. Com tal conduta (omissão de
informações acerca dos valores auferidos pela empresa), o acusado, de modo consciente e voluntário, teria sonegado os tributos que fatalmente incidiriam sobre o montante que deixou de declarar. Logo, não há que se falar em inexistência de
individualização da conduta, tampouco em falta de afirmação de que o réu teria sido o autor destas.
6) Acerca da aventada ilegitimidade do apelante, já se viu que a denúncia apontou sim o réu como o agente que, de modo consciente e voluntário, na condição de único administrador da empresa, omitiu receitas tributáveis, que transitaram, inclusive, por
sua conta bancária, com a finalidade de sonegar tributos, o que, de fato, ocorreu. Logo, irrefutável sua legitimidade para configurar no polo passivo da demanda.
7) O próprio apelante foi quem assinou o termo de entrega dos documentos solicitados. Bem por isto, não houve sequer quebra de sigilo, quiçá ilegalidade a ser sanada. Ademais, consoante previsto na LC n.º 105/2001, a RFB pode requisitar das instituições
financeiras informações bancárias de contribuintes sem que seja necessária autorização judicial.
8) Não pode a defesa - seja porque alertada pelo juízo deprecante, seja porque a própria Súmula 273 do STJ assim dispõe - tentar defender a tese de que teria sido cerceada em seu direito de defesa na medida em que não fora intimada da audiência
deprecada. Em outras palavras, além de o juízo ter sido claro no sentido de que os advogados somente seriam intimados da expedição da deprecata (cabendo a eles, doravante, acompanhar as marcações de audiências e eventuais outros atos), a situação
ocorrida nos autos segue prevista e acobertada, inclusive, em entendimento já sumulado.
9) Quanto à continuidade delitiva, a sentença merece reforma. É que a peça acusatória não descreve com a clareza necessária que o réu atuara de maneira reiterada, nas mesmas circunstâncias de tempo, modo de execução e outros similares, nos termos
exigidos pelo art. 71 do CPB.
10) Em outras palavra, a acusação apenas menciona que o apelante sonegou tributos em 2005, mas não indica de maneira precisa em que datas, tampouco sinalizando para a configuração do cometimento dos crimes em cadeia, o que, efetivamente, inviabiliza a
aplicação da causa de aumento de pena, sob a mácula de afrontar os princípios do contraditório e da ampla defesa.
11) Sentença reformada apenas para desconsiderar a causa de aumento de pena prevista no art. 71 do CPB, substituindo a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
12) Recurso parcialmente provido.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CAPITULAÇÃO EQUIVOCADA NA PEÇA INAUGURAL. CORREÇÃO POSTERIOR. DESCRIÇÃO DOS FATOS COM PRECISÃO PELA ACUSAÇÃO. TESE DE INÉPCIA E MÁCULA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. RÉU QUE APRESENTA DOCUMENTOS REQUERIDOS
PELO FISCO. POSTERIOR ALEGAÇÃO DE QUEBRA DE SIGILO ILEGAL. INOCORRÊNCIA. DENÚNCIA QUE DESCREVE AS CONDUTAS E O LIAME SUBJETIVO. CRIME TRIBUTÁRIO. DESNECESSIDADE DE DESCRIÇÃO MINUNCIOSA. SUFICIÊNCIA DA DESCRIÇÃO CONTIDA NA PEÇA ACUSATÓRIA. MATERIALIDADE
E AUTORIA DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1) Entendeu, o juízo, que, após a merecida instrução processual penal, teria restado comprovado que o apelante, de modo consciente e voluntário, na condição de administrador da empresa R. PAES MARTINS ME., teria omitido receitas recebidas durante o ano
de 2005, no valor total de R$ 4.459.185,48, o que teria originado um crédito tributário de R$ 1.318.808,89, montante este sonegado e que caracterizaria o crime previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8137/90, c/c art. 71 do CPB.
2) Inconformado com o decreto condenatório, a defesa apresentou apelação. Em suas razões, aduziu, resumidamente, como preliminares: 1) a inépcia da denúncia, já que esta teria capitulado os fatos em dispositivo legal que não faria referência a qualquer
crime, qual seja, art. 1º da Lei n. 9.430; 2) a ausência de individualização da conduta, já que a denúncia, em momento algum, teria dito que o apelante havia prestado declarações falsas; 3) a ilegitimidade passiva do réu, já que a acusação não o teria
apontado como o autor da "omissão de receitas"; 4) a nulidade do feito em face de ter havido quebra de sigilo bancário sem autorização judicial; 5) cerceamento ao direito de defesa, ao argumento de que os advogados não teriam sido intimados e/ou
comunicados acerca da designação de audiência realizada em 24.03.2015 em Nova Olinda/CE, para a oitiva das testemunhas. No mérito, destacou: 6) a inexistência de crime; 7) a inexistência de materialidade delitiva; 8) a inexistência de autoria delitiva;
bem como 9) a inexistência de continuidade delitiva.
3) Por equívoco, a peça acusatória imputou originariamente as condutas perpetradas pelo apelante no art. 1º, I e II, da Lei n. 9.430/96. Todavia, verificando o equívoco cometido, o MPF o sanou, capitulando os fatos no art. 1º, I e II, da Lei n.
8.137/90.
4) O feito seguiu o trâmite regular, tendo a instrução processual penal e a defesa sido realizadas tendo por norte o art. 1º da Lei n. 8.137/90 e não o originariamente declinado pelo parquet. Logo, não houve qualquer nulidade decorrente da capitulação
erroneamente sugerida pelo MPF na peça inaugural, seja porque o MPF a corrigiu; seja porque toda a instrução processual penal se deu com base na capitulação correta; seja, enfim, porque, como se sabe, o acusado não se defende do dispositivo a si
cominado, senão dos fatos.
5) A denúncia foi precisa ao declinar que o réu, na condição de microempresário, teria deixado de informar ao Fisco (omitido, portanto), movimentações financeiras que, por razões óbvias, gerariam a incidência de tributos. Com tal conduta (omissão de
informações acerca dos valores auferidos pela empresa), o acusado, de modo consciente e voluntário, teria sonegado os tributos que fatalmente incidiriam sobre o montante que deixou de declarar. Logo, não há que se falar em inexistência de
individualização da conduta, tampouco em falta de afirmação de que o réu teria sido o autor destas.
6) Acerca da aventada ilegitimidade do apelante, já se viu que a denúncia apontou sim o réu como o agente que, de modo consciente e voluntário, na condição de único administrador da empresa, omitiu receitas tributáveis, que transitaram, inclusive, por
sua conta bancária, com a finalidade de sonegar tributos, o que, de fato, ocorreu. Logo, irrefutável sua legitimidade para configurar no polo passivo da demanda.
7) O próprio apelante foi quem assinou o termo de entrega dos documentos solicitados. Bem por isto, não houve sequer quebra de sigilo, quiçá ilegalidade a ser sanada. Ademais, consoante previsto na LC n.º 105/2001, a RFB pode requisitar das instituições
financeiras informações bancárias de contribuintes sem que seja necessária autorização judicial.
8) Não pode a defesa - seja porque alertada pelo juízo deprecante, seja porque a própria Súmula 273 do STJ assim dispõe - tentar defender a tese de que teria sido cerceada em seu direito de defesa na medida em que não fora intimada da audiência
deprecada. Em outras palavras, além de o juízo ter sido claro no sentido de que os advogados somente seriam intimados da expedição da deprecata (cabendo a eles, doravante, acompanhar as marcações de audiências e eventuais outros atos), a situação
ocorrida nos autos segue prevista e acobertada, inclusive, em entendimento já sumulado.
9) Quanto à continuidade delitiva, a sentença merece reforma. É que a peça acusatória não descreve com a clareza necessária que o réu atuara de maneira reiterada, nas mesmas circunstâncias de tempo, modo de execução e outros similares, nos termos
exigidos pelo art. 71 do CPB.
10) Em outras palavra, a acusação apenas menciona que o apelante sonegou tributos em 2005, mas não indica de maneira precisa em que datas, tampouco sinalizando para a configuração do cometimento dos crimes em cadeia, o que, efetivamente, inviabiliza a
aplicação da causa de aumento de pena, sob a mácula de afrontar os princípios do contraditório e da ampla defesa.
11) Sentença reformada apenas para desconsiderar a causa de aumento de pena prevista no art. 71 do CPB, substituindo a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
12) Recurso parcialmente provido.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
15/03/2018
Data da Publicação
:
16/03/2018
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 12936
Órgão Julgador
:
Terceira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Cesar Carvalho
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Doutrina
:
AUTOR:Júnior, José Paulo Baltazar.
OBRA:Crimes Federais. 8ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, pgs.. 225 e ss
Referência
legislativa
:
LEG-FED SUM-273 (STJ)
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LEG-FED LCP-105 ANO-2001 ART-6
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***** CPP-41 Codigo de Processo Penal
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-654 PAR-2 ART-41
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LEG-FED LEI-9430 ANO-1996 ART-1 INC-1 INC-2 ART-42 PAR-1 PAR-2
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***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-71 ART-44 INC-1 INC-2 INC-3 PAR-2 ART-46 PAR-3 ART-43 INC-4 ART-55 ART-45 PAR-2 ART-77 INC-3
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LEG-FED LEI-8137 ANO-1990 ART-1 INC-1
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***** CF-88 Constituição Federal de 1988
ART-225 PAR-3
Fonte da publicação
:
DJE - Data::16/03/2018 - Página::105
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