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Jurisprudência


TRF5 0000283-53.2012.4.05.8107 00002835320124058107

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL, NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA E DE ATOS PROBATÓRIOS REJEITADAS. IMPUTAÇÃO DA PRÁTICA DOS DELITOS DE TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. ART. 33 DA LEI Nº. 11.348/2006 E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ART. 35 DA LEI Nº. 11.348/2006. AUTORIA E MATERIALAIDADE DELITIVA. COMPROVAÇÃO. CONCURSO MATERIAL DE DELITOS. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. NOVA VALORAÇÃO. REDUÇÃO DAS PENAS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL IMPROVIDO. RECURSOS DOS RÉUS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. Apelações interpostas pelo Ministério Público Federal e pelos réus contra sentença que julgou procedente a denúncia que imputou aos réus a prática dos delitos de Tráfico Internacional de Entorpecentes (tipificado no art. 33 da Lei 11.343/2006) e de Associação para o Tráfico (art. 35 do mencionado diploma legal), em concurso material (art. 69 do Código Penal). 2. Consta da denúncia que os acusados, de forma associada e organizada, adquiriram, receberam, transportaram, guardaram e depositaram 174,80 kg de pasta-base de cocaína proveniente da Bolívia, que foi apreendida na zona rural em cidade do interior do Estado do Ceará. 3. A sentença condenou os réus pela prática dos crimes tipificados nos seguintes dispositivos legais: DERCI GUELCI MALHEIROS, MARCÍLIO ALVES FEITOSA, FERNANDO BIZZI, CÍCERO ALVES FEITOSA, JOSÉ TADEU DOS SANTOS e ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO (art. 33, caput, c/c o art. 40, I e V e art. 35, todos da Lei nº. 11.343/2006, e em concurso material - art.69, do Código Penal); FELIPE RAMOS MORAIS (art. 33, caput, c/c o art. 40, I e V, da Lei nº. 343/2006) e AURINO PATRÍCIO DO NASCIMENTO (art. 33, caput, e parágrafo 4º, da Lei nº. 11.343/2006). 4. Em seu recurso, o Ministério Público Federal alegou, em síntese: a) a prática do delito tipificado no art. 288 do CP não importaria em bis in idem em relação ao delito de associação para o tráfico, posto que tutelam objetos jurídicos distintos; b) a possibilidade de redirecionamento das penas-base aplicadas aos réus, um vez ser possível a consideração da mentira do réu, perjúrio, como fator determinante para a majoração da pena-base; c) as circunstâncias judiciais não foram devidamente analisadas pelo Juízo singular, devendo ser consideradas desfavoráveis aos réus a circunstância culpabilidade; d) em relação ao réu Derci G. Malheiros, não foi levado em conta o registro de condenação anterior, bem como o registro de ocorrência de prisão em flagrante, que denotam a sua habitualidade para o cometimento de atividades ilícitas. Deve-se também, ser valorada negativamente tal circunstância em relação aos réus José Tadeu dos Santos (condenação por homicídio e contravenção penal), Cícero Alvez Feitosa (condenação por roubo), Marcílio Alves Feitosa (condenações anteriores), Fernando Bizzi (condenação anterior por tráfico). As circunstâncias e consequências do crime também deveriam ser valoradas negativamente em relação a todos os réus; e) não resta dúvida de que o réu Felipe Ramos Morais desenvolveu atividade principal de transporte de drogas em sua aeronave, de forma que deve ser enquadrado como coautor do fato criminoso e deve ser condenado como incurso nas penas do art. 35 da Lei nº 11.343/2006. 5. Em seus recursos os réus alegaram, preliminarmente, a incompetência da Justiça Federal para julgar o feito, já que não foi comprovada a transnacionalidade do tráfico de drogas; nulidade processual por ausência de intimação sobre a audiência de oitiva das testemunhas arroladas pela acusação; nulidade absoluta por cerceamento de defesa, por não se haver oportunizado o direito à apresentação de defesa prévia, nos termos do art. 55, da Lei nº. 11. 343/2006 e ainda nulidade dos atos processuais com nova produção de provas, diante do erro na identificação quanto à pessoa de alcunha "Alemão", que não correspondia ao corréu ALEXANDRO PINHEIRO DOS SANTOS, bem como em face da existência de interesses antagônicos com o do réu FELIPE MORAES, representados pelo mesmo defensor nos presentes autos. No mérito, existência do erro tipo essencial, ausência de provas do cometimento do crime de tráfico, não ocorrência do crime de associação para o tráfico, por não haver sido comprovado o ânimo associativo entre os réus; excessividade na fixação da pena-base; impossibilidade de pagar o valor da pena de multa, que ao preço de hoje alcança a quantia de R$ 72.566,66 (setenta e dois mil, quinhentos e sessenta e seis reais e sessenta e seis centavos). 6. Preliminar de incompetência da Justiça Federal afastada, porquanto de acordo com os depoimentos dos acusados e demais provas colhidas nos autos, o crime de tráfico de drogas teve origem na Bolívia, de onde veio a droga que fora acondicionada em longarinas de caminhão e transportada até o Estado de Mato Grosso. 7. O colendo Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que a existência de indícios da transnacionalidade do tráfico de drogas ou de associação para o tráfico é suficiente para atrair a competência da Justiça Federal, nos termo do art. 109, V, da Constituição. Precedente: Quinta Turma, RHC 75627/GO, Relator: Min. Joel Ilan Paciornkil, julg. 20/10/2016, publ. DJE: 28/10/2016, decisão unânime. 8. Rejeição da preliminar de nulidade processual por falta de intimação em relação à Carta Precatória para a oitiva de testemunha, tendo em vista que não restou demonstrado pelos acusados qualquer prejuízo decorrente da realização desse ato processual. 9. Rejeição da prefacial de nulidade absoluta por cerceamento de defesa em face de suposta falta de oportunização para apresentação de defesa prévia. De acordo com a jurisprudência do STF, não há que se falar em nulidade do processo por falta de oportunização para apresentação de defesa prévia, pois aquela Corte Superior entendeu que, havendo conexão de crimes com ritos distintos, deve ser aplicado o rito ordinário, que se mostra mais consentâneo ao exercício da ampla defesa. Precedente: (STF, Segunda Turma, RHC 105243/RS, Relatora: Ministra Ellen Gracie, julg. 14/09/2010, publ. 01/10/2010). 10. No caso em tela, a denúncia enquadrou alguns dos acusados pela prática também do delito tipificado no art. 288, do Código Penal. Por essa razão, se aplicou o procedimento comum, tendo os acusados apresentado defesa preliminar quando notificados da ação penal, não restando evidenciado qualquer prejuízo quanto à utilização do procedimento escolhido no presente feito. 11. Rejeição da preliminar de nulidade dos processuais com a designação de nova produção de prova, pois o acusado JOSÉ TADEU, em seu interrogatório (registrado em mídia digital) esclareceu que as pessoas de "Alemão" e "Alemão sem bigode" não são a mesma pessoa. Na verdade, "Alemão" é o próprio acusado Alexandro Pinho dos Santos, que tem os olhos e a pele clara, com feições de alemão, o qual foi o responsável pela elaboração de toda a logística para o transporte da droga, do Estado de Mato Grosso para o Estado do Ceará, tendo contratado o acusado FELIPE MORAES para transportar o entorpecente em helicóptero até uma Fazenda no Município de Acopiara-CE, operação que realizou juntamente com o acusado JOSÉ TADEU DOS SANTOS. 12. Rejeição da preliminar de nulidade da sentença por colidência entre as teses apresentadas pelo mesmo defensor dos acusados ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO e FELIPE RAMOS MORAIS, pois os dois acusados mencionados livremente escolheram o mesmo defensor e este acompanhou-os durante toda a instrução do processo, sem que se tenha sido comprovado o alegado conflito de interesses. 13. O tipo penal do delito previsto no art. 33 da Lei nº. 11.343/2006 consiste em "importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar". A conduta prevista no artigo 35 da Lei 11.343/2006, por sua vez, consiste em "associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e parágrafo 1º, e 34 desta Lei". Por sua vez, o art. 40 do aludido diploma legal prevê que "as penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se: I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito; (...) V - caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal". Por último, a conduta tipificada no art. 288, do Código Penal consiste em "associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes". 14. A materialidade dos crimes está devidamente comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante, pelo Auto de Apresentação e Apreensão, pelo Laudo Preliminar de Constatação e pelo Laudo da Substância Apreendida constantes dos autos do Inquérito Policial. 15. Consta do Laudo Pericial acostado aos autos que "A COCAÍNA é de uso proscrito no Brasil, podendo causar dependência física ou psíquica, de acordo com a Portaria nº 344-SVS/MS de 12/05/1998, estando inserida na Lista F1 da Resolução-RDC Nº 37, de 02.07.2012, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde". 16. A autoria delitiva restou demonstrada pelos autos de prisão em flagrante acostados aos autos, pela prova testemunhal e pelas declarações dos acusados nos autos do processo criminal, os quais confirmarem que houve o transporte de 173,80 Kg de pasta base de cocaína, que foi conduzida de helicóptero, do Município de Alta Floresta/MT para Acopiara/CE, com sucessivas paradas para abastecimento da aeronave e pernoite. 17. O crime de quadrilha ou bando, previsto no art. 288 do Código Penal, e o de associação para o tráfico, previsto no art. 35 da Lei nº. 11.343/2006 não podem coexistir. Isto porque o crime de associação para o tráfico é especial em relação ao crime de formação de quadrilha ou bando, já que diz respeito à prática reiterada de tráfico de drogas, e não de qualquer outro delito. 18. Evidenciado o conflito de normas penais incriminadoras, deve prevalecer o principio da especialidade, ou seja, a lei especial, no caso, a Lei nº. 11.343/2006, deve se sobrepor à lei geral, no caso, a norma inserta no art. 288, do Código Penal. 19. Julga-se prejudicada a alegação do Ministério Público de que não existe bis in idem entre o crime de formação de quadrilha com o crime de associação para o tráfico. Ainda que não se adotasse este entendimento, não se poderia reconhecer a prática do crime de formação de quadrilha ou bando (art. 288 do Código Penal), pois não foram imputados aos acusados a prática de outros delitos, a não ser os previstos na Lei nº. 11.343/2006 (tráfico de entorpecentes). 20. O Supremo Tribunal Federal já reconheceu em várias oportunidades que a Constituição assegura aos acusados o direito de permanecerem em silêncio, inserindo neste direito a prerrogativa processual penal da negação da prática de infração penal que lhe é imputada. Precedente: Segunda Turma, HC 111567 AgR/AM, Relator: Ministro Celso de Mello, julg. 05.08.2014, decisão unânime. 21. Nos termos do art. 186, parágrafo único do CPP, o silêncio do acusado, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo de sua defesa. Deste modo, não há como acolher o perjúrio como fator determinante para a elevação da pena. 22. As circunstâncias do fato evidenciaram a transnacionalidade do delito, bem como ficou caracterizado o tráfico entre Estados da Federação, que são causas de aumento da pena previstas no art. 40, I e V, da Lei nº. 11.343/2006. 23. As provas que constam nos autos comprovam que o acusado FELIPE RAMOS MORAIS foi contratado como piloto da aeronave para realizar o transporte da carga de drogas. No aparelho de GPS utilizado na aeronave constam registros de várias passagens por região de fronteira e de outros países conhecidos como exportadores de cocaína. Tal se justifica pelo fato de que o referido aparelho de GPS pertencia ao acusado JOSÉ TADEU DOS SANTOS, o qual liderou toda a operação de transporte da droga. 24. Inexistem provas nos autos de que o acusado FELIPE RAMOS MORAIS tenha praticado o delito de associação para o tráfico, não havendo estabilidade da associação deste para cometer tal delito, justificando-se, nesse tocante, a improcedência da denúncia quanto a esse crime imputado a mencionado acusado. 25. A associação não se confunde com a simples coautoria, sendo que a adesão ocasional do réu FELIPE RAMOS MORAIS à conduta dos demais réus não se subsume ao tipo penal do art. 35 da Lei de Drogas, conforme entendimento do STJ. 26. É de se reconhecer a harmonia entre os elementos informativos constantes dos autos e a parte do depoimento do acusado FELIPE RAMOS MORAES, no qual este descreveu a prática do fato delituoso com riqueza de detalhes, abrangendo a sua contratação para o transporte de mercadoria, (que percebeu durante o transporte se tratar de cocaína), desde Mato Grosso (nas margens de Rodovia entre Sinop/MT e Juína/MT) até a Fazenda Córrego, no Município de Acopiara-CE), com as paradas para pernoite e abastecimento da aeronave. 27. A conduta do acusado FELIPE RAMOS MORAIS durante o vôo em que pilotou o helicóptero transportando a droga é incompatível com sua alegação de inocência, uma vez que ele teve a oportunidade de interromper o voo durante as paradas de abastecimento, como bem destacou o Ministério Público no Primeiro Grau de Jurisdição e ressaltado na sentença. Neste caso, Resta evidenciada a participação do aludido acusado no transporte da droga em aeronave de sua propriedade, sendo, portanto enquadrado como coautor do fato delituoso. As circunstâncias do fato evidenciaram a transnacionalidade do crime, bem como restou caracterizado o tráfico entre Estados da Federação, que são causas de aumento da pena previstas no art. 40, I e V, da Lei nº. 11.343/2006. 28. A versão dos fatos dada pelo acusado ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO (conhecido como "Alemão"), durante o interrogatório no Inquérito Policial, quando afirmou que não tinha conhecimento do transporte da cocaína por meio de helicóptero, foi contestada pelo acusado FELIPE RAMOS MORAIS (piloto da aeronave), quando este foi ouvido em Juízo e afirmou que aquele acusado foi quem contratou o transporte da droga, dando todas as instruções para descarregar a substância ilícita em locais próximos aos pontos de reabastecimento do helicóptero. 29. O acusado JOSÉ TADEU em seu interrogatório (mídia digital acostada aos autos) confirmou que o acusado ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO foi quem lhe contratou juntamente com o acusado FELIPE RAMOS MORAIS para fazer o transporte da droga até a coordenada geográfica no Ceará fornecida por ele (Alexandro de Oliveira Pinho), onde a droga deveria ser descarregada e onde deveria procurar a pessoa conhecida por "Alemão com Bigode". 30. Restou evidenciado que o acusado ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO foi o responsável por toda a logística de transporte da droga (174,80 Kg de pasta-base de cocaína) contratando os Pilotos Felipe Ramos Morais e José Tadeu para tal fim, plotando a área de pouso da aeronave no Ceará e indicando a alcunha do recebedor da droga "Alemão de bigode". 31. O acusado ALEXANDRO OLIVEIRA PINHO atuava de modo permanente no tráfico de entorpecente, pois era o responsável por todo o transporte da droga e exercia ainda a tarefa de pilotagem das coordenadas para o pouso do helicóptero usado para transportar a droga. Por tal razão, esse acusado se encontra incurso nas penas do art. 33, caput, c/c o art. 40, Ie V e 35, da Lei nº. 11.343/2006, em concurso material, nos termos do art. 69 do Código Penal. 32. A participação do acusado DELCI MALHEIROS nos delitos de Tráfico Internacional de Entorpecente e de Associação para o tráfico ficou evidenciada nos autos, sendo rechaçada sua versão de que foi ao Ceará apenas para receber o pagamento pela venda do caminhão, em face das afirmações feitas pelos demais denunciados pelo tráfico internacional de entorpecentes, onde ficou demonstrado o seu envolvimento no fato delituoso. Consta do depoimento de um dos condutores (que efetuou a prisão em flagrante) e de testemunhas ouvidas em juízo que parte da droga pertencia ao acusado DERCI MALHEIROS. 33. Da análise dos autos sobressai que o acusado DERCI MALHEIROS, conhecido também como "Bigode", era um dos compradores da droga (cocaína em pasta) originária da Bolívia e trazida de helicóptero de Mato Groso para uma Fazenda no Município Acopiara/CE, para onde se dirigiu para receber a sua parte da carga ilícita. 34. O depoimento em juízo da testemunha Francisco Rodrigues do Nascimento transcrito na sentença, confirma a habitualidade do acusado DERCI MALHEIROS na associação para o tráfico. 35. As provas dos autos evidenciam que o acusado JOSÉ TADEU DOS SANTOS tinha plena consciência da ilicitude da sua conduta consistente no recebimento da droga do exterior e da elaboração da logística do transporte da droga, do pagamento por tal transporte, das despesas com a viagem até o interior do Ceará e do ato de esconder a droga antes de cada parada para abastecimento de combustível. Por essa razão, não merece prosperar a alegação do acusado de ter agido incorrendo em erro do tipo. 36. Como se observa dos autos, o acusado JOSÉ TADEU DOS SANTOS exerceu papel fundamental no tráfico internacional da droga, recebendo-a perto da fronteira e embarcando-a em Juína/MT até o seu destino final na Fazenda Córrego, em Acopiara/CE, sendo o responsável pela logística de despesa com o transporte, hospedagem (sua e do piloto), e ainda de esconder a droga antes de cada parada para abastecimento da aeronave. 37. Outro aspecto a ser considerado é que, ao contrário do que apregoa a sua defesa, o acusado JOSÉ TADEU DOS SANTOS participou da prática do delito tipificado no art. 35 da Lei nº. 11.343/2006, ou seja, da organização para o tráfico, na medida em que havia estabilidade e permanência na associação criminosa voltada ao cometimento de delitos de tráfico de entropecentes, como restou demonstrado nos autos. 38. A tarefa da qual estava incumbido (transportar uma grande e valiosa quantidade da droga proveniente do exterior) não podia ser atribuída a amador, mas a alguma pessoa que tivesse experiência e gozasse da confiança dos outros membros integrantes da associação. 38. Resta comprovado o liame para a configuração do delito de associação para o tráfico com estabilidade, já que o acusado JOSÉ TADEU DOS SANTOS não apenas era o responsável pelo transporte da droga, bem como por sua guarda e vigilância durante os pousos do helicóptero para abastecimento e também durante os pernoites nos hotéis até o destino final da droga. Todo esse papel exercido pelo acusado evidenciava a experiência que possuía em face da habitualidade com que praticava tal ilícito penal. Deve por esta razão ser enquadrado nas sanções do art. 33 e 35, ambos da Lei nº. 11.343/2006, em concurso material, nos termos do art. 69 do Código Penal. 39. Os acusados CÍCERO ALVES FEITOSA e MARCÍLIO ALVES FEITOSA alegaram em suas apelações a existência de erro sobre o tipo, quando na verdade pretendem demonstrar a ausência de dolo em suas condutas tendo em vista que desconheciam o conteúdo da mercadoria transportada. Esses dois acusados são irmãos e, consoante restou comprovado nos autos, estavam ambos no veículo de cor preta marca Nissan, Modelo Sentra, que foi usado para buscar o acusado ALEXANDRO OLIVEIRA PINHO no Aeroporto Pinto Martins, em Fortaleza-CE, e com este viajaram para a Fazenda no Município de Acopiara-CE, juntamente com os acusados DERCI MALHEIROS e FERNANDO BIZZI, onde foram receber a droga que ia chegar de helicóptero. O acusado ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO foi o encarregado de fazer a pilotagem das coordenadas de pouso do helicóptero. 40. Restou comprovada pelas provas colhidas nos autos, tanto do Inquérito Policial quanto do Processo Judicial, a participação dos acusados MARCILIO FEITOSA e CÍCERO FEITOSA no crime de tráfico internacional de entorpecentes, adquirindo e recebendo a droga originária da Bolívia e transportada de helicóptero de Mato Grosso para a Fazenda Córrego em Acopiara/CE, onde se encontravam, bem como no delito de associação para o tráfico. 41. Como restou demonstrado nos autos, o acusado CÍCERO FEITOSA ajudou o seu irmão MARCÍLIO FEITOSA na execução do crime, sendo o seu braço direito. Como enfatizado na sentença, este acusado "recebia todas as ordens e cumpria. (....) levou Alexandro até o sítio, onde foram pilotadas as coordenadas de pouso. Cícero também pageava Alexandro o tempo todo, para que nada desse errado. O automóvel Fiat Palio pertencia a ele.". Os acusados se encontram incursos nas penas do art. 33, caput, c/c no art. 40, I e V, da Lei nº. 11.343/2006. 42. Do exame das provas dos autos se observa que a MARCÍLIO ALVES FEITOSA pertencia parte da droga apreendida, a qual pretendia vender no Estado do Ceará, com o auxilio de seu irmão CÍCERO ALVES FEITOSA, tendo sido também o responsável pela hospedagem dos acusados ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO, FERNANDO BIZZI e DERCI ALVES MALHLEIROS na casa de sua ex-cunhada. 43. A participação na prática dos delitos tipificados nos arts. 33 e 35, ambos da Lei nº. 11.343/2006 restou evidenciada nos autos, como se vê do depoimento de um condutor (agente que efetuou a prisão em flagrante) e das testemunhas da prisão em flagrante dos acusados, os quais afirmaram que o réu FERNANDO BIZZI, juntamente com os acusados MARCÍLIO ALVES FEITOSA, CÍCERO ALVES FEITOSA, FERNANDO BIZZI, AURINO PATRÍCIO DO NASCIMENTO e DERCI MALHEIROS participou do descarregamento da droga que chegou a Fazenda Córrego em Acopiara/CE, em helicóptero pilotado pelo acusado FELIPE MORAES. 44. O acusado FERNANDO BIZZI praticou o crime de associação para o tráfico previsto no art. 35 da Lei nº. 11.343/2006, juntamente com DERCI MALHEIROS, JOSÉ TADEU DOS SANTOS, ALEXANDRO OLIVEIRA PINHO, CÍCERO ALVES FEITOSA E MARCÍLIO ALVES FEITOSA, promovendo, organizando a cooperação e dirigindo a atividade dos demais agentes. Por tal razao, há de ser enquadrado nas sanções do art. 35 da Lei nº. 11.343/2006, em concurso material, nos termos do art. 69 do Código Penal. 45. As provas colhidas nos autos também evidenciam a participação do acusado AURINO PATRÍCIO DO NASCIMENTO no delito tipificado no art. 33, da Lei nº. 11.343/2006. Entretanto, sua participação foi secundária, pois se resumiu à permissão, para ingresso na Fazenda, dos demais acusados ALEXANDRO PINHO DE OLIVEIRA, MARCÍLIO ALVES FEITOSA, CÍCERO ALVES FEITOSA, FERNANDO BIZZI, e também se encarregou da guarda e depósito da cocaína apreendida. Não ficou comprovada qualquer participação do acusado AURINO PATRÍCIO na operacionalização e transporte da droga. 46. Circunstâncias judiciais (art. 59 do CPB) reapreciadas para fixação da pena-base - acima do mínimo cominado em razão de agentes com circunstâncias judiciais desfavoráveis - com esteio nos seguintes parâmetros: mínimo legal, acrescido de 100% desse mínimo, para os que apresentaram maior número de circunstâncias judiciais desfavoráveis, via de regra, os "cabeças" do esquema criminoso; mínimo legal, acrescido de 80% desse mínimo, para os acusados com um menor número de circunstâncias judiciais desfavoráveis; mínimo legal, acrescido de 60% desse mínimo, para o que teve participação inferior na empreitada criminosa. 47. Manutenção dos capítulos da sentença referentes à dosimetria da pena, quanto à inexistência de atenuantes em relação a todos os acusados. Inexistência de circunstâncias agravantes em relação aos acusados FERNANDO BIZZI, CÍCERO ALVES FEITOSA, ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO e FELIPE RAMOS MORAES; existência de circunstâncias agravantes (art. 62, I, do Código Penal) em relação aos acusados DERCI GUELCI MALHEIROS, MARCÍLIO ALVES FEITOSA e JOSÉ TADEU DOS SANTOS; existência de causa de aumento da pena (art. 40, I e V, da Lei nº. 11.343/2008) para os acusados DERCI GUELCI MALHEIROS, MARCÍLIO ALVES FEITOSA, FERNANDO BIZZI, CÍCERO ALVES FEITOSA, JOSÉ TADEU DOS SANTOS, ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO e FELIPE RAMOS MORAES; e existência de causa de diminuição da pena (art. 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/2006) somente em relação aos acusados FELIPE RAMOS MORAES e AURINO PATRÍCIO DO NASCIMENTO. 48. Não acolhimento dos argumentos do Ministério Público Federal quanto ao reconhecimento da prática do delito tipificado no art. 288 do CP e quanto à pretensão de majoração das penas infligidas aos acusados. 49. Acolhimento em parte das apelações dos acusados para modificar a dosimetria, reduzindo-se a pena-base, e para diminuir a pena após a aplicação do critério trifásico: 49.1. Em relação ao réu FELIPE RAMOS MORAIS: a) acolher a minoração da pena-base fixada para os delitos, fixando-as em 60% acima do mínimo legal; b) reduzir a pena total privativa de liberdade de 09 (nove) anos e 10 (dez) meses de reclusão para 06 (seis) anos, 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e para reduzir a pena de multa total de 910 (novecentos e dez) dias-multa para 800 (oitocentos) dias-multa, mantendo o valor do dia-multa em 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato. 49.2. Em relação ao réu ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO: a) acolher a minoração da pena-base fixada para os delitos, fixando-as no mínimo legal, acrescido de 80%; b) reduzir a pena total privativa de liberdade de 25 (vinte e cinco) anos e 06 (seis) meses de reclusão para 16 (dezesseis) anos, 09 (nove) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão, e reduzir a pena de multa total de 2.560 (dois mil, quinhentos e sessenta) dias-multa, para 2.160 (dois mil, cento e sessenta) dias-multa, mantendo o valor do dia-multa em 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato. 49.3. Em relação ao réu DERCI GUELCI MALHEIROS: a) acolher a minoração da pena-base fixada para os delitos, fixando-as no dobro do mínimo legal (mínimo previsto acrescido de 100%); b) reduzir a pena total privativa de liberdade de 35 (trinta e cinco) anos de reclusão para 21 (vinte e um) anos de reclusão, e ao pagamento de 2.400 (dois mil e quatrocentos) dias-multa. O valor do dia-multa foi fixado em 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato. 49.4. Em relação ao réu JOSÉ TADEU DOS SANTOS: a) acolher a minoração da pena-base fixada para os delitos, fixando-as no dobro do mínimo legal (mínimo previsto acrescido de 100%); b) reduzir a pena total privativa de liberdade de 35 (trinta e cinco) anos de reclusão para 21 (vinte e um) anos de reclusão e pagamento de 2.400 (dois mil e quatrocentos) dias-multa. O valor do dia-multa foi fixado em 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato. 49.5. Em relação ao réu CÍCERO ALVES FEITOSA: a) acolher a minoração da pena-base fixada para os delitos, fixando-as no dobro do mínimo legal (mínimo previsto acrescido de 100%); b) reduzir a pena total privativa de liberdade de 35 (trinta e cinco) anos de reclusão para 18 (dezoito) anos e 08 (oito) meses de reclusão, e pagamento de 2.400 (dois mil e quatrocentos) dias-multa. O valor do dia-multa foi fixado em 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato. 49.6. Em relação ao réu MARCÍLIO ALVES FEITOSA: a) acolher a minoração da pena-base fixada para os delitos, fixando-as no dobro do mínimo legal (mínimo previsto acrescido de 100%); b) reduzir a pena total privativa de liberdade de 37 (trinta e sete) anos de reclusão para 21 (vinte e um) anos de reclusão e o pagamento de 2.400 (dois mil e quatrocentos) dias-multa. O valor do dia-multa foi fixado em 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato. 49.7. Em relação ao réu FERNANDO BIZZI: a) acolher a minoração da pena-base fixada para os delitos, fixando-as no dobro do mínimo legal (mínimo previsto acrescido de 100%); b) reduzir a pena total privativa de liberdade de 30 (trinta) anos de reclusão para 18 (dezoito) anos e 08 (oito) meses de reclusão, e pagamento de 2.400 (dois mil e quatrocentos) de dias-multa. O valor do dia-multa foi fixado em 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato 49.8. Em relação ao réu AURINO PATRÍCIO DO NASCIMENTO: a) acolher a minoração da pena-base fixada para os delitos, fixando-a em 20% acima do mínimo legal; b) reduzir a pena total privativa de liberdade de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão para 03 (três) anos de reclusão, e reduzir a pena de multa total de 360 (trezentos e sessenta dias-multa) para 300 (trezentos) dias-multa, mantendo o valor do dia-multa em 1/30 do salário-mínimo vigente na data do fato. 50. Em virtude de sua condenação em pena privativa de liberdade inferior a 04 (quatro) anos de reclusão, o réu AURINO PATRÍCIO DO NASCIMENTO deve cumprir a pena no regime aberto. Entretanto, em face do quantum da privativa de liberdade que lhe foi imposta, é cabível a sua substituição por duas sanções restritivas de direitos a serem definidas pelo Juízo da Execução Penal. 51. Em face da condenação do acusado FELIPE RAMOS MORAIS nas sanções do art. 33 da Lei nº, 11.343/2006 a uma pena inferior a 08 (oito) anos de reclusão, esta deverá ser cumprida no regime semiaberto. 52. Os réus ALEXANDRO DE OLIVEIRA PINHO e DERCI GUELCI MALHEIROS, condenados à pena privativa de liberdade superior a 08 (oito) anos, tendo apelado em liberdade, devem cumprir inicialmente a pena no regime fechado. 53. Os demais réus que recorreram presos devem assim permanecer, em face de suas condenações a uma pena privativa de liberdade superior a 08 (oito) anos de reclusão. 54. Transitado em julgado o acórdão, os nomes dos réus devem ser lançados no rol dos culpados. 55. Apelação do Ministério Público Federal improvida e apelações dos réus parcialmente providas para reduzir as penas privativas de liberdade e de multa que lhes foram impostas.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 18/05/2017
Data da Publicação : 03/10/2017
Classe/Assunto : ACR - Apelação Criminal - 12307
Órgão Julgador : Terceira Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Janilson Bezerra de Siqueira
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Revisor : Desembargador Federal Paulo Machado Cordeiro
Referência legislativa : LEG-FED LEI-9437 ANO-1997 ART-10 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED SUM-522 (STJ) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED SUM-444 (STJ) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-7209 ANO-1984 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CPPM-20 Codigo de Processo Penal Militar LEG-FED DEC-14450 ANO-1920 ART-3 LET-A - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED DEC-4307 ANO-2002 ART-28 INC-1 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED RES-37 ANO-2012 (RDC/ANVISA) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED PRT-344 ANO-1998 (SVS/MS) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-8072 ANO-1990 ART-8 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-288 ART-62 INC-1 INC-2 ART-69 ART-59 ART-68 ART-307 ART-121 PAR-2 INC-1 INC-2 INC-3 INC-4 ART-29 ART-33 ART-157 PAR-2 INC-1 INC-2 INC-3 PAR-2 ART-44 INC-3 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CPP-41 Codigo de Processo Penal LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-593 ART-386 INC-5 INC-4 ART-563 ART-186 PAR-ÚNICO ART-312 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 (CAPUT) ART-40 INC-1 INC-5 ART-35 ART-288 ART-34 ART-55 PAR-1 INC-1 INC-2 INC-3 PAR-4 PAR-ÚNICO ART-42 ART-43 ART-36 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-109 INC-5 ART-5 INC-54 INC-55
Fonte da publicação : DJE - Data::03/10/2017 - Página::58
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