TRF5 0000433-40.2012.4.05.8202 00004334020124058202
PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 1O., INCISO I, DO DL 201/67. APROPRIAR-SE DE BENS OU RENDAS PÚBLICAS, OU DESVIÁ-LOS EM PROVEITO PRÓPRIO OU ALHEIO. INÉPCIA DA INICIAL ACUSATÓRIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS EVIDENCIADAS NO FEITO.
DOLO DEMONSTRADO. DOSIMETRIA DA PENA. INEXISTÊNCIA DE EXCESSO PUNITIVO.
1. O que se observa da cópia da denúncia é que o órgão ministerial descreveu fatos que, em tese, correspondem a ilícitos criminais, tendo indicado a prova indiciária em que se amparou para a formulação da acusação. Não se tratou de denúncia genérica,
tendo o Parquet individualizado os fatos, dando-lhes características de concretude, pelo menos para o exame que deve ser feito por ocasião do recebimento, ou não, da referida peça, em que vigora o princípio do in dubio pro societatis.
2. A denúncia destacou a quota de participação de cada acusado na suposta infração que narrou e o modus operandi, indicando que o desvio teria ocorrido através de saques na conta corrente específica do convênio por meio de cheques nominais à própria
tesouraria do município, ora creditados na conta-corrente de titularidade do ex-prefeito, ora sacado em espécie na "boca do caixa", ou pelo próprio tesoureiro ou sem identificação do beneficiário (...).
3. Também destacou o fato de que a microfilmagem realizada nos cheques sacados da conta vinculada ao convênio no. 192/2001 (SIAFI 425896) identificou o acusado JOSÉ AURENI MANGUEIRA como responsável pelos endossos nos cheques de no. 850001, no valor de
R$ 35.596,09 (fls. 109/110, do IPL), e de no. 850004, no valor de R$ 7.403,91 (fls. 115/116, do IPL); e o acusado ESPEDITO ALDECI MANGUEIRA DINIZ, como titular da conta corrente onde ocorridos os depósitos desses valores.
4. Peça acusatória que é idônea, atendendo ao requerido pelo art. 41, do CPP, preenchendo os pressupostos e requisitos concernentes à tutela da efetividade do processo, à correta tipificação do fato pelo juiz, com observância dos princípios
constitucionais da ampla defesa e do contraditório, possibilitando aos acusados o pleno exercício do direito de defesa.
5. Foi devidamente comprovada a materialidade do delito do art. 1o., inciso I, do DL 201/67(apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio), sobretudo pelos elementos que ampararam a denuncia (apensos), dos quais se
destacam o Parecer Técnico da FUNASA, que relata o não cumprimento total do objeto pactuado no plano de trabalho, com prejuízo ao erário; os Pareceres 19/2004 e 263/2005; o Despacho 608/2005, da Divisão de Engenharia e Saúde Pública, que registra que a
obra não atendeu a etapa útil do projeto; e as cópias microfilmadas dos cheques sacados da conta vinculada ao convênio, sob o número 7.756-9, agência 0913-X, Banco do Brasil, relacionados ao exame dos saques realizados na conta-corrente específica do
convênio, com a indicação de cheque endossado pelo acusado JOSÉ AURENI MANGUEIRA e depositado em conta corrente de titularidade do ex-gestor ESPEDITO ALDECI MANGUEIRA DINIZ, no valor de R$ 35.596,09, e cheque nominal à tesouraria e endossado pelo
acusado JOSÉ AURENI MANGUEIRA, no valor de R$ 7.403,91.
6. O Relatório de Fiscalização de número 00903, da Controladoria Geral da União, afora destacar que a licitação realizada para cumprimento do objeto conveniado, na modalidade carta-convite (procedimento licitatório no. 04/2002), foi simulada, mediante
adulteração de certidões de regularidade fiscal de apresentação obrigatória, anota que parte dos recursos do convênio foram depositados na conta bancária do ex-prefeito ou sacados em espécie pelo então tesoureiro.
7. A autoria por parte dos apelantes também restou devidamente provada nos autos pelos documentos trazidos e pelos interrogatórios procedidos. Os próprios acusados confirmaram o saque de valores do convênio na boca do caixa, bem assim a não prestação de
contas de parte dos valores sacados à FUNASA.
8. A defesa trouxe alegações desprovidas de provas que as evidenciassem, a ponto de desconstituir o que restou constatado no decorrer da instrução criminal. O argumento do ex-prefeito de que tal procedimento irregular era realizado para propiciar o
pagamento de trabalhadores da cidade e em razão de compras que eram efetuadas no comércio local, além de desconectado ao contexto produzido, não foi evidenciado por qualquer elemento de prova nos autos.
9. O dolo para configuração do delito do art. 1o., inciso I, do DL 201/67, por parte dos dois acusados, de igual modo, foi satisfatoriamente demonstrado no feito, por todas as provas já indicadas. Restaram claras a consciência e vontade dos acusados
direcionadas ao desvio, em proveito próprio, de parte das verbas públicas federais repassadas pela FUNASA em razão do convênio 192/2001. O dano ao erário público restou claro no Relatório de Fiscalização de número 00903, da Controladoria Geral da União,
que concluiu pela inexecução das obras objeto do convênio e pelo desvio de recursos para conta pessoal do ex-prefeito ou para saque em espécie pelo tesoureiro, na boca do caixa.
10. DOSIMETRIA DA PENA. Magistrado de Primeira Instância que estipulou a pena de ambos os réus em 4 anos e 6 meses de reclusão, pelo cometimento do delito do art. 1o., inciso I, do DL 201/67, isso considerando a presença de duas circunstâncias judiciais
desfavoráveis, na primeira fase de dosagem, e a ausência de elementos na segunda e terceira fase da dosimetria da pena.
11. Erro material existente na sentença, que quando fala em penalidade privativa de liberdade definitiva, para o réu JOSÉ AURENI MANGUEIRA, em 4 anos e 3 meses, quer dizer 4 anos e 6 meses, conclusão a que se chega quando do exame do percurso da
dosimetria.
12. Motivo destacado no apelo do Parquet, referente à torpeza em enriquecer, angariar patrimônio, desfrutar de bens materiais, tudo em detrimento do bem-estar coletivo, que integra o próprio delito do inciso I, do DL 201/67, que busca justamente tutelar
o bem jurídico patrimônio público contra desmandos de prefeitos e coautores; consideração que repercutiria inevitavelmente em bis in idem, pelo que não pode ser procedida.
13. A decisão ora combatida justificou devidamente o quantum de pena a que chegou na primeira fase da dosagem, 4 anos e 6 meses de reclusão, acima do mínimo legal previsto para o delito de desvio de verbas públicas, registrando como negativas as
circunstâncias culpabilidade e consequências do crime. De fato, a destinação diversa dos recursos, daquela legalmente prevista, privou a população carente de saneamento básico, trazendo graves prejuízos à comunidade local, justificando a penalidade em
montante superior à pena mínima.
14. Nega-se provimento aos apelos do MPF e da defesa dos acusados, para manter a decisão ora vergastada em todos os seus termos.
Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 1O., INCISO I, DO DL 201/67. APROPRIAR-SE DE BENS OU RENDAS PÚBLICAS, OU DESVIÁ-LOS EM PROVEITO PRÓPRIO OU ALHEIO. INÉPCIA DA INICIAL ACUSATÓRIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS EVIDENCIADAS NO FEITO.
DOLO DEMONSTRADO. DOSIMETRIA DA PENA. INEXISTÊNCIA DE EXCESSO PUNITIVO.
1. O que se observa da cópia da denúncia é que o órgão ministerial descreveu fatos que, em tese, correspondem a ilícitos criminais, tendo indicado a prova indiciária em que se amparou para a formulação da acusação. Não se tratou de denúncia genérica,
tendo o Parquet individualizado os fatos, dando-lhes características de concretude, pelo menos para o exame que deve ser feito por ocasião do recebimento, ou não, da referida peça, em que vigora o princípio do in dubio pro societatis.
2. A denúncia destacou a quota de participação de cada acusado na suposta infração que narrou e o modus operandi, indicando que o desvio teria ocorrido através de saques na conta corrente específica do convênio por meio de cheques nominais à própria
tesouraria do município, ora creditados na conta-corrente de titularidade do ex-prefeito, ora sacado em espécie na "boca do caixa", ou pelo próprio tesoureiro ou sem identificação do beneficiário (...).
3. Também destacou o fato de que a microfilmagem realizada nos cheques sacados da conta vinculada ao convênio no. 192/2001 (SIAFI 425896) identificou o acusado JOSÉ AURENI MANGUEIRA como responsável pelos endossos nos cheques de no. 850001, no valor de
R$ 35.596,09 (fls. 109/110, do IPL), e de no. 850004, no valor de R$ 7.403,91 (fls. 115/116, do IPL); e o acusado ESPEDITO ALDECI MANGUEIRA DINIZ, como titular da conta corrente onde ocorridos os depósitos desses valores.
4. Peça acusatória que é idônea, atendendo ao requerido pelo art. 41, do CPP, preenchendo os pressupostos e requisitos concernentes à tutela da efetividade do processo, à correta tipificação do fato pelo juiz, com observância dos princípios
constitucionais da ampla defesa e do contraditório, possibilitando aos acusados o pleno exercício do direito de defesa.
5. Foi devidamente comprovada a materialidade do delito do art. 1o., inciso I, do DL 201/67(apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio), sobretudo pelos elementos que ampararam a denuncia (apensos), dos quais se
destacam o Parecer Técnico da FUNASA, que relata o não cumprimento total do objeto pactuado no plano de trabalho, com prejuízo ao erário; os Pareceres 19/2004 e 263/2005; o Despacho 608/2005, da Divisão de Engenharia e Saúde Pública, que registra que a
obra não atendeu a etapa útil do projeto; e as cópias microfilmadas dos cheques sacados da conta vinculada ao convênio, sob o número 7.756-9, agência 0913-X, Banco do Brasil, relacionados ao exame dos saques realizados na conta-corrente específica do
convênio, com a indicação de cheque endossado pelo acusado JOSÉ AURENI MANGUEIRA e depositado em conta corrente de titularidade do ex-gestor ESPEDITO ALDECI MANGUEIRA DINIZ, no valor de R$ 35.596,09, e cheque nominal à tesouraria e endossado pelo
acusado JOSÉ AURENI MANGUEIRA, no valor de R$ 7.403,91.
6. O Relatório de Fiscalização de número 00903, da Controladoria Geral da União, afora destacar que a licitação realizada para cumprimento do objeto conveniado, na modalidade carta-convite (procedimento licitatório no. 04/2002), foi simulada, mediante
adulteração de certidões de regularidade fiscal de apresentação obrigatória, anota que parte dos recursos do convênio foram depositados na conta bancária do ex-prefeito ou sacados em espécie pelo então tesoureiro.
7. A autoria por parte dos apelantes também restou devidamente provada nos autos pelos documentos trazidos e pelos interrogatórios procedidos. Os próprios acusados confirmaram o saque de valores do convênio na boca do caixa, bem assim a não prestação de
contas de parte dos valores sacados à FUNASA.
8. A defesa trouxe alegações desprovidas de provas que as evidenciassem, a ponto de desconstituir o que restou constatado no decorrer da instrução criminal. O argumento do ex-prefeito de que tal procedimento irregular era realizado para propiciar o
pagamento de trabalhadores da cidade e em razão de compras que eram efetuadas no comércio local, além de desconectado ao contexto produzido, não foi evidenciado por qualquer elemento de prova nos autos.
9. O dolo para configuração do delito do art. 1o., inciso I, do DL 201/67, por parte dos dois acusados, de igual modo, foi satisfatoriamente demonstrado no feito, por todas as provas já indicadas. Restaram claras a consciência e vontade dos acusados
direcionadas ao desvio, em proveito próprio, de parte das verbas públicas federais repassadas pela FUNASA em razão do convênio 192/2001. O dano ao erário público restou claro no Relatório de Fiscalização de número 00903, da Controladoria Geral da União,
que concluiu pela inexecução das obras objeto do convênio e pelo desvio de recursos para conta pessoal do ex-prefeito ou para saque em espécie pelo tesoureiro, na boca do caixa.
10. DOSIMETRIA DA PENA. Magistrado de Primeira Instância que estipulou a pena de ambos os réus em 4 anos e 6 meses de reclusão, pelo cometimento do delito do art. 1o., inciso I, do DL 201/67, isso considerando a presença de duas circunstâncias judiciais
desfavoráveis, na primeira fase de dosagem, e a ausência de elementos na segunda e terceira fase da dosimetria da pena.
11. Erro material existente na sentença, que quando fala em penalidade privativa de liberdade definitiva, para o réu JOSÉ AURENI MANGUEIRA, em 4 anos e 3 meses, quer dizer 4 anos e 6 meses, conclusão a que se chega quando do exame do percurso da
dosimetria.
12. Motivo destacado no apelo do Parquet, referente à torpeza em enriquecer, angariar patrimônio, desfrutar de bens materiais, tudo em detrimento do bem-estar coletivo, que integra o próprio delito do inciso I, do DL 201/67, que busca justamente tutelar
o bem jurídico patrimônio público contra desmandos de prefeitos e coautores; consideração que repercutiria inevitavelmente em bis in idem, pelo que não pode ser procedida.
13. A decisão ora combatida justificou devidamente o quantum de pena a que chegou na primeira fase da dosagem, 4 anos e 6 meses de reclusão, acima do mínimo legal previsto para o delito de desvio de verbas públicas, registrando como negativas as
circunstâncias culpabilidade e consequências do crime. De fato, a destinação diversa dos recursos, daquela legalmente prevista, privou a população carente de saneamento básico, trazendo graves prejuízos à comunidade local, justificando a penalidade em
montante superior à pena mínima.
14. Nega-se provimento aos apelos do MPF e da defesa dos acusados, para manter a decisão ora vergastada em todos os seus termos.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
29/09/2016
Data da Publicação
:
06/10/2016
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 14023
Órgão Julgador
:
Primeira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Manuel Maia
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-59
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
LEG-FED INT-1 ANO-1997 ART-20 (STN)
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
LEG-FED LEI-9069 ANO-1995 ART-69
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
***** CPP-41 Codigo de Processo Penal
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-41
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
LEG-FED RGI-000000 ART-29 INC-4 (TRF5)
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
LEG-FED DEL-201 ANO-1967 ART-1 INC-1
Fonte da publicação
:
DJE - Data::06/10/2016 - Página::42
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