main-banner

Jurisprudência


TRF5 0001238-35.2013.4.05.8500 00012383520134058500

Ementa
PROCESSO CIVIL. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MPF E MPSE. LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO DE ARACAJU, DA EMURB, IBAMA E UNIÃO. OCORRÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA SENTENÇA. ÁREA DE PROTEÇÃO PERMANENTE. PREVISÃO NO CÓDIGO FLORESTAL ANTERIOR E NO CÓDIGO FLORESTAL VIGENTE. DANOS AMBIENTAIS. COMPROVAÇÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA. DEVER DE INDENIZAÇÃO. POSSIBILIDADE DE MULTA DIÁRIA À FAZENDA NACIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS AO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1.Remessa oficial e apelações interpostas pelo Ministério Público Federal, pelo Ministério Público Estadual de Sergipe, pelo Município de Aracaju/SE, pela Empresa Municipal de Obras e Urbanização- EMURB, pelo IBAMA, pela União, por Marcelo Ramos e Silva e pelo Restaurante O Caranguejo MR LTDA., em face de sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Sergipe, que julgou parcialmente procedente a pretensão autoral. 2. Inconteste é a legitimidade do MPF e do MPSE para atuar no feito em que se pretende a salvaguarda do meio ambiente, em vista das atribuições que lhes foram conferidas pela CF/88, no art. 129, III, bem como em razão das previsões encartadas na Lei Complementar nº 75/93. 3. Concernente à não integração dos proprietários das demais residências localizadas na rua Alú Campos no feito, não há que se falar em nulidade processual, já que estes podem integrar outra ação civil pública, não havendo prejudicialidade para a presente ação. Da mesma forma, não seria razoável a reunião de mais de 20 proprietários em um mesmo processo. 4. De acordo com o art. 23, VI e VII, da CF/88, é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios proteger o meio ambiente, combater a poluição e preservar as florestas, a fauna e a flora. Por sua vez, o art. 225, "caput", da CF/88, impõe ao Poder Público, aqui incluídos todos os entes da Federação, o dever de preservar e fiscalizar o meio ambiente. Configurada a legitimidade do Município de Aracaju e da União, restam rejeitadas as preliminares suscitadas. 5. Como a área degradada se situa em região de manguezal, sendo terreno acrescido de marinha, fato este não contestado pelos réus, não há dúvida acerca da legitimidade da EMURB, sendo esse o entendimento desta Corte (APELREEX 00060228920124058500, deste Relator, 3ª Turma, DJe 12/05/2016). 6. Quanto à preliminar de nulidade arguida pelo IBAMA, não deve prosperar. Consta nos autos, à fl. 944, a intimação da Autarquia, na pessoa de seu Procurador Chefe, sobre a sentença. Essa intimação ocorreu em 01/02/2017, ficando ciente o Procurador no dia 02/02/2017. Não há, portanto, nulidade na intimação. 7. Em relação ao pedido da União para a apreciação do agravo retido interposto (fls. 496/498), percebe-se que o assunto tratado em tal recurso diz respeito à questão da ilegitimidade passiva deste ente federativo. Diante disso, averigua-se que essa tese foi afastada pelo Juízo "a quo", em decisão preliminar, e analisada neste acórdão. 8. Entendendo o julgador que o processo se encontra devidamente instruído, torna-se perfeitamente possível a dispensa da audiência, sem que disto decorra a nulidade por cerceamento do direito de defesa. 9. O Código Florestal anterior ao vigente (Lei n.º 4.771/1965) considerava, como área de preservação permanente, as florestas e demais formas de vegetação situadas ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água. Nesse caminhar, não merecem amparo as alegações do Município no sentido de que o Código Florestal instituído pela Lei nº 4.771/1965 não regulamentava a preservação da área em questão. 10. Não há controvérsia quanto ao fato de o imóvel em questão (assim como outros referenciados) ter sido edificado em área de preservação permanente, consoante o laudo pericial. Segundo o Código Florestal (Lei nº 4.771/65) vigente à época dos fatos, são consideradas áreas de preservação permanente as situadas ao longo dos rios, contendo vegetação típica do local, sendo os manguezais tidos como recursos naturais de preservação permanente. 11. Dos Laudos Periciais, depreende-se que houve, de fato, dano ambiental em decorrência da ampliação do empreendimento. Ademais, comprovou-se que o estabelecimento não possui licença para funcionar e não obteve a aprovação do Município para a sua construção, não atendendo às exigências das normas. Verificou-se, também, que o restaurante se localiza em Área de Preservação Permanente (APP), tendo em vista que, de acordo com o laudo complementar do perito biólogo, "o empreendimento está edificado sobre a área do Rio Poxim e inserido integralmente em Área de Preservação Permanente (APP), que no caso em questão são 100 metros de largura" (fl. 683). 12. Comprovada a ocorrência de danos ambientais e de irregularidades referentes à Área de Preservação Permanente, não se pode olvidar que, no Direito brasileiro e de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade civil pelo dano ambiental, qualquer que seja a qualificação jurídica do degradador, público ou privado, é de natureza objetiva, solidária e ilimitada, sendo regida pelos princípios poluidor-pagador, da reparação in integrum e da prioridade da reparação in natura (REsp 1454281/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/08/2016, DJe 09/09/2016). 13. Em relação à EMURB, caberia a esta, de acordo com o art. 3º, da Lei nº 1.996/93, a fiscalização da área atingida, já que inserida no território desta urbe, a fim de evitar ações danosas ao ordenamento urbano do município e, consequentemente, ao meio ambiente, a partir das diretrizes fixadas pelo Município de Aracaju. Assim, tanto aos Municípios, como à União e aos seus órgãos, levando- se em conta a sua área de atuação, compete o exercício do poder de polícia, visando prevenir, evitar ou minimizar o dano ambiental de maiores proporções, irreparáveis ou de difícil reparação. 14. No que concerne à tese levantada pelo IBAMA sobre a impossibilidade de análise do pedido subsidiário, o STJ entendeu que, "No caso de omissão de dever e fiscalização, a responsabilidade solidária é de execução subsidiária (ou com ordem de preferência)"(REsp nº 1.071.741/SP, Min. Herman Benjamin, DJe 16/12/2010). Nesse diapasão, a responsabilidade solidária e de execução subsidiária significa que o Estado integra o título executivo sob a condição de, como devedor-reserva, só ser chamado quando o degradador original, direto ou material (=devedor principal) não quitar a dívida, seja por total ou parcial exaurimento patrimonial ou insolvência, seja por impossibilidade ou incapacidade, por qualquer razão, inclusive técnica, de cumprimento da prestação judicialmente imposta, assegurado, sempre, o direito de regresso (art. 934, do Código Civil), com a desconsideração da personalidade jurídica, conforme preceitua o art. 50, do Código Civil. Por isso, faz-se possível a condenação subsidiária do IBAMA a demolir o imóvel objeto da lide. 15. No tocante ao poder de polícia, por sinal não exercido tempestivamente pelos Réus na área em comento, a Lei nº 6.938, regulamentada pelo Decreto n.º 99.274/90, institui o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), que é organizado nos termos do art. 6º, constituindo-se por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos municípios e pelas fundações instituídas pelo poder público, responsáveis pela proteção e pela melhoria da qualidade ambiental. Por essa razão, é o IBAMA responsável solidariamente pela demolição do estabelecimento e pela recuperação da área degradada, com a apresentação do projeto de recuperação da área degradada (PRAD) e pela sua execução. Entende-se, também, ser responsável solidariamente a União e, por essa razão, merecem ser mantidas as obrigações de fazer determinadas nos itens 3 e 4 da sentença. 16. Em se tratando de APP, verifica-se a necessidade da não edificação da área em questão, para o fito de sua recuperação. 17. A proteção e a restauração dos processos ecológicos essenciais e a instituição de espaços territoriais especialmente protegidos - entre os quais se incluem as áreas de preservação permanente - constituem deveres expressamente impostos ao Poder Público pela CF/88 (art. 225, parágrafo 1º, I e II). Considerando que o fato passado, consistente na construção do imóvel, continua a irradiar efeitos sobre o meio ambiente até os dias de hoje e que tais efeitos se tornaram incompatíveis com a proteção normativa do meio ambiente sobrevinda com a promulgação da CF/88, não há como prosperar a escusa de ocupação antrópica consolidada e de segurança jurídica, uma vez que não oponível a normas de status constitucional, sobretudo porque veiculadoras de direitos fundamentais de titularidade difusa. Há, também, o fato de que não existe direito adquirido de poluir. 18. O controle jurisdicional da correção das políticas públicas na área da saúde e do meio ambiente, longe de caracterizar infringência ao princípio da separação dos poderes, é um dever do Poder Judiciário. Dever este que deve ser exercido na perspectiva intervencionista e transformadora para a emancipação do homem na sociedade, para o seu pleno desenvolvimento humano e para a consolidação da justiça social. 19. Sobre a possibilidade de cominação de multa diária, a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que "é possível ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, fixar multa diária cominatória - astreintes -, ainda que contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de obrigação de fazer" (AgInt no AREsp 885.840/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/08/2016, DJe 23/08/2016). Sendo a União uma das responsáveis por garantir o direito ao meio ambiente, também a ela deve ser dirigida a penalidade. 20. O montante da multa arbitrado judicialmente, fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais), atende os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, não violando em nada a finalidade pedagógica da sanção pecuniária. 21. Em se tratando de dano ambiental, tal evento traz para a recomposição do prejuízo o instituto da responsabilidade civil, cuja aplicação na seara ambiental encontra fundamento no art. 225, parágrafo 3º, da CF/88, que impõe a reparação integral dos prejuízos causados ao meio ambiente. Outrossim, o parágrafo 1º, do art. 14, da Lei nº 6.938/81, consagra a responsabilidade objetiva, pela qual o poluidor é obrigado, independentemente de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade, o que se aplica ao poluidor pessoa física ou jurídica, pública ou privada, e reclama a existência dos seguintes requisitos para se configurar: o ato lícito ou ilícito, o dano e o nexo de causalidade, requisitos que se encontram presentes no caso. 22. Não assiste razão ao Ministério Público ao se insurgir a favor da condenação ao pagamento de honorários em favor do Ministério Público, vez que, por critério de simetria, não sendo cabível a condenação do MP ao ônus da sucumbência, caso seja vencido no âmbito da Ação Civil Pública, também não cabe a condenação nesta verba, quando seja vencedor (AgInt no AREsp 873.026/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/09/2016, DJe 11/10/2016). 23. Parcial provimento das apelações do Ministério Público Federal e do Ministério Público Estadual de Sergipe e não provimento da remessa oficial e das demais apelações.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 05/10/2017
Data da Publicação : 11/10/2017
Classe/Assunto : APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - 34751
Órgão Julgador : Primeira Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Élio Wanderley de Siqueira Filho
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Doutrina : AUTOR:Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero OBRA:Novo Código de Processo Civil Comentado 2ª ed., rev., atual. e ampl., São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2016, p. 382
Referência legislativa : LEG-FED SUM-282 (STF) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CC-02 Código Civil LEG-FED LEI-10406 ANO-2002 ART-50 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-9605 ANO-1998 ART-70 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-12651 ANO-2012 ART-4 INC-1 LET-A LET-B LET-C LET-D LET-E - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-7803 ANO-1989 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-4771 ANO-1965 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-6938 ANO-1981 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED DEC-99274 ANO-1990 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LCP-140 ANO-2011 ART-17 PAR-3 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED SUM-83 (STJ) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CPC-73 Código de Processo Civil LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-295 INC-2 ART-535 ART-300 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LCP-75 ANO-1993 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-MUN LEM-1996 ANO-1993 ART-3 ((Aracaju/SE)) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-MUN LEM-1659 ANO-1990 ART-53 INC-1 INC-2 INC-3 INC-4 INC-5 INC-6 (Aracaju/SE) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-129 INC-3 ART-225 (CAPUT) ART-23 INC-6 ART-20 INC-6 INC-7 ART-109 INC-1
Fonte da publicação : DJE - Data::11/10/2017 - Página::38
Mostrar discussão