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Jurisprudência


TRF5 0001326-84.2010.4.05.8401 00013268420104058401

Ementa
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONVÊNIO FEDERAL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ. FALTA DE ENTREGA DE MEDICAMENTOS OU EM MENOR QUANTIDADE. TERMOS DE DOAÇÃO FRAUDADOS. MALVERSAÇÃO DE RECURSOS PÚBLICOS. FARTA PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. ATOS ÍMPROBOS. CONFIGURAÇÃO. IMPROVIMENTO DA APELAÇÃO DOS RÉUS. - Cuida-se de apelação interposta por ALDANISA RAMALHO PEREIRA DE SÁ e FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ contra sentença que os condenou, em sede de ação civil pública de improbidade administrativa, às sanções, em relação à primeira, de perda da função pública, acaso esteja ainda exercendo, de suspensão dos direitos políticos por 8 (oito) anos, e, para cada um dos condenados, de pagamento de multa civil no valor de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) e de proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de 5 (cinco) anos, em decorrência da prática de atos ímprobos descritos no art. 10, caput, incisos I, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa). - Asseveram ALDANISA RAMALHO PEREIRA DE SÁ e FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ, em seu apelo hospedado às fls. 2755/2769, que: a) foram constatadas apenas irregularidades - e não ilegalidades - sem que tivesse sido apontado quem seriam os sujeitos por elas responsáveis, tendo a primeira demandada sido condenada unicamente por ser gestora e ordenadora de despesas da segunda; b) as irregularidades atribuídas, genérica e abstratamente, à FUNDAÇÃO condenada, não lesaram o erário público, nem prejudicaram os beneficiários dos programas e das ações de saúde desencadeadas pela referida entidade; c) a sentença atacada consagrou verdadeira responsabilidade objetiva, pois não vinculou as irregularidades a condutas individuais de pessoas físicas, deixando, portanto, de indicar os agentes que trabalhavam ao lado da primeira apelante ou que se sujeitavam diretamente às suas ordens; d) a primeira recorrente não praticava atos de gestão dentro da FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ, segundo esclareceu a testemunha Damião Luiz de Medeiros, ouvido na Polícia Federal; e) não se pode presumir que a primeira apelante quis, com a celebração de aditivo contratual entre a FUNDAÇÃO e a empresa DIPROFARMA, ensejar prejuízo ao erário federal, já que buscou somente ampliar a aquisição de medicamentos, para evitar solução de continuidade na execução do objeto do convênio; f) o que a sentença atacada considerou como dano ao erário federal no importe de R$ 124.415,80 (cento e vinte e quatro mil, quatrocentos e quinze reais e oitenta centavos), na verdade, representa apenas o dispêndio necessário ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato; g) no Relatório produzido pelo DENASUS - Departamento Nacional de Auditoria do SUS, não há indicação de que tenha ocorrido aquisição de medicamentos superfaturados, inexistindo prejuízo ao erário; e h) a sentença hostilizada desconsiderou os depoimentos prestados pelas testemunhas Kátia Maria de Oliveira França e Maria das Graças, que não mencionaram qualquer irregularidade na execução do convênio - Acusa o parquet federal, na peça vestibular, que a ré ALDANIZA RAMALHO PEREIRA DE SÁ, então Presidente da FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ, a partir de 17 de outubro de 2005, forjou termos de doação de medicamentos e outros materiais comprados com verba federal no montante total de R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais), oriunda do Convênio nº 2879/2004 celebrado com o Ministério da Saúde, que se destinava a entidades associativas de diversos municípios do Estado do Rio Grande do Norte, supostamente dedicadas à atuação na área de saúde. - Relata, ainda, que, em auditoria realizada pelo Departamento Nacional do SUS - DENASUS, órgão integrante do Ministério da Saúde, constatou-se que algumas instituições associativas (Associação Beneficente Ana Nunes do Rego e Fundação Maria das Dores Lima Silveira) nunca receberam tais medicamentos e, em alguns casos, outras receberam apenas parcela dos medicamentos indicados nos anexos dos termos de doação (Centro Social Heitor Barbosa de Morais, Associação de Proteção e Assistência a Maternidade e a Infância de Martins - APAMI, Associação Comunitária de Apoio aos Pequenos Artesões de Ouro Branco, Lar São Camilo de Lélis e Associação Comunitária Cultural e Desportiva e de Desenvolvimento Rural Raimundo Maneco). - Narra, por fim, o órgão ministerial que, em situações até mais graves, alguns representantes das entidades não reconheceram as assinaturas apostas nos termos de doação, o que comprovaria a apresentação pela FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ de documentos fraudulentos na prestação de contas, com o escopo de tentar demonstrar a distribuição de medicamentos. - É de bom alvitre realçar que não há margem para imputar ao agente público a prática de ato acoimado de improbidade administrativa, quando ausente o elemento da desonestidade, podendo, assim, o ato hostilizado revestir-se de ilegalidade, mas não apresentar a nota da desonestidade e, em última instância, da improbidade. Daí a importância de se aquilatar elementos probantes que demonstrem a responsabilidade político-administrativa de feição subjetiva, que possa revelar a perpetração de alguma conduta atinente a dolo, a desonestidade, a má-fé ou a imoralidade. - Na espécie em apreço, restou devidamente comprovado, mediante robusta prova documental e testemunhal, que as rés, ora recorrentes, malversaram recursos federais provenientes do Convênio nº 2879/2004, convolado com o Ministério da Saúde, simulando inexistentes doações e quantitativos a maior de medicamentos, que teriam sido supostamente adquiridos com tais verbas públicas, a diversas associações espalhadas pelo Estado do Rio Grande do Norte. Em alguns casos, nem sequer havia a própria sede física da associação que teria sido contemplada com o recebimento de medicamentos, segundo noticiava o termo de doação apresentado pela FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ. - É certo que irregularidades no cumprimento de convênio federal não configuram, necessariamente, atos de improbidade administrativa estampados no art. 10 da Lei 8.429/1992, porém, na hipótese dos autos, não é o que se cuida. A testemunha Suely Galdino Leite (fl. 2414) revelou que a Associação de Proteção e Assistência à Maternidade e à Infância de Martins - APAMI, onde trabalha, nunca recebeu medicamentos da FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ, não tendo conhecimento sequer de quem se tratavam ou quem eram as pessoas acusadas. - A testemunha José Augusto de Freitas Rego, que foi presidente da Associação Beneficente Ana Nunes do Rego de Portalegre, prestou depoimento em juízo (fl. 2387) e contou que recebeu uma única vez medicamentos da FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ em quantidade bem inferior àquela informada no termo de doação exibido pela fiscalização do Ministério da Saúde. O mesmo aconteceu com a Fundação Maria das Dores Lima Silveira, como declarou a testemunha Maria do Socorro Rodrigues Silveira (fl. 2442), da qual havia sido presidente, tendo recebido quantitativo de medicamentos da FUNDAÇÃO em número bem inferior ao que constava no termo de doação. - Em algumas hipóteses, nem sequer existia a entidade associativa com estrutura fisicamente constituída para receber medicamentos, como denunciou a testemunha Antônio José da Silva (fl. 2387), ao se referir à Associação Comunitária de Apoio aos Pequenos Artesões de Ouro Branco. Referida testemunha, que participou da equipe de fiscalização do DENASUS, relata que chegou a encontrar o presidente daquela entidade, porém inexistia endereço, sede social, nem muito menos qualquer farmácia para acondicionar os medicamentos. - As duas testemunhas, que integravam a equipe de auditoria do DENASUS/Ministério da Saúde e cujos depoimentos foram utilizados nesta demanda como prova emprestada (fls. 2478), trouxe elementos probantes consistentes e bastante detalhados do que encontraram na sede da FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ. A primeira delas, Jovita José Rosa, disse que, logo no início da fiscalização, detectou a existência de um espaço insuficiente oferecido pela FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ para muitas ações que informava realizar. Também deixou claro que a FUNDAÇÃO não distribuía medicamentos e, quando o fazia, entregava quantitativos bem inferiores ao que constava nos termos de doação apresentados. Além disso, foi constatado, ainda, que existiam vários termos de doação com as assinaturas de representantes de várias entidades que diziam não ter recebido medicamentos. A outra, Solismar Vieira da Silva Mendes, expôs que nada do que havia previsto no convênio foi encontrado na casa onde funcionava a FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ. Revela que a fiscalização acabou localizando termos de doação de medicamentos que se apresentavam falsificados, esclarecendo, outrossim, que das 90 (noventa) entidades supostamente beneficiadas, escolheram cerca de 40 delas para visitar in locu. Dessas, observaram que a grande maioria não havia recebido os medicamentos e muitos não reconheciam sequer as assinaturas apostas nos termos de doação exibidos. - Até mesmo a testemunha Terezinha Toscano de Andrade (fl. 2504), ex-funcionária da FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ, onde lá laborou por cerca de 20 (vinte) anos, confidenciou que pode ter havido a entrega de medicamentos em menor quantidade. - Pela farta prova produzida nos autos, de fato, a FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ, com o protagonismo de sua então presidente ALDANISA RAMALHO PEREIRA DE SÁ, malversou recursos públicos federais oriundos do Convênio 2879/2004, ao ter deixado de entregar medicamentos a entidades associativas que teriam sido supostamente adquiridos, ou que o fez em quantitativos bem inferiores aos lançados nos termos de doação. Com efeito, a ré ALDANISA RAMALHO, ao assinar documentos, aditivos contratuais, termos de doação que viabilizava a simulação fraudulenta de medicamentos a associações das mais diversas, concorreu para a incorporação ilícita de verba pública federal ao patrimônio particular da FUNDAÇÃO APRONIANO SÁ, liberando em seu favor recursos federais sem a obediência às normas legais e regulamentares, incorrendo nas condutas capituladas no art. 10, inciso I, XI e XII, da Lei 8.429/1992. - Não resta dúvida de que a apelante ALDANISA RAMAHO tinha plena ciência de seu dever de aplicar corretamente os repasses federais e em sintonia com o objeto do convênio, por se tratar de manejo de recursos públicos, tanto que as ações nele preconizadas compreendiam atividades essencialmente de doação de medicamentos para associações com as quais dizia manter algum liame. - Não se trata de mera irregularidade no trato da gestão pública, mas, essencialmente, de ter concorrido para incorporar a patrimônio particular de verbas federais provenientes de convênio celebrado com o Ministério da Saúde e ter liberado verba pública sem observar o que se achava inscrito nos termos de doação. Assim, agiu ALDANISA RAMALHO com dolo e no deliberado intuito de causar prejuízo ao erário público. - Improvimento do apelo dos réus.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 03/04/2018
Data da Publicação : 11/04/2018
Classe/Assunto : AC - Apelação Civel - 580951
Órgão Julgador : Segunda Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Carlos Wagner Dias Ferreira
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : LEG-FED LEI-8429 ANO-1992 ART-10 (CAPUT) INC-1 INC-8 INC-11 INC-12
Fonte da publicação : DJE - Data::11/04/2018 - Página::89