TRF5 0001502-02.2015.4.05.8300 00015020220154058300
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. CRIME DE USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSIFICADO (ART. 304 C/C ART. 297 DO CP). OFENSA AO ART. 155 DO CPP. INEXISTÊNCIA. PROVAS COLHIDAS DURANTE O INQUÉRITO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. VALIDADE. EMENDATIO LIBELLI. SENTENÇA.
PRÉVIA INTIMAÇÃO. DESNECESSIDADE. DOSIMETRIA. PENA-BASE. REDUÇÃO. ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA. INAPLICABILIDADE. DIA-MULTA. VALOR UNITÁRIO. RÉU HIPOSSUFICIENTE. REDUÇÃO. PENA DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. REDUÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO.
1. Apelação interposta contra sentença que, julgando parcialmente procedente o pedido formulado na denúncia, condenou o réu à pena de 3 (três) anos de reclusão, substituída por duas penas restritivas de direito e 50 dias-multa, no valor de 1/3 (um
terço) do salário mínimo vigente à época do fato, pela prática do crime previsto no artigo 304 c/c art. 297, ambos do CP, absolvendo-o da prática do crime tipificado no art. 299 do CP (fls. 120/134).
2. Não merece acolhida a alegação de ofensa ao art. 155 do CPP, porque as provas produzidas durante o Inquérito Policial, quando submetidas, durante a instrução, ao crivo do contraditório e da ampla defesa, constituem meios de convencimento aptos a
fundamentar a sentença condenatória, a teor da jurisprudência pacífica do STJ: "perícias e documentos, mesmo produzidos na fase do inquérito policial, constituem-se efetivamente em prova, com contraditório postergado para a ação penal, sem refazimento
necessário na ação penal (...). Como provas que são, independentemente do momento de sua realização, podem validamente perícias e documentos serem somados a outras provas ou indícios para a definição da culpa penal, sem violação aos arts. 155 e 156 do
CPP" (AgRg no AREsp 536.881/RS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 08/11/2016, DJe 21/11/2016).
3. O STJ também já decidiu ser inviável a alegação de nulidade em razão da ausência de repetição, durante a fase judicial, das diligências realizadas na fase inquisitiva, quando o réu deixa de impugnar a prova colhida no inquérito, de requerer a sua
complementação, ou se tiver desistido da impugnação ou da complementação (AgRg no REsp 1314702/RN, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma, DJe 23/10/2017). É o caso dos autos, em que, conforme ressaltou a sentença vergastada "não houve
qualquer questionamento da Defesa acerca do valor probatório dos documentos colhidos e da perícia realizada, limitando-se a afirmar que foram produzidos na fase do Inquérito Policial. Tais elementos probatórios, no entanto, são idôneos, aptos e
suficientes a comprova a materialidade e a autoria delitivas" (fl. 125). Assim, afasta-se a alegação de nulidade em razão do embasamento da sentença nas provas colhidas na fase pré-processual.
4. Relativamente à alegação de inobservância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, em razão da ausência de intimação prévia para manifestação das partes sobre a emendatio libelli, tampouco merece guarida a tese defensiva, porque, além de a
legislação processual não o exigir (art. 383 do CPP), no processo penal o réu defende-se de fatos e não da classificação jurídica que lhes é atribuída, podendo o magistrado sentenciante proceder, de ofício, à nova classificação do delito, sem
necessidade de qualquer formalidade prévia. A propósito, conforme lição do STJ: "é assente que não havendo modificação quanto ao fato descrito na exordial acusatória, assim como a hipótese presente, pode o magistrado dar nova classificação jurídica ao
fato definido na denúncia ao prolatar a sentença (emendatio libelli), prescindindo de aditamento da peça exordial ou mesmo de abertura de prazo para a defesa se manifestar, já que o réu se defende dos fatos narrados pela acusação e não dos dispositivos
de lei indicados" (EDcl no AREsp 226.167/PR, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe 12/12/2013).
5. Ficou comprovado nos autos que o réu usou diploma de graduação em Fisioterapia falso, com o intuito de inscrever-se junto ao Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional - CREFIT e, posteriormente, exercer a profissão de modo irregular.
Ocorre que, conforme entendimento jurisprudencial majoritário "embora emitido por instituição particular de ensino, o diploma de ensino superior possui natureza pública porque se submete à certificação do Ministério da Educação" (ACR 71238, Rel. Des.
FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, TRF3 - Quinta Turma, e-DJF3: 26/09/2017). Portanto, sendo o diploma de curso superior documento público, andou bem a sentença recorrida quando procedeu à recapitulação do delito de uso (art. 304) em cumulação com as penas do
tipo de falsificação de documento público (art. 297 do CP) e não o de falsidade ideológica (art. 299 do CP), devendo-se manter a condenação nesse ponto.
6. Dosimetria. Na primeira fase, a decisão combatida reputou neutras as seguintes circunstâncias judiciais: antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos do crime, circunstâncias, consequências do delito e comportamento da vítima (fls.
132). Todavia, em sentido contrário, julgou negativa a culpabilidade, sob o fundamento de que "a utilização de Diploma falso para fins de inscrição em Conselho de Classe é conduta bastante reprovável, uma vez que permitiria ao acusado exercer profissão
para a qual não seria habilitado, colocando em risco a saúde de eventuais pacientes. Sob a sua conduta, pois, incide grau de reprovabilidade mediano".
7. Conquanto seja correto o entendimento adotado pelo juízo de origem, de ter o réu agido com dolo mais intenso do que o comum à espécie (porque buscava o exercício irregular de profissão de saúde, podendo colocar em risco, na condição de falso
profissional, a integridade física de diversas pessoas), essa circunstância, por si só, não é suficiente para exacerbar a pena-base em 1 (um) ano acima do mínimo legal. Considerando que o crime do art. 304 c/c o art. 297 do CP comina pena de 2 (dois) a
6 (seis) anos de reclusão, o peso de somente uma circunstância do art. 59 do CP não pode ultrapassar os 6 (seis) meses de acréscimo de pena, levando em conta, sobretudo, que o grau de culpabilidade foi considerado "mediano". Portanto, reduz-se a
pena-base para 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, mantendo-se, entretanto, os 50 dias-multa aplicados, número compatível, pelas regras de proporção direta, com a valoração negativa de apenas uma circunstância judicial.
8. Na segunda fase, não há que se falar na aplicação da atenuante de confissão espontânea (art. 65, III, d, do CP), porquanto é firme o entendimento do STJ no sentido de que "a circunstância atenuante da confissão espontânea deverá ser aplicada se
auxiliou de forma efetiva para o embasamento da sentença condenatória" (Cfr. AGARESP 201401245462, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, STJ - Sexta Turma, DJE: 02/09/2014). No caso, a prova da autoria delitiva é robusta, havendo prescindido a
sentença da confissão (feita exclusivamente durante o Inquérito Policial, não sendo corroborada durante a instrução) para o embasamento da sentença condenatória.
9. Razão assiste ao apelante quanto ao pleito de redução do quantum do dia-multa (aplicado na sentença no valor de um terço do salário mínimo vigente à época do fato), porque o réu, representado nesses autos pela DPU, é hipossuficiente, não sendo
fundamento bastante para inferir sua boa condição financeira a indicação do valor pago pela falsificação (R$5.000,00). Assim, reduz-se o valor do dia-multa para 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
10. Pelos mesmos fundamentos utilizados para a redução do valor unitário da pena de multa, reduz-se a prestação pecuniária para R$ 100,00 (cem reais) por mês de condenação, mantendo-se, em todos os seus termos, a sanção de prestação de serviços à
comunidade.
11. Apelação parcialmente provida, para condenar o réu à pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, substituída por duas sanções restritivas de direitos, com redução da pena de prestação pecuniária para R$ 100,00 (cem
reais) por mês de condenação, além de 50 (cinquenta) dias-multa, fixados à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. CRIME DE USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSIFICADO (ART. 304 C/C ART. 297 DO CP). OFENSA AO ART. 155 DO CPP. INEXISTÊNCIA. PROVAS COLHIDAS DURANTE O INQUÉRITO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. VALIDADE. EMENDATIO LIBELLI. SENTENÇA.
PRÉVIA INTIMAÇÃO. DESNECESSIDADE. DOSIMETRIA. PENA-BASE. REDUÇÃO. ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA. INAPLICABILIDADE. DIA-MULTA. VALOR UNITÁRIO. RÉU HIPOSSUFICIENTE. REDUÇÃO. PENA DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. REDUÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO.
1. Apelação interposta contra sentença que, julgando parcialmente procedente o pedido formulado na denúncia, condenou o réu à pena de 3 (três) anos de reclusão, substituída por duas penas restritivas de direito e 50 dias-multa, no valor de 1/3 (um
terço) do salário mínimo vigente à época do fato, pela prática do crime previsto no artigo 304 c/c art. 297, ambos do CP, absolvendo-o da prática do crime tipificado no art. 299 do CP (fls. 120/134).
2. Não merece acolhida a alegação de ofensa ao art. 155 do CPP, porque as provas produzidas durante o Inquérito Policial, quando submetidas, durante a instrução, ao crivo do contraditório e da ampla defesa, constituem meios de convencimento aptos a
fundamentar a sentença condenatória, a teor da jurisprudência pacífica do STJ: "perícias e documentos, mesmo produzidos na fase do inquérito policial, constituem-se efetivamente em prova, com contraditório postergado para a ação penal, sem refazimento
necessário na ação penal (...). Como provas que são, independentemente do momento de sua realização, podem validamente perícias e documentos serem somados a outras provas ou indícios para a definição da culpa penal, sem violação aos arts. 155 e 156 do
CPP" (AgRg no AREsp 536.881/RS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 08/11/2016, DJe 21/11/2016).
3. O STJ também já decidiu ser inviável a alegação de nulidade em razão da ausência de repetição, durante a fase judicial, das diligências realizadas na fase inquisitiva, quando o réu deixa de impugnar a prova colhida no inquérito, de requerer a sua
complementação, ou se tiver desistido da impugnação ou da complementação (AgRg no REsp 1314702/RN, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma, DJe 23/10/2017). É o caso dos autos, em que, conforme ressaltou a sentença vergastada "não houve
qualquer questionamento da Defesa acerca do valor probatório dos documentos colhidos e da perícia realizada, limitando-se a afirmar que foram produzidos na fase do Inquérito Policial. Tais elementos probatórios, no entanto, são idôneos, aptos e
suficientes a comprova a materialidade e a autoria delitivas" (fl. 125). Assim, afasta-se a alegação de nulidade em razão do embasamento da sentença nas provas colhidas na fase pré-processual.
4. Relativamente à alegação de inobservância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, em razão da ausência de intimação prévia para manifestação das partes sobre a emendatio libelli, tampouco merece guarida a tese defensiva, porque, além de a
legislação processual não o exigir (art. 383 do CPP), no processo penal o réu defende-se de fatos e não da classificação jurídica que lhes é atribuída, podendo o magistrado sentenciante proceder, de ofício, à nova classificação do delito, sem
necessidade de qualquer formalidade prévia. A propósito, conforme lição do STJ: "é assente que não havendo modificação quanto ao fato descrito na exordial acusatória, assim como a hipótese presente, pode o magistrado dar nova classificação jurídica ao
fato definido na denúncia ao prolatar a sentença (emendatio libelli), prescindindo de aditamento da peça exordial ou mesmo de abertura de prazo para a defesa se manifestar, já que o réu se defende dos fatos narrados pela acusação e não dos dispositivos
de lei indicados" (EDcl no AREsp 226.167/PR, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe 12/12/2013).
5. Ficou comprovado nos autos que o réu usou diploma de graduação em Fisioterapia falso, com o intuito de inscrever-se junto ao Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional - CREFIT e, posteriormente, exercer a profissão de modo irregular.
Ocorre que, conforme entendimento jurisprudencial majoritário "embora emitido por instituição particular de ensino, o diploma de ensino superior possui natureza pública porque se submete à certificação do Ministério da Educação" (ACR 71238, Rel. Des.
FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, TRF3 - Quinta Turma, e-DJF3: 26/09/2017). Portanto, sendo o diploma de curso superior documento público, andou bem a sentença recorrida quando procedeu à recapitulação do delito de uso (art. 304) em cumulação com as penas do
tipo de falsificação de documento público (art. 297 do CP) e não o de falsidade ideológica (art. 299 do CP), devendo-se manter a condenação nesse ponto.
6. Dosimetria. Na primeira fase, a decisão combatida reputou neutras as seguintes circunstâncias judiciais: antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos do crime, circunstâncias, consequências do delito e comportamento da vítima (fls.
132). Todavia, em sentido contrário, julgou negativa a culpabilidade, sob o fundamento de que "a utilização de Diploma falso para fins de inscrição em Conselho de Classe é conduta bastante reprovável, uma vez que permitiria ao acusado exercer profissão
para a qual não seria habilitado, colocando em risco a saúde de eventuais pacientes. Sob a sua conduta, pois, incide grau de reprovabilidade mediano".
7. Conquanto seja correto o entendimento adotado pelo juízo de origem, de ter o réu agido com dolo mais intenso do que o comum à espécie (porque buscava o exercício irregular de profissão de saúde, podendo colocar em risco, na condição de falso
profissional, a integridade física de diversas pessoas), essa circunstância, por si só, não é suficiente para exacerbar a pena-base em 1 (um) ano acima do mínimo legal. Considerando que o crime do art. 304 c/c o art. 297 do CP comina pena de 2 (dois) a
6 (seis) anos de reclusão, o peso de somente uma circunstância do art. 59 do CP não pode ultrapassar os 6 (seis) meses de acréscimo de pena, levando em conta, sobretudo, que o grau de culpabilidade foi considerado "mediano". Portanto, reduz-se a
pena-base para 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, mantendo-se, entretanto, os 50 dias-multa aplicados, número compatível, pelas regras de proporção direta, com a valoração negativa de apenas uma circunstância judicial.
8. Na segunda fase, não há que se falar na aplicação da atenuante de confissão espontânea (art. 65, III, d, do CP), porquanto é firme o entendimento do STJ no sentido de que "a circunstância atenuante da confissão espontânea deverá ser aplicada se
auxiliou de forma efetiva para o embasamento da sentença condenatória" (Cfr. AGARESP 201401245462, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, STJ - Sexta Turma, DJE: 02/09/2014). No caso, a prova da autoria delitiva é robusta, havendo prescindido a
sentença da confissão (feita exclusivamente durante o Inquérito Policial, não sendo corroborada durante a instrução) para o embasamento da sentença condenatória.
9. Razão assiste ao apelante quanto ao pleito de redução do quantum do dia-multa (aplicado na sentença no valor de um terço do salário mínimo vigente à época do fato), porque o réu, representado nesses autos pela DPU, é hipossuficiente, não sendo
fundamento bastante para inferir sua boa condição financeira a indicação do valor pago pela falsificação (R$5.000,00). Assim, reduz-se o valor do dia-multa para 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
10. Pelos mesmos fundamentos utilizados para a redução do valor unitário da pena de multa, reduz-se a prestação pecuniária para R$ 100,00 (cem reais) por mês de condenação, mantendo-se, em todos os seus termos, a sanção de prestação de serviços à
comunidade.
11. Apelação parcialmente provida, para condenar o réu à pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, substituída por duas sanções restritivas de direitos, com redução da pena de prestação pecuniária para R$ 100,00 (cem
reais) por mês de condenação, além de 50 (cinquenta) dias-multa, fixados à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
15/03/2018
Data da Publicação
:
27/03/2018
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 14903
Órgão Julgador
:
Primeira Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Roberto Machado
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CPP-41 Codigo de Processo Penal
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-155 ART-156 ART-383
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-304 ART-297 ART-299 ART-59 ART-65 INC-3 LET-D
Fonte da publicação
:
DJE - Data::27/03/2018 - Página::64
Mostrar discussão