TRF5 0002388-98.2015.4.05.8300 00023889820154058300
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. OPERAÇÃO ESTALO. ART. 288 DO CÓDIGO PENAL (COM REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 12.850/13). INCOMPETÊNCIA, INÉPCIA DA INICAL E ILEGALIDADE DA PROVA. PRELIMINARES AFASTADAS. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. COMPROVAÇÃO DA
MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA. PRESENÇA DO DOLO. DOSAGEM DA PENA. NECESSIDADE DE AJUSTES. PROVIMENTO PARCIAL.
1. A competência da Justiça Federal em relação à prática criminosa prevista no art. 288 do Código Penal decorre da incidência da Súmula 122 do STJ, a qual dispõe competir à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de
competência federal e estadual. O crime de formação de quadrilha, embora tenha sido objeto de denúncia em separado, tem estreita ligação com o de contrabando de pássaros exóticos, uma vez que o grupo era dedicado à exploração dessa prática criminosa,
cuidando-se, pois, de fatos conexos. O crime de contrabando ofende interesses da União e, dessa forma, enquadra-se na regra prevista no art. 109, inciso IV, da Constituição Federal de 1988.
2. A denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal descreve suficientemente os limites das condutas imputadas ao recorrente, permitindo, dessa forma, o entendimento da acusação e o exercício da ampla defesa. Alegação de inépcia da denúncia
afastada.
3. A interceptação de comunicações telefônicas, que foi precedida de investigações preliminares, restou autorizada pelo juízo da 13ª Vara Federal do Estado de Pernambuco, por ser o único meio disponível para identificar o local exato de captura das
aves, seus responsáveis e meios de captura, além da destinação final dos espécimes. A quebra do sigilo telefônico do apelante resultou do fato de ele ter mantido contato com alvos da investigação e, a partir dos diálogos travados, terem sido colhidos
indícios suficientes para justificar a sua inclusão como alvo direto da investigação policial. Não acolhimento da tese de ilegalidade da interceptação das comunicações telefônicas do apelante.
4. O ora recorrente não se manifestou na primeira oportunidade em que falou nos autos acerca da recusa do Ministério Público Federal em propor a suspensão condicional do processo. Matéria que restou atingida pela preclusão. Hipótese, ademais, em que o
recorrente não faz jus ao sursis processual, tendo em vista que após o ajuizamento da presente ação penal, foi ajuizada outra ação penal contra a sua pessoa (Processo n.º 0001572-87.2013.4.05.8300).
5. Sendo o delito de quadrilha crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, o prazo prescricional deve ser contado a partir da cessação da permanência que, no caso concreto, decorreu da deflagração da fase ostensiva da "OPERAÇÃO ESTALO", em 2
de abril de 2012. Tendo sido a denúncia recebida em 11 de maio de 2012 e a sentença condenatória recorrível proferida em 22 de fevereiro de 2016, não há que se falar em prescrição da pretensão punitiva estatal. Hipótese em que mesmo se fixada a pena no
mínimo legal, isto é, em 1 (um) ano de reclusão, ainda assim não estaria prescrita, tendo em vista que não decorridos 4 (quatro) anos entre a data do recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória recorrível.
6. A existência de um grupo organizado, com atuação em vários Estados da Federação e com o propósito de cometer crimes causa abalo à paz pública, objeto jurídico do crime de quadrilha. É prova disso o fato de que a ação policial para desarticular a
grupo criminoso foi amplamente noticiada pela imprensa, através de notícias veiculadas na internet, revelando o interesse da coletividade em ver desbaratado o referido grupo criminoso e restaurada a paz pública.
7. A demonstração de que determinado agente integra, de forma livre e consciente, grupo estável e permanente, formado por mais de três pessoas e voltado à prática de crimes, é o que basta para a comprovação da materialidade e autoria do crime de
quadrilha. Hipótese em que os diálogos interceptados, bem assim os termos de apreensão, permitem uma conclusão segura quanto à destacada atuação do recorrente em quadrilha especializada no tráfico e comércio de aves exóticas e nativas. Provas que
demonstram, ainda, a vontade consciente (dolo) do apelante de se associar a outras pessoas para a prática de crimes.
8. Dosagem da pena.
9. A fundamentação empregada pelo juízo a quo na avaliação do vetor culpabilidade cuida, em verdade, do modus operandi e dos recursos empregados na atividade criminosa, dados que devem ser avaliados na operativa relacionada às circunstâncias do crime.
10. O entendimento adotado na sentença para considerar o vetor conduta social em prejuízo do apelante encontra óbice na súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso
para agravar a pena-base".
11. O fato de o réu não ter demonstrado arrependimento da prática delitiva não constitui elemento suficiente à avaliação da operativa da personalidade, a qual exige criterioso estudo e profusão de dados do comportamento do agente, não presentes no caso
concreto.
12. Há prova nos autos de que o recorrente, ao associar-se a outras pessoas para a prática de crimes, buscou maximizar o seu ganho financeiro, eis que lucrava com o comércio dos pássaros e com a realização de apostas nas rinhas. Motivação do crime que
justifica a majoração da pena-base.
13. O número de envolvidos, a extensão da área de atuação da quadrilha, o fato de movimentarem enorme número de pássaros, os quais, no mais das vezes, eram submetidos a condições absurdas de transporte, armazenados em microgaiolas depositadas em malas e
bolsas que não permitiam o movimento e geravam temperaturas extremas, privando os animais de oxigênio, justificam a elevação da pena-base a título de circunstâncias do crime.
14. A consequência do crime descrita na sentença condenatória (prejuízo à fauna) refere-se muito mais aos crimes conexos cometidos pela quadrilha do que ao crime imputado ao recorrente na denúncia. Para consideração da mencionada circunstância neste
feito seria necessária a demonstração de algum dano concreto à fauna, não apenas da possibilidade de ocorrência de uma lesão.
15. Fixação da pena-base privativa de liberdade no quantitativo de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão.
16. Redução da pena definitiva imposta na sentença de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de reclusão para 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. Manutenção da substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos.
17. Valor da prestação pecuniária mensal (R$ 500,00) mantido, tendo em vista ter a sentença possibilitado ao juízo da execução, caso a situação fática recomende, operar a substituição dessa pena restritiva de direitos por outra mais conveniente.
Possibilidade, ainda, de o juízo da execução, por ocasião da audiência admonitória, reduzir o valor estabelecido à título de prestação pecuniária a patamar que julgue mais adequado à situação financeira do apelante.
18. Provimento parcial da apelação, para redução das penas impostas ao recorrente.
Ementa
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. OPERAÇÃO ESTALO. ART. 288 DO CÓDIGO PENAL (COM REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 12.850/13). INCOMPETÊNCIA, INÉPCIA DA INICAL E ILEGALIDADE DA PROVA. PRELIMINARES AFASTADAS. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. COMPROVAÇÃO DA
MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA. PRESENÇA DO DOLO. DOSAGEM DA PENA. NECESSIDADE DE AJUSTES. PROVIMENTO PARCIAL.
1. A competência da Justiça Federal em relação à prática criminosa prevista no art. 288 do Código Penal decorre da incidência da Súmula 122 do STJ, a qual dispõe competir à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de
competência federal e estadual. O crime de formação de quadrilha, embora tenha sido objeto de denúncia em separado, tem estreita ligação com o de contrabando de pássaros exóticos, uma vez que o grupo era dedicado à exploração dessa prática criminosa,
cuidando-se, pois, de fatos conexos. O crime de contrabando ofende interesses da União e, dessa forma, enquadra-se na regra prevista no art. 109, inciso IV, da Constituição Federal de 1988.
2. A denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal descreve suficientemente os limites das condutas imputadas ao recorrente, permitindo, dessa forma, o entendimento da acusação e o exercício da ampla defesa. Alegação de inépcia da denúncia
afastada.
3. A interceptação de comunicações telefônicas, que foi precedida de investigações preliminares, restou autorizada pelo juízo da 13ª Vara Federal do Estado de Pernambuco, por ser o único meio disponível para identificar o local exato de captura das
aves, seus responsáveis e meios de captura, além da destinação final dos espécimes. A quebra do sigilo telefônico do apelante resultou do fato de ele ter mantido contato com alvos da investigação e, a partir dos diálogos travados, terem sido colhidos
indícios suficientes para justificar a sua inclusão como alvo direto da investigação policial. Não acolhimento da tese de ilegalidade da interceptação das comunicações telefônicas do apelante.
4. O ora recorrente não se manifestou na primeira oportunidade em que falou nos autos acerca da recusa do Ministério Público Federal em propor a suspensão condicional do processo. Matéria que restou atingida pela preclusão. Hipótese, ademais, em que o
recorrente não faz jus ao sursis processual, tendo em vista que após o ajuizamento da presente ação penal, foi ajuizada outra ação penal contra a sua pessoa (Processo n.º 0001572-87.2013.4.05.8300).
5. Sendo o delito de quadrilha crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, o prazo prescricional deve ser contado a partir da cessação da permanência que, no caso concreto, decorreu da deflagração da fase ostensiva da "OPERAÇÃO ESTALO", em 2
de abril de 2012. Tendo sido a denúncia recebida em 11 de maio de 2012 e a sentença condenatória recorrível proferida em 22 de fevereiro de 2016, não há que se falar em prescrição da pretensão punitiva estatal. Hipótese em que mesmo se fixada a pena no
mínimo legal, isto é, em 1 (um) ano de reclusão, ainda assim não estaria prescrita, tendo em vista que não decorridos 4 (quatro) anos entre a data do recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória recorrível.
6. A existência de um grupo organizado, com atuação em vários Estados da Federação e com o propósito de cometer crimes causa abalo à paz pública, objeto jurídico do crime de quadrilha. É prova disso o fato de que a ação policial para desarticular a
grupo criminoso foi amplamente noticiada pela imprensa, através de notícias veiculadas na internet, revelando o interesse da coletividade em ver desbaratado o referido grupo criminoso e restaurada a paz pública.
7. A demonstração de que determinado agente integra, de forma livre e consciente, grupo estável e permanente, formado por mais de três pessoas e voltado à prática de crimes, é o que basta para a comprovação da materialidade e autoria do crime de
quadrilha. Hipótese em que os diálogos interceptados, bem assim os termos de apreensão, permitem uma conclusão segura quanto à destacada atuação do recorrente em quadrilha especializada no tráfico e comércio de aves exóticas e nativas. Provas que
demonstram, ainda, a vontade consciente (dolo) do apelante de se associar a outras pessoas para a prática de crimes.
8. Dosagem da pena.
9. A fundamentação empregada pelo juízo a quo na avaliação do vetor culpabilidade cuida, em verdade, do modus operandi e dos recursos empregados na atividade criminosa, dados que devem ser avaliados na operativa relacionada às circunstâncias do crime.
10. O entendimento adotado na sentença para considerar o vetor conduta social em prejuízo do apelante encontra óbice na súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso
para agravar a pena-base".
11. O fato de o réu não ter demonstrado arrependimento da prática delitiva não constitui elemento suficiente à avaliação da operativa da personalidade, a qual exige criterioso estudo e profusão de dados do comportamento do agente, não presentes no caso
concreto.
12. Há prova nos autos de que o recorrente, ao associar-se a outras pessoas para a prática de crimes, buscou maximizar o seu ganho financeiro, eis que lucrava com o comércio dos pássaros e com a realização de apostas nas rinhas. Motivação do crime que
justifica a majoração da pena-base.
13. O número de envolvidos, a extensão da área de atuação da quadrilha, o fato de movimentarem enorme número de pássaros, os quais, no mais das vezes, eram submetidos a condições absurdas de transporte, armazenados em microgaiolas depositadas em malas e
bolsas que não permitiam o movimento e geravam temperaturas extremas, privando os animais de oxigênio, justificam a elevação da pena-base a título de circunstâncias do crime.
14. A consequência do crime descrita na sentença condenatória (prejuízo à fauna) refere-se muito mais aos crimes conexos cometidos pela quadrilha do que ao crime imputado ao recorrente na denúncia. Para consideração da mencionada circunstância neste
feito seria necessária a demonstração de algum dano concreto à fauna, não apenas da possibilidade de ocorrência de uma lesão.
15. Fixação da pena-base privativa de liberdade no quantitativo de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão.
16. Redução da pena definitiva imposta na sentença de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de reclusão para 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. Manutenção da substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos.
17. Valor da prestação pecuniária mensal (R$ 500,00) mantido, tendo em vista ter a sentença possibilitado ao juízo da execução, caso a situação fática recomende, operar a substituição dessa pena restritiva de direitos por outra mais conveniente.
Possibilidade, ainda, de o juízo da execução, por ocasião da audiência admonitória, reduzir o valor estabelecido à título de prestação pecuniária a patamar que julgue mais adequado à situação financeira do apelante.
18. Provimento parcial da apelação, para redução das penas impostas ao recorrente.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
16/01/2018
Data da Publicação
:
19/01/2018
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 14056
Órgão Julgador
:
Quarta Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED SUM-444 (STJ)
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LEG-FED LEI-13008 ANO-2014
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LEG-FED LEI-12234 ANO-2010
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LEG-FED LEI-9605 ANO-1998 ART-31 ART-29 PAR-1 INC-3
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LEG-FED SUM-122 (STJ)
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***** CPP-41 Codigo de Processo Penal
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-80 ART-83 ART-41
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LEG-FED PRT-93 ANO-1998 (IBAMA)
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LEG-FED LEI-9099 ANO-1995 ART-89
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LEG-FED LEI-12850 ANO-2013
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***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-288 ART-296 PAR-1 ART-109 INC-4 ART-155 ART-334 PAR-1 LET-C INC-1 ART-33 PAR-2 LET-C
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***** CF-88 Constituição Federal de 1988
ART-109 INC-4
Fonte da publicação
:
DJE - Data::19/01/2018 - Página::283
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