TRF5 0002397-60.2015.4.05.8300 00023976020154058300
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. OPERAÇÃO ESTALO. ART. 288 DO CÓDIGO PENAL (COM REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 12.850/13). INCOMPETÊNCIA, INÉPCIA DA INICAL E ILEGALIDADE DA PROVA. PRELIMINARES AFASTADAS. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. COMPROVAÇÃO DA
MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA. PRESENÇA DO DOLO. DOSAGEM DA PENA. NECESSIDADE DE AJUSTES. PROVIMENTO PARCIAL.
1. A competência da Justiça Federal em relação à prática criminosa prevista no art. 288 do Código Penal decorre da incidência da Súmula 122 do STJ, a qual dispõe competir à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de
competência federal e estadual. O crime de formação de quadrilha, embora tenha sido objeto de denúncia em separado, tem estreita ligação com o de contrabando de pássaros exóticos, uma vez que o grupo era dedicado à exploração dessa prática criminosa,
cuidando-se, pois, de fatos conexos. O crime de contrabando ofende interesses da União e, dessa forma, enquadra-se na regra prevista no art. 109, inciso IV, da Constituição Federal de 1988.
2. A denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal descreve suficientemente os limites das condutas imputadas ao recorrente, permitindo, dessa forma, o entendimento da acusação e o exercício da ampla defesa. Alegação de inépcia da denúncia
afastada.
3. O ora recorrente não se manifestou na primeira oportunidade em que falou nos autos acerca da recusa do Ministério Público Federal em propor a suspensão condicional do processo. Matéria que restou atingida pela preclusão. Hipótese, ademais, em que o
recorrente não faz jus ao sursis processual, tendo em vista que após o ajuizamento da presente ação penal, foi ajuizada outra ação penal contra a sua pessoa (Processo n.º 0018032-86.2012.4.05.8300).
4. Sendo o delito de quadrilha crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, o prazo prescricional deve ser contado a partir da cessação da permanência que, no caso concreto, decorreu da deflagração da fase ostensiva da "OPERAÇÃO ESTALO", em 2
de abril de 2012. Tendo sido a denúncia recebida em 11 de maio de 2012 e a sentença condenatória recorrível proferida em 26 de abril de 2016, não há que se falar em prescrição da pretensão punitiva estatal. Hipótese em que mesmo se fixada a pena no
mínimo legal, isto é, em 1 (um) ano de reclusão, ainda assim não estaria prescrita, tendo em vista que não decorridos 4 (quatro) anos entre a data do recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória recorrível.
5. A existência de um grupo organizado, com atuação em vários Estados da Federação e com o propósito de cometer crimes causa abalo à paz pública, objeto jurídico do crime de quadrilha. É prova disso o fato de que a ação policial para desarticular a
grupo criminoso foi amplamente noticiada pela imprensa, através de notícias veiculadas na internet, revelando o interesse da coletividade em ver desbaratado o referido grupo criminoso e restaurada a paz pública.
6. A demonstração de que determinado agente integra, de forma livre e consciente, grupo estável e permanente, formado por mais de três pessoas e voltado à prática de crimes, é o que basta para a comprovação da materialidade e autoria do crime de
quadrilha. Hipótese em que os diálogos interceptados, bem assim os termos de apreensão, permitem uma conclusão segura quanto à destacada atuação do recorrente em quadrilha especializada no tráfico e comércio de aves exóticas e nativas. Provas que
demonstram, ainda, a vontade consciente (dolo) do apelante de se associar a outras pessoas para a prática de crimes.
7. Dosagem da pena.
8. A fundamentação empregada pelo juízo a quo na avaliação do vetor culpabilidade cuida, em verdade, do modus operandi e dos recursos empregados na atividade criminosa, dados que devem ser avaliados na operativa relacionada às circunstâncias do crime.
9. A circunstância de o recorrente presidir sindicato de caminhoneiros, tendo utilizado o terminal telefônico da entidade para tratar de assuntos relacionados a atividade criminosa da quadrilha, não apresenta relevância a ponto de justificar a
exasperação da pena-base à título de má conduta social. Hipótese em que o simples fato de ser o recorrente caminhoneiro, garantia-lhe maior facilidade na cooptação de colegas para o transporte dos espécimes contrabandeados.
10. O fato de o réu não ter demonstrado arrependimento da prática delitiva não constitui elemento suficiente à avaliação da operativa da personalidade, a qual exige criterioso estudo e profusão de dados do comportamento do agente, não presentes no caso
concreto.
11. Há prova nos autos de que o recorrente, ao associar-se a outras pessoas para a prática de crimes, buscou maximizar o seu ganho financeiro, lucrando com o comércio dos pássaros, sendo remunerado, ainda, pelo seu transporte. Embora seja ínsita ao
crime de contrabando, a referida circunstância justifica a majoração da pena-base, no que concerne ao delito tipificado no art. 288 do Código Penal.
12. O número de envolvidos, a extensão da área de atuação da quadrilha, o fato de movimentarem enorme número de pássaros, os quais, no mais das vezes, eram submetidos à condições absurdas de transporte, armazenados em microgaiolas depositadas em malas e
bolsas que não permitiam o movimento e geravam temperaturas extremas, privando os animais de oxigênio, justificam a elevação da pena-base a título de circunstâncias do crime.
13. A consequência do crime descrita na sentença condenatória (prejuízo à fauna) refere-se muito mais aos crimes conexos cometidos pela quadrilha do que ao crime imputado ao recorrente na denúncia. Para consideração da mencionada circunstância neste
feito seria necessária a demonstração de algum dano concreto à fauna, não apenas da possibilidade de ocorrência de uma lesão.
14. É jurisprudência consolidada no Tribunal Regional Federal da 5ª Região que o comportamento da vítima não poderá ser considerado em desfavor do acusado, quando não for possível, pela própria natureza daquela, atribuir-lhe qualquer influência no fato
criminoso.
15. Fixação da pena-base privativa de liberdade no quantitativo de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão.
16. Não obstante exista prova nos autos de que o recorrente promovia ou organizava a cooperação no crime, assumindo posição de destaque na quadrilha, a denúncia não imputou ao apelante tal circunstância agravante, de sorte que não pode ser ela
reconhecida na sentença, por força do princípio da correlação.
17. Redução da pena definitiva imposta na sentença de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses para 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. Manutenção da substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos.
18. Provimento parcial da apelação, para redução da pena imposta ao recorrente.
Ementa
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. OPERAÇÃO ESTALO. ART. 288 DO CÓDIGO PENAL (COM REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 12.850/13). INCOMPETÊNCIA, INÉPCIA DA INICAL E ILEGALIDADE DA PROVA. PRELIMINARES AFASTADAS. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. COMPROVAÇÃO DA
MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA. PRESENÇA DO DOLO. DOSAGEM DA PENA. NECESSIDADE DE AJUSTES. PROVIMENTO PARCIAL.
1. A competência da Justiça Federal em relação à prática criminosa prevista no art. 288 do Código Penal decorre da incidência da Súmula 122 do STJ, a qual dispõe competir à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de
competência federal e estadual. O crime de formação de quadrilha, embora tenha sido objeto de denúncia em separado, tem estreita ligação com o de contrabando de pássaros exóticos, uma vez que o grupo era dedicado à exploração dessa prática criminosa,
cuidando-se, pois, de fatos conexos. O crime de contrabando ofende interesses da União e, dessa forma, enquadra-se na regra prevista no art. 109, inciso IV, da Constituição Federal de 1988.
2. A denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal descreve suficientemente os limites das condutas imputadas ao recorrente, permitindo, dessa forma, o entendimento da acusação e o exercício da ampla defesa. Alegação de inépcia da denúncia
afastada.
3. O ora recorrente não se manifestou na primeira oportunidade em que falou nos autos acerca da recusa do Ministério Público Federal em propor a suspensão condicional do processo. Matéria que restou atingida pela preclusão. Hipótese, ademais, em que o
recorrente não faz jus ao sursis processual, tendo em vista que após o ajuizamento da presente ação penal, foi ajuizada outra ação penal contra a sua pessoa (Processo n.º 0018032-86.2012.4.05.8300).
4. Sendo o delito de quadrilha crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, o prazo prescricional deve ser contado a partir da cessação da permanência que, no caso concreto, decorreu da deflagração da fase ostensiva da "OPERAÇÃO ESTALO", em 2
de abril de 2012. Tendo sido a denúncia recebida em 11 de maio de 2012 e a sentença condenatória recorrível proferida em 26 de abril de 2016, não há que se falar em prescrição da pretensão punitiva estatal. Hipótese em que mesmo se fixada a pena no
mínimo legal, isto é, em 1 (um) ano de reclusão, ainda assim não estaria prescrita, tendo em vista que não decorridos 4 (quatro) anos entre a data do recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória recorrível.
5. A existência de um grupo organizado, com atuação em vários Estados da Federação e com o propósito de cometer crimes causa abalo à paz pública, objeto jurídico do crime de quadrilha. É prova disso o fato de que a ação policial para desarticular a
grupo criminoso foi amplamente noticiada pela imprensa, através de notícias veiculadas na internet, revelando o interesse da coletividade em ver desbaratado o referido grupo criminoso e restaurada a paz pública.
6. A demonstração de que determinado agente integra, de forma livre e consciente, grupo estável e permanente, formado por mais de três pessoas e voltado à prática de crimes, é o que basta para a comprovação da materialidade e autoria do crime de
quadrilha. Hipótese em que os diálogos interceptados, bem assim os termos de apreensão, permitem uma conclusão segura quanto à destacada atuação do recorrente em quadrilha especializada no tráfico e comércio de aves exóticas e nativas. Provas que
demonstram, ainda, a vontade consciente (dolo) do apelante de se associar a outras pessoas para a prática de crimes.
7. Dosagem da pena.
8. A fundamentação empregada pelo juízo a quo na avaliação do vetor culpabilidade cuida, em verdade, do modus operandi e dos recursos empregados na atividade criminosa, dados que devem ser avaliados na operativa relacionada às circunstâncias do crime.
9. A circunstância de o recorrente presidir sindicato de caminhoneiros, tendo utilizado o terminal telefônico da entidade para tratar de assuntos relacionados a atividade criminosa da quadrilha, não apresenta relevância a ponto de justificar a
exasperação da pena-base à título de má conduta social. Hipótese em que o simples fato de ser o recorrente caminhoneiro, garantia-lhe maior facilidade na cooptação de colegas para o transporte dos espécimes contrabandeados.
10. O fato de o réu não ter demonstrado arrependimento da prática delitiva não constitui elemento suficiente à avaliação da operativa da personalidade, a qual exige criterioso estudo e profusão de dados do comportamento do agente, não presentes no caso
concreto.
11. Há prova nos autos de que o recorrente, ao associar-se a outras pessoas para a prática de crimes, buscou maximizar o seu ganho financeiro, lucrando com o comércio dos pássaros, sendo remunerado, ainda, pelo seu transporte. Embora seja ínsita ao
crime de contrabando, a referida circunstância justifica a majoração da pena-base, no que concerne ao delito tipificado no art. 288 do Código Penal.
12. O número de envolvidos, a extensão da área de atuação da quadrilha, o fato de movimentarem enorme número de pássaros, os quais, no mais das vezes, eram submetidos à condições absurdas de transporte, armazenados em microgaiolas depositadas em malas e
bolsas que não permitiam o movimento e geravam temperaturas extremas, privando os animais de oxigênio, justificam a elevação da pena-base a título de circunstâncias do crime.
13. A consequência do crime descrita na sentença condenatória (prejuízo à fauna) refere-se muito mais aos crimes conexos cometidos pela quadrilha do que ao crime imputado ao recorrente na denúncia. Para consideração da mencionada circunstância neste
feito seria necessária a demonstração de algum dano concreto à fauna, não apenas da possibilidade de ocorrência de uma lesão.
14. É jurisprudência consolidada no Tribunal Regional Federal da 5ª Região que o comportamento da vítima não poderá ser considerado em desfavor do acusado, quando não for possível, pela própria natureza daquela, atribuir-lhe qualquer influência no fato
criminoso.
15. Fixação da pena-base privativa de liberdade no quantitativo de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão.
16. Não obstante exista prova nos autos de que o recorrente promovia ou organizava a cooperação no crime, assumindo posição de destaque na quadrilha, a denúncia não imputou ao apelante tal circunstância agravante, de sorte que não pode ser ela
reconhecida na sentença, por força do princípio da correlação.
17. Redução da pena definitiva imposta na sentença de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses para 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. Manutenção da substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos.
18. Provimento parcial da apelação, para redução da pena imposta ao recorrente.Decisão
UNÂNIME
Data do Julgamento
:
16/01/2018
Data da Publicação
:
19/01/2018
Classe/Assunto
:
ACR - Apelação Criminal - 14235
Órgão Julgador
:
Quarta Turma
Relator(a)
:
Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto
Comarca
:
TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-12234 ANO-2010
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LEG-FED LEI-9099 ANO-1995 ART-89
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***** CPP-41 Codigo de Processo Penal
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-83 ART-41
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
LEG-FED LEI-9605 ANO-1998 ART-31
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LEG-FED SUM-122 (STJ)
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LEG-FED PRT-93 ANO-1998 (IBAMA)
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LEG-FED LEI-9099 ANO-1995 ART-89
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LEG-FED LEI-12850 ANO-2013
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***** CP-40 Codigo Penal
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-288 ART-296 PAR-1 INC-1 ART-109 INC-4 ART-62 INC-1 ART-33 PAR-2 LET-C
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
***** CF-88 Constituição Federal de 1988
ART-109 INC-4
Fonte da publicação
:
DJE - Data::19/01/2018 - Página::289
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