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Jurisprudência


TRF5 0004265-64.2015.4.05.8400 00042656420154058400

Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. DISPONIBILIZAÇÃO E ARMAZENAMENTO DE MATERIAL COM CONTEÚDO PEDÓFILO. ARTS. 241-A E 241-B DA LEI 8.069/90. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DOLO PRESENTE. ERRO DE PROIBIÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS PESSOAIS E FÁTICAS QUE DEMONSTRAM A CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE. DOSIMETRIA. ART. 59 DO CP. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. CONTINUIDADE DELITIVA. PLEITO EM QUE SE BUSCA O SEU NÃO RECONHECIMENTO. PEDIDO PREJUDICIAL AO RÉU. NÃO CONHECIMENTO. APELO CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO EM PARTE. 1. Hipótese em que identificados em disco rígido de notebook de uso pessoal do recorrente 8.810 arquivos de imagem e vídeo (8.520 imagens e 290 vídeos), contendo cenas de sexo explícito ou pornográficas envolvendo crianças e adolescentes. 2. A perícia constatou evidências de disponibilização de parte desse material por meio da internet, através dos programas "Shareaza" e "Ares Galaxy". Apurou a disponibilização de 1 (um) arquivo de vídeo de pornografia infanto-juvenil na internet, através do programa "Shareaza", e de 73 (setenta e três) arquivos com nomes relacionados à pornografia infanto-juvenil, por meio do "Ares Galaxy". Desses últimos, 16 (dezesseis) foram encontrados no sistema analisado, permitindo concluir que se tratam de imagens e/ou vídeos contendo cenas de sexo explícito ou pornográficas envolvendo crianças e/ou adolescentes. 3. A tese de ausência de dolo não convence. O laudo pericial afirma que os programas "Shareaza" e "Ares" possibilitam ao usuário acompanhar e gerenciar os arquivos que estão sendo recebidos e enviados. Some-se a isso o fato de o recorrente possuir elevado conhecimento na área de informática, eis que é técnico em informática pelo IFRN e também graduado no curso de Rede de Computadores da mesma instituição de ensino, possuindo, ainda, certificações em cursos de administração de sistemas e redes de computadores obtidas no exterior. Diante da expertise do apelante, não é possível concluir que desconhecesse o funcionamento dos softwares utilizados para obtenção do material pornográfico infantil e, sobretudo, que tais programas permitiam também o envio de arquivos para terceiros. O dolo, portanto, está presente, podendo-se afirmar que, no mínimo, o recorrente assumiu o risco de produzir o resultado. 4. Hipótese em que o próprio recorrente admitiu que transferia os arquivos da pasta de compartilhamento, com o intuito de que não ficassem disponíveis para download de terceiros, o que revela possuir o agente consciência da ilicitude do fato, não se podendo falar, pois, em erro de proibição, seja ele invencível ou vencível. Em que pese a argumentação do apelante, o fato é que 74 (setenta e quatro) arquivos foram disponibilizados para download, quantitativo que não pode ser considerado irrisório. 5. Manutenção da condenação pelo crimes de disponibilização de arquivos de fotos e vídeos contendo cenas de sexo explícito ou pornográficas envolvendo crianças e adolescentes (ECA, art. 241-A) e de armazenamento desse material (ECA, art. 241-B). 6. Dosagem da pena. 7. Em relação ao crime previsto no art. 241-A da Lei 8.069/90, a fundamentação do vetor culpabilidade não evidenciou fatos que justifiquem a maior reprovabilidade da conduta do réu. Em crimes desse jaez, o grau de instrução do recorrente não torna mais ou menos censurável a prática criminosa por ele perpetrada. Afinal, em sentido contrário, seria impensável admitir como menos abjeto e repugnante tal comportamento, apenas porque praticado por pessoa de pouca instrução. O conteúdo repulsivo das imagens disponibilizadas não justifica a elevação da pena-base em virtude da intensa censura social, uma vez que cenas de sexo explícito ou pornográficas envolvendo crianças e adolescentes sempre serão consideradas abomináveis, causando repulsa ao homem médio. Por fim, não há como justificar o aumento dado à pena-base em virtude da intensidade e da repetição do crime, quando, concomitantemente, reconhece-se a incidência da causa de aumento de pena relativa à continuidade delitiva. 8. Em relação ao delito tipificado no art. 241-B da Lei n.º 8.069/90, mantém-se a avaliação negativa do vetor culpabilidade, tendo em vista o grande número de arquivos com conteúdo pedófilo (mais de oito mil) armazenados pelo réu. 9. Supressão do aumento de pena relacionado ao vetor consequências do delito, no que concerne a ambos os crimes. Embora concorde com o magistrado a quo quando afirma que os atos atentatórios às crianças e aos adolescentes, no mais das vezes, causam traumas psicológicos irreversíveis, nenhum fato concreto foi relacionado pela decisão condenatória, não se encontrando, pois, justificada a exasperação da pena a esse título. 10. Redução da pena-base fixada para o crime de disponibilização de material com conteúdo pedófilo (ECA, art. 241-A) de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de reclusão para o mínimo previsto em lei, qual seja, 3 (três) anos de reclusão. Redução da pena-base fixada para o crime de armazenamento de material com conteúdo pedófilo, tipificado art. 241-B do ECA, de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de reclusão para 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão. 11. Na segunda fase da dosimetria, é de ser mantida a incidência da atenuante da confissão espontânea para o crime do art. 241-B da Lei 8.069/90, com redução da pena relativa a esse delito para 1 (um) ano de reclusão, sanção mínima prevista no preceito secundário desse tipo penal. 12. Não é possível falar em relevante contribuição para a resolução do feito (CP, art. 66), eis que as provas coletadas com a busca e apreensão realizada na residência do recorrente se mostraram suficientes para embasar a condenação penal, prescindindo, portanto, de sua colaboração. Ademais, o STJ já sumulou o entendimento de que fixadas no mínimo as penas-base impostas ao agente, não cabe, na segunda fase da dosimetria, reduzir ainda mais a sanção de modo a fixá-la em patamar abaixo do mínimo previsto em lei. 13. Na terceira fase da dosagem da pena, considerando que os setenta e quatro crimes de disponibilização de arquivos contendo cenas de sexo explícito ou pornográficas envolvendo crianças e adolescentes (ECA, art. 241-A) ocorreram nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, mantenho o aumento de pena relativo à continuidade delitiva (CP, art. 71), conforme aplicado na sentença, no patamar de 1/3 (um terço). Fixação da pena relativa ao crime inscrito no art. 241-A da Lei 8.069/90, em 4 (quatro) anos de reclusão. 14. A tese defensiva, no sentido de não ser possível a aplicação da continuidade delitiva em virtude dos crimes terem sido praticados em lapso temporal superior a 30 (trinta) dias é prejudicial ao réu e não merece, portanto, ser conhecida. A alternativa ao reconhecimento da continuidade delitiva seria a aplicação da regra do concurso material, o que, por óbvio, não traria benefícios ao réu. Não conhecimento do apelo, quanto a essa matéria. 15. Pena definitiva aplicada para o crime previsto no art. 241-A da Lei 8.069/90 reduzida para 4 (quatro) anos de reclusão. Pena definitiva aplicada para o crime previsto no art. 241-B da Lei 8.069/90 reduzida para 1 (um) ano de reclusão. Em virtude do concurso material aplicável ao caso (CP, art. 69), o somatório das sanções aplicadas ao agente resulta na pena unificada de 5 (cinco) anos de reclusão, a ser cumprida no regime inicial semiaberto. 16. Pena de multa redimensionada. Fixação de 10 (dez) dias-multa para crime do art. 241-A do ECA e de 10 (dez) dias-multa para o crime do art. 241-B do ECA, ambas à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo em vigor na época do crime. Nos termos do art. 72 do CP, no concurso de crimes, as penas de multa deverão ser unificadas em 20 (vinte) dias-multa, à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo em vigor na época do crime. 17. Apelo, em parte, conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido, para reduzir as penas impostas ao réu na sentença.
Decisão
Decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por maioria, vencido o relator, conhecer a preliminar e, por unanimidade, indeferi-la. No mérito, decide a turma, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa extensão, prover em parte o apelo, nos termos do Relatório.

Data do Julgamento : 01/08/2017
Data da Publicação : 04/08/2017
Classe/Assunto : ACR - Apelação Criminal - 14893
Órgão Julgador : Quarta Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Revisor : Desembargador Federal Lazaro Guimarães
Referência legislativa : ***** CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-71 ART-21 ART-59 ART-65 INC-3 LET-D ART-33 PAR-2 LET-B ART-72 ART-69 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** ECA-90 Estatuto da Criança e do Adolescente LEG-FED LEI-8069 ANO-1990 ART-241-A ART-241-B
Fonte da publicação : DJE - Data::04/08/2017 - Página::184
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