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Jurisprudência


TRF5 0004497-18.2011.4.05.8400 00044971820114058400

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. CONCESSÃO IRREGULAR DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO EM TROCA DE VANTAGEM PECUNIÁRIA E ELEITORAL. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA DEMONSTRADAS. TIPICIDADE E DOLO. PRESENÇA. CONJUNTO PROBATÓRIO HÁBIL À CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA. PENA BASE. ANTECEDENTES. CONSIDERAÇÃO DE INQUÉRITOS POLICIAIS. SÚMULA Nº 444/STJ. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. VALORAÇÃO NEGATIVA DIANTE DA CONTINUIDADE DELITIVA. VIOLAÇÃO DO CRITÉRIO TRIFÁSICO. PRECEDENTES. AGRAVANTES. ART. 62, I E III, DO CÓDIGO PENAL. INCIDÊNCIA. 1. Cuida-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal e por Gilzamar Silva do Nascimento e Francisca Varela do Nascimento contra a sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva, absolvendo Francisca Dilma da Silva Cruz, a teor do art. 386, VII, do Código de Processo Penal, e condenando Gilzamar Silva do Nascimento e Francisca Varela do Nascimento, pelo cometimento do capitulado no art. 171, parágrafo 3º, c/c art. 71, ambos do Código Penal, cada qual às penas de 7 (sete) anos e 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime de cumprimento inicialmente semiaberto, e de 550 (quinhentos e cinquenta) dias-multa, cada qual valorado em 1/20 (um vigésimo), para a primeira, e em 1/30 (um trigésimo), para a segunda, do salário mínimo vigente à época dos fatos, noticiando a denúncia que Gilmara Tayana Silva de Freitas, filha da acusada Gilzamar Silva do Nascimento, foi estagiária da Agência da Previdência Social do Município de João Câmara, no período de 2 de janeiro de 2003 a 26 de novembro de 2004, e ela, valendo-se da relação de confiança que tinha com seus superiores, teria utilizado a senhas desses para conceder irregularmente 131 (cento e trinta e um) benefícios de salário-maternidade, inserindo dados falsos no sistema e, em alguns casos, valendo-se de documentos falsos, acrescentando a peça acusatória que as fraudes teriam ocorrido entre os meses de junho e setembro de 2004, fazendo parte de um esquema articulado pelas acusadas, as quais teriam fornecido instrumentos para falsear a condição de segurado trabalhador rural de diversas pessoas, além de arregimentar beneficiários, com o fito de obter ilicitamente vantagem pecuniária e eleitoral, neste último caso votos para a acusada Gilzamar Silva do Nascimento, causando um prejuízo superior a R$ 110.000,00 (cento e dez mil reais). 2. O Ministério Público Federal, em suas razões recursais, aduz equivocado, na sentença, o sopesamento dos motivos e das circunstâncias do crime, que entende bastante desfavoráveis; a necessária incidência das agravantes do art. 62, I e III, do Código Penal, pela promoção da cooperação no crime e direção das atividades dos demais agentes e, ainda, pela instigação ou determinação, a cometer o crime, da sua filha, não punível por contar, à época dos fatos, com 17 (dezessete) anos; e igualmente equivocada a valoração dos dias-multa, em descompasso com a real capacidade econômica das ora apeladas. 3. A defesa, por seu turno, às fls. 380/389 e 419/425, aduz a ausência de tipicidade e de dolo, além de prova suficiente à condenação, sendo específica, no que se refere à apelante Gilzamar Silva do Nascimento, mostrar-se excessiva a pena base, fixada em 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, por não haver ela manipulado documentos, desconhecer a lei previdenciária e a rotina administrativa do INSS, além de não haver arregimentado funcionários do INSS para concorrerem nos delitos apontados na peça acusatória. 4. Pelo carreado aos autos, seja a partir do noticiado em juízo por Gilmara Tayana Silva de Freitas, na qualidade de declarante, foram cerca de 131 (cento e trinta e um) benefícios previdenciários concedidos irregularmente, a partir da inserção de dados falsos no sistema informatizado do INSS, declarando, ainda, que os processos físicos eram destruídos para evitar a descoberta da fraude pelos servidores daquela autarquia previdenciária, assim como pela prova testemunhal produzida, formada por beneficiários da ação irregular, aponta para a obtenção, pela estagiária, de vantagem pecuniária e de voto em favor de sua mãe, a acusada Gilzamar Silva do Nascimento, candidata às eleições municipais naquele ano de 2004, resta demonstrada a materialidade delitiva, eis que as acusadas, além da menor Gilmara Tayana Silva de Freitas, obtiveram para si vantagem ilícita (pecuniária e/ou eleitoral) em prejuízo do INSS mediante fraude para a concessão de benefícios previdenciários irregulares, com a inserção de dados ou o uso de documentos falsos sobre os beneficiários. 5. Do colhido em juízo, as próprias acusadas ratificam a concessão irregular dos benefícios previdenciários, contudo refutam sua participação na empreitada delitiva narrada na peça acusatória, contudo o conjunto probatório carreado aos autos, no entanto, apresenta-se em total desfavor das acusadas, eis que, em contraposição aos argumentos trazidos por Francisca Varela do Nascimento, a prova testemunhal se faz forte no sentido de que ela providenciava documentação falsa para dar alicerce aos pedidos formulados à autarquia previdenciária, obtendo para si, após a percepção do benefício, vantagem pecuniária, sendo ela, por sua condição de trabalhar no sindicato dos trabalhadores rurais, e seria ela a responsável por arregimentar pessoas, providenciando a documentação necessária à concessão do benefício. 6. Em relação a Gilzamar Silva do Nascimento, forte é o conjunto probatório carreado aos autos, com prova testemunhal no sentido de que a acusada teria encaminhado várias pessoas à APS de João Câmara/RN para, ali, procurar por sua filha para dar entrada no pedido de salário maternidade, pois ela "resolveria o problema", bem como pedira seu voto, sendo certa sua responsabilidade em arregimentar pessoas, fornecendo documentação inidônea para a concessão do benefício e, de outro lado, a participação no esquema de concessão fraudulenta dos benefícios previdenciários, eis que dirigia as pessoas à APS para que, lá, sua filha "resolvesse o problema", e não se poder creditar uma mera gratidão o atendimento ao pleito do voto na candidata no pleito municipal, tendo em vista saberem os beneficiários ser indevida a concessão a concluir por troca de favores, eis que Gimara Tayana Silva de Freitas, filha da acusada Gilzamar Silva do Nascimento, que se demonstrou ter conhecimento da atividade ilícita executada através da sua condição de estagiária naquela agência, era por ela orientada, inclusive cabalando votos, 7. Ao contrário do que infere o parecer ministerial, de se adotar critério meramente objetivo para fixar a pena base a partir do quantitativo das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal em desfavor da parte ré, necessária a aquilatação das mesmas, em um critério subjetivo, a fim de se obter uma correta individualização das penas. 8. Merece reparo a desvaloração das circunstâncias do crime, tendo em vista que o montante do prejuízo causado à Previdência Social se apresenta decorrente da totalidade de condutas apuradas em continuidade delitiva, explicitando a sentença em 128 (cento e vinte e oito) benefícios irregulares, mostrando-se sua desvaloração violar o critério trifásico da dosimetria da pena. Precedente: STJ, 5ªT., RESP-1196299/SP, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 08.05.2013. 9. Em relação à acusada Francisca Varela do Nascimento, além do já expendido anteriormente quanto às consequências do crime, o sopesamento em desfavor quanto aos antecedentes encontram óbices na Súmula nº 444/STJ, eis que a remissão feita, às fls. 499/500, dispõe tão somente de inquéritos em curso, inclusive o próprio que ensejou a presente ação penal. 10. Faz-se pertinente a reforma da sentença quanto à fixação da pena base, pelo que, adotando-se critérios objetivos e subjetivos, é de fixá-la em 3 (três) anos de reclusão, para Gilzamar Silva do Nascimento, e em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão para Francisca Varela do Nascimento. 11. Ainda que a acusada sustente o contrário, observa-se restar demonstrada sua participação, inclusive com a prova testemunhal apontando ao fato de que reuniões vieram a ocorrer em sua residência, bem como ser uma das maiores beneficiárias, diante de só a ela convergir a vantagem eleitoral, é de se firmar caber a ela a promoção, ou organização, no esquema delitivo, inclusive não sendo equivocado apontá-la como dirigente das atividades das demais pessoas envolvidas, a permitir a incidência da agravante do art. 62, I, do Código Penal e, de igual sorte, é certo haver ela instigado/determinado sua própria filha, Gilmara Tayana Silva de Freitas, a cometer o crime, em seu proveito, valendo-se da sua autoridade e não ser punível, a permitir a incidência igualmente da agravante do art. 62, III, do Código Penal, de forma a agravar a pena-base em 1 (um) ano, correspondente a 1/6 (um sexto) para cada circunstância agravante, a conduzir a pena, para Gilzamar Silva do Nascimento, na segunda fase da dosimetria da pena, a 4 (quatro) anos de reclusão, diante da ausência de atenuantes. 12. Presente unicamente a causa especial de aumento prevista no art. 171, parágrafo 3º, do Código Penal, em 1/3 (um terço), é de se fixar, aqui, as penas em 5 (cinco) anos e 4 (quatro) de reclusão, para Gilzamar Silva do Nascimento, e em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão para Francisca Varela do Nascimento e, em vista da continuidade delitiva, no caso concreto decorrente dos 128 (cento e vinte e oito) benefícios irregulares noticiados na sentença, é de se adotar o patamar de 2/3 (dois terços), diante do critério objetivo firmado pelos tribunais superiores, para se obter, ao final, por concreta e definitiva, as penas em 8 (oito) anos, 10 (dez) e 20 (vinte) dias de reclusão, para Gilzamar Silva do Nascimento, e em 5 (cinco) anos, 4 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão para Francisca Varela do Nascimento. 13. A pena de multa deve guardar obediência aos limites do art. 49 do Código Penal, eis que, por se tratar de um sistema bifásico, onde se aponta, em um primeiro momento, seu quantum e, no segundo, sua valoração, não há que se entender tal cominação tão somente em consonância com a pena base, mas sim seus limites para a definição em concreto. 14. Para guardar proporcionalidade às penas privativas de liberdade fixadas a cada uma das acusadas, é de se fixar, na primeira fase, em 360 (trezentos e sessenta) dias-multa para Gilzamar Silva do Nascimento, e em 205 (duzentos e cinco) dias-multa para Francisca Varela do Nascimento. 15. No que se refere à valoração, no entanto, a partir das próprias alegações de apelo formuladas pelo órgão acusador, em que se aponta as respectivas condições econômicas das acusadas, não diviso qualquer mácula na sentença. 16. Apelação da ré Gilzamar Silva do Nascimento improvida. 17. Apelações do órgão ministerial e da ré Francisca Varela do Nascimento parcialmente providas, tão somente quanto à dosimetria da pena para, ao final, por concretas e definitivas, fixá-las em 8 (oito) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime de cumprimento inicialmente fechado, e em 360 (trezentos e sessenta) dias-multa, cada qual valorado em 1/20 (um vigésimo) do salário mínimo à época dos fatos, para Gilzamar Silva do Nascimento, e em 5 (cinco) anos, 4 (quatro) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime de cumprimento inicialmente semiaberto, e em 205 (duzentos e cinco) dias-multa, cada qual valorado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, para Francisca Varela do Nascimento.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 15/01/2019
Data da Publicação : 27/02/2019
Classe/Assunto : ACR - Apelação Criminal - 12979
Órgão Julgador : Segunda Turma
Relator(a) : Desembargador Federal Leonardo Carvalho
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Revisor : Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima
Referência legislativa : LEG-FED SUM-444 (STJ) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ART-71 ART-62 INC-1 INC-3 ART-59 ART-49 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CPP-41 Codigo de Processo Penal LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-386 INC-7
Fonte da publicação : DJE - Data::27/02/2019 - Página::71 - Nº::41
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