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Jurisprudência


TRF5 0004595-75.2014.4.05.0000 00045957520144050000

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. INQUÉRITO POLICIAL. CONCUSSÃO E FALSIDADE IDEOLÓGICA. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERALIDADE. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO EM RELAÇÃO A DOIS DOS DENUNCIADOS. 1. Denúncia ofertada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de: a) F.R.S (conduta tipificada no art. 316 do CP - concussão), atual Prefeito do Município de Pariconha/AL; b) L.B.M (conduta tipificada no art. 316 do CP - concussão, em coautoria), então Secretária e Chefe de Gabinete do aludido Município; c) J.G.M.S (conduta tipificada no art. 316 - concussão, em coautoria, e no art. 299 - falsidade ideológica, c/c art. 298 - falsificação de documento particular, do CP, em concurso material), Contador da Prefeitura de Pariconha/AL; d) R.P.B e E.T.S (condutas tipificadas no art. 299 do CP - falsidade ideológica), sócios das empresas Global Tec e Center Cell. 2. No caso sub examine, a denúncia narra fatos descritos no Inquérito Policial (IPL 0193/2014), instaurado em decorrência de noticia criminis originada a partir de depoimento da sócia-proprietária da empresa Estratégia Consultoria Ltda, M.L.A.F, segundo o qual a mesma teria sido obrigada a entregar ao Prefeito do Município de Pariconha/AL, o denunciado F.R.S, o valor entre R$40.000,00 e R$50.000,00, como condição para a liberação dos pagamentos referentes ao contrato de prestação de assessoria técnica celebrado, após procedimento licitatório, entre o Município e a empresa Estratégia Consultoria Ltda (no valor total de R$253.011,30, com recursos provenientes da FUNASA), da qual é sócia M.L.A.F. Segundo a proprietária da aludida empresa, foi realizado o depósito de 50% da verba logo no início do contrato, para realização do plano de mobilização social e do diagnóstico técnico participativo, e o restante seria depositado na segunda fase de execução do contrato, ou seja, quando da apresentação do diagnóstico técnico participativo, da elaboração do projeto de lei e do planejamento estratégico. A FUNASA teria depositado a segunda parcela na conta da Prefeitura, que foi retida pelo Prefeito, o qual teria exigido vantagem indevida para liberá-la. M.L.A.F afirmou, ainda, que funcionários da Prefeitura teriam preenchido e repassado notas fiscais e recibos inidôneos nos valores correspondentes aos dos cheques que deveriam, por ela, serem emitidos. Em virtude da pressão psicológica sofrida, a empresária teria desmaiado nos arredores da agência bancária no momento em que iria solicitar os cheques, vindo a ser atendida em Hospital de Emergência. Tais informações foram corroboradas pelo esposo da empresária, V.G.N. 3. As condutas dos denunciados encontram-se assim descritas: a) F.R.S (Prefeito), na segunda semana de janeiro de 2014, na sua residência sediada em Maceió/AL, exigiu para si vantagem indevida, como condição para liberação dos pagamentos referentes ao contrato de prestação de assessoria técnica celebrado entre o Município e a empresa Estratégia, da qual é sócia a denunciante do crime, M.L.A.F; b) em 20/02/14, a acusada L.B.M (Secretária e Chefe de Gabinete da Prefeitura), em nome do Prefeito, na Prefeitura, exigiu que a empresária preenchesse e entregasse três cheques que seriam repassados ao Prefeito, tendo levado a empresária à agência do Bradesco na cidade vizinha de Delmiro Golveia/AL para a coleta dos cheques; c) no mesmo dia, o contador do Município J.G.M.S, apresentado como alguém que iria "ajudar" a empresária a fim de viabilizar o pagamento da propina em favor do Prefeito, obteve, forneceu e preparou documentos falsos (com vistas a justificar o repasse dos citados cheques e ocultar que os valores seriam repassados para o Prefeito), consistentes em notas fiscais e recibos, supostamente emitidos por três empresas das quais também era contador (Art & Design, Center Cell e Global Tec), vindo a elaborar de próprio punho a nota fiscal falsa da Center Cell (NF 000156, no valor de R$ 31.520,00, de acordo com o Laudo Pericial 197/2014 - SETEC/SR/DPF/AL, acostado aos autos); d) na mesma data, os denunciados R.P.B e E.T.S, sócios das empresas Global Tec e Center Cell, forneceram as vias de notas fiscais que vieram a ser falsificadas ideologicamente, bem como assinaram os respectivos recibos falsos de próprio punho (E.T.S emitiu recibo da Center Cell no valor de R$31.520,00, de acordo com o Laudo Pericial 197/2014 - SETEC/SR/DPF/AL; e R.P.B emitiu recibo da Globo Tec no valor de R$ 18.060,00, de acordo com o Laudo Pericial 197/2014 - SETEC/SR/DPF/AL). 4. Conforme consignado na denúncia, por ocasião do cumprimento de mandado de busca e apreensão na residência do Prefeito, foram apreendidos documentos denominados "Notas e Recibos a Pagar", constando anotações que demonstram possíveis "credores" do Prefeito que venderiam "notas fiscais" ou "recibos" de prestação de serviços, dentre eles o também acusado R.P.B. 5. O Interrogatório dos proprietários das empresas Art & Design, Center Cell e Global Tec, confirmando que nunca mantiveram relações negociais com a empresa Estratégia Consultoria, e o Laudo Pericial 197/2014 - SETEC/SR/DPFAL, comprovando que as assinaturas constantes das notas e recibos partiram do próprio punho dos denunciados J.G.M.S, E.T.S e R.P.B, para intermediar o repasse da vantagem indevida exigida pelo Prefeito F.R.S, com a participação de L.B.M e J.G.M.S, conforme noticia criminis originada a partir de depoimento de M.L.A.F, demonstram a prática, em tese, dos crimes descritos na denúncia (concussão: Prefeito F.R.S, Secretária do Prefeito L.B.M e Contador da Prefeitura J.G.M.S/falsidade ideológica: Contador da Prefeitura J.G.M.S e sócios das empresas Global Tec e Center Cell E.T.S e R.P.B). Em relação ao crime de falsificação de documento particular (art. 298 do CP) imputado ao Contador J.G.M.S, por falta de fundamentação na denúncia, deixo de apreciar a sua prática, sem prejuízo de que, posteriormente, o MPF, caso entenda necessário, venha aditar a peça acusatória. 6. Ao contrário do sustentado pela defesa do Prefeito F.R.S, a hipótese não é de nulidade de provas decorrentes do IPL 0193/2014 obtidas em investigação desenvolvida pela autoridade policial: a uma, porque tão logo a autoridade policial tenha identificado, após ouvir alguns depoimentos, que autoridade com privilégio de foro teria, em tese, participado das condutas delituosas, de imediato, representou a esta Corte Regional solicitando a expedição de mandados de busca e apreensão nas residências e nas empresas titulares das notas fiscais emitidas por funcionários da Prefeitura, não havendo qualquer sinal de atraso ou demora deliberada no encaminhamento dos autos ao TRF5 no intuito de atentar contra direitos e prerrogativas do Prefeito investigado; e a duas, porque, se, já no início das investigações, apenas, repita-se, ouvidos alguns depoimentos, constatou-se a existência de elementos que apontaram para a competência do TRF5, tal situação não pode afetar a validade e a licitude dos atos investigatórios anteriores à remessa dos autos a esta Corte (em ordem cronológica: em 25/02/14, foi apresentada noticia criminis por M.L.A.F; em 26/03/14, foi instaurado o IPL 193/14 e logo após ouvidos alguns depoimentos; em 28/05/14, o Delegado da Polícia Federal apresentou pedido de busca e apreensão perante esta Corte (PEBUAP 12/AL) e foi distribuído neste Regional o INQ 2992/AL; em 06/03/15, houve o indiciamento dos investigados; em 21/09/15, o Delegado da Polícia Federal apresentou o Relatório; em 19/10/15, foi oferecida a denúncia). 7. Digno de nota que, conforme decidido pelo eg. STJ, 5ª T., RHC 77518/RJ, rel. Min. Ribeiro Dantas, DJ 17/03/17, "O art. 5º do Código de Processo Penal, em seus incisos I e II, dispõe que, nos crimes de ação penal pública, o inquérito será iniciado de ofício ou mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para o representar", sendo certo que, "Da prerrogativa de função, não decorre qualquer condicionante à atuação do Ministério Público, ou da autoridade policial, no exercício do mister investigatório, sendo, em regra, despicienda a admissibilidade da investigação pelo Tribunal competente. 8. Noutro turno, no julgamento do REsp 1563962/RN (STJ, 5ª T., rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJ 16/11/16), restou consignado que, "No que concerne às investigações relativas a pessoas com foro por prerrogativa de função, tem-se que, embora possuam a prerrogativa de serem processados perante o Tribunal, a lei não excepciona a forma como se procederá à investigação, devendo ser aplicada, assim, a regra geral trazida no art. 5º, inciso II, do Código de Processo Penal, a qual não requer prévia autorização do Judiciário". Ali foi assinalado que a prerrogativa de foro do autor do fato delituoso é critério atinente, de modo exclusivo, à determinação da competência jurisdicional originária do tribunal respectivo, quando do oferecimento da denúncia ou, eventualmente, antes dela, se se fizer necessária diligência sujeita à prévia autorização judicial. (Pet 3825 QO, Relator p/ Acórdão: Min. Gilmar Mendes, Pleno, julgado em 10/10/2007)", registrando que "Não há razão jurídica para condicionar a investigação de autoridade com foro por prerrogativa de função a prévia autorização judicial" e que, "Conforme orientação do Supremo Tribunal Federal no julgamento de MC na ADI n. 5.104/DF, condicionar a instauração de inquérito policial a uma autorização do Poder Judiciário institui modalidade de controle judicial prévio sobre a condução das investigações, em aparente violação ao núcleo essencial do princípio acusatório. 9. Por outro lado, nos termos do art. 41 do CPP, a denúncia descreve as circunstâncias fáticas do delito supostamente cometido pelos denunciados, especificando a data, o local e todas as circunstâncias que envolveram a sua prática, permitindo aos acusados a compreensão dos fatos que lhes foram imputados, tanto que apresentaram suas defesas, não havendo que se falar em inépcia. 10. Da leitura da exordial acusatória, depreende-se que o órgão acusador descreveu minuciosamente em que teria consistido a suposta participação da denunciada L.B.M, então Secretária e Chefe de Gabinete da Prefeitura do Município de Pariconha/AL. Alegação de ausência de justa causa não acolhida. 11 Para o recebimento da inicial acusatória, é suficiente que o Juiz esteja convencido de que haja indícios da autoria e materialidade do delito, sendo prescindível a certeza exigida por ocasião da condenação, vigendo, nessa fase, o princípio in dubio pro societate. 12. O argumento apresentado em defesa prévia - de que inexiste prova de envolvimento de L.B.M nos fatos descritos na denúncia - não faz desaparecer a suposta participação da denunciada, porque: a uma, a circunstância de não haver ligação de L.B.M. no preenchimento das notas fiscais inautênticas, só por si, não exclui a sua participação, até porque, segundo a denúncia, a participação de L.B.M não estaria circunscrita a tal tarefa, mas, sim, nas conversas/reuniões/tratativas direcionadas ao repasse dos recursos; a duas, a ação de execução de título extrajudicial (Processo 0731472-56.2014.8.02.0001 - 2ª Vara Cível de Maceió/AL) movida por L.B.M (ora denunciada) em face da empresa Estratégia Consultoria somente foi ajuizada em novembro/14, meses após a notitia criminis formulada em fevereiro/14 por M.L.A.F, sócia-proprietária da aludida sociedade empresarial, o que demonstra a fragilidade da tese de "vingança" e livramento das obrigações contratuais aventada pela denunciada L.B.M. De todo modo, tais questões só poderão ser esclarecidas quando da instrução criminal, em que o contraditório e ampla defesa são amplamente exercidos. 13. É certo que a presença do elemento subjetivo dolo conclama uma análise mais acurada, a bem da sua completa elucidação, o que poderá ser aferido durante a instrução criminal. 14. Quanto aos denunciados R.P.B. e E.T.S, sócios das empresas Global Tec e Center Cell, considerando que a pena mínima prevista para o delito a eles imputado (falsidade ideológica - art. 299 do CP) não é superior a um ano e já tendo o MPF apresentado proposta de suspensão condicional do processo por um prazo de 02 anos, deve incidir, na espécie, o disposto no art. 89, caput, da Lei 9.099/95. 15. Denúncia recebida.
Decisão
UNÂNIME

Data do Julgamento : 07/03/2018
Data da Publicação : 15/03/2018
Classe/Assunto : INQ - Inquerito - 2992
Órgão Julgador : Pleno
Relator(a) : Desembargador Federal Paulo Machado Cordeiro
Comarca : TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Tipo : Acórdão
Revisor : Desembargador Federal Cid Marconi
Referência legislativa : LEG-FED RES-632 ANO-2009 ART-2 PAR-2 (CJF) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - LEG-FED LEI-9099 ANO-1995 ART-89 (CAPUT) - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CPP-41 Codigo de Processo Penal LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-5 INC-1 INC-2 ART-41 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CP-40 Codigo Penal LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-316 (CAPUT) ART-299 (CAPUT) ART-298 PAR-ÚNICO ART-29 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - ***** CF-88 Constituição Federal de 1988 ART-29 INC-10
Fonte da publicação : DJE - Data::15/03/2018 - Página::31
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